ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA.
PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CIVIL.
PROFESSOR FLÁVIO TARTUCE.
SUCESSÃO LEGÍTIMA. SUCESSÃO DO
CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO.
1
INTRODUÇÃO. TABELA COMPARATIVA.
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual
Não existia a concorrência
sucessória envolvendo o
cônjuge e o companheiro.Foi
introduzido o sistema de
concorrência sucessória
envolvendo o cônjuge (art.
1.829 do CC/2002) e o
companheiro (1.790 do
CC/2002).
Foi introduzido o sistema de
concorrência sucessória
envolvendo o cônjuge (art.
1.829 do CC/2002) e o
companheiro (1.790 do
CC/2002).
2
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual
A ordem de sucessão legítima estava prevista no
art. 1.603 do CC/1916 (“A sucessão legítima
defere-se na ordem seguinte: I – aos
descendentes; II – aos ascendentes; III – ao
cônjuge sobrevivente; IV – aos colaterais; V –
aos Municípios, ao Distrito Federal ou à União”).
Não havia maiores complicações na ordem,
justamente diante da inexistência do instituto da
concorrência. A ordem relativa à sucessão
legítima consta do art. 1.829 do CC/2002, com a
introdução da complicada concorrência
sucessória do cônjuge (“A sucessão legítima
defere-se na ordem seguinte: I – aos
descendentes, em concorrência com o cônjuge
sobrevivente, salvo se casado este com o falecido
no regime da comunhão universal, ou no da
separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão
parcial, o autor da herança não houver deixado
bens particulares; II – aos ascendentes, em
concorrência com o cônjuge; III – ao cônjuge
sobrevivente; IV – aos colaterais”.
A ordem relativa à sucessão legítima consta
do art. 1.829 do CC/2002, com a introdução
da complicada concorrência sucessória do
cônjuge (“A sucessão legítima defere-se na
ordem seguinte: I – aos descendentes, em
concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no
regime da comunhão universal, ou no da
separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da
comunhão parcial, o autor da herança não
houver deixado bens particulares; II – aos
ascendentes, em concorrência com o
cônjuge; III – ao cônjuge sobrevivente; IV –
aos colaterais”.
3
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual.
Existia previsão de um usufruto vidual a favor
do cônjuge do falecido no art. 1.611 do
CC/1916 (“À falta de descendentes ou
ascendentes será deferida a sucessão ao
cônjuge sobrevivente, se, ao tempo da morte
do outro, não estava dissolvida a sociedade
conjugal. § 1.º O cônjuge viúvo, se o regime
de bens do casamento não era o da comunhão
universal, terá direito, enquanto durar a
viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens
do cônjuge falecido, se houver filhos, deste ou
do casal, e à metade, se não houver filhos
embora sobrevivam ascendentes do de
cujus”).Não há mais o usufruto vidual a favor
do cônjuge, pois esse foi supostamente
substituído pelo instituto da concorrência
sucessória.
Não há mais o usufruto vidual a favor do
cônjuge, pois esse foi supostamente
substituído pelo instituto da concorrência
sucessória.
4
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual.
A sucessão do companheiro não constava do CC/1916, mas
de duas leis que regulamentavam a união estável, a Lei
8.971/1994 e a Lei 9.278/1996.O art. 2.º da Lei 8.971/1994
tratada substancialmente dos direitos sucessórios decorrentes
da união estável, nos seguintes termos: “As pessoas referidas
no artigo anterior participarão da sucessão do(a)
companheiro(a) nas seguintes condições: I – o(a)
companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não
constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do
de cujos, se houver filhos ou comuns; II – o(a)
companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não
constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de
cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes;
III – na falta de descendentes e de ascendentes, o(a)
companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da
herança”.O confuso e criticado art. 1.790 do CC/2002 trata
especificamente da sucessão do companheiro ou convivente
nos seguintes termos: “A companheira ou o companheiro
participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos
onerosamente na vigência da união estável, nas condições
seguintes: I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a
uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II
– se concorrer com descendentes só do autor da herança,
tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III –
se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a
um terço da herança; IV – não havendo parentes sucessíveis,
terá direito à totalidade da herança”. Não há mais o usufruto
a favor do companheiro e convivente, mais uma vez
supostamente substituído pela concorrência sucessória.
O confuso e criticado art. 1.790 do CC/2002
trata especificamente da sucessão do
companheiro ou convivente nos seguintes
termos: “A companheira ou o companheiro
participará da sucessão do outro, quanto aos
bens adquiridos onerosamente na vigência da
união estável, nas condições seguintes: I – se
concorrer com filhos comuns, terá direito a uma
quota equivalente à que por lei for atribuída ao
filho; II – se concorrer com descendentes só do
autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que
couber a cada um daqueles; III – se concorrer
com outros parentes sucessíveis, terá direito a
um terço da herança; IV – não havendo
parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da
herança”.
Não há mais o usufruto a favor do companheiro
e convivente, mais uma vez supostamente
substituído pela concorrência sucessória.
5
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual.
O CC/1916 reconhecia direito real de
habitação sobre o imóvel do casal como
direito sucessório, somente ao cônjuge
casado pelo regime da comunhão universal
de bens, conforme o seu art. 1.611 (“§ 2.º Ao
cônjuge sobrevivente, casado sob regime de
comunhão universal, enquanto viver e
permanecer viúvo, será assegurado, sem
prejuízo da participação que lhe caiba na
herança, o direito real de habitação
relativamente ao imóvel destinado à
residência da família, desde que seja o único
bem daquela natureza a inventariar. § 3.º Na
falta do pai ou da mãe, estende-se o
benefício previsto no § 2.º ao filho portador
de deficiência que o impossibilite para o
trabalho”).
O CC/2002 consagra o direito real de
habitação como direito sucessório a favor do
cônjuge casado por qualquer regime de bens
(“Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente,
qualquer que seja o regime de bens, será
assegurado, sem prejuízo da participação
que lhe caiba na herança, o direito real de
habitação relativamente ao imóvel destinado
à residência da família, desde que seja o
único daquela natureza a inventariar”)..
6
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual.
O direito real de habitação como
direito sucessório do
companheiro constava
expressamente do art. 7.º,
parágrafo único, da Lei
9.278/1996 (“Dissolvida a união
estável por morte de um dos
conviventes, o sobrevivente terá
direito real de habitação,
enquanto viver ou não constituir
nova união ou casamento,
relativamente ao imóvel
destinado à residência da
família”).
O direito real de habitação como
direito sucessório do convivente
não é expresso no CC/2002.
Todavia, como se verá, prevalece
o
entendimento
pela
sua
manutenção.
7
Sucessão no sistema anterior
Sucessão no sistema atual.
Eram reconhecidos como
herdeiros necessários os
descendentes e os
ascendentes (art. 1.721 do
CC/1916).
São herdeiros necessários
os
descendentes,
os
ascendentes e o cônjuge
(art. 1.845 do CC/2002).
8
Da sucessão dos descendentes e a concorrência do cônjuge
“Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na
ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o
cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com
o falecido no regime da comunhão universal, ou
no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão
parcial, o autor da herança não houver deixado
bens particulares.”
9
Da sucessão dos descendentes e a concorrência do cônjuge
TABELA
Regimes em que o
cônjuge herda em
concorrência
Regimes em que o
cônjuge não herda em
concorrência
Regime da comunhão parcial de
bens, em havendo bens
particulares do falecido.
Regime da participação final nos
aquestos.
Regime da separação
convencional de bens
Regime da comunhão parcial de
bens, não havendo bens
particulares do falecido.
Regime da comunhão universal de
bens.
Regime da separação legal ou
obrigatória de bens.
10
OBSERVAÇÕES.
• A primeira observação é que, como se nota, o
objetivo do legislador foi separar claramente a
meação da herança. Assim, pelo sistema instituído,
quando o cônjuge é meeiro não é herdeiro; quando
é herdeiro não é meeiro. Nunca se pode esquecer
que a meação não se confunde com a herança,
sendo esta confusão muito comum entre os
operadores do Direito. Meação é instituto de
Direito de Família, que depende do regime de
bens adotado. Herança é instituto de Direito das
Sucessões, que decorre da morte do falecido.
11
OBSERVAÇÕES.
• Como segunda observação, fica em xeque a
hipótese em que o regime em relação ao
falecido é o da comunhão parcial de bens,
não deixando o de cujus bens particulares.
Isso porque, como observa Zeno Veloso em
suas palestras e exposições, é provável que
o morto tenha deixado pelo menos a roupa
do corpo, sendo esta um bem particular. Em
suma, fica difícil imaginar a hipótese em que
o cônjuge casado pela comunhão parcial
não tenha deixado bens particulares.
12
OBSERVAÇÕES.
• Terceira observação: no regime da comunhão parcial de bens, a
concorrência sucessória somente se refere aos bens particulares. Nesse
sentido o Enunciado n. 270 CJF/STJ, da III Jornada de Direito Civil: “O
art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de
concorrência com os descendentes do autor da herança quando
casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados
nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o
falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência
se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser
partilhados exclusivamente entre os descendentes”. Destaque-se esse
também é o entendimento de Christiano Cassettari, Eduardo de Oliveira
Leite, Giselda Hironaka, Gustavo Nicolau, Jorge Fujita, José Fernando
Simão, Maria Helena Daneluzzi, Mário Delgado, Rodrigo da Cunha
Pereira, Rolf Madaleno, Sebastião Amorim, Euclides de Oliveira e Zeno .
Tal corrente, prevalecente na doutrina, é adotada por vários julgados (a
título de exemplo: TJMG, Apelação Cível 1.0016.05.046273-4/0011,
Alfenas, 5.ª Câmara Cível, Rel. Des. Barros Levenhagen, j. 17.12.2009,
DJEMG 22.01.2010; TJRS, Agravo de Instrumento 70021504923,
Pelotas, 8.ª Câmara Cível, Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, j.
11.12.2007, DOERS 28.12.2007, p. 20; TJSP, Agravo de Instrumento
635.958.4/1, Acórdão 3651464, Araçatuba, 4.ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani, j. 14.05.2009, DJESP
13
15.06.2009).
OBSERVAÇÕES
• Todavia, o entendimento está longe de ser
unânime, pois há quem entenda que a
concorrência na comunhão parcial deve se dar
tanto em relação aos bens particulares quanto aos
comuns (Francisco Cahali, Guilherme Calmon
Nogueira da Gama, Inácio de Carvalho Neto, Maria
Helena Diniz e Mário Roberto Carvalho de Faria).
• Por fim, isoladamente, Maria Berenice Dias
entende que a concorrência somente se refere aos
bens comuns. De toda sorte, destaque-se que há
decisão do STJ que chega a mencionar uma
quarta corrente.
14
“(...). A regra do art. 1.829, I, do CC/2002, que seria aplicável caso a
companheira tivesse se casado com o ‘de cujus’ pelo regime da comunhão
parcial de bens, tem interpretação muito controvertida na doutrina,
identificando-se três correntes de pensamento sobre a matéria: (i) a
primeira, baseada no Enunciado n. 270 das Jornadas de Direito Civil,
estabelece que a sucessão do cônjuge, pela comunhão parcial, somente se
dá na hipótese em que o falecido tenha deixado bens particulares, incidindo
apenas sobre esses bens; (ii) a segunda, capitaneada por parte da doutrina,
defende que a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenas se o
‘de cujus’ tiver deixado bens particulares, mas incide sobre todo o
patrimônio, sem distinção; (iii) a terceira defende que a sucessão do
cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido não tiver deixado
bens particulares. (...). É possível encontrar, paralelamente às três linhas de
interpretação do art. 1.829, I, do CC/2002 defendidas pela doutrina, uma
quarta linha de interpretação, que toma em consideração a vontade
manifestada no momento da celebração do casamento, como norte para a
interpretação das regras sucessórias. Impositiva a análise do art. 1.829, I,
do CC/2002, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretando o
dispositivo em harmonia com os demais que enfeixam a temática, em atenta
observância dos princípios e diretrizes teóricas que lhe dão forma,
marcadamente, a dignidade da pessoa humana, que se espraia, no plano
da livre manifestação da vontade humana, por meio da autonomia privada e
da consequente autorresponsabilidade, bem como da confiança legítima, da
qual brota a boa-fé; a eticidade, por fim, vem complementar o sustentáculo
principiológico que deve delinear os contornos da norma jurídica.
15
“Até o advento da Lei n.º 6.515/1977 (Lei do Divórcio), vigeu no
Direito brasileiro, como regime legal de bens, o da comunhão
universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre à
herança, por já lhe ser conferida a meação sobre a totalidade
do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio,
contudo, o regime legal de bens no casamento passou a ser o
da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 do
CC/2002. Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens,
de acordo com o postulado da autodeterminação, ao
contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação,
além da concorrência hereditária sobre os bens comuns,
mesmo que haja bens particulares, os quais, em qualquer
hipótese, são partilhados apenas entre os descendentes.
Recurso especial improvido” (STJ, REsp 1.117.563/SP, Rel.
Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 17.12.2009, DJe
06.04.2010).
16
OBSERVAÇÕES.
Como quarta observação, há um claro erro na
menção ao art. 1.640, parágrafo único, do CC,
referente ao regime da separação obrigatória
de bens. Isso porque o regime da separação
legal ou obrigatória é aquele tratado pelo art.
1.641 do CC, envolvendo as pessoas que se
casam
em
inobservância
às
causas
suspensivas do casamento, os maiores de 70
anos (atualizado com a Lei n. 12.344/2010) e
as pessoas que necessitam de suprimento
judicial para casar. Nessa linha, afastando a
concorrência sucessória apenas na separação
17
obrigatória de bens
“Inventário. Viúva casada com o autor da
herança no regime de separação convencional
de bens. Direito à sucessão legítima em
concorrência com a filha do falecido.
Inteligência do artigo 1.829, I, do Código Civil.
Vedação que somente ocorre, entre outras
causas, se o regime de casamento for o de
separação obrigatória de bens. Recurso
improvido” (TJSP, Agravo de Instrumento
313.414-4/1, Barretos, 3.ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Des. Flavio Pinheiro, j.
04.11.2003).
18
Porém, em decisão surpreendente, o Superior Tribunal
de Justiça concluiu que “O regime da separação
obrigatória de bens, previsto no art. 1.829, inc. I, do
CC/02, é gênero que congrega duas espécies: (i)
separação legal, (ii) separação convencional. Uma
decorre da lei e outra da vontade das partes, e ambas
obrigam os cônjuges, uma vez estipulado o regime da
separação de bens, à sua observância. Não
remanesce, para o cônjuge casado mediante
separação de bens, direito à meação, tampouco à
concorrência sucessória, respeitando-se o regime de
bens estipulado, que obriga as partes na vida e na
morte. Nos dois casos, portanto, o cônjuge não é
herdeiro necessário” (STJ, REsp 992.749/MS, Rel.
Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 01.12.2009, DJe
19
05.02.2010).
• Na verdade, o julgado se refere a uma situação peculiar, de um
homem viúvo, com 51 anos de idade e graves problemas de
saúde, que se casou com uma mulher de 21 anos de idade
pelo regime da separação convencional de bens. Pela
evidência, no caso, de um suposto golpe do baú, houve-se por
bem desenvolver a tese exposta, a fim de afastar o direito
sucessório da esposa.
• O julgado merece críticas como já fez parte da doutrina, caso
de José Fernando Simão e Zeno Veloso. A principal crítica se
refere ao fato de o julgado ignorar preceito legal, bem como
todo o tratamento doutrinário referente às categorias da
separação legal e da separação convencional de bens.
Ademais, some-se a constatação pela qual o acórdão
supostamente solucionou um caso concreto, mas criou
problemas outros tantos, pela incerteza categórica que gerou.
Em suma, como Zeno Veloso, espera-se que tal forma de
conclusão permaneça sozinha e isolada.
20
• Merece destaque o julgado da 2.ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em decisão do
final do ano de 2011, que afasta a concorrência sucessória do
cônjuge no regime da separação convencional de bens. O
acórdão foi assim ementado: “AGRAVO DE INSTRUMENTO.
Inventário. Decisão que declarou que o cônjuge supérstite não
é herdeiro nem meeiro. Viúva que foi casada com o autor da
herança pelo regime da separação convencional. Decisão que
contraria a lei, em especial os artigos 1.845 e 1829 do Código
Civil. Decisão reformada. Agravo provido” (TJSP, Agravo de
Instrumento 0007645-96.2011. Agravantes: Silvia Maria Aranha
Matarazzo (inventariante) e outro. Agravada: Flavia Matarazzo
Comarca: São Paulo. Relator Des. José Carlos Ferreira Alves,
j. 04.10.2011).
21
• Mais recentemente: RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS
SUCESSÕES. INVENTÁRIO E PARTILHA. EGIME DE BENS.
SEPARAÇÃO CONVENCIONAL. PACTO ANTENUPCIAL POR
ESCRITURA PÚBLICA. CÔNJUGE SOBREVIVENTE.
CONCORRÊNCIA NA SUCESSÃO HEREDITÁRIA COM
DESCENDENTES. CONDIÇÃO DE HERDEIRO. RECONHECIMENTO.
EXEGESE DO ART. 1.829, I, DO CC/02. AVANÇO NO CAMPO
SUCESSÓRIO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO
AO RETROCESSO SOCIAL. 1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002
confere ao cônjuge casado sob a égide do regime de separação
convencional a condição de herdeiro necessário, que concorre com os
descendentes do falecido independentemente do período de duração do
casamento, com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário para uma
sobrevivência digna. 2. O intuito de plena comunhão de vida entre os
cônjuges (art. 1.511 do Código Civil) conduziu o legislador a incluir o
cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários (art. 1.845), o
que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo
sucessório, à luz do princípio da vedação ao retrocesso social. 3. O
pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional
somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de
administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a
morte por inexistir no ordenamento pátrio previsão de ultratividade do
regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime 22
matrimonial...
“4. O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e
não, como cediço no direito de família, a vida em comum. As situações,
porquanto distintas, não comportam tratamento homogêneo, à luz do
princípio da especificidade, motivo pelo qual a intransmissibilidade
patrimonial não se perpetua post mortem. 5. O concurso hereditário na
separação convencional impõe-se como norma de ordem pública, sendo
nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque o
referido regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência
posta no art. 1.829, I, do Código Civil. 6. O regime da separação
convencional de bens escolhido livremente pelos nubentes à luz do
princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se
confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é
imposto de forma cogente pela legislação (art. 1.641 do Código Civil), e no
qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente. 7.
Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o intérprete
restringir onde a lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma da
separação dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal de 1988). 8. O novo
Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao
casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda
que os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões
deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo patrimônio
é, inexoravelmente, composto somente por acervo particular. Recurso
especial não provido”. (REsp 1472945/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS
BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe
19/11/2014)
23
• Superadas tais observações, outra regra
importante consta do art. 1.832 do CC, outra
novidade introduzida no sistema, cuja redação
merece destaque:
• “Art. 1.832. Em concorrência com os
descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao
cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem
por cabeça, não podendo a sua quota ser
inferior à quarta parte da herança, se for
ascendente dos herdeiros com que concorrer”.
24
• De início, a norma enuncia que o cônjuge recebe o mesmo
quinhão que receberem os descendentes. Ademais, o
comando consagra a reserva de 1/4 da herança ao cônjuge, se
ele for ascendente dos descendentes com quem concorrer.
Assim, se o cônjuge concorrer somente com descendentes do
falecido, não haverá a referida reserva. Na verdade, a questão
somente ganha relevo se houver a concorrência com mais de
três descendentes do falecido, situação em que a reserva da
quarta parte ficaria em xeque.
• Pois bem, o debate que o dispositivo desperta tem relação com
a chamada sucessão híbrida, expressão de Giselda Hironaka,
presente quando o cônjuge concorre com descendentes
comuns (de ambos) e com descendentes exclusivos do autor
da herança, isso porque tal hipótese não foi prevista pelo
legislador, presente uma lacuna normativa. Duas são as
correntes fundamentais que surgem, conforme consta da
25
tabela doutrinária elaborada por Francisco Cahali:
• 1.ª Corrente – Majoritária – Em havendo sucessão híbrida, não se
deve fazer a reserva da quarta parte ao cônjuge, tratando-se todos
os descendentes como exclusivos do autor da herança. Assim
entendem Caio Mário da Silva Pereira, Christiano Cassettari,
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Gustavo René Nicolau,
Inácio de Carvalho Neto, Jorge Fujita, Luiz Paulo Vieira de Carvalho,
Maria Berenice Dais, Maria Helena Diniz, Maria Helena Braceiro
Daneluzzi, Mário Delgado, Mário Roberto Carvalho de Faria, Rodrigo
da Cunha Pereira, Rolf Madaleno, Sebastião Amorim, Euclides de
Oliveira e Zeno Veloso; além do presente autor. O entendimento
prestigia os filhos em detrimento do cônjuge, sendo essa a opção
constitucional, na opinião deste autor. Adotando a premissa, na V
Jornada de Direito Civil aprovou-se o seguinte enunciado: “Na
concorrência entre o cônjuge e os herdeiros do de cujus não será
reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso de
filiação híbrida” (Enunciado n. 527).
• 2.ª Corrente – Minoritária – Em havendo sucessão híbrida, deve ser
feita a reserva da quarta parte ao cônjuge, tratando-se todos os
descendentes como comuns. Assim pensam Francisco José Cahali,
José Fernando Simão e Sílvio de Salvo Venosa.
26
• Ainda a respeito do direito hereditário do
cônjuge, é fundamental o estudo do polêmico
art. 1.830 do CC, que tem aplicação tanto para
os casos em que o cônjuge sucede
isoladamente quanto em concorrência com os
descendentes e ascendentes:
• “Art. 1.830. Somente é reconhecido direito
sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao
tempo da morte do outro, não estavam
separados judicialmente, nem separados de
fato há mais de dois anos, salvo prova, neste
caso, de que essa convivência se tornara
27
impossível sem culpa do sobrevivente”.
Da sucessão do cônjuge isoladamente.
• De acordo com a primeira parte do dispositivo, se o cônjuge
sobrevivente estava separado judicialmente ao tempo da morte
do outro, não terá direito sucessório reconhecido. Deve-se
atentar ao fato de que este autor segue a corrente que
sustenta que a Emenda Constitucional 66/2010 retirou do
sistema a separação de direito – a incluir a separação judicial e
a extrajudicial –, restando apenas o divórcio como forma de
extinção do casamento. Por esse caminho, a primeira parte do
comando somente se aplica às pessoas separadas
judicialmente quando da entrada em vigor da Emenda
Constitucional, perdendo em parte considerável a sua
aplicação prática.
• Já a segunda parte do art. 1.830 do CC preconiza que o
cônjuge separado de fato há mais de dois anos também não
tem reconhecido o seu direito sucessório, salvo se provar que
o fim do casamento não se deu por culpa sua. A menção à
culpa é amplamente criticada pelos doutrinadores brasileiros.
Rolf Madaleno aponta e critica a existência de uma culpa
28
mortuária, a conduzir a uma prova diabólica.
• Na esteira de suas palavras, e conforme já manifestado em obra escrita em
coautoria com José Fernando Simão, este autor entende que a menção à
culpa deve ser vista com ressalvas, prevalecendo na análise do intérprete
apenas a separação de fato do casal.
• De toda sorte, ainda podem ser encontrados dois outros posicionamentos
antagônicos. Para um primeiro entendimento, a culpa não pode ser mais
debatida para fins de dissolução do casamento, desde a entrada em vigor
da Emenda do Divórcio (EC 66/2010). Sendo assim, também não pode ser
discutida para fins sucessórios. Assim pensam, por exemplo, Paulo Lôbo,
Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. Para um segundo
entendimento, o art. 1.830 do CC permanece incólume, tendo ampla
aplicação, pois em vigor, devendo a citada culpa mortuária ou funerária ser
investigada. Alguns julgados fazem o comando incidir, sem qualquer
restrição, inclusive com perquirição de culpa (a título de exemplo: TJMG,
Apelação Cível 1.0431.05.022656-9/0011, Monte Carmelo, 2.ª Câmara
Cível, Rel. Des. Caetano Levi Lopes, j. 02.06.2009, DJEMG 23.06.2009;
TJMG, Apelação Cível 1.0479.05.094351-9/0011, Passos, 4.ª Câmara Cível,
Rel. Des. Moreira Diniz, j. 05.02.2009, DJEMG 27.02.2009; TJSP, Agravo de
Instrumento 582.605.4/1, Acórdão 3509289, Batatais, 10.ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Des. Octavio Helena, j. 03.03.2009, DJESP
09.06.2009).
• Em suma, os limites de subsunção do art. 1.830 do CC é tema ainda em
aberto na doutrina e na jurisprudência nacionais, residindo na norma um
dos grandes desafios da civilística sucessória brasileira.
29
DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CÔNJUGE
• Ato contínuo de estudo, repise-se que o art. 1.831 reconhece ao
cônjuge sobrevivente, seja qual for o regime de bens do casamento,
o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à
residência da família, desde que seja o único daquela natureza a
inventariar. Na esteira da melhor jurisprudência, não importa se o
imóvel é comum ou exclusivo do falecido, reconhecendo-se o direito
real em ambos os casos (STJ, REsp 826.838/RJ, 3.ª Turma, Rel.
Min. Castro Filho, j. 25.09.2006, DJU 16.10.2006, p. 373).
• A norma visa a proteger o direito de moradia do cônjuge, direito
fundamental reconhecido pelo art. 6.º da Constituição Federal. Em
sintonia com o comando, pode ser citada a célebre tese do
patrimônio mínimo, de Luiz Edson Fachin, segundo a qual deve-se
assegurar à pessoa um mínimo de direitos patrimoniais para a
manutenção de sua dignidade.
• Leciona Zeno Veloso que tal direito real de habitação é
personalíssimo, tendo como destinação específica a moradia do
titular, que não poderá emprestar ou locar o imóvel a terceiro. Aponta
ainda o jurista paraense não parecer justo manter tal direito se o
cônjuge constituir nova família
30
DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CÔNJUGE
• Merece críticas o Enunciado n. 271 CJF/STJ, da III
Jornada de Direito Civil, pelo qual: “O cônjuge pode
renunciar ao direito real de habitação, nos autos do
inventário ou por escritura pública, sem prejuízo de
sua participação na herança”. Na opinião deste autor,
o direito real de habitação é irrenunciável, por
envolver a consagração do direito fundamental à
moradia nas relações privadas (art. 6.º da CF/1988).
Repise-se que, nessa linha, a jurisprudência do STJ
entende que o Bem de Família, pela mesma razão, é
irrenunciável (ver, por todos: STJ, AgRg-Ag
426.422/PR, 3.ª Turma, Rel. Des. Conv. Paulo
Furtado, j. 27.10.2009, DJE 12.11.2009 e AgRg-Ag
1.114.259/RS, 3.ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j.
31
26.05.2009, DJE 08.06.2009).
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
Um dos dispositivos mais criticados e comentados da atual codificação
privada é o relativo à sucessão do companheiro, merecendo
destaque especial para os devidos aprofundamentos:
“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão
do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da
união estável, nas condições seguintes:
I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente
à que por lei for atribuída ao filho;
II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á
a metade do que couber a cada um daqueles;
III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um
terço da herança;
IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da
herança”.
A norma está mal colocada, introduzida entre as disposições gerais do
Direito das Sucessões. Isso se deu pelo fato de o tratamento relativo
à união estável ter sido incluído no CC/2002 nos últimos momentos
de sua elaboração. Pelo mesmo fato, o companheiro não consta da
ordem de vocação hereditária, sendo tratado como um herdeiro 32
especial.
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• HÁ QUEM ENTENDA QUE O TRATAMENTO DIFERENCIADO
É INCONSTITUCIONAL. ZENO VELOSO E GISELDA
HIRONAKA.
• TRIBUNAIS ESTADUAIS.
Alguns Órgãos Especiais de Tribunais já julgaram a matéria:
- TJSP – PELA CONSTITUCIONALIDADE.
- TJES – PELA CONSTITUCIONALIDADE.
- TJRS – PELA CONSTITUCIONALIDADE.
- TJPR – PELA INCONSTITUCIONALIDADE.
- TJRJ – PELA INCONSTITUCIONALIDADE
33
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
O STJ DETERMINOU A REMESSA PARA O ÓRGÃO ESPECIAL PARA
APRECIAÇÃO DA MATÉRIA.
O julgado suscitava apenas a inconstitucionalidade dos incs. III e IV do art.
1.790.
“INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1.790,
INCISOS III E IV DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. UNIÃO ESTÁVEL.
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. CONCORRÊNCIA COM PARENTES
SUCESSÍVEIS. Preenchidos os requisitos legais e regimentais, cabível o
incidente de inconstitucionalidade dos incisos, III e IV, do art. 1790, Código
Civil, diante do intenso debate doutrinário e jurisprudencial acerca da
matéria tratada” (STJ, AI no REsp 1135354/PB, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/05/2011, DJe 02/06/2011).
Porém, em outubro de 2012, o Órgão Especial da Corte Superior concluiu pela
não apreciação dessa inconstitucionalidade suscitada pela 4.ª Turma, eis
que o recurso próprio para tanto deve ser o extraordinário, a ser julgado
pelo Supremo Tribunal Federal (publicado no Informativo n. 505 do STJ).
Em suma, a questão da inconstitucionalidade não foi resolvida em sede de
Superior Tribunal de Justiça, aguardando-se eventual julgamento pelo STF
34
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
Pois bem, como premissa fundamental para o reconhecimento do
direito sucessório do companheiro ou companheira, o caput do
comando enuncia que somente haverá direitos quanto aos
bens adquiridos onerosamente durante a união. Desse modo,
comunicam-se os bens havidos pelo trabalho de um ou de
ambos durante a existência da união estável, excluindo-se
bens recebidos a título gratuito, por doação ou sucessão. Deve
ficar claro que a norma não está tratando de meação, mas de
sucessão ou herança, independentemente do regime de bens
adotado
Por isso, em regra, pode-se afirmar que o companheiro é meeiro
e herdeiro, eis que, no silêncio das partes, vale para a união
estável o regime da comunhão parcial de bens (art. 1.725 do
CC). Cumpre destacar que tais premissas foram adotadas e
citadas em recente acórdão do Superior Tribunal de Justiça
(STJ, REsp 887990/PE, Rel. Min. Fernando Gonçalves, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, 4.ª Turma, j. 24.05.2011, DJe
23.11.2011).
35
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• Surge, como primeira polêmica, problema referente aos bens adquiridos
pelo companheiro a título gratuito (v.g., doação). Se o companheiro falecido
tiver apenas bens recebidos a esse título, não deixando descendentes,
ascendentes ou colaterais, os bens devem ser destinados ao companheiro
ou ao Estado?
• Filia-se ao entendimento de transmissão ao companheiro, pela clareza do
art. 1.844 do CC, pelo qual os bens somente serão destinados ao Estado se
o falecido não deixar cônjuge, companheiro ou outro herdeiro. Na tabela
doutrinária, esse parece ser o entendimento majoritário, eis que exposta a
dúvida em relação à possibilidade de o companheiro concorrer com o
Estado em casos tais. A maioria dos doutrinadores respondeu
negativamente para tal concorrência, caso de Caio Mário da Silva Pereira,
Christiano Cassettari, Eduardo de Oliveira Leite, Guilherme Calmon
Nogueira da Gama, Gustavo René Nicolau, Jorge Fujita, José Fernando
Simão, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Maria Berenice Dias, Maria Helena
Diniz, Mario Roberto de Faria, Rolf Madaleno, Sebastião Amorim, Euclides
de Oliveira e Sílvio de Salvo Venosa; além do presente autor.
• Por outra via, sustentando que o companheiro deve concorrer com o Estado
em casos tais: Francisco José Cahali, Giselda Hironaka, Inácio de Carvalho
Neto, Maria Helena Daneluzzi, Mário Delgado, Rodrigo da Cunha Pereira e
Zeno Veloso. Ato contínuo de estudo, nota-se que o art. 1.790 do CC
reconhece direitos sucessórios ao convivente em concorrência com os 36
descendentes do autor da herança.
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• Nos termos do seu inc. I, se o companheiro concorrer com filhos comuns
(de ambos), terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída
ao filho. Por outra via, se concorrer com descendentes só do autor da
herança (descendentes exclusivos), tocar-lhe-á a metade do que couber a
cada um daqueles. O equívoco é claro na redação dos incisos, uma vez que
o primeiro faz menção aos filhos; enquanto que o segundo aos
descendentes. Na esteira da melhor doutrina, é forçoso concluir que o inc. I
também incide às hipóteses em que estão presentes outros descendentes
do falecido. Nesse sentido, o Enunciado n. 266 CJF/STJ, da III Jornada de
Direito Civil: “Aplica-se o inc. I do art. 1.790 também na hipótese de
concorrência do companheiro sobrevivente com outros descendentes
comuns, e não apenas na concorrência com filhos comuns”.
• Na tabela doutrinária de Francisco Cahali, tal conclusão é quase unânime,
assim pensando Caio Mário da Silva Pereira, Christiano Cassettari,
Francisco Cahali, Giselda Hironaka, Inácio de Carvalho Neto, Guilherme
Calmon Nogueira da Gama, Gustavo René Nicolau, Jorge Fujita, José
Fernando Simão, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Rolf Madaleno, Sebastião
Amorim e Euclides de Oliveira; além do presente autor. Em sentido
contrário, pela aplicação do inc. III do art. 1.790 do CC, em situações tais,
apenas Maria Berenice Dias e Mário Roberto Carvalho de Faria.[
37
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• Mais uma vez, situação não descrita refere-se à sucessão
híbrida, ou seja, caso em que o companheiro concorre, ao
mesmo tempo, com descendentes comuns e exclusivos do
autor da herança. Novamente, a Torre de Babel aparece,
surgindo, sobre o problema, três correntes fundamentais bem
definidas:
• 1.ª Corrente – Em casos de sucessão híbrida, deve-se aplicar
o inciso I do art. 1.790, tratando-se todos os descendentes
como se fossem comuns, já que filhos comuns estão
presentes. Esse entendimento é o majoritário na tabela
doutrinária de Cahali: Caio Mário da Silva Pereira, Christiano
Cassettari, Francisco Cahali, Inácio de Carvalho Neto, Jorge
Fujita, José Fernando Simão, Luiz Paulo Vieira de Carvalho,
Maria Berenice Dias, Maria Helena Daneluzzi, Mário Delgado,
Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno e Silvio de Salvo
Venosa.
38
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• 2.ª Corrente – Presente a sucessão híbrida, subsume-se o
inciso II do art. 1.790, tratando-se todos os descendentes
como se fossem exclusivos (só do autor da herança). Este
autor está filiado a tal corrente, assim como Gustavo René
Nicolau, Maria Helena Diniz, Sebastião Amorim, Euclides de
Oliveira e Zeno Veloso. Ora, como a sucessão é do falecido,
em havendo dúvida por omissão legislativa, os
descendentes devem ser tratados como sendo dele, do
falecido.
Anote-se que julgado do TJSP adotou essa corrente (TJSP,
Agravo de Instrumento 994.08.138700-0, Acórdão 4395653,
São Paulo, 7.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Álvaro
Passos, j. 24.03.2010, DJESP 15.04.2010). No mesmo
sentido: TJSP, Agravo de Instrumento 652.505.4/0, Acórdão
4068323, São Paulo, 5.ª Câmara de Direito Privado, Rel.
Des. Roberto Nussinkis Mac Cracken, j. 09.09.2009, DJESP
05.10.2009).
39
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• 3.ª Corrente – Na sucessão híbrida, deve-se aplicar fórmula matemática de
ponderação para a sua solução. Dentre tantas fórmulas, destaca-se a
Fórmula Tusa, elaborada por Gabriele Tusa, com o auxílio do economista
Fernando Curi Peres.
Superada a controvérsia a respeito da sucessão híbrida, seguindo na leitura e
estudo do art. 1.790 do CC, enuncia o seu inciso III que se o companheiro
ou convivente concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um
terço da herança. Como outros parentes sucessíveis, leiam-se os
ascendentes e os colaterais até quarto grau. Como se verá, há julgados que
reconhecem a inconstitucionalidade dessa previsão, por colocar o
companheiro em posição desfavorável em relação a parentes longínquos,
com os quais muitas vezes não se tem contato social. Ora, muitas vezes
não se sabe sequer o nome de um tio-avô, de um sobrinho-neto ou mesmo
de um primo. Deve ficar claro que este autor está filiado à tese de
inconstitucionalidade do comando.
Por fim, consagra o inc. IV do art. 1.790 do CC que, não havendo parentes
sucessíveis – descendentes, ascendentes e colaterais até o quarto grau –, o
companheiro terá direito à totalidade da herança.
40
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• Outra questão controvertida a respeito da sucessão do companheiro se
refere ao direito real de habitação sobre o imóvel do casal, eis que o
CC/2002 não o consagra expressamente. Todavia, apesar do silêncio do
legislador, prevalece o entendimento pela manutenção de tal direito
sucessório. Nesse sentido, o Enunciado n. 117 CJF/STJ, da I Jornada de
Direito Civil: “o direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro,
seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/1996, seja em
razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6.º,
caput, da CF/1988”.
• Como se nota, dois são os argumentos que constam do enunciado
doutrinário. O primeiro é que não houve a revogação expressa da Lei
9.278/1996, na parte que tratava do citado direito real de habitação (art. 7.º,
parágrafo único). O segundo argumento, mais forte, é a prevalência do
citado direito diante da proteção constitucional da moradia, retirada do art.
6.º da CF/1988, o que está em sintonia com o Direito Civil Constitucional.
De fato, esse entendimento prevalece na doutrina nacional. Na citada tabela
doutrinária, assim deduzem Christiano Cassettari, Giselda Hironaka,
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Gustavo René Nicolau, Jorge Fujita,
José Fernando Simão, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Maria Berenice Dias,
Maria Helena Diniz, Maria Helena Daneluzzi, Rodrigo da Cunha Pereira,
Rolf Madaleno, Sebastião Amorim, Euclides de Oliveira, Sílvio de Salvo
Venosa e Zeno Veloso; além deste autor.
41
SUCESSÃO DO COMPANHEIRO.
• Não é diferente a conclusão da jurisprudência, havendo inúmeros julgados
que concluem pela manutenção do direito real de habitação a favor do
companheiro (por todos: STJ, REsp. 821.660/DF, 3.ª Turma, Rel. Min.
Sidnei Beneti, j. 14.06.2011, v.u.; TJSP, Agravo de Instrumento
990.10.007582-9, Acórdão 4569452, Araçatuba, 1.ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Des. De Santi Ribeiro, j. 29.06.2010, DJESP 28.07.2010;
TJRS, Apelação Cível 70029616836, Porto Alegre, 7.ª Câmara Cível, Rel.
Des. André Luiz Planella Villarinho, j. 16.12.2009, DJERS 06.01.2010, p. 35;
TJDF, Recurso 2006.08.1.007959-5, Acórdão 355.521, 6.ª Turma Cível,
Rel.ª Des.ª Ana Maria Duarte Amarante Brito, DJDFTE 13.05.2009, p. 145;
TJSP, Apelação 573.553.4/2, Acórdão 4005883, Guarulhos, 4.ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani, j. 30.07.2009, DJESP
16.09.2009; TJSP, Apelação com Revisão 619.599.4/5, Acórdão 3692033,
São Paulo, 6.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Percival Nogueira, j.
18.06.2009, DJESP 14.07.2009).
• De toda sorte, a conclusão não é unânime, pois há quem entenda que tal
direito não persiste mais, tendo o legislador feito silêncio eloquente:
Francisco José Cahali, Inácio de Carvalho Neto e Mário Luiz Delgado. No
mesmo sentido podem ser encontrados alguns julgados (cite-se: TJSP,
Apelação 991.06.028671-7, Acórdão 4621644, São Paulo, 22.ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Des. Campos Mello, j. 26.07.2010, DJESP 12.08.2010
e TJSP, Apelação com Revisão 473.746.4/4, Acórdão 4147571,
Fernandópolis, 7.ª Câmara de Direito Privado B, Rel.ª Des.ª Daise Fajardo
42
Nogueira Jacot, j. 27.10.2009, DJESP 10.11.2009).
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aula. escola paulista da magistratura. sucessão do