X Encontro Nacional de Educação Matemática
Educação Matemática, Cultura e Diversidade
Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010
TRABALHO DOCENTE NO ENSINO MÉDIO: UMA APROXIMAÇÃO
DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA
Gilvan Luiz Machado Costa
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
[email protected]
Resumo: O estudo objetivou compreender preliminarmente o trabalho do professor de
matemática do ensino médio no Brasil. Buscou-se na literatura e nos documentos
disponibilizados pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE e pelo Ministério da
Educação – MEC, identificar quem são os sujeitos docentes do ensino médio e
compreender as condições em que o trabalho docente se realiza nessa etapa da educação
básica. Pode-se inferir que os professores do ensino médio das escolas públicas
compõem um grupo muito singular e que foi precarizado pelas reformas. Esses
professores, em relação aos da educação infantil e ensino fundamental, têm mais aulas,
turmas, alunos, turnos e empregos. Tal compreensão sinaliza para a necessidade de
estudos que possam desvelar, ainda mais, quem são os sujeitos que ensinam matemática
na última etapa da educação básica e suas condições de trabalho. Questões relacionadas
à saúde, à evasão de professores de matemática, ao desinteresse dos jovens em tornar-se
trabalhador da educação e à falta de professores de matemática, sobretudo no ensino
médio, e que estão articuladas à precarização da remuneração e das condições de
trabalho, continuam atuais e precisam ser compreendidas.
Palavras-chave: Professor de Matemática; Ensino Médio; Regulação; Expansão.
INTRODUÇÃO
A escola aparece hoje como uma instituição frequentada pela quase totalidade da
população brasileira de 7 a 14 anos. Tudo indica que, em poucos anos, essa realidade se
estenderá para os brasileiros pertencentes à faixa etária de 4 a 17 anos. É inegável a
ampliação significativa do acesso à educação básica em todas as suas etapas. Em 2008,
foram matriculados 53.232.868 alunos na educação infantil, ensino fundamental e
médio. O ensino médio, no mesmo ano, apresentou 8.366.100 alunos matriculados
nessa etapa da educação básica. As políticas educacionais no Brasil das duas últimas
décadas tiveram como eixo a equidade social e se articularam inicialmente pela busca
da universalização do ensino fundamental e mais recentemente buscam ampliar o acesso
ao ensino médio e educação infantil.
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O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb, que substitui o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério – Fundef, é uma demonstração de tais intenções, ao ampliar a abrangência
do financiamento a etapas e modalidades da educação anteriormente excluídas do
Fundef. E mais recentemente, a Emenda Complementar 59/2009, cuja redação alterou
os incisos I e VII, do artigo 208, prevê obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete
anos.
As reformas educacionais ocorridas no Brasil buscaram a promoção da justiça
social e foram concebidas para amenizar as desigualdades sociais, ao ampliar o acesso à
educação básica e abrir a escola pública à população em situação vulnerável. As
políticas educacionais foram ao mesmo tempo políticas de desenvolvimento e políticas
sociais ao buscar, com a ampliação do acesso e a permanência na escola, a formação da
força de trabalho articulada à distribuição de renda e assistência social (ASSUNÇÃO;
OLIVEIRA, 2009).
A lógica adotada para as mudanças tem sua gênese na reforma do Estado que, a
partir de 1990, assume uma forma de gestão baseada nos princípios da descentralização
administrativa e financeira. A escola se “fortalece” e passa a assumir responsabilidades
na condução do processo educacional e na captação de recursos para atingir as metas
determinadas pelos órgãos centrais. O Estado centraliza as decisões, via diretrizes
nacionais e avaliações, e descentraliza dando autonomia para as escolas públicas
construírem seus projetos político-pedagógicos e buscarem outros recursos de ordem
financeira, além dos recebidos do governo federal, estadual ou municipal.
Com a Emenda Constitucional 14/1996, o governo federal transferiu as
responsabilidades do ensino fundamental e médio para os municípios e estados,
respectivamente. Com a criação do Fundef, em 1996, o movimento de ampliação das
matrículas na educação básica se intensifica e ganha novos contornos. As redes
estaduais e municipais adquirem autonomia e a usam para ampliar a matrícula, a partir
da construção de novas escolas, sobretudo, pelas redes municipais, do aumento do
número de alunos nas salas de aula, do uso intensivo do turno noturno e, em algumas
situações, do turno intermediário. A escola passa a abrigar a quase totalidade das
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crianças e adolescentes, além dos jovens e adultos que voltam à escola para
manter/adquirir empregabilidade.
A reforma educacional implantada no Brasil nas duas últimas décadas pode estar
na contramão de uma educação de qualidade social. Tem-se como hipótese que as novas
regulações educativas atribuem mais responsabilidades aos docentes, que não dispõem,
nas escolas públicas, de condições apropriadas para realizar o seu trabalho. A nova
regulação da política educacional centrada na eficácia e na responsabilidade da escola
trouxe sérias consequências para os professores, provocando uma reestruturação de seu
trabalho.
Após vinte anos de aprovação da Constituição e aproximadamente quinze da
promulgação da LDBEN 9394/96, vale questionar se as reformas que incidiram sobre as
escolas de educação básica, os trabalhadores da educação e os estudantes tiveram uma
“escola pública de qualidade para todos, como direito social” (DOURADO;
OLIVEIRA, 2008, p. 15).
Considerando que durante vinte anos, aproximadamente, os trabalhadores
docentes convivem nas escolas públicas brasileiras com as novas regulações trazidas
pelas reformas educacionais, e por se tratar de uma categoria de trabalhadores
quantitativamente considerável, vale problematizar o trabalho docente, em sua
totalidade, e do professor de matemática do ensino médio, em particular.
Diante do exposto, questiona-se: Quem são os sujeitos docentes que lecionam
matemática no ensino médio nas escolas públicas estaduais do Brasil? Considerando as
novas regulações educativas, em que condições esses docentes realizam o seu trabalho?
Para tentar compreender preliminarmente esse tema tão caro a uma educação de
qualidade social, foram identificados e analisados artigos de periódicos da área de
educação, sobretudo os disponíveis no portal Scielo, e que publicaram dossiês sobre o
trabalho docente. Os painéis do VII Seminário da Rede Latino-Americana de Estudos
sobre Trabalho Docente completaram o material bibliográfico.
A discussão teórica foi cotejada com dados dos professores do ensino médio
coletados pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, através da Pesquisa Nacional
de Amostra por Domicílios – Pnad; pelo Ministério da Educação – MEC, via
informações e documentos disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – Inep.
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O TRABALHO DOCENTE NO DEBATE EDUCACIONAL
O campo educacional apresenta, nessa primeira década do novo século, um
paradoxo preocupante: mesmo com a centralidade atribuída à educação escolar “faltam”
professores habilitados para lecionar nas escolas públicas brasileiras, sobretudo no
ensino médio (BRASIL. Inep/MEC, 2009). Chama atenção a forma como esse
problema foi enfrentado pelos governos dos últimos 20 anos: ampliar o acesso a cursos
de formação inicial. A opção pela ampliação das vagas nos cursos de licenciaturas
sugere que as discussões e ações no campo educacional não incidiram uniformemente
sobre o estatuto econômico, social e científico dos professores (DOURADO;
OLIVEIRA, 2008).
A organização e expansão da formação de professores foram exaustivamente
debatidas nos meios acadêmicos, durante a década de 1990, e passou por algumas
mudanças, todavia, o mesmo parece não se verificar com o trabalho docente. Em um
contexto marcado por novas regulações educacionais que atingiram duramente as
condições materiais e simbólicas do trabalho docente, “as investigações acadêmicas
dedicadas a investigar o tema foram menos numerosas”. (LEHER; LOPES, 2008, p. 1).
Destaca-se, a partir dos primeiros anos do século XXI, a retomada do debate
sobre as condições objetivas do professor. Ganha proeminência no Brasil pesquisas
cujos resultados indicam que está para além das forças dos professores a plena
realização das demandas trazidas às escolas públicas contemporâneas, sem que as
condições objetivas e subjetivas sejam substancialmente modificadas (OLIVEIRA,
2006). Adquire ênfase “investigações que procurem contemplar a difícil equação entre a
macrorrealidade dos sistemas educacionais e o cotidiano escolar” (OLIVEIRA, 2004, p.
1128). Corroborando esse entendimento, Mancebo (2007) aponta que o trabalho
docente, para ser investigado em sua totalidade, é imprescindível que tenha certa cautela
metodológica, de tal modo que se possa permitir um fecundo diálogo entre a teoria e a
confrontação empírica dos contextos em que ele se realiza.
Boa parte dos estudos sobre o trabalho docente destaca a centralidade atribuída
pelas reformas educacionais à administração escolar, elegendo a escola como núcleo do
planejamento e da gestão; o financiamento per capita, presente no ensino fundamental e
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mais recentemente incluindo a educação infantil e o ensino médio; a regularidade e
ampliação dos exames nacionais de avaliação; a avaliação institucional e de
desempenho; e outros mecanismos de gestão escolares que insistem na participação da
comunidade, bem como a proliferação de conselhos com funções consultivas
(OLIVEIRA, 2008; MANCEBO, 2007; HYPÓLITO, 2008).
A Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien, em
março de 1990, pode ser considerada o marco das reformas educacionais dos países
mais pobres e populosos do mundo, o que inclui o Brasil: a educação para a equidade
social. A partir de Jomtien, as políticas educacionais visaram a ampliar o atendimento
escolar às populações menos favorecidas economicamente, entretanto, sem onerar em
demasia os cofres dos Estados Nacionais (OLIVEIRA, 2006).
É nítido que a expansão da educação básica no Brasil logrou êxito. As redes
municipais de ensino apresentaram 24.500.852 matrículas em 2008, superando a rede
estadual que apresentou 21.433.441 e a rede particular, 7.101.043. A rede federal de
ensino apresentou 197.532 matrículas em suas escolas técnicas. Os estados e
municípios, portanto, concentram a maior parte das matrículas da educação básica. Em
2008, essa etapa apresentava 45.934.283 alunos matriculados nas escolas públicas
brasileiras. Em 1991, eram 25.490.176 (BRASIL. Inep/MEC, 2008).
Pode-se inferir, através das pesquisas, que o docente foi envolvido pelas novas
regulações e teve seu trabalho reestruturado com as reformas educacionais e com a
explícita expansão do atendimento público (GARCIA; ANADON, 2009). A ampliação
de matrículas suscita uma grande demanda por professores. Em 1991, a necessidade de
docentes na educação básica era de 1.360.924, subindo para 1.882.961 professores em
2007 (BRASIL. Inep/MEC, 2009).
As reformas educacionais e as novas regulações, acrescidas da ampliação de
vagas na educação básica, sobrecarregaram o docente, atribuindo-lhe mais
responsabilidade, para além das relacionadas à sala de aula (OLIVEIRA, 2006).
Ampliam-se as funções dos professores, incluindo cuidar das demandas oriundas dos
contextos de pobreza que marcam os alunos das escolas públicas. Soma-se o apelo à
participação do coletivo dos professores na gestão democrática da escola e o aumento
quantitativo dos dias letivos. Passa a fazer parte do repertório do professor, segunda
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Oliveira (2004), desempenhar funções de agente público, assistente social, enfermeiro,
psicólogo, entre outras.
O PROFESSOR DE MATEMÁTICA E SEU TRABALHO NO CONTEXTO DO
ENSINO MÉDIO
A matrícula na última etapa da educação básica se concentra, majoritariamente,
na rede estadual de ensino que nas duas últimas décadas registrou uma expressiva
ampliação. Dos 2.472.964 alunos da rede estadual de ensino, em 1991, passou-se para
7.177.377 matriculados em 2008. O mesmo crescimento não se verificou na rede
privada que, em 1991, contemplava 1.019.374 matriculados, recuando para 970.523, em
2008 (BRASIL. Inep/MEC, 2008). Com os números da matrícula pode-se considerar
que a maioria dos professores do ensino médio vende sua força de trabalho para
gestores estaduais. Logo, são 27 possibilidades salariais, carreira e condições de
trabalho, no caso específico do ensino médio.
A expansão do número de alunos em todas as etapas da educação básica
desencadeou a ampliação do número de professores. No primeiro ano da década
passada, encontravam-se 259.380 funções docentes no ensino médio. Vale ressaltar que
o número de funções docente é maior que o número de professores, que em 2007
alcança a marca de 414.555 (BRASIL. Inep/MEC, 2009). É inegável o tamanho da
categoria docente, que tende a aumentar, considerando a emergência de ampliação da
matrícula no ensino médio.
Ao considerar os 414.555 professores da última etapa da educação básica,
percebe-se que 317.286 são funcionários públicos estaduais, 147.381 são do sexo
masculino. A maioria dos professores do ensino médio, mais precisamente 302.435,
possui mais de 32 anos (BRASIL. Inep/MEC, 2009). Trata-se de um grupo de
trabalhadores com características muito próprias como mostra a Tabela 1. Pode-se
inferir que os professores do ensino médio apresentam determinadas singularidades que
podem lhes fazer reagir a sua maneira as novas regulações colocadas pelas reformas
educacionais.
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1 – Professores dos Anos Iniciais e Ensino Médio, segundo a Dependência
Administrativa. Sexo e Idade Predominante
Etapa da
Dependência
Sexo
Faixa Etária
Educação
Administrativa
Básica
Estadual
Municipal
Masculino
Feminino
Até 24
25-32
Ensino Médio
317.286
8.243
147.381
267.174
14.895
97.225
Anos Iniciais
141.237
419.159
60.175
624.850
36.994
175.499
Fonte: MEC/Inep/Deed
Nesse contexto de reformas educacionais e das novas regulações por elas
trazidas, cresce o número de alunos, de tarefas, e mais professores são necessários. No
caso específico do ensino de matemática no ensino médio são necessários 67.447
professores (BRASIL. Inep/MEC, 2009) submetidos às demandas dentro e fora da sala
de aula: cobrança constante de cumprimento de prazos, necessidade permanente de
reciclagem e atualização, realização de inúmeras tarefas não remuneradas, como
reuniões noturnas e em finais de semana e trabalhos realizados em casa (REIS et. al.,
2006). Somam-se a remuneração e o número de alunos, turmas e aulas sob
responsabilidade do professor. Como corolário, o processo de trabalho realizado nas
escolas públicas tem sofrido ampla precarização, mormente, nas condições de sua
realização.
Os docentes constituem uma categoria numerosa. Pagar bons salários para
1.573.317 professores da educação básica que atuam nas escolas públicas (BRASIL.
Inep/MEC, 2009), como é o caso brasileiro, seria natural para um Estado plenamente
comprometido com a ampla formação de suas crianças, jovens e adolescentes.
Entretanto, as pesquisas têm apontado em outra direção. Ao considerar as últimas cinco
décadas da história dos trabalhadores da educação, percebe-se que foram cinquenta anos
de forte arrocho salarial (GARCIA; ANADON, 2009). A tabela 2 explicita a média e a
mediana relacionada ao salário do professor da educação básica.
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2- Remuneração dos professores da educação básica/2006
Brasil
Nível de Ensino
Parâmetro
Educação
Ensino
Ensino
Total
Infantil
Fundamental
Médio
Média
661
873
1.390
927
Mediana
500
700
1.200
720
Fonte:IBGE/Pnad
Os baixos salários dos professores, a partir da instauração do regime militar no
Brasil, também são destacados por Ferreira Jr e Bittar (2006). Para os autores, essa
situação se mantém, considerando que os governos democráticos dos últimos vinte anos
não reverteram o quadro de perdas salariais dos docentes. As políticas educacionais
implantadas durante a ditadura e as políticas neoliberais adotadas a partir da década de
1990 foram devastadoras e distanciaram na linha do horizonte “a possibilidade da
libertação espiritual e econômica do professor, mediante uma formação e remuneração
que lhe confira dignidade e prestígio” (FERREIRA JR; BITTAR, 2006, p.1174).
Para Sampaio e Marin (2004), a precarização se torna mais aguda com os
salários recebidos pelos docentes, pois a pauperização profissional significa
empobrecimento da vida pessoal nas suas relações entre vida e trabalho, sobretudo no
que tange ao acesso a bens culturais. A melhoria da educação básica exige condições de
trabalho para os docentes que hoje não estão presentes nas escolas públicas
(SAMPAIO; MARIN, 2004).
O aumento das demandas tem suscitado a necessidade e consequente apelo à
formação em nível superior dos docentes. Tal compreensão é reforçada pela LDB
9394/96. A partir da referida lei, observa-se a busca por cursos de formação inicial em
nível superior. Entretanto, o número de professores da última etapa da educação básica
sem habilitação na disciplina em que atuam é significativo. Esse contexto é ainda mais
grave nas disciplinas de Física, Química, Matemática e Biologia. O ensino de
Matemática talvez seja um dos mais preocupantes. Ao considerar a última etapa da
educação básica, tem-se 67.447 professores de matemática e apenas 39.285 possuem
licenciatura na área (BRASIL. Inep/MEC, 2009).
Tornar-se professor, inclusive de matemática da última etapa da educação
básica, parece não ser desejado pela maioria dos jovens que estão concluindo o ensino
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médio, como explicita a Tabela 3. As atividades que oferecem maior remuneração são
as principais opções dos alunos que participaram em 2007 do Exame Nacional do
Ensino Médio-ENEM. Não considerar a urgência de melhor remuneração para os
docentes, carreira que permita ganhos significativos com o tempo de docência e
realização de formação continuada de forma ampla, compromete a busca de uma
educação de qualidade para todos, pois, segundo Sampaio e Marin (2008, p.1223), a
“relação de desvalorização e relativização total do conhecimento se articula ao
desmonte da escola pública e acompanha o movimento de desvalorização das pessoas
que usam a escola e fazem dela seu posto de trabalho”.
3-Alunos do Ensino Médio e o Tornar-se Professor-2007
Escolheu Ser Professor
Não Escolheu Ser Professor
5,2%
94,8%
Fonte: Elaboração Dired/Inep, a partir de dados do Enem 2007
AMPLIAÇÃO DA JORNADA E INTENSIFICAÇÃO DO TRABALHO
As precárias condições de trabalho e remuneração parecem “convidar” o
professor a aumentar sua carga horária, ou seja, a ampliar a jornada de trabalho. A
jornada, considerando sua duração, está relacionada à quantidade de tempo que o
trabalho consome da vida das pessoas. Entendido como uma dimensão-chave da vida
humana, o trabalho padece no apagar das luzes da primeira década do século XXI. Os
professores da educação básica, particularmente os que lecionam no ensino médio,
possuem uma carga horária extensa como mostra a Tabela 4.
4- Número de Horas Trabalhadas no Ensino Médio/2006
Nível de Ensino no
Administração
Trabalho
Ensino Fundamental
Privada
Pública
Média
Mediana
Média
Mediana
28
24
31
30
28
26
33
40
Anos Iniciais
Ensino Médio
MET/Pnad-2006
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Trabalhar em demasia parece ser rotina entre os professores da última etapa da
educação básica. A carga horária parece estar diluída em pelo menos dois turnos de
trabalho com ampla utilização do noturno que apresentou 3.087.933 alunos
matriculados nas escolas públicas estaduais em 2008 (BRASIL. Inep/MEC, 2008).
Em um contexto de grande flexibilização do trabalho e de múltiplas funções
atribuídas ao professor, desenha-se uma jornada de trabalho com novos contornos.
Destaca-se a intensificação do trabalho docente, entendida como a ampliação das tarefas
sem a ampliação do tempo. A carga de trabalho torna-se mais aguda com a ampliação
do número de alunos por turma, o que implica o aumento do número de alunos por
professor. Além disso, como tem várias turmas, é grande a rotatividade/itinerância dos
professores pelas escolas (SAMPAIO; MARIN, 2004).
O impacto sobre o trabalho docente, a partir dos processos de reestruturação
educacional desencadeados a partir da década de 1990, com a captura da subjetividade
do professor pelos reformadores, é apontado também por Hypólito (2008), ao destacar
que o processo de trabalho docente se encontra demasiadamente intensificado. O autor
destaca a importância de aprofundar o conceito de intensificação para compreender os
encargos e sobrecargas colocados aos professores das escolas públicas. Tal acúmulo de
tarefas/funções interfere no corpo e, sobretudo, na mente, fazendo com que os processos
de intensificação se internalizem e se transformem em processos de autointensificação.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A escola básica brasileira está mais pública que há vinte anos. A equidade social
preconizada pela reforma educacional logrou êxito com 53.232.868 de matrículas na
educação básica em 2008, mas a que custo para os docentes das escolas públicas?
Tentou-se neste estudo cotejar uma parte da produção bibliográfica com o conjunto de
dados disponibilizados sobre o trabalho docente no ensino médio, contexto em que o
professor de matemática está inserido. O contraste dos dados com a literatura permitiu
perceber manifestações da precarização da remuneração, da jornada e das condições do
trabalho realizado pelo professor do ensino médio, fortemente imbricadas.
O estudo sugere que a expansão quantitativa da educação básica gerou impacto
sobre o professor que não dispõe das condições objetivas para dar conta das inúmeras
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demandas que chegam às escolas e às salas de aula. Como consequência, o processo de
trabalho do professor, materializado nas escolas públicas brasileiras, se encontra
precarizado, mormente quanto às condições de sua realização.
Pode-se inferir que os professores da última etapa da educação básica, inclusive
os de matemática, em relação aos da educação infantil e ensino fundamental, têm mais
aulas, turmas, alunos, turnos e empregos. Esses elementos apontam que a precarização
do trabalho docente no ensino médio tem suas singularidades. Tal compreensão sinaliza
para a necessidade de estudos que possam desvelar, ainda mais, quem são os sujeitos
que ensinam matemática e suas condições de trabalho.
Tais argumentos ganham força na atualidade, a partir das novas ações
governamentais que incidem sobre os docentes e condicionam as condições de trabalho
oferecidas aos professores da educação básica. Questões relacionadas à saúde, à evasão
de professores de matemática, ao desinteresse dos jovens em tornar-se trabalhador da
educação e à falta de professores de matemática, sobretudo no ensino médio, continuam
atuais e precisam ser compreendidas. Tal compreensão é condição necessária para que
políticas públicas, que venham ao encontro das reais necessidades dos docentes e de
uma educação matemática de qualidade socialmente referenciada, possam ser
concebidas.
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