O gênero “seminário” como objeto de ensino-aprendizagem: modelo didático Adair Vieira Gonçalves (Drº em Linguística e Língua Portuguesa, Docente da UFGDUniversidade Federal da grande Dourados, e-mail: [email protected]) RESUMO: Neste presente texto, o autor pretende contribuir para o ensino-aprendizagem de língua portuguesa, tendo o gênero como objeto e o texto como unidade de ensino e, apoiando-se nos no Interacionismo sóciodiscursivo (Bronckart 2003) e na didática do grupo de Genebra e na releitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) sobre o ensino do oral, particularmente, do gênero seminário. Posteriormente, para a transposição didática do referido gênero, elaborou-se o modelo didático, tendo como corpus seminários apresentados numa turma de Letras de uma universidade pública. Assim, apresentamos o referido modelo, a partir das formulações de Dolz & Schneuwly, a respeito do modelo didático de gênero. PALAVRAS-CHAVE: seminários, gêneros textuais, modelo didático. ABSTRACT: In this present text, the author intends to contribute to the teachingapprenticeship of Portuguese language, taking the genre as an object and the text like unity of teaching and, being supported us in the Sociodiscursive Interacionism (Bronckart 2003) and in the educational of the group of Geneva and in the reading of the National Curriculum Parameters (PCNs) on the teaching of the oral, particularly, of the seminar genre. Subsequently, for the educational transposition of the above-mentioned genre, the educational model prepared, having how corpus seminars presented in a group of Letters of a public university public. So, we present the above-mentioned model, from the formulations of Dolz and Schneuwly, about the educational model of genre. KEY WORDS: seminars, genre of texts, didactic model. 1. Introdução O objetivo deste artigo é o de divulgar o modelo didático do gênero “seminário”, a partir das formulações de Schneuwly & Dolz (2004), para os quais, a elaboração de um modelo didático deve levar em consideração a representação do contexto social ou contextualização (capacidades de ação); as capacidades discursivas relativas à estruturação discursiva do texto e, finalmente, as capacidades linguístico-discursivas. Na consulta a pesquisas e por meio de nossa própria prática, não é difícil constatar que nas aulas de Língua Portuguesa, o gênero seminário não tem tido espaço merecido. Devido a isso, poucos estudantes conseguem apresentar controle consciente e voluntário para o efetivo domínio dos gêneros orais e formais. Doutra parte, em nosso contexto, temos documentos, tais como os PCNs, que preconizam o ensino de gêneros orais, a fim de que nossos estudantes sejam sujeitos capazes de interagir/comunicar-se em diversas instâncias de sua vida pública e, sobretudo, que estes consigam expandir suas interações para fora do muro escolar. Assim, tal como Bronckart (2003) e Goulart (2005), só entendemos que seja possível falar em práticas de linguagem oral fora do âmbito escolar se correlacionarmos à questão do desenvolvimento da competência comunicativa do estudante para agir no seio da sociedade. Consequentemente, para tal desenvolvimento, em nossas pesquisas, temos enfatizado a questão da produção de modelos didáticos de gêneros (Gonçalves, 2007, 2008) para a posterior construção de sequências didáticas (SD) (Gonçalves, 2007), daqui para frente SD, para o ensino dos gêneros textuais orais ou escritos. Tendo em vista a dificuldade de produção oral/escrita de tal gênero, elaboramos o modelo didático do gênero, para, posteriormente, divulgarmos a SD do mesmo gênero. Como sabemos, os gêneros orais carecem de sistematização didática, conforme alerta Goulart (2005). Além disso, por meio de pesquisas já realizadas, é senso comum a exiguidade de atividades orais no ensino de língua materna. Além das capacidades que devem compor o modelo, apresentaremos fatores não linguísticos que o compõem: meios paralinguísticos, meios cinésicos etc. Tentando refletir sobre o gênero seminário, num contexto específico, nossa estratégia é a de, sinteticamente, trazer reflexões sobre o ensino do oral na escola brasileira. Posteriormente, apresentaremos um modelo didático construído a partir de leituras diversas e consulta a especialistas no gênero, ou seja, será um modelo didático construído a priori, isto é, sua construção (não) necessita levar em conta o nível dos estudantes nem as particularidades de uma turma (princípio da pertinência à turma em que o gênero será trabalhado). Para apresentar, a seguir, o modelo didático do gênero seminário, um gênero da esfera pública de utilização da língua, centraremos esforços, sobretudo, nos aspectos verbais, para promover posteriores situações de ensino. 2. A importância do oral no ensino da língua: discussões a partir dos PCNs É consenso que a escola brasileira privilegia as atividades de escrita em detrimento das atividades com gêneros orais (GOULART, 2005). Em decorrência disso, sempre nos inquietou a falta de sistematização e transposição didática dos gêneros orais em sala de aula. As pesquisas de Goulart (2005) confirmam o mesmo fato. Em artigo no prelo, Gonçalves (2008), em pesquisa realizada com 50 docentes de duas universidades públicas, sendo uma federal e a outra estadual, e uma escola de Ensino Médio do Estado de São Paulo, confirmou o desconhecimento, dentro do universo investigado, do uso de atividades orais nas práticas docentes. De acordo com os PCNs (BRASIL, 1997/1998, p.58), é dever da escola, de forma sistematizada e regular propiciar ao estudante a o planejamento prévio da fala em função da intencionalidade do locutor, das características do receptor, das exigências da situação e dos objetivos selecionados; a seleção, adequada ao gênero, de recursos discursivos, semânticos e gramaticais, prosódicos e gestuais; emprego dos recursos escritos (gráficos, esquemas, tabelas) como apoio para a manutenção da continuidade da exposição; ajuste da fala em função da reação dos interlocutores, como levar em conta o ponto de vista do outro para acatá-lo, refutá-lo ou negociá-lo. Consequentemente, embora a escola privilegie a produção/leitura de textos escritos, parecenos, como exercício hipotético, que o oral, neste caso específico, “funciona como elemento mediador fundamental no desenvolvimento de habilidade de leitura e produção de fala em contextos formais, dentro e fora da escola” (GOULART, 2005, p. 4). Dolz & et al (2004), em pesquisas suíças, afirmam que 51% dos professores dizem recorrer a seminários com frequência. Estes são ultrapassados apenas pela atividade de ler em voz alta (70%), compreensão oral de narrativa (68%) e compreensão de instruções e de manuais de utilização (65%). Apesar disso, seja lá ou cá, não é difícil perceber que as atividades de linguagem oral sejam feitas sem preparo para tal e, quando feitas, servem apenas para que os estudantes exponham conteúdos previamente estudados/lidos. A prática da linguagem oral deveria ocupar lugar de destaque nas aulas de Língua Portuguesa, lugar ocupado, fundamentalmente, pelas atividades de escrita. Os PCNs, publicados em 1998, são um documento que, apesar de apresentar uma miscelânea de correntes e tendências lingüísticas (cf. APARÍCIO, 2007), é embasado em teorias linguísticas e discursivas e pressupõe, nas palavras de Goulart (2005), “a necessária expansão de um ensino mais centrado nos usos da linguagem por meio da inserção do aluno em contextos significativos de fala e de escrita, ressaltando a importância do trabalho com os gêneros orais” (p. 32). Desse modo, cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral no planejamento e realização de apresentações públicas: realização de entrevistas, debates, seminários, apresentações teatrais etc. Trata-se de propor situações didáticas nas quais essas atividades façam sentido de fato, pois é descabido treinar um nível mais formal da fala, tomando como mais apropriado para todas as situações. A aprendizagem de procedimentos apropriados de fala e de escuta, em contextos públicos, dificilmente ocorrerá se a escola não tomar para si a tarefa de promovê-la. (BRASIL, p. 25) Assim, baseando-nos nos PCNs, acreditamos que, para a eficácia no ensino de gêneros orais, seja necessário um conjunto sistemático, planejado de atividades, com a finalidade específica para o ensino-aprendizagem de um determinado gênero, neste caso específico, o seminário. Ou seja, faz-se necessário, na escola, um trabalho para tentar desenvolver no estudante uma relação consciente e voluntária com seu próprio conhecimento linguístico, fornecer aos estudantes meios eficazes para melhorar sua capacidade de escrever e de falar, sobretudo, como afirma Schneuwly (2004), “construir com os alunos uma representação das atividades de escrita e de fala, em situações complexas, como produto de um trabalho, de uma lenta elaboração” (p. 135). Mais adiante, os PCNs afirmam que a escola deve “organizar um conjunto de atividades que possibilitem ao aluno desenvolver o domínio da expressão oral e escrita em situações de uso público da linguagem” (p.35), devendo ela levar em conta o contexto de produção, as características dos gêneros e suportes. Goulart (2005), em sua dissertação de mestrado, acredita que existe uma crença fortemente desenhada durante a formação profissional do futuro professor: a de que a escola é o lugar para o trabalho sistemático dos gêneros escritos. A autora chega à constatação de que, embora a escola brasileira trabalhe com discussão de temas controversos que são propulsores para a posterior produção escrita (de artigos de opinião, por exemplo), não é difícil constatar que, ao final do Ensino Fundamental, provavelmente Médio, os estudantes não desenvolveram proficiência no gênero seminário. Goulart (2005) afirma que dar primazia aos gêneros escritos “seria ignorar o fato de que as atividades humanas de interação acontecem em sua grande maioria por meio de manifestações orais que estão cada vez mais frequentes nas novas mídias pertencentes à cultura eletrônica: videoconferência, teleconferências, e etc.” (p.34). Desse modo, e de acordo com a autora, faz-se necessário o trabalho sistemático com os gêneros orais. Por outro lado, parece haver, na escola brasileira, em situações de apresentação de seminários, apenas o “decorar” o conteúdo de determinada disciplina e o “apresentar” aos colegas de turma, disciplina, etc. repetindo, assim, o logocentrismo do professor. Assim, na escola brasileira, é de consenso que o seminário permanece bastante tradicional. Segundo Dolz et al (2004) a exposição oral 1 , “representa um instrumento privilegiado de transmissão de diversos conteúdos”. Ainda afirmam que “...sobretudo pra aquele que o prepara o apresenta, a exposição fornece um instrumento para aprender conteúdos diversificados, mas estruturados graças ao enquadramento viabilizado pelo gênero textual” (DOLZ ET AL, 2004, p.216). Ao apresentar um seminário o estudante passa a exercer o papel de especialista num determinado assunto. Segundo Dolz et al (2004), informar-se sobre assunto desconhecido é, geralmente, a finalidade de uma determinada plateia. E, tais quais as intervenções para a produção de gêneros escritos, é preciso intervir didaticamente com ferramentas eficazes para o domínio dos gêneros orais. O ideal, como afirmam Dolz & Schneuwly (2004), é que haja o menos possível de ficcionalização na transposição didática de um gênero para a sala de aula. O seminário, a nosso ver, é um gênero que pode oferecer condições efetivas de interações reais e de fornecimento de contextos de comunicação também distintos. A escola deve priorizar, em suas atividades, o trabalho com gêneros orais, na medida em que os estudantes já dominam com desenvoltura os gêneros primários de interação face a face. Dessa forma, (GOULART, 2005, p.57) “o papel da escola seria (...) o de levar os alunos a aprender a moldar as formas cotidianas de produção oral a outras esferas mais formais de utilização da língua”. 3. O modelo didático do gênero: condição para a transposição didática Pode-se dizer que já existem pesquisas relevantes acerca da modelização didática como condição para a posterior transposição didática de um determinado gênero, tais como as de De Pietro & Schneuwly (2003), Cristóvão (2002), Cristóvão & Machado (2006), Gonçalves (2007). Nesta seção, delinearemos as capacidades de ação, capacidades discursivas e linguísticodiscursivas que, posteriormente devem aparecer numa SD. Para a produção deste modelo didático, apoiar-nos-emos em leituras de especialistas na didatização do gênero, tais como Dolz & Schneuwly (1998), Dolz et al ( 2004) e Goulart (2005). O modelo a seguir foi produzido a partir de seminários apresentados na disciplina Estágio Supervisionado de Língua 1 Para a produção deste artigo, para o que Dolz et al ( 2004) intitulam de exposição oral, nós denominamos de seminário, nome corrente em contexto brasileiro. Portuguesa, na UFGD, para a turma de 4º ano da licenciatura em Letras, com habilitação em Língua Inglesa. Em relação aos aspectos não-verbais, Dolz, Schneuwlye Haller (2004) alertam que a palavra está intimamente ligada ao corpo. Dessa forma, afirmam que a comunicação oral não se limita aos mecanismos linguísticos e prosódicos, mas “vai utilizar também signos de sistemas não linguísticos, desde que codificados, isto é, convencionalmente reconhecidos como significantes ou sinais de uma atitude” (p.160). Assim, destacam a gestualidade do corpo ao longo da interação , as mímicas da face, posturas, olhares, etc. Ao acompanhamento gestual ou mímico durante a interação, convencionou-se chamar de cinésica. Exerce papel importante na constituição do gênero em análise os elementos prosódicos e a paralinguagem, estes sendo compreendidos pela qualidade vocal, etc 2 . Dolz et al (2004) definem o seminário “como um gênero textual público, relativamente formal e específico, no qual o expositor especialista dirige-se a um auditório, de maneira estruturada (explicitamente), para lhe transmitir informações, descrever-lhe ou explicar alguma coisa” (p.218). Tomando o seminário nestes termos, e, baseando-nos nos autores supracitados, que mapearam o gênero seminário, tecemos a seguir as principais características que configuram tal gênero 3 num contexto universitário. Além disso, nosso modelo didático apoia-se em nossas práticas de referência e no que dizem os especialistas. São elas: a) Um estudante determinado, no papel de “aluno-especialista”, conhecedor do assunto e das capacidades implicadas na produção de um seminário, realiza uma ação de linguagem escrita e oral (com apoio de recursos tecnológicos) neste gênero determinado pelo professor-pesquisador 4 . a. Lugar de produção: instituição de ensino, UFGD. b. Momento de produção: durante horas-aula do professor-pesquisador, na disciplina de Estágio Supervisionado. c. Emissor: estudante de Letras. 2 Para mais aprofundamento na questão, remetemos o leitor a Schneuwly e Dolz (2004). Estamos utilizando o seminário como estratégia didática nas aulas de Estágio Supervisionado de Língua Portuguesa que ministramos na 4ª ano do curso de Letras na Faculdade de Comunicação, Artes e Letras da UFGD. 4 As funções de orientador de estágio da disciplina de Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa e de professor-pesquisador são exercidas pela mesma pessoa. 3 d. Leitor/Receptor: primeiramente, o professor com formação em Letras e a plateia, constituída pelos demais estudantes de Letras. No contexto sociossubjetivo: e. Papel social do produtor: Estudante. f. Objetivos: fazer o público tomar conhecimento dos aspectos fundamentais das temáticas que estavam sendo desenvolvidas à época; convencer seus destinatários múltiplos a adotarem em sua futura prática de ensino as ferramentas didáticas intituladas de modelos didáticos e SD 5 . g. Papel social do leitor: num primeiro momento, o professor supervisor de estágio e os colegas de sala (atuando como mediadores, neste processo interativo) desempenham o papel de leitor/ouvinte; i. Instituição: Universidade Federal da Grande Dourados. b) Para a mobilização dos conteúdos a serem “didatizados” em sala de aula, o estudante deve ler/participar de sessões de eliminação de dúvidas com o docente, participar de debates/informar-se sobre a temática (cf. nota 5). Na sala de aula, deve haver discussões acerca da temática sugerida pelo docente, seja através dos textos indicados pelo professor, seja por meio de textos extras trazidos pelos próprios alunos. O agente-produtor mobilizou conhecimentos vindos de seu próprio arquivo pessoal como das práticas pedagógicas desenvolvidas pelos atuais e (ex)professores. É necessário ainda para a geração de dados/informações fazer uma seleção dos conteúdos disponíveis, reorganizá-los adequadamente, a depender da finalidade da interação, hierarquizar informações/ideias, distinguir as principais das acessórias. 5 Á época, março de 2009, dividimos a sala, que é composta por 20 estudantes, em quatro grupos de cinco estudantes cada. Para cada grupo, distribuímos leituras previstas para a disciplina “Estágio Supervisionado de Língua Portuguesa”. Os textos de referência para a consecução dos seminários foram: “Gêneros e progressão em expressão oral e escrita- elementos para reflexões sobre uma experiência Suíça (francófona)”, “Os gêneros escolares- das práticas de linguagem aos objetos de ensino”, “Sequências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento”. Esses três textos são de autoria de Bernard Schneuwly & Joaquim Dolz (2004), referenciados no final deste artigo. Um quarto texto compõe os textos utilizados para a didatização do seminário: “Gêneros textuais: definição e funcionalidade de Luiz Antônio Marcuschi”. c) Com o intuito de produzir um seminário 6 e, portanto, de posicionar-se sobre uma questão pedagógica, a contextualização far-se-á por meio de textos lidos e pelo momento vivido pelas instituições universitárias de ensino superior, em quaisquer níveis. A contextualização ocorrerá, consequentemente, a partir dos documentos direcionadores da prática pedagógica, tais como: PCNs, PCNEM, PCN+, OCEM, etc. que são lidos/discutidos em/nas disciplinas de Estágio Supervisionado de Língua Portuguesa e Literatura da UFGD. d) Com relação ao plano global (convencional), o seminário, geralmente, apresenta as seguintes características: uma fase de abertura, fase da introdução ao tema, (Introdução); apresentação do plano da exposição, desenvolvimento e encadeamento dos temas/subtemas (desenvolvimento), fase de recapitulação, fase da conclusão e encerramento (conclusão). e) A progressão temática do seminário deve ocorrer por meio de encadeamentos lógico-argumentativos, de tal forma que uma ideia articula-se à próxima ideia 7 . f) Com relação aos aspectos discursivos 8 do gênero seminário, baseamo-nos na pesquisa de Goulart (2005) quando examinou seminários no Ensino Fundamental da região de Campinas-SP. O seminário está situado no mundo do EXPOR, já que se refere diretamente às coordenadas gerais do mundo da ação de linguagem em curso. O conteúdo temático mobilizado é acessível e CONJUNTO ao mundo ordinário dos agentes produtores das ações de 6 Neste caso específico, estamos tratando apenas dos seminários (apresentação oral) em sala de aula. Sabemos da existência de outros gêneros orais em contexto acadêmico: comunicação em congressos, conferência pública, etc, mas que, devido às finalidades deste trabalho, restringir-nos-emos ao seminário. 7 Em nosso caso, tomando o texto-base “Gêneros Textuais: definição e funcionalidade” como exemplo, o encadeamento lógico da apresentação em sala seguiu a ordem de aparição no próprio artigo. (Cf. MARCUSCHI, p.19-36). 8 A atividade linguageira, devido à sua semiotização, apoia-se, obviamente, em mundos virtuais. Bronckart (2003) sustenta que tais mundos são sistemas de coordenadas formais, que são outros se comparados aos sistemas dos mundos representados em que são desenvolvidas ações humanas. Textualmente, afirma o autor (p.151), “por convenção, chamaremos os mundos representados pelos agentes humanos de mundo ordinário e os mundos virtuais criados pela atividade de linguagem, de mundos discursivos”. Assim, o autor chega a dois mundos semiotizados pela linguagem: o do NARRAR e o do EXPOR. Quando um texto deixa claras as instâncias do agente produtor com os parâmetros materiais da ação de linguagem (produtor, interlocutor e sua situação no tempo e no espaço), dizemos que o texto IMPLICA os parâmetros com elementos dêiticos integrados ao tema e, para interpretar, na íntegra, essa produção empírica, é necessário ter acesso às condições de produção, contextualmente falando. linguagem autônomo e apresenta, predominantemente, o discurso teórico 9 .O gênero oral seminário um discurso teórico implicado. g) Devem prevalecem, a priori as sequências explicativas e argumentativas 10 . A sequência dialogal, conforme Bronckart (2003), também costuma ser frequente em situações de exposição oral, comunicações em congressos e seminários 11 . h) Com relação aos aspectos linguístico-discursivos, há predominância de frases declarativas. As formas verbais, em sua maioria, estão no presente com valor atemporal fazendo afirmações de caráter universal; a linguagem utilizada é, predominantemente, o registro culto da Língua Portuguesa; presença da 1° pessoa no plural. (Nós, como em vejamos, em referência aos integrantes de apresentação do seminário), mas, este (Nós) refere-se à interação global, universal e, às vezes, aos interlocutores em curso na interação. Nas sequências dialogais há forte presença de frases interrogativas, além das assertivas, normalmente, quando surgem dúvidas a respeito do conteúdo temático. i) Forte presença de anáforas nominais e pronominais. Exemplo: “As seqüências didáticas são um conjunto planejado de atividades...” “ Os PCNs preconizam o ensino de gêneros...” Em geral, há alta freqüência também das retomadas pelo mesmo item lexical, principalmente, na 1° versão, exemplos: as SDs, SD, PCN, PCNEM, etc. Presença marcante de marcadores lógico-argumentativos, tais como: porém, todavia, mas, entretanto, apesar disso, embora, pois, etc. além de organizadores textuais que marcam as partes do texto, como: em primeiro lugar, em segundo lugar, etc. j) Com relação às vozes no gênero seminário, prevalecem as vozes sociais (grupos, instituições, pessoas), as quais não intervêm no decorrer do seminário, 9 Cf. Bronckart 2003. As primeiras têm origem na confirmação de um objeto de estudo incontestável. Entretanto, seja um acontecimento natural, seja uma ação humana, tais fenômenos configuram-se incompletos, necessitando de um desenvolvimento que servirá para responder a questões ou a contradições aparentes. Dito de outro modo, às vezes, devido ao hermetismo de um objeto, devemos apresentar as causas de uma afirmação inicial e esclarecer as polêmicas possíveis. Nas sequências argumentativas, desenvolve-se o raciocínio argumentativo implicando, por isso, uma tese a partir da qual propõem-se dados novos (argumentos), que, por sua vez, são objetos de inferência, a qual orienta uma conclusão. Neste ínterim, o movimento argumentativo pode ser recheado por justificativas e restrições. 10 11 As sequências dialogiais concretizam-se apenas em trechos de discursos interativos dialogados. Por isso, podem ser estruturados em turnos de fala assumidos pelos agentes produtores envolvidos na interação verbal. mas são trazidas para corroborar as apresentações 12 . Com relação às modalizações, há predomínio das modalizações lógicas, com a presença de orações principais de forma impessoal, traduzidas por tempos verbais do condicional, auxiliares, advérbios como: “A verdade é que com as SD o aluno tende a captar as capacidades para melhor produção textua” (grupo 4). É comum a ocorrência de quantidade considerável de modalizações apreciativas. As demais modalizações ocorrem, mas em quantidade reduzida. k) O léxico fortemente influenciado pelo conteúdo temático. Há, por ex., palavras como “SD, leis, ensino, formação de professor, PCNs, OCEM, etc.” Com o intuito de didatizar o modelo e, principalmente, facilitar a leitura, e, baseando-nos na literatura concernente ao gênero de Dolz et al (2004) e Goulart (2005), produzimos o quadro abaixo que resume a metodologia a ser empregada para a produção de SD do gênero seminário. OUTROS PRINCÍPIOS QUE REGEM A CONSTRUÇÃO DO SEMINÁRIO O seminário deve apresentar elementos coesivos que sintetizem/costuram as diversas partes do gênero: a) coesão temática ( garante a articulação das diferentes partes do conteúdo temático a ser apresentado); b) deve haver sinalizações coesivas que diferenciam as partes principais das A COESÃO secundárias; Em nosso caso, apresentar o esquema prototípico de uma SD é secundário, ao passo que a explicação de cada componente de uma SD é prioritário: apresentação de uma situação de comunicação, produção inicial, módulos, produção final. c) deve haver sinalizações que anunciam a conclusão do seminário: Portanto, enfim, etc. d) deve haver organizadores textuais que garantem a explicação e exemplificação das partes do conteúdo: por exemplo, assim sendo, porque, visto que; e) deve haver paráfrases/reformulações para elementos tidos como complexos/densos no texto: Dito de outra forma, isto é, quer dizer, etc. A LEITURA DURANTE O SEMINÁRIO São três as formas de utilização das palavras: memorização, leitura em voz alta e fala espontânea. A fala ideal é entrecortada com anotações, recursos multimídia, etc. Nas conferências, tem-se a impressão de que a fala é espontânea, quando muitas vezes, é resultado de sucessivos ajustes de textos escritos. As três formas devem ser objeto de ensino. Além disso, despertar no seminarista a preocupação com a plateia, selecionar as fontes de pesquisa, escrever um texto contendo as informações mais relevantes, ficar atento ao estilo de exposição. 12 Assim, são frequentes as menções aos documentos oficiais, às práticas de seus ex e atuais docentes. Tais vozes são trazidas pelos estudantes/especialistas no assunto como instâncias de avaliação de aspectos do conteúdo temático. Embora em ocorrência mínima, houve também a voz do autor que comenta, explica, avalia aspectos do que é anunciado. O FOCO: OS ESTUDANTES AS ETAPAS DE CONTRUÇÃO DE UM SEMINÁRIO: O MODELO DIDÁTICO EM AÇÃO ARTICULAR AS DIFDERENTES PARTES DO SEMINÁRIO 13 ASPECTOS NÃO VERBAIS O trabalho docente deve se configuar na direção de levar o estudante a apresentar seminários não para serem lidos. Devem apoiar-se em anotações, gráficos, power point, entre outros. As partes conceituais e mais densas podem/devem ser lidas. A oralidade deve facilitar a compreensão do texto. Levá-los a pronunciar as palavras articulada e pausadamente, e, a depender dos objetivos em sala de aula, tentar captar a audiência, variar a voz, gerar suspense/curiosidade. a) apresentação pelo professor de uma situação de comunicação; b) exploração das fontes de pesquisa: documentos, internet, gráficos,etc.; c) estruturação e hierarquização das informações; (utilizar a exemplificação, ilustração, explicação) d) formulação de paráfrases, reformulações. Isto é, o “seminarista” deve prever as dificuldades da plateia e reformular as partes mais densas; e) desenvolver consciência metadiscursiva: mostrar a estruturação do seminário; f) deter-se na impostação da voz, olhar, atitude corporal, etc. g) preparar e oralizar as notas. Para a introdução, os estudantes podem utilizar as seguintes formas de abertura: “vou tentar-lhes explicar hoje...”; “vou abordar primeiramente....depois....enfim....”, “ o assunto de meu seminário é...”; “ vamos começar por...” Para o desenvolvimento do tema, os estudantes podem utilizar as seguintes fórmulas fixas. “Depois de apresentada a introdução, passemos à segunda parte que trata de...”; “...a etapa seguinte é...” Para a conclusão, o anúncio pode ser feito por meio das seguintes expressões: “ enfim, ...”; “Para concluir...”; “chegamos à parte final que consiste em...” Para mais detalhamento e conhecimento do gênero seminário, faz-se necessário ainda observar os seguintes elementos não verbais: a) a voz, que é o suporte acústico da fala; b) a articulação das vogais e consoantes; c) a combinação das sílabas; d) os fatos prosódicos suprassegmentais, como a entonação, a acentuação, o ritmo, as falas espontâneas 4. Conclusão Para finalizar este texto, faz-se necessário reiterar o que dizem os documentos oficiais e incentivar um ensino que aborde a questão didático-pedagógica de maneira que procure levar o estudante a tomar consciência do que se fala/escreve; para quem (interlocutores), da finalidade da interação e da importância de onde se dão as interações, em gêneros orais e escritos. Em síntese, é preciso atentar para o contexto de produção. Em síntese, procuramos mostrar as parametrizações dos documentos oficias para os gêneros orais, e aqui, apresentamos, a priori, o modelo didático para a posterior transposição didática desse mesmo gênero. É bem verdade que priorizamos aspectos verbais na modelização, devido às dificuldades com gravação e transposição de falas, e sobretudo, devido ao espaço de que dispomos. Em trabalhos posteriores, investigaremos a produção inicial e, depois de feita 13 Para mais aprofundamento de questões didáticas referentes ao gênero seminário, remetemos o leitor a Dolz et al (2004). a intervenção, por meio de uma SD, avaliaremos a produção final, necessitando, para tal, gravações em áudio e vídeo. Em termos práticos, atestadas pela nossa própria vivência docente, temos a hipótese de que o seminário é um gênero que os estudantes, em geral, não dominam ou o dominam parcialmente. Dolz, Schnuewly & Haller (2004), em pesquisas suíças, atestaram que, após as intervenções e mapeadas as dificuldades iniciais, os estudantes passam a dominar mais eficazmente os gêneros orais. O gênero seminário é, para nós, de suma importância, já que, atestadas por pesquisas suíças e brasileiras que o oral pode/deve ser elemento mediador para o desenvolvimento de atividades de leitura e de escrita, em contextos escolares ou não. Referências APARÍCIO, A. S. M. 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