LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL: ÚLTIMO ANO DE MANDATO - CARTILHA DE ORIENTAÇÃO AOS AGENTES PÚBLICOS ESTADUAIS Miguel Ramos Campos Procurador do Estado do Paraná 1-APRESENTAÇÃO. Apesar da chamada Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/2000) ser de natureza estritamente financeira, em nada regulando matéria eleitoral, traz em seu corpo regras que limitam específicas condutas dos agentes públicos, em ano de Eleições. Essas regras, dirigidas aos agentes públicos das três esferas de Governo e dos Poderes, visam manter o equilíbrio orçamentário e não permitem o aumento de despesas ou dívidas para o exercício subseqüente. Objetiva, com isso, afastar a possibilidade de se inviabilizar as ações do futuro governante ou administrador, com o engessamento financeiro da administração seguinte, sem o devido aumento de receita. AS PRINCIPAIS RESTRIÇÕES IMPOSTAS NA LEI COMPLEMENTAR Nº 101/2000, NO ÚLTIMO ANO DO MANDATO DO GESTOR ESTADUAL, DIZEM RESPEITO AOS SEGUINTES TEMAS: CONTROLE DE DESPESA TOTAL COM PESSOAL; RECONDUÇÃO DA DÍVIDA CONSOLIDADA AOS LIMITES; OPERAÇÕES DE ANTECIPAÇÃO ORÇAMENTÁRIA; EFEITOS CRÉDITO POR DE RECEITA DO ORÇAMENTO EM RELAÇÃO A DIREITOS DE TERCEIROS. 2- CONTROLE DE DESPESA TOTAL COM PESSOAL: Prevê o art. 21, parágrafo único, da LRF o seguinte: “Art. 21. (...) Parágrafo único – Também é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art.20”. Da leitura do artigo, verifica-se que não pode haver aumento de despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao término do mandato, sob pena de nulidade. A ideia do legislador é não comprometer o orçamento subseqüente ao ano eleitoral, ou mesmo ultrapassar o limite de gastos com pessoal, salvo se houver diminuição da despesa com pessoal, quando, aí sim, é permitido, em caráter compensatório, a manutenção do patamar de gastos no patamar permitido. Veja-se que poderão existir situações emergenciais, pontuadas caso a caso, que exigirão contratações temporárias, com efetivo aumento de despesa, com lastro no art. 37, IX da CF/88. 3- DA RECONDUÇÃO DA DÍVIDA CONSOLIDADA AOS LIMITES: Prevê o art. 31, §§ 1° a 3º da LRF o seguinte: “Art. 31. Se a dívida consolidada de um ente da Federação ultrapassar o respectivo limite ao final de um quadrimestre, deverá ser a ele reconduzida até o término dos três subseqüentes, reduzindo o excedente em pelo menos 25% (vinte e cinco por cento) no primeiro. § 1º Enquanto perdurar o excesso, o ente que nele houver incorrido: I – estará proibido de realizar operação de crédito interna ou externa, inclusive por antecipação de receita, ressalvado o refinanciamento do principal atualizado da dívida mobiliária; II – obterá resultado primário necessário à recondução da dívida ao limite, promovendo, entre outras medidas, limitação de empenho, na forma do art. 9º. § 2º Vencido o prazo para retorno da dívida ao limite, e enquanto perdurar o excesso, o ente ficará também impedido de receber transferências voluntárias da União ou do Estado. § 3º As restrições do § 1º aplicam-se imediatamente se o montante da dívida exceder o limite no primeiro quadrimestre do último ano do mandato do Chefe do Poder Executivo”. 3- DA RECONDUÇÃO DA DÍVIDA CONSOLIDADA AOS LIMITES: Nota-se que a restrição é direcionada diretamente ao Chefe do Poder Executivo Estadual. O que se objetiva com tal dispositivo é manter a dívida pública sob controle. Fica vedada operação de crédito externa e interna, inclusive por Antecipação de Receita, se a dívida consolidada (LRF, art. 29, I) do Estado ultrapassar o limite no primeiro quadrimestre do último ano do mandato do Governador. O limite da dívida consolidada é previsto na proposta orçamentária e no próprio orçamento. Assim, caso não seja eliminado o excesso no quadrimestre seguinte pode o administrador responsável ser incriminado, na forma do artigo 73 da LRF, com redação inserida pela LCF nº 131/2009, verbis: “Art. 73. As infrações dos dispositivos desta Lei Complementar serão punidas segundo o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); a Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950; o Decreto-Lei no 201, de 27 de fevereiro de 1967; a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992; e demais normas da legislação pertinente.” 3- DA RECONDUÇÃO DA DÍVIDA CONSOLIDADA AOS LIMITES: Vale salientar, então, a submissão dos gestores públicos, caso não observem as limitações antes mencionadas, às seguintes sanções criminais previstas nos arts. 359-B, 359-C E 359-G1, todos do Código Penal, com redação conferida pela Lei nº 10.028/2000; ao cometimento de crime de responsabilidade contra a lei orçamentária (art. 10 da Lei Federal nº 1.079/50 e Decreto-lei nº 201/67) e às penas pelo cometimento de improbidade administrativa (arts. 10 a 12 da Lei Federal nº 8.429/92). Arts. 359-B, 359-C e 359-G do Código Penal, verbis: “Art. 359-B. Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar, de despesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Art. 359-G. Ordenar, autorizar ou executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” 4- DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO POR ANTECIPAÇÃO DE RECEITA ORÇAMENTÁRIA: Prevê o art. 38, inciso IV, “a” da LRF o seguinte: “Art. 38. A operação de crédito por antecipação de receita destina-se a atender insuficiência de caixa durante o exercício financeiro e cumprirá as exigências mencionadas no art. 32 e mais as seguintes: (...); IV – estará proibida: (...); b) no último ano de mandato do Presidente, Governador ou Prefeito Municipal.” O dispositivo proíbe operação de crédito por antecipação de receita no último ano do mandato do Governador. Tal operação de crédito é a que visa atender insuficiência de caixa durante o exercício financeiro, visando ao impedimento de transferência de dívida para o exercício seguinte ao do último ano do mandato. 5- EFEITOS DO ORÇAMENTO EM RELAÇÃO A DIREITOS DE TERCEIROS. Prevê o art. 42 da LRF o seguinte: “Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou Órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito”. O mencionado dispositivo legal é claro ao vedar nos últimos 08 (oito) meses do mandato do gestor público, e não apenas do Chefe do Poder Executivo, contrair despesa que não possa ser integralmente cumprida ou quitada até o término do respectivo mandato; ou ainda, que assuma compromisso para pagar parcelas no exercício seguinte sem que possa deixar recursos suficientes em caixa para pagar as parcelas antes ajustadas. Tal intelecção do dispositivo alcança até mesmo despesa continuada prevista na LDO e na lei orçamentária, salvo em casos de calamidade pública ou despesa extraordinária.