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A PROTEÇÃO DOS DIREITOS AUTORAIS NA INTERNET
Ricardo Funaki
RESUMO
Este artigo irá analisar a proteção dos direitos autorais em um território relativamente
muito novo e que possui muitos instrumentos de comunicação que dificultam a
proteção da propriedade intelectual. Contudo, as legislações mundiais vêm se
adaptando na medida em que os avanços tecnológicos estão surgindo, através de
legislação interna, tratados e convenções internacionais, além das organizações
internacionais que surgiram para tal finalidade. Com o surgimento de diversos
mecanismos de comunicação, há que se falar em uma relativização dos direitos
autorais, por conta da facilidade de violação e dificuldade de controle.
PALAVRAS-CHAVE: direito autoral; internet; proteção da propriedade intelectual;
instrumentos normativos; relativização do direito autoral; tratados e convenções
internacionais.
INTRODUÇÃO
A sociedade sofreu diversas transformações com o decorrer do tempo, e uma
dessas transformações diz respeito às evoluções tecnológicas: a criação de
computadores, bem como o surgimento de novos mecanismos de comunicação, dentre
elas a internet.
Esse novo meio de comunicação, continua sendo “novo” por conta das
diversas novidades que surgem a cada dia, trouxe muitas facilidades para a vida de
todos que têm acesso a ele, por exemplo, uma maior facilidade de comunicação entre
pessoas através de e-mails e páginas virtuais. Entretanto, existem autores que
defendem que a internet é um luxo para poucos, que apenas uma pequena porcentagem
da sociedade tem acesso à ela, como será visto no decorrer deste trabalho.
Em contrapartida com esse lado positivo do surgimento do mundo virtual,
existe a questão que a internet gerou uma relativização à proteção do direito autoral,
tanto referente a uma maior facilidade de violação e dificuldade de proteção, quanto no
2
sentido de que ela se tornou mais um mecanismo de propagação da informação, mas
de forma mais eficaz.
A proteção da propriedade intelectual nessa área se dá através das legislações
nacionais dos países e pelos acordos internacionais sobre esse tema, onde são
determinados os parâmetros de proteção em nível mundial. Contudo, a evolução
tecnológica não pára de evoluir, fazendo com que as legislações tenham que se adaptar
constantemente a elas.
1 O DIREITO AUTORAL: CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA
Os direitos autorais visam proteger as criações originais de obras artísticas ou
intelectuais, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou
intangível, conhecido ou que venha a ser inventado, de reproduções que venham a ferir
os direitos de seus autores, as quais podem ser realizadas em todos os meios possíveis,
sejam em livros, jornais, revistas ou, especificamente neste trabalho, no campo virtual
da internet.
A legislação brasileira prevê a proteção dos direitos autorais na lei n. 9.610/98
e no Código Civil de 2002, na parte em que trata sobre os direitos reais. Contudo,
existe uma grande discussão sobre a natureza jurídica desse direito, para alguns
autores, a propriedade intelectual deveria encontrar-se junto aos direitos da
personalidade, sendo esta, segundo LISBOA: “(...) a capacidade de gozo da pessoa em
ser titular de direitos e obrigações projetadas para o mundo exterior, cuja prerrogativa
fundamenta-se na própria condição inerente à natureza humana de seu titular,
independentemente do grau de discernimento que tenha atingido”1.
Outra parte da doutrina considera que o direito autoral não é nem um direito
real e nem um direito da personalidade, mas, pelo fato de seu objeto ser um bem
intelectual, fala-se não mais em propriedade intelectual, mas em titularidade de um
direito intelectual, sendo para BITTAR: “(...) direitos intelectuais como aqueles
1
LISBOA, Roberto Scenise. Manual elementar de direito civil. 2 ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002. p. 175 – 180.
3
referentes às relações entre a pessoa e as coisas (bens) imateriais que cria e traz à
lume”2.
Uma última corrente, a mais aceita nos dias de hoje, defende que a
propriedade intelectual deve ser considerada como um duplo direito, moral e
patrimonial3. O primeiro (art. 24 da lei n. 9.610) corresponde ao sentimento de criador
da obra pelo autor, pelo seu ineditismo, de ter seu nome vinculado à sua criação e
sobre ela atuar de modo a protegê-la de publicações que ferem o seu direito autoral e
de modificá-la ou aperfeiçoá-la como for sua vontade4. Cabe dizer, ainda, que os
direitos morais são irrenunciáveis e inalienáveis, e que fazem parte dos direitos da
personalidade5. O segundo garante ao autor o direito de explorar economicamente sua
criação, “são aqueles que dizem respeito aos resultados econômicos da obra
assegurados ao autor. (...) Com isso, possibilita-se ao criador auferir os proventos
econômicos compensatórios de seu esforço”6. Ou seja, é assegurado ou autor o direito
de utilizar, fruir e dispor de sua obra (literária, artística ou científica)7, todavia, pode
um terceiro exercer essas atividades tão amplamente quanto o autor, desde que
autorizado por este; portanto, é garantido ao autor o direito de autorizar ou de impedir
que terceiros utilizem suas obras publicamente8.
Esses direitos são garantidos ao autor, mas não exclusivamente a ele, pois,
com sua morte, todos os direitos patrimoniais, e somente eles, são transmitidos aos
seus herdeiros (art. 24, § 1°), que irão ter o direito de adquirir as vantagens econômicas
2
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de autor. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2003. p. 13.
3
PRONER, Carol. Propriedade intelectual: para uma outra ordem jurídica possível. São
Paulo: Cortez, 2007. p. 24.
4
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das coisas. 5 vol. 28 ed. rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2003. p. 252.
5
BRASIL. MINISTÉRIO DA CULTURA. Direito autoral. Brasília: Ministério da Cultura,
2006. p. 221.
6
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das coisas: de acordo com a lei n° 10.406, de 10.01.2002.
Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 695.
7
BRASIL. MINISTÉRIO DA CULTURA. Op. cit., p. 221.
8
TESSLER, Leonardo Gonçalves. O direito autoral e a reprodução, distribuição e
comunicação de obra ao público na internet. In: WACHOWICZ, Marcos (Coord.). Propriedade
intelectual e internet: uma perspectiva integrada à sociedade da informação. 3 tir. Curitiba: Juruá,
2004. p. 176.
4
decorrentes do trabalho e o dever de defender a integridade da obra, impedindo cópias
irregulares e alterações.
Há que se falar, também nos chamados direitos conexos, que é um ramo na
matéria dos direitos autorais de extrema complexidade, pois há uma discussão se eles
são autônomos ou dependem da proteção garantida ao autor.
Os titulares desses direitos são basicamente três: o intérprete ou artista, que
confere uma expressão corporal a uma obra; o produtor, que fixa uma criação em um
disco ou outro meio de mídia; e as empresas de rádio e televisão, que transmitem as
obras através de seus programas ou imagens.
No tocante aos direitos autorais, a tecnologia trouxe meios eletrônicos de
criação de uma obra, fazendo com que muitos autores defendessem que não haveria
mais somente a manifestação humana de criação, afastando o caráter individual do
direito do autor e tornando-se um direito mais coletivo, como um bem cultural com
valor econômico; chegou-se a essa conclusão pois as obras digitais podem ser
disponibilizadas em ambientes eletrônicos, como a internet, onde o acesso é livre para
qualquer pessoa acessar e por conta da facilidade de alteração nas obras por meio de
programas de computador9.
2 A CRIAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS
O mundo passou e continua passando por grandes avanços tecnológicos em
todas as áreas científicas (informática, genética, robótica, biotecnológica), e esse
avanço gerou grandes benefícios à humanidade em geral, entretanto, fizeram com que
surgissem diversos problemas em relação à propriedade intelectual10.
Os avanços da tecnologia geram algumas situações problemáticas à proteção
do direito autoral, dentre elas: o aparecimento de novas formas de criação, registro e
armazenamento, nos dias de hoje existem meios eletrônicos de criação e de
9
PAULON, Rosana Marques. A propriedade intelectual na internet: aspectos tributários. In:
WACHOWICZ, Marcos (Coord.). Propriedade intelectual e internet: uma perspectiva integrada à
sociedade da informação. 3 tir. Curitiba: Juruá, 2004. p. 147 – 148.
10
LANGE, Deise Fabiana. O impacto da tecnologia digital sobre o direito de autor e
conexos. Porto Alegre: Unisinos, 1996. p. 102.
5
armazenagem que não eram imaginados tempos atrás, vale-se dizer que não muito
tempo, hoje é possível a manifestação artística de qualquer tipo e feita por qualquer
pessoa que tenha um microcomputador e programas específicos.
Em consonância com esses problemas está a falta de segurança das
informações na internet, mais especificamente na falta de: integridade, que diz respeito
à
evidente
possibilidade
de
modificação
no
conteúdo
de
um
trabalho;
confidencialidade, o qual se refere a não observância do sigilo da informação, pois os
conteúdos disponíveis na grande rede são facilmente acessíveis e copiadas; e
disponibilidade, que ocorre quando uma obra é apagada ou torna-se inacessível11.
Pode-se dizer, ainda, que com o advento de novos meios tecnológicos, ocorre
uma maior facilidade de adaptação e modificação, ou seja, “qualquer obra digitalizada
é facilmente passível de alterações por parte do usuário, que poderá adaptá-la ao seu
gosto pessoal, ou mesmo, a partir daquela base, transformá-la numa outra
composição”12.
Enfim, o avanço da tecnologia cria uma expansão da proteção jurídica pelo
direito autoral, ou seja, esse direito deve se adaptar conforme esse avanço, e, com isso,
aumentar sue nível de incidência para que uma norma não se torne letra morta, mas
sim que seja efetiva e cumpra sua finalidade, que é de proteção dos direitos do autor13.
Essa evolução também criou uma nova figura de sociedade, a sociedade da
informação, pela importância atribuída à esse componente, o qual revela-se um critério
muito importante no desenvolvimento econômico dos países. A informação, bem
como o conhecimento humano, tornou-se um critério de avaliação de desenvolvimento
dos Estados14.
Com essas inovações tecnológicas surgiram novos instrumentos de
comunicação e transmissão de dados, principalmente com a chegada do mundo virtual,
e, com isso, afetando a abrangência da tutela dos direitos autorais, abrindo a
11
CONCERINO, Arthur José. Internet e segurança são compatíveis?. In: LUCCA, Newton
de; SIMÃO FILHO, Adalberto (Coords.). Direito e internet: aspectos jurídicos relevantes. Bauru:
EDIPRO, 2001. p. 133 – 134.
12
LANGE, Deise Fabiana. Op. cit., p. 111 – 122.
13
Id.
14
BRASIL. MINISTÉRIO DA CULTURA. Op. cit., p. 212.
6
necessidade de revisões contratuais e dando uma maior possibilidade ao autor de pedir
indenizações pelas violações de seus direitos15.
Muito dos contratos de direitos autorais mais antigos garantiam a proteção do
autor de forma específica, prevendo todos os meios de comunicação existentes na
época; com o surgimento dessas novas tecnologias, muitos contratos foram revisados e
muitos autores indenizados como o caso trazido por OLIVER:
“A atriz Marisa Sommer (...), nos anos 70, havia participado das filmagens de uma obra do
saudoso cineasta Massaini, e no decorrer dos anos, com a chegada do videocassete, essa obra
fora adaptada para vídeo (...), não prevista no contrato de seção de imagem. Após exame
minucioso do contrato observamos que o mesmo tinha objeto certo e definido, não falando
em tecnologia moderna, permitindo então que a atriz reclamasse por seus novos direitos,
uma vez que não estava definido no documento firmado a autorização para nova edição da
obra por método moderno.”16
3 O “CRESCIMENTO” NA UTILIZAÇÃO DA INTERNET
A utilização da internet cresceu e continua a crescer muito, no ano de 2000, no
Brasil, apenas 2,9% da população da época, aproximadamente 5 milhões de pessoas,
acessavam a rede mundial de computadores, já no ano de 2009 essa porcentagem
aumentou para 34,4%, correspondente a aproximadamente 67,5 milhões de pessoas.
Nos Estados Unidos, o país onde nasceu esse mecanismo de comunicação digital, o
acesso chega à 72,5% da população total, um número razoável em relação ao Brasil e
em relação à porcentagem de pessoas que têm acesso à internet no mundo que chega a
23,6%, mais de 1,5 bilhões de usuários do mundo virtual17.
Esse crescimento se dá por conta de diversos fatores que surgiram, como: a
facilidade de aquisição de um microcomputadores ou notebook; diversos meios de
acesso à internet; e a necessidade de ter um contato virtual, através de e-mails, sites,
comunidades, blogs, para um melhor aproveitamento profissional e social, sendo para
o primeiro, muitas vezes, um requisito para atividade laboral.
15
OLIVER, Paulo. Direitos autorais da obra literária: frente à lei n. 9.610/98. Belo
Horizonte: Del Rey, 2004. p. 37 – 39.
16
Ibid., p. 38.
17
INTERNET WORLD STATS. Disponível em: <http://www.internetworldstats.com>
Acesso em: 23 mar. 2009.
7
Pela grande abrangência da internet, além de seus usuários domésticos, ela é
muito utilizada pelas organizações comerciais para a obtenção de lucros, pois com o
enorme crescimento de usuários, o nicho de mercado estende-se cada vez mais e com a
facilidade de aquisição de mercadoria pelos consumidores através dos mercados
virtuais, o aumento de lucro é certo.
Esse grande instrumento digital que nasceu e está crescendo cada vez mais,
por conta de sua facilidade e velocidade de comunicação e de transferência de dados,
possui seu aspecto negativo. Muitas pessoas utilizam esse meio eletrônico para
propagar conteúdos e condutas contrárias ao ordenamento jurídico e contra os bons
costumes, são aqueles que: fazem parte da indústria da pornografia, que utilizam os
meios eletrônicos para propagar a prostituição e a exploração sexual, além dos
pedófilos; utilizam a internet para a pirataria de programas de computador (softwares),
músicas, filmes e outras mídias; pertencem a um grupo criminoso ou terrorista que
propagam seus ideais na grande rede; e os hackers, que são aqueles indivíduos que
possuem um grande conhecimento sobre informática, mas utilizam esses
conhecimentos para invadirem os computadores pessoais de outras pessoas ou
empresas para descobrirem suas senhas bancárias, quando utilizadas pela internet, ou
simplesmente para infectar a máquina do outro com um vírus de grande impacto, por
diversão, talvez18.
Essas práticas criminosas aumentam cada vez mais por conta da facilidade de
cometê-las no mundo virtual, isso se torna um atrativo para os criminosos; nesse
sentido, para reduzir essa prática, deve-se reduzir esse atrativo por meio de elaboração
de mecanismos de segurança e “disseminando uma formação ética dos membros da
sociedade em condições de acesso à informática e dos especialistas em particular”,
pois estes podem, por conta de seu grande conhecimento dos mecanismos digitais,
cometerem grandes ilegalidades na internet de difícil constatação19.
Atualmente existem mecanismos para evitar esses usuários que utilizam a
internet para esses fins, mas não são absolutamente eficazes, por conta da dificuldade
18
CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos jurídicos da internet. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 7
19
ROSA, Fabrízio. Crimes de informática. Campinas: Bookseller, 2002. p. 41.
– 10.
8
de identificação do autor do crime, que pode estar aqui no Brasil ou em outro país do
outro lado do planeta.
Relativizando essa concepção, encontram-se alguns autores, os quais
observam que essa evolução tecnológica atingiu uma minoria da população mundial,
somente aquele grupo que tem acesso a computadores e à internet, gerando, assim,
certo mito em relação à globalização desses instrumentos.
Como escreve Milton SANTOS, um dos defensores dessa idéia, existem três
mundos diferentes: “o primeiro seria o mundo tal como nos fazem vê-lo: a
globalização como fábula; o segundo seria o mundo tal como ele é: a globalização
como perversidade; e o terceiro o mundo como ele pode ser: uma outra
globalização”20.
O primeiro mundo seria aquele em que trata a globalização e a evolução da
tecnologia com muita “maquiagem”, relevando somente seus aspectos positivos,
partindo da premissa de que todos se beneficiam desse processo de evolução, sem
levar em consideração que a grande maioria da população não possui a oportunidade
de acesso as novas tecnologias surgidas21.
O segundo mundo mostra como a globalização seria verdadeiramente, que ela
seria considerada de forma perversa, pois com ela as sociedades tornaram-se escravas
do dinheiro e da informação, os quais são manipulados de forma a privilegiar poucos,
resultando em um aumento na pobreza, nos problemas sociais, e nos males morais,
como o egoísmo e a corrupção22.
E o terceiro mundo trata de uma proposta de SANTOS, em uma globalização
mais humana, que utilize os instrumentos que são utilizados de modo perverso, de
forma a beneficiar um maior número de pessoas.23
Como defende PRONER, a evolução tecnológica acompanha a evolução
econômica e que a dependência desta gera uma dependência daquela, fazendo com que
os países em desenvolvimento, submissos as regras do comércio internacional,
20
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal. 10 ed. Rio de Janeiro: Record, 2003. p. 18.
21
Ibid., p. 18 – 19.
22
Ibid., p. 37 – 40.
23
Ibid., p. 20 – 21.
9
“tenham pouco espaço para reagir”. Alguns internacionalistas apontam um caminho
para reduzir essa desigualdade, que seria a valorização do direito ao desenvolvimento
dos países menos desenvolvidos; ainda, deve-se valorizar o conceito de cooperação
internacional entre os Estados periféricos e semi-periféricos para promover a
possibilidade de um “outro mundo possível”.24
No ano de 2008 foi realizada uma pesquisa no Brasil pelo IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre a quantidade de pessoas que tem um
computador em casa e se possui acesso à internet. Nessa constatação ficou claro que a
evolução tecnológica atinge de forma mais significativa as classes da população com
um maior poder econômico: das pessoas pesquisadas que ganham até 10 salários
mínimos (86,3% das pessoas pesquisadas), 74,2% delas não possuem um computador,
7,8% possui computador, mas sem conexão com a internet, e 17,9% têm acesso ao
mundo virtual; daquelas que ganham de 10 à 20 salários mínimos, existe já uma
grande diferença na quantidade, 17,4% delas não têm computador, 7,8% têm
computador, contudo sem o acesso da internet, e 74,6% possui tal acesso; essa
diferença fica ainda maior na comparação com as pessoas pesquisadas que ganham
mais de 20 salários mínimos (2,7% das pessoas pesquisadas), onde somente 7% não
possuem computador, 3,9% possui, mas sem acesso à internet, e quase 90% delas
possuem tal acesso25, deixando claro que o mundo virtual atinge somente uma pequena
parcela da população, e essa parcela esconde a grande população que não goza dos
benefícios trazidos pela evolução da tecnologia.
Algumas pessoas acham que a internet é uma “terra de ninguém”, um lugar
onde a lei não se aplica, ou seja, onde nada é proibido, fazendo com que ocorra
violações à direitos autorais em diversos sites26. Contudo, esse entendimento já resta
PRONER, Carol. Propriedade intelectual. Op. cit., p. 102 – 104.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. PNAD 2008.
Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/
pnad2008/brasil/tab7_7.pdf> Acesso em: 21 set. 2009.
24
25
26
BLUM, Renato Ópice; BRUNO, Marcos Gomes da S. A internet e os
direitos autorais. In: KAMINSKI, Omar (Org.). Internet legal: o direito na tecnologia
da informação – Doutrina e Jurisprudência. Curitiba: Juruá, 2004. p. 43.
10
vencido como será mostrado neste trabalho, o território virtual atualmente possui
regulação em leis, Tratados Internacionais e outros instrumentos normativos.
Outros defendem que a lei a ser aplicada na internet sempre será a lei norteamericana, independentemente da “localização geográfica do usuário ou de onde o site
foi concebido e/ou armazenado, bem como a existência de outros países e,
conseqüentemente, ordenamentos jurídicos.”27.
Existem, também, aqueles que falam que o mundo virtual possui um regime
anárquico, onde é aplicável qualquer regra ou princípio do direito, com fundamento de
ser utilizado para fins militares e educacionais, defendendo a ampla liberdade de
expressão, afastando as imposições dos regimes totalitários. Argumentam, ainda, que o
direito não pode regular a internet, pois se trata de um mundo virtual, portanto,
inatingível28.
Por conta do imenso território que possui a internet, é besteira tentar proibir
acessos, reproduções e distribuições de obras por meios eletrônicos, o que é possível é
tentar minimizar as violações através de alguns instrumentos tecnológicos. Os mais
famosos utilizados são: as senhas e a criptografia de arquivos. Todavia, esses
instrumentos funcionam somente até algum especialista encontrar uma maneira de
burlá-los29, e pessoas com esse espírito não faltam.
Questiona-se no uso desses instrumentos de segurança, que eles protegem
somente a integridade da obra, porém sua distribuição continua da mesma forma, em
outras palavras, não é possível modificar o conteúdo do arquivo, mas é possível fazer
diversas cópias e distribuí-las30.
4 RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO AUTORAL NA INTERNET
O território da internet possui, como visto, diversos mecanismos de
comunicação (e-mails, sites, fóruns de discussão, comunidades virtuais) que são
27
ROSA, Fabrízio. Op. cit., p. 39.
Id.
29
TESSLER, Leonardo Gonçalves. Op. cit., p. 199 – 200.
30
Id.
28
11
utilizados por pessoas do mundo inteiro com diversas finalidades, sejam elas de cunho
acadêmico, laboral ou somente por lazer e diversão.
Nos dias atuais, é comum encontrar estudantes que utilizam estes mecanismos
para se comunicarem com seus colegas e professores, por conta da facilidade e
utilidade na utilização, com o intuito de melhorar o aprendizado e compartilhar
materiais de estudos como textos, artigos, parte ou integralmente obras que foram
digitalizadas.
Nesse sentido, esse compartilhamento de materiais, resguardando a autoria e
não utilizando com fins econômicos, pode ser considerado uma violação aos direitos
autorais? Pois comumente não existe uma autorização do autor para publicar seus
trabalhos na internet, onde é possível o acesso de qualquer pessoa, de qualquer parte
do globo terrestre, salvo nas páginas que necessitam de alguma senha ou código para
serem acessados.
Segundo OIKAWA, os direitos autorais, bem como seus direitos conexos,
estão previstos no artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII, da Constituição Federal
brasileira de 1988, por essa razão, esses diretos são considerados direitos fundamentais
e com o crescimento dos meios tecnológicos pode-se dizer que são sua proteção sofre
algumas relativizações31.
Comumente são copiados trechos de obras para utilização própria do copista,
na maior parte das vezes com finalidade de estudo, sem observar a necessidade de
autorização do autor para tal utilização, salvo os casos de obras que já caíram em
domínio público. Em um primeiro momento, há que se pensar em uma violação aos
direitos autorais, por conta do direito de reprodução do autor, o qual é um de seus
direitos fundamentais, e porque a lei não difere a pirataria ilegal do uso doméstico.
Tenta-se resolver esse problema através dos dispositivos da lei de direitos autorais (lei
nº 9.619/98), nos artigos 46 a 48, onde prevê a utilização de obras sem ofensa aos
direitos do autor32.
31
OIKAWA, Alysson Hautsch. O marco regulatório do direito autoral. Disponível em: <
http://www.bheringadvogados.com.br/port/mid/pdf_valor_DtoAutoral20080919.pdf> Acesso em: 03
out 2009.
32
Id.
12
Desde que garantidos os direitos de paternidade da obra e não a utilizando
com intuito de obter lucro, não é necessária a autorização do autor para veicular seu
trabalho na internet com a finalidade supra, pois, além da previsão legal pela lei de
direitos autorais brasileira, não proibindo esse tipo de utilização, e da contribuição ao
conhecimento, existe um lado positivo dessa conduta ao autor, seus pensamentos
estarão veiculados a rede mundial de computadores, ou seja, poderá ser reconhecido
mundialmente por suas idéias. A internet oportuniza o aparecimento de diversos novos
autores e os promove, pois a comunicação dos arquivos na grande rede é muito veloz,
além de incidir em diversas pessoas ao mesmo tempo.
Outro ponto positivo em relação a essa relativização dos direitos autorais é o
fato das pessoas buscarem muito esse mecanismo para obterem informações de modo
muito rápido e sendo essa disposição de forma não onerosa, a influência será muito
maior do que sendo onerosa33.
5 PROTEÇÃO DA PROPRIEDADE INTELECTUAL NO BRASIL
No ordenamento brasileiro, a proteção dos direitos de autor é uma garantia
constitucional, prevista no artigo 5º, incisos XXVII, XXVIII e XXIX da Constituição
Federal de 1988, na parte sobre os direitos e garantias fundamentais.
Protegido, também, pela lei nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998 (Lei dos
Direitos Autorais), a qual determina em seu art. 7º que as obras protegidas são todas
“as criações de espíritos, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte,
tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro”; com isso, a proteção
dada por essa lei abrange também as obras encontradas na internet34. Pelas regras e
princípios trazidos no Código Civil Brasileiro de 2002, na parte sobre direitos reais e
de propriedade, e nos acordos internacionais sobre esse tema assinados e ratificados
pelo Brasil, como exemplo a Convenção de Berna, de Paris e o Acordo TRIPS.
33
34
TESSLER, Leonardo Gonçalves. Op. cit., p. 203.
BLUM, Renato Ópice. Op. cit., p. 44.
13
A aplicabilidade desses Tratados Internacionais não se dá de forma direta aos
particulares, deve ser editada uma lei no ordenamento brasileiro, tendo como base
mínima esses instrumentos internacionais, prevendo esses direitos e garantias aos
direitos autorais; a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça autoriza a aplicação
direta de Tratados que trazem especificamente leis uniformes, como no caso do cheque
ou da letra de câmbio, sendo que as Convenções supracitadas não possuem este
caráter35.
O objeto protegido pelo ordenamento jurídico pátrio relaciona-se diretamente
com a pessoa do criador de uma obra, ênfase no direito moral, e a criação deve
observar certos elementos: a novidade, a originalidade e a distinguibilidade36.
Em nosso ordenamento está previsto a proteção dos direitos autorais na
internet pela lei nº 9610/98 e pelos tratados e convenções internacionais, na lei de
direitos autorais está previsto que somente é caracterizado violação aos direitos
autorais na rede mundial de computadores quando a obra digital for utilizada
publicamente, o simples fato de armazenar o arquivo no computador, sem o intuito de
utilizá-lo com finalidade econômica lucrativa, mas com a vontade de utilização
estritamente privada, não caracteriza uma violação; dentro desse conceito deve ser
abrangido, também, que o ato de fazer o download para utilizar a obra privativamente,
da mesma forma, não caracteriza um dano ao direito autoral37.
Critica OIKAWA no sentido de que a realidade social e econômica brasileira
não possui um nível considerável, ao ponto de fazer com que sejam cobradas condutas
semelhantes a outros países mais desenvolvidos. A economia brasileira encontra-se em
uma situação em que as atividades informais, dentre elas o comércio ilegal de produtos
pirateados, são uma ótima saída para o desemprego que afeta uma grande parte da
população, gerando, também pelo fato dessas pessoas não considerarem que essa
conduta seja um crime grave, um crescimento dessa economia. Para uma solução dessa
35
BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade intelectual. 2 ed. rev. e atual.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 217.
36
PIMENTEL, Luiz Otávio. Propriedade intelectual e universidade: aspectos legais.
Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005. p. 18.
37
TESSLER, Leonardo Gonçalves. Op. cit., p. 191 – 193.
14
situação, deve-se, além das medidas repressivas, aumentar a qualidade das políticas
públicas devidas pelo Estado38.
O Brasil privilegiou o sistema norte-americano, quando determinou uma
proteção maior aos interesses do proprietário. Isso ocorreu, segundo BARBOSA, por
conta da aprovação de legislações de proteção à propriedade intelectual com cunho
eminentemente patrimonialista e sem o devido equilíbrio, e pela aplicação do TRIPS
em pleno desacordo com o tratado. Alguns autores definem essa questão como “a
marcha da insensatez”, quando o Estado, por meio de seus Poderes, impõe ao seu
sistema jurídico, através de leis e julgados, questões de seus interesses, sem considerar
qualquer interferência externa39.
Um exemplo, apontado por BARBOSA, é o caso da regra processual de
inversão do ônus da prova nas discussões sobre patentes, prevista na lei nº 9279/96,
segundo a qual cabe ao réu o ônus de provar, ou seja, ele deve comprovar que não
houve violação dos direitos autorais por parte dele e não o autor da obra que irá
defender seu próprio direito40.
CONCLUSÃO
A estrondosa evolução tecnológica, em especial o advento do mundo virtual,
trouxe importantes conseqüências no ordenamento jurídico mundial. Com essa
evolução foram surgindo diversas situações novas que passaram a necessitar de um
regramento específico.
Os direitos autorais, existentes desde o século XV, sofreram grande
interferência, principalmente da internet, pois esse novo instrumento digital de
comunicação de dados gerou um problema na proteção de tais direitos, pela grande
dificuldade de identificar os violadores, a origem da violação e de fiscalizar a
38
OIKAWA, Alysson Hautsch. O cenário da propriedade intelectual no Brasil.
Disponível em: <http://www.bheringadvogados.com.br/port/artigos/AHO_CenarioPI_20051
0.pdf> Acesso em: 04 out. 2009.
39
BARBOSA, Denis Borges. Trips e a experiência brasileira. In: VARELA, Marcelo Dias
(Org.). Propriedade intelectual e desenvolvimento. São Paulo: Lex editora, 2005. p. 148 – 149.
40
Id.
15
ocorrência delas; além do surgimento de mecanismos tecnológicos que reproduzem e
copiam as obras com uma grande velocidade e perfeição.
A proteção à propriedade intelectual passou a ser um tema muito discutido em
âmbito internacional, por conta dessa evolução tecnológica afetar o mundo inteiro e
pela ampliação de abrangência da internet entre as pessoas, fazendo com que a
comunicação de arquivos contendo diversos conteúdos (musicais, literários,
fotográficos, artísticos) se tornasse muito intensa, gerando uma maior facilidade de
violação de direitos autorais e uma maior dificuldade de fiscalização por parte de seus
autores.
Observando isso, foram realizadas diversas Convenções e Tratados
Internacionais visando à proteção da propriedade intelectual; o Brasil participou,
assinou e ratificou diversas delas, dentre as mais importantes estão: a Convenção da
União de Paris, a Convenção da União de Berna e o Acordo TRIPS. Esses diversos
acordos prevêem parâmetros mínimos de proteção dos direitos autorais aos paísesmembros, devendo estes elaborar suas normas internas respeitando essas bases.
No Brasil a proteção dos direitos autorais, além da proteção internacional dos
acordos e tratados, é garantida pela Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, incisos
XXVII, XXVIII e XXIX), prevista na parte de proteção aos direitos fundamentais.
Além dessa garantia constitucional existe a proteção legal pela lei nº 9.610 de 1998,
que prevê a proteção dos direitos autorais, bem como as regras e princípios que a rege,
os objetos a serem protegidos e os mecanismos de proteção.
Alguns autores defendem que a tecnologia vem a afetar somente uma pequena
parcela da sociedade, somente aquela que possui condições de manter e adquirir tais
instrumentos sem prejudicar sua condição de existência digna, para a outra classe de
pessoas resta somente aguardar que este acesso seja mais democrático para poderem
desfrutar desses avanços.
O grande avanço da tecnologia, mais especificamente da internet, traz grandes
benefícios para a sociedade, mesmo que para uma minoria, e cria, também,
constantemente fatos novos que devem ser regulados pelos ordenamentos nacionais,
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através de normas internas, e internacionais, por meio de acordos e tratados
internacionais.
É inevitável que a cada dia surja um instrumento diferente utilizado para tentar
violar os direitos intelectuais, por conta disso deve ser utilizado o dinamismo do
direito para tentar solucionar os dilemas futuros-tecnológicos que vierem a surgir.
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