UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
LUIZ ALBERTO MACHADO NETO
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
CURITIBA
2013
UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
LUIZ ALBERTO MACHADO NETO
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
Pré-projeto apresentado ao curso de
Direito da Universidade Tuiuti do Paraná
- UTP como requisito inicial para a
elaboração e apresentação do Trabalho
de Conclusão de Curso.
Orientador: Felipe Hasson
CURITIBA
2013
TERMO DE APROVAÇÃO
Luiz Alberto Machado Neto
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel
no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná
Curitiba,_____ de____________de 2013
__________________________________________________
Prof. Phd. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenação do Núcleo de Monografia
Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador: ______________________________________________________
Prof. Felipe Hasson
Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito
Supervisor: ______________________________________________________
Prof.
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Supervisor: ______________________________________________________
Prof.
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
DEDICATÓRIA
Este trabalho eu dedico à minha
família. Ao meu pai Luiz Alberto
Machado Filho, aos meus irmãos, aos
meus avós Luiz Alberto Machado e
Aidê
e
à
minha
tia
Vanessa,
presentes em todos os momentos da
minha
caminhada
profissional.
pessoal
e
AGRADECIMENTO
Aos meus Professores, que durante todo o Curso me incentivaram e
partilharam de sua sabedoria e conhecimento, me inspirando a trilhar pelo
caminho da busca incessante pela Justiça e aplicação do Direito.
Ao meu orientador Professor Felipe Hasson, que além de me auxiliar na
busca do tema, foi incansável e dedicado, mostrando-me sempre que o único
caminho para a realização de um bom trabalho está na pesquisa, estudo e
dedicação.
Aos meus colegas, que apesar de não serem os mesmos desde o início
da minha experiência acadêmica, tiveram um papel importante em todo este
processo de aprendizagem, aprimoramento e busca por um ideal comum.
Aos meus amigos que muito me incentivaram e me apoiaram em todo
esse momento.
Por fim, quero agradecer, em especial, à minha família, na pessoa do
meu pai Luiz Alberto Machado Filho, amigo, incentivador e companheiro
incansável, aos meus irmãos, aos meus avós Luiz Alberto Machado, meu maior
orgulho e Aidê, pelo amor, carinho e compreensão , e à minha tia Vanessa,
pela sua dedicação e compreensão.
RESUMO
A finalidade do presente trabalho científico é demonstrar que a busca de
soluções para os nossos conflitos em sociedade não está apenas no acesso ao
Poder Judiciário; que existem outros meios, que não a via judicial; meios
alternativos de solução das controvérsias, e a Arbitragem, objeto de análise do
presente trabalho por meio de suas duas modalidades. ao lado do Princípio da
Boa-Fé.
De
início,
numa
abordagem
conceitual,
destacando-a
como
Alternative Dispute Resolution (ADR), passando depois para um estudo do seu
desenvolvimento histórico no Brasil, demonstrando dessa forma que a
Arbitragem vem a ser um instituto antigo e que veio ganhando força,
importância e reconhecimento, ao longo dos anos, principalmente após o
advento da Lei Federal nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem), no atual mundo
globalizado dos contratos, através de suas duas modalidades: a cláusula
compromissória e o compromisso arbitral, demonstrando os diferentes
tratamentos normativos dispensados às mesmas. Em destaque para a cláusula
compromissória (objeto da presente monografia), antes e após o advento da
Lei de Arbitragem, numa discussão acerca de sua natureza jurídica e
aplicabilidade. Por fim, buscou resgatar o Princípio da Boa-Fé e o seu papel na
aplicação do instituto da Arbitragem; sua importância na busca e manutenção
do comportamento ético, de lealdade e confiança mútuas que se deve ter em
todo o procedimento arbitral, e que deve se estender à figura do advogado e do
árbitro, num trabalho de cooperação para a obtenção de um objetivo comum: a
solução para as controvérsias que tenham por objeto apenas direitos
disponíveis. Como método de pesquisa utilizou-se da análise da Legislação
pátria e doutrina nacional e estrangeira, com a finalidade de tratar e discutir o
Instituto da Abitragem e a importância e do Princípio da Bo-Fé no procedimento
arbitral.
Palavras-chave: Arbitragem, Princípio da Boa-Fé, Cláusula Comprimissória e o
Princípio da Boa-Fé na Arbitragem
ABSTRACT
The purpose of this scientific work is to demonstrate that the search for
solutions to the conflicts in our society is not only access to the courts, there are
other ways, not the courts, alternative means of settlement of disputes and
arbitration object analysis of this work through its two modalities. next to the
Principle of Good Faith. Inicially, a conceptual approach, highlighting it as
Alternative Dispute Resolution (ADR), then moving to a study of its historical
development in Brazil, thereby demonstrating that the arbitration is to be an
institute that came old and gaining strength, importance and recognition over
the years, especially after the advent of the Federal Law No. 9.307/96
(Arbitration Act), in the current globalized world of contracts, through its two
modalities: the arbitration clause and the arbitration agreement, demonstrating
the different regulatory treatments dispensed thereto. In particular the clause
(the subject of this monograph), before and after the advent of the Arbitration
Law, a discussion of its legal nature and applicability. Finally, we tried to rescue
the Principle of Good Faith and its role in the implementation of the Arbitration
Institute; their importance in the pursuit and maintenance of ethical behavior,
loyalty and trust that you must have in any arbitration proceeding, and must be
extend the figure of the lawyer and arbitrator, a cooperative effort to achieve a
common goal: the solution to the controversies which have as their object rights
only available. As a method of research used the analysis of legislation
homeland and national and foreign doctrine, in order to treat and discuss the
importance and the Institute of Abitragem and Principle of Faith in Bo-arbitration
procedure.
Keywords: Arbitration, Principle of Good Faith Clause Comprimissória
and the Principle of Good Faith in Arbitration
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................9
CAPÍTULO 1. CONCEITUAÇÃO E DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA
ARBITRAGEM........................................................................................14
1.1 A ARBITRAGEM COMO ALTERNATIVE DISPUTE RESOLUTION OU
ADR.......................................................................................................14
1.2 UMA ABORDAGEM HISTÓRICA SOBRE A ARBITRAGEM NO BRASIL E
OS
DIFERENTES
CLÁUSULA
TRATAMENTOS
COMPROMISSÓRIA
NORMATIVOS
E
CONCEDIDOS
À
COMPROMISSO
ARBITRAL.............................................................................................19
CAPÍTULO 2. A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA NA APLICAÇÃO DA LEI
DE ARBITRAGEM..................................................................................24
2.1
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA: SUA NATUREZA JURÍDICA
ANTES DA LEI FEDERAL 9.307/96......................................................24
2.2 A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA APÓS O ADVENTO DA
LEI FEDERAL 9.307/96 ......................................................................26
CAPÍTULO 3. A BOA FÉ: UM ELEMENTO ÉTICO NA ARBITRAGEM. ......30
3.1 A BOA-FÉ NO DIREITO BRASILEIRO SOB A ÓTICA DO CÓDIGO CIVIL
BRASILEIRO E DO ESTATUTO DA OAB...................................................... 32
3.2. A BOA-FÉ APLICADA AO INSTITUTO DA ARBITRAGEM....................38
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................46
9
INTRODUÇÃO
É inerente, ao ser humano, no convívio em sociedade, o surgimento de
conflitos e, nesse aspecto, o Direito passa a ter uma função fundamental, servindo
assim de instrumento na regulamentação destes conflitos, de forma a atingir a
preservação da harmonia em sociedade.
Como bem nos ensina Carlos Alberto Câmara, 1 trata-se de um:
“Mecanismo privado de solução de solução de litigios, por meio do qual um
terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser
cumprida pelas partes. Esta característica impositiva da solução arbitral
(meio heterocompositivo de solução de controvérsias) a distância da
mediação e da conciliação, que são meios autocompositivos de solução de
2
litígios” CAMARA (2009, p. 31-32)
Situado entre as mais novas tendência do Processo Civil moderno, na busca
efetfiva dos provimentos jurisdicionais e priorização do princípio da autonomia da
vontade, com a vantagem de trazer consigo a celeridade e economicidade
processuais, não encontradas no processo judicial, a arbitragem, numa visão
doutrinária contemporânea vem a ser colocada à disposição de quem quer que seja
na busca de solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais que podem ser
dispostos pelos litigantes.
Embora tenha recebido críticas no sentido de que suas disposições
comprometem o princípio do devido processo legal e da ampla defesa e duplo grau
de jurisdição (respectivamente arts. 5º, LIV eLV da Constituição Federal, tais são
irrelevantes. Isso porque a mesma não viola a garantia do controle jurisidicional, o
qual se encontra assegurado no mesmo dispositivo constitucional supracitado, inciso
1
ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À LEI Nº 9307/96, 3ª Ed.,São Paulo, Ed.
Atlas S.A.-2009, p.31-32
2
Mediação-como bem sintetizou Alexandre Freitas Câmara (Arbitragem, Lei nº 9.307/96, Rio
de Janeiro, Lumen Júris, 1997, p.128-129- é técnica de solução de conflitos através da qual um
terceiro exerce a função de aproximar as partes fim de que os próprios litigantes ponham termo ao
seu conflito, direta e pessoalmente;..... Em outras palavras, a distinção entre um e outro meio
autocompositivo está na maior ou menor intensidade de atuação do terceiro...”
10
XXXV da Carta Magna.
É o que se pode constatar em artigo publicado por Sabino Lamego de
Camago3, o qual afirma ainda que a arbitragem vem a constituir-se em em meio
eficaz de composição de litigios. Dotada de normas processuais perfeitamente
definidas no diploma legal que a instituiu (Lei nº 9.307/96) inclusive com previsão de
recurso ao judiciário nos casos previstos na lei, a decisão arbitral, portanto, tal como
a decisão judicial, é uma exteriorização da função jurisdicional, o que afasta
qualquer
óbice
a
supostos
comprometimentos
das
garantias
processuais
asseguradas na Constituição Federal.
Em consideração aos benefícios trazidos pelo juízo arbitral e a importância
que vem a assumir nas relações de comércio moderno, sobretudo a liberdade de
ordem constitucional de que desfrutam as partes contratantes (… ) não resta dúvida
que o instituto da arbitragem em sua dupla modalidade de cláusula compromissória
e de compromisso é uma opção legítima e plenamente compatível com a
Constituição Federal.
Sendo assim, tem-se que a Lei de Arbitragem, objeto do presente trabalho,
não vem a encontrar impedimento algum nos preceitos constitucionais vigentes .
Pode-se afirmar que :
“são plenamente compatíveis com a Constituição Federal no que diz
respeito aos preceitos de natureza processual e sobretudo encontram
guarida
nos
preceitos
que
agasalham
especialmente no princípio da livre iniciativa”.
a
autonomia
da
vontade,
4
No desenvolvimento do presente trabalho serão tratadas e discutidas questões
diretamente relacionadas ao instituto da Arbitragem no Brasil, desde o advento da
Lei nº 9.307/96 e as conseqüentes mudanças havidas na legislação civil e
processual civil pátrias bem como no tratamento doutrinário e jurisprudencial
3
A ARBITRAGEM EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.Disponível em:
http://www.http://www.scamargo.adv.br/scripts/forum/textoTema.asp?Id=33&tema=A+Arbitragem+em
+Face+da+Constitui%E7%E3o+Federal
4
A ARBITRAGEM EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.Disponível em:
http://www.http://www.scamargo.adv.br/scripts/forum/textoTema.asp?Id=33&tema=A+Arbitragem+em
+Face+da+Constitui%E7%E3o+Federal
11
dispensados a este instituto. Assim a Arbitragem passou a ganhar um novo impulso
em nosso País. Foram mudanças de natureza cultural positiva e, principalmente, nos
meios econômicos e empresarial.
Ao incluir no ordenamento jurídico pátrio instrumentos eficazes na instituição
do juízo arbitral, notadamente no que diz respeito à cláusula compromissória, a Lei
da Arbitragem Brasileira tornou o seu uso eficaz tanto na órbita nacional como
também internacional, na qual vem sendo utilizado com êxito, permitindo que
confltos de interesses disponíveis havidos entre empresas brasileiras e estrangeiras
sejam solucionadas por árbitros escolhidos pelas partes e, dessa forma, o que
implica serem de sua confiança.
Face à necessidade em se dar maior agilidade e especificidade aos processos,
e diante dos sinais de esgotamento do sistema judiciário, (implicando numa
necessária reformulação, reinterpretação e reoganização da justiça, na atualização
de conceitos, institutos e normas, da transformação da realizadade social),
pensadores contemporâneos passaram a discutir a adoção de meios mais
adequados às lides internacionais e à instituição de órgãos na busca de meios
alternativos na solução de conflitos, situando-se, entre eles a arbitragem.
Tratada no artigo 4º da Lei nº 9.307/96 a cláusula compromissória vem a ser
definida como:
“…a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se
a submeter à arbitragem os litigios que possam vir a surgir, relativamente a
tal contrato.” (Lei 9.307, 1996)
Um instrumento por meio do qual as partes confirmam a sua vontade relativa
a todas as questões relacionadas à instituição do juízo arbitral, tais como definir o
árbitro, a lei aplicável à espécie, as regras procedimentais e o prazo de duração. Um
instrumento cuja natureza contratual passa a ser afetado pela positivação do
princípio da boa fé no Código Civil.
“…Portanto, do ponto de vista da conclusão da cláusula compromissória,
estariam as partes alinhadas com o princípio da boa fé. Há inerente na
conclusão da cláusula compromissória o traço da colaboração entre as
12
partes signatárias, da identidade de propósitos, qual seja, o de utilizarem-se
da arbitragem quando venham a surgir suas controvérsias.”
5
Em artigo publicado por Selma Ferreira Lemes 6 uma importante questão vem
a reforçar e prestigiar a arbitragem, ao ser analisada à luz do princípio da boa fé, o
qual, com o Novo Código Civil, veio a penetrar nas relações contratuais (artigos 113
e 422), de forma a exigir que as partes, tanto na conclusão como na execução do
contrato, sejam obrigadas a guardar os princípios da boa fé e da probidade. Um
componente de eticidade que sempre esteve presente em nosso direito civil mesmo
quando da ausência de normas expressas que regulassem as relações contratuais
cíveis.
Com a cláusula geral da boa fé passam a ser impostos deveres de conduta
no cumprimento do contrato, entre eles a lealdade e a confiança. Vem a exigir um
comportamento honesto; um comportamento que leve em consideração a pessoa do
outro contratante, obrigando assim as partes a agirem de modo colaborativo e
unidas com a finalidade de dar ao contrato sua verdadeira e completa eficácia.
E vem a ser neste sentido que a abordagem ao Princípio da Boa-Fé se
justifica: quando passa a obrigar as partes a agirem colaborativamente; unidas num
mesmo objetivo, que vem a ser o de dar ao contrato a sua verdadeira eficácia, cujo
descumprimento implicará na violação tanto da Lei de Arbitragem quanto da
legislação civil.
A tendência natural do presente trabalho científico será a de demonstrar a
arbitragem como mecanismo de solução para as controvérsias havidas em
sociedade, abrindo-se espaço ao seu aperfeiçoamento, evolução e estudo, ao
mesmo tempo em que buscará demonstrar os vários conceitos que o instituto veio a
receber, tanto da doutrina estrangeira quanto da nacional, incluindo-se aqui uma
visão da arbitragem como Alternative Dispute Resolution ou ADR (para o o Direito
norte-americano); as duas formas pelas quais a arbitragem vem a se manifestar e os
5
PINTO, José Emilio Nunes. A cláusula compromissória à luz do Código Civil. Jus Navigandi,
Teresina, ano 9, n. 518, 7 dez. 2004 Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6025>. Acesso
em: 29 mar. 2013.
6
A CLÁUSULA ARBITRAL E O PRINCÍPIO DA BOA FÉ. Disponível em: http://
www.camarb.com.br/areas/subareas conteudo.aspx?subareano=37. Acesso em:29/03/2013
13
diferentes tratamentos normativos concedidos às mesmas (cláusula compromissória
e compromisso arbitral),antes e após o advento da Lei Federal nº 9.307/96.
Por fim o papel e a importância da ética no processo arbitral, dentre todos os
princípios norteadores do direito pois, assim como a jurisdição estatal, a arbitragem
também segue normas e princípios que buscam definir a forma a ser utilizada na
solução eficaz e crível para os conflitos que vierem a surgir, ampliando-se ao
máximo a garantia de acesso à Justiça.
14
CAPÍTULO 1. CONCEITUAÇÃO
E
DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA
ARBITRAGEM.
1.1
A ARBITRAGEM COMO ALTERNATIVE DISPUTE RESOLUTION OU ADR
Na busca por uma definição clara e precisa sobre arbitragem a doutrina tanto
nacional como estrangeira tem encontrado dificuldade; uma diversidade conceitual
decorrente da falta de consenso entre os juristas acerca da natureza juridical deste
instituto. Uma diversidade conceitual que retrata a preocupação em conceituâ-la
sempre com base em seus traços marcantes, quais sejam a intervenção de um
terceiro, fora do poder judiciário, o consenso entre as partes e a disponibilidade dos
direitos envolvidos.
Tal ponderação se torna importante, na medida em que com a delimitação da
natureza juridica da arbitragem, será possível, conseqüentemente, estabelecer sua
conceituação e sua distinção em relação aos demais institutos congêneres
(mediação, conciliação, etc).
Para alguns doutrinadores pátrios, como veremos a seguir, a arbitragem é
vista como um sistema de solução de conflitos; para outros um processo de solução
de litigios ou divergências; ou ainda uma técnica ou meio paraestatal de solução
destes conflitos. Na acepção específica do processo civil é vista como forma de
jurisdição, ou seja:
“poder conferido a certas pessoas determinadas por lei ou indicadas
pelas partes para solucionarem a controvérsia judicial ou extrajudicial
7
relativa a direito patrimonial disponível, suscitada entre elas” .DINIZ (1998,
p. 251)
Então vejamos, alguns destes posicionamentos doutrinários, primeiramente
no plano nacional, CARMONA afirma que: “Trata-se de mecanismo privado de
solução de litigios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe
7
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico,V.1, São Paulo: Saraiva, 1998, p.251. Disponivel
em: http://jus.com.br.Arbitragem como forma de solução de conflitos no processo civil: teoria, prática e
crítica-Revista Jus Navigandi-Doutrina e Peças. Acesso em: 13 agosto de 2012.
15
sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes”.8
“… é a técnica, pela qual a divergência pode ser solucionada, por meio da
intervenção de terceiro (terceiros), indicado pelas partes, gozando da
confiança de ambas . Com a assinatura da cláusula compromissória ou do
compromisso arbitral, a arbitragem assume o caráter obrigatório. Pode ser
realizada por um árbitro ou por mais de um. Neste caso, estará constituído o
9
Tribunal Arbitral. A sentença tem força judicial”
Para IRINEU STRENGER10 vem a se constituir numa instância jurisdicional
praticada em função de regime contratualmente estabelecido, para dirimir
controvérsias entre pessoas de direito privado e/ou público, com procedimentos
próprios e força executória perante tribunais estatais.
Já JOSÉ CRETELLA JÚNIOR11, renomado e conhecido processualista compreende
a arbitragem como um:
“…sistema especial de julgamento, com procedimento técnico e
princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo
direito comum, mas a esse subtraído, mediante o qual duas ou mais
pessoas físicas, ou jurídicas, de direito privado ou de direito público, em
conflito de interesses, escolhem de comum acordo, contractualmente, uma
terceira pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes a
pendência, anuindo os litigantes em aceitar a decisão proferida”.
8
CARMONA, Carlos Alberto. ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À LEI Nº
9.307/96, 3ª ed. Revista, Atualizada e Ampliada. EDITORA ATLAS, p. 31.
9
Szlarowsky.
Leon
Fredja.
A
Arbitragem.
Primeiras
Noções.
em:http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29772-29788-1-PB.htm.
em:06/08/2012.
10
Comentários à lei brasileira de arbitragem. São Paulo: LTr, 1998, p.17.
11
Comentários à Constituição Brasileira de 1988, p.3218-3219.
Disponível
Acesso
16
Some-se a estes posicionamentos um clássico conceito estrangeiro, de
autoria do ilustre e saudoso jurista francês e Professor PHILLIPE FOUCHARD, para
o qual: “Pela abitragem, as partes convêm submeter o litígio ao julgamento de
particulares que elas escolheram”.12 FOUCHARD (1965)
Por outro lado, é vista pelos juristas brasileiros como meio ou mecanismo
alternativo de solução de controvérsias, dentre eles CARLOS ALBERTO
CARMONA, já anteriormente citado, para o qual a alternatividade :
“(…) não diz respeito à jurisdicionalidade do método arbitral, servindo a
nomenclatura usual apenas para apartar este mecanismo de
13
equacionamento de litigios daquele empregado pelo Estado”.
(grifo
nosso).
Compreende ainda CARMONA que o uso desta nomenclatura “alternativo”
serve tão somente para separar o uso da arbitragem em relação ao uso do
mecanismo empregado pelo Estado, vindo a fazer um alerta, logo em seguida:
“…. : a terminologia tradicional, que se reporta a “meios alternativos”,
parece estar sob ataque, na medida em que uma visão mais moderna do
tema aponta meios adequados (ou mais adequados) de solução de litigios,
não necessariamente alternativos. Em boa lógica (e tendo em conta o grau
de civilidade que a maior parte das sociedades atingiu neste terceiro
milênio), é razoável pensar que as controvérsias tendam a ser resolvidas,
num primeiro momento, diretamente pelas partes interessadas (negociação,
mediação, conciliação); em caso de fracasso deste diálogo primário
(método autocompositivo), recorrerão os conflitantes às formulas
heterocompositivas (processo estatal, processo arbitral).Sob este enfoque,
os métodos verdadeiramente alternativos de solução de controvérsias
seriam os heterocompositivos (o processo, seja estatal, seja arbitral), não os
autocompositivos (negociação, mediação, conciliação). Para evitar esta
contradição, soa correta a referência a métodos adequados de solução de
14i
litigios, não a métodos alternativos”
E continua,
12
http:// www.abdconst.com.br/especializacao/710.doc. Ph. Fouchard,L’arbitrage commercial
international, Paris, Dalloz, 1965, nº 11.
13
CARMONA, Carlos Alberto. ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À LEI Nº
9.307/96, Ed. Atlas, 3ª Ed., p. 32.
14
Apud, p.32-33.
17
“…. é razoável pensar que as controvérsias tendam a ser resolvidas, num
primeiro momento, diretamente pelas partes interessadas (negociação,
mediação, conciliação); em caso de fracasso deste diálogo primário
(método autocompositivo), recorrerão os conflitantes às formulas
heterocompositivas (processo estatal, processo arbitral). Sob esse enfoque,
os métodos verdadeiramente alternativos de solução de controvérsias
seriam os heterocompositivos (o processo, seja estatal, seja arbitral), não os
autocompositivos (negociação, mediação, conciliação).Para evitar esta
contradição, soa correta a referência a métodos adequados de solução de
litigios, não a métodos alternativos…..”
Seguindo tal linha de entendimento temos ainda o pensamento do jurista LUIZ
CARLOS DE AQUINO JUNIOR15 para o qual o instituto da arbitragem vem
ganhando cada vez mais espaço, no Brasil, como alternativa legal ao poder
judiciário, ao dizer que :
“ a arbitragem no direito brasileiro é uma forma alternativa ao Poder
Judiciário de dirimir conflitos, através da qual as partes estabelecem em
contrato ou simples acordo que vão utilizar o juízo arbitral para solucionar
controvérsia existente ou eventual em vez de procurar o poder judiciário…E
que, neste sentido vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil”.
Um mecanismo alternativo de solução de conflito por heterocomposição,
diferentemente da mediação, negociação e conciliação, no qual a participação do
Poder Judiciário é reduzida, como pudemos constatar nos ensinamentos
doutrinários de CARLOS ALBERTO CARMONA16 quando se procurou demonstrar a
arbitragem como forma ou meio alternativo de solução de controvérsias; um
mecanismo privado de solução de litigios em que um terceiro (escolhido pelos
litigantes impõe sua decisão a ser cumprida pelas partes).
Em 1996 a Lei Federal (Lei de Arbitragem), ganhou força e reconhecimento
quando, em 1996, os ministros do Supremo Tribunal Federal, por sete votos a
quatro, decidiram pela constitucionalidade da mesma em entendimento firmado em
julgamento de recurso de processo de homologação de sentença estrangeira.
15
DA
HISTÓRIA
DA
ARBITRAGEMLEI
9307/96.Disponível
http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=7526. Acesso em: 24 de agosto de 2012.
16
em
ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À LEI Nº9.307/96, 3ª EDIÇÃO
REVISTA.ATUALIZADA E AMPLIADA
18
Como a lei de arbitragem permite que as partes possam escolher um árbitro
para solucionar litigios sobre direitos patrimoniais e o laudo arbitral resultante do
acordo não precisa ser homologado por autoridade judicial.
“Trata-se de uma ação movida a partir de 1995. A empresa, de origem
estrangeira, pretendia homologar um laudo de sentença arbitral dada na
Espanha, para que tivesse efeitos no Brasil. A princípio, o pedido havia sido
indeferido. Entretanto, em 1996, foi promulgada a Lei 9.307, que
dispensaria a homologação desse laudo na justiça do país de origem.
Durante o julgamento do recurso, o ministro Moreira Alves levantou a
questão da constitucionalidade da nova lei.” CARMONA
“Apesar de todos os ministros terem votado pelo deferimento do recurso, no
sentido de homologar o laudo arbitral espanhol no Brasil, houve
discordância quanto ao incidente de inconstitucionalidade. Sepúlveda
Pertence, o relator do recurso, bem como Sydney Sanches, Néri da Silveira
e Moreira Alves entenderam que a lei de arbitragem, em alguns de seus
dispositivos, dificulta o acesso ao Judiciário, direito fundamental previsto
pelo artigo quinto, inciso XXXV, da Constituição Federal. A corrente
vencedora, por outro lado, considera um grande avanço a lei e não vê
nenhuma ofensa à Carta Magna. O ministro Carlos Velloso, em seu voto,
salientou que se trata de direitos patrimoniais e, portanto, disponíveis.
Segundo ele, as partes têm a faculdade de renunciar a seu direito de
recorrer à Justiça. ‘O inciso XXXV representa um direito à ação, e não um
17
dever’."
17
STF declara que a Lei da Arbitragem é constitucional. Artigo disponível em: HTTP://www.
conjur.com.br. Acesso em: 31/03/2013
19
A seguir, o presente trabalho buscará demonstrar que, além da confiabiidade
que o instituto da arbitragem vier a adquirir a partir deste marco histórico; o antes e o
depois do advento da Lei Federal de Arbitragem e o tratamento a ser dispensado à
cláusula compromissória e ao compromisso arbitral (espécies do gênero convenção
de arbitragem), os quais servem de base à instituição da arbitragem no Brasil. Além
das mudanças sofridas em relação às mesmas no decorrer do tempo e o tratamento
normativo hoje dispensado à elas, em especial quanto à cláusula compromissória.
1.2
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA SOBRE A ARBITRAGEM NO BRASIL E OS
DIFERENTES TRATAMENTOS NORMATIVOS CONCEDIDOS À CLÁUSULA
COMPROMISSÓRIA E AO COMPROMISSO ARBITRAL.
Para melhor compreender o seu alcance faz-se necessário, antes de mais
nada, uma abordagem histórica sobre a arbitragem, revelando os verdadeiros
obstáculos criados pela legislação infraconstitucional quanto ao se uso como
mecanismo alternativo de solução de conflitos.
Um instituto que não é recente mas que veio ganhando espaço e
reconhecimento no mundo jurídico após sua regulamentação por lei federal,
introduzindo novos conceitos e princípios, inovações no trato legal da convenção de
arbitragem, tida como a “pedra angular” da arbitragem, a qual vem a se manifestar
de duas formas diferentes: a cláusula compromissória ou o compromisso arbitral,
possibilitando a adoção da primeira em contratos internos e internacionais, bem
como atribuído à sentença arbitral os mesmos efeitos de uma sentença judicial.
No Brasil existe desde os primórdios de sua descoberta, no século XV,
trazida pela colonização portuguesa como uma forma de solução de conflitos. Ao
longo do tempo foi sendo tratada por diferentes instrumentos normativos, dos quais
se tem registro o Regulamento nº 737, de 1850, que, ao disciplinar a arbitagem,
tornou-a obrigatória para a solução de litigios entre comercio.
Simultaneamente ao regulamento 737, entrou em vigor no país o Código
Comercial Brasileiro por meio da Lei 556 de 25 de junho de 1850, a qual passou a
estabelecer a obrigatoriedade da justiça arbitral para questões decorrentes de
20
contrato de locação mercantil e nas questões sociais entre sócios, obrigatoriedade
essa que veio a ser revogada pelo art. 3º Lei nº 1.350, de 14.09.1866 (o primeiro
diploma legal a tratar somente da arbitragem), após diversas críticas, substituíndo
tão somente a arbitragem voluntária18.
Após a Independência, a Constituição Imperial de 1824 já estipulava que as
partes em conflito poderiam, por meio da convenção, nomear árbitros para virem a
solucionar litigios na área civil. Sem contemplação no texto das Constituições
Republicana de 1895, bem como nas Constituições de 1937, 1946 e 1967, ausência
essa que não implicou em desconsiderá-la como um meio de solução de litigios
referentes à locação de serviços, no plano infraconstitucional. A atual Constituição
Federal refere-se à arbitragem nos arts. 4º,parágrafo 9º, VII, e 114, parágrafo 1º.
Irrelevante no bojo da legislação pátria, a cláusula compromissória seria vista
como simples promessa de contratar; uma mera obrigação de fazer que se resolvia
em perdas e danos, caso não se cumprisse, sem comportar execução específica.
Tal vinha a ocorrer no Código de Procecsso Civil de 1939, que ratificava os
conceitos já definidos pelo Código Civil, atrelando o uso do juízo arbitral ao Poder
Judiciário.
Embora não existisse previsão no plano constitucional no final do século XIX
e início do século XX, a arbitragem veio a ser introduzida no Código Civil de 1916,
nos seus artigos 1.037 a 1.048, regulando expressamente o compromisso arbitral
mas silenciando-se quanto à cláusula compromissória.
A arbitragem voluntária foi mantida. Nessa o compromisso era o instrumento
básico do juízo arbitral, sem torná-lo capaz de permitir a instauração da arbitragem,
fato que apenas veio a ocorrer com o advento do atual Código Civil. Um obstáculo
criado pela lei brasileira e também detectado no Código Processual Civil de 1973.
Ainda em relação ao Código de Processo Civil de 1973, deve-se ressaltar a
manutenção da tradição legislativa do juízo arbitral, o qual se via sob rígido e
compulsório controle do Poder Judiciário. Mas dois avanços podiam ser registrados:
o primeiro, no art. 267, VII, prevendo que o processo judicial se extinguiria pelo
compromisso arbitral; o segundo, ao deixar de consignar que a falta de
18
BRAGHETTA, Adriana. Clãusula Compromissória: auto-suficiência da cláusula cheia, Revista
dos Tribunais, ano 91, vol.800, junho 202, São Paulo: Revista dos Tribunais,p. 138. Disponível no site
http://
21
homologação do laudo arbitral acarretaria a sua nulidade.
Em 1975, no Projeto de Código Civil houve a tentativa em preencher a lacuna
deixada
pelo
Código
anterior,
prevendo
a
admissibilidade
da
cláusula
compromissória nos contratos, tornando-a sem efeito caso os árbitros não
pudessem atuar por não terem as partes concordado quanto à nomeação de seus
substitutos.
Até a década de 90 não havia uma regulamentação que trata-se devidamente
do uso da arbitragem no Brasil, destacando-se, nesse sentido, as duas versões do
Código de Processo Civil (de 1939 e 1973), os quais previam a possibilidade de
submeter litigios ao juízo arbitral, com decisões autônomas, desde que dela
participasse um juiz togado, caso contrário a homologação se fazia necessária. Um
juizo arbitral que, a não ser no período posterior à Constituição Imperial, era
dependente de intervenção judicial.
22
Dentre as alterações trazidas pelo atual Código Civil está a admissão da
cláusula compromissória nos contratos para solucionar controvérsias mediante juízo
arbitral, na forma estabelecida em lei especial, vindo a enfatizar a harmonia das
normas da Lei nº 9.307/96 com as da legislação civil, bem como a não distinção
entre a cláusula e compromisso arbitral, concedendo às mesmas a força para
instaurar o juízo arbitral.
Também chamada de pactum de compromitendo ou de contrahendo; pacto
prévio, a cláusula arbitral ou contrato preliminar de arbitragem vem a ser um antiga
conhecida de nossos juristas, ao ser acolhida em nossa legislação em meados do
século XIX, não havendo, até o advento da Lei de Arbitragem a preocupação por
parte de nosso direito positivo em normatizá-la; discipliná-la. É o que nos ensina
CARLOS ALBERTO CARMONA,
“Antes da Lei 9.307/96, o legislador não teve a preocupação de disciplinar a
cláusula compromissória: o Código Cvil de 1916 era silente, o Código
Comercial a ignorava e o Código de Processo Civil dela não se ocupou”
19
CARMONA (1995, p.94)
Com o advento da Lei Federal 9.307/96, procurou-se atualizar a legislação
referente ao instituto arbitral no ordenamento, tornando-o capaz de afastar a
competência do juiz togado e viabilizando o seu uso através de duas formas: o
compromisso arbitral e a cláusula compromissória, essa última a ser abordada no
decorrer do presente trabalho, de forma a visualizá-la antes e depois do advento da
Lei de Arbitragem (Lei Federal nº 9.307/96). Trata-se de uma conquista para o direito
brasileiro na moderna ciência processual.
A regulamentação legal da arbitragem no país, passou a ser tratada como
meio de solução de conflitos relativos a direito patrimonial, facultativamente
estabelecido entre partes capazes para contratar, com muitas vantagens em relação
ao Poder Judiciário, tais como a celeridade, sigilo e especialização dos julgadores.
Nesse sentido podemos dizer que:
19
Apud,p.94
23
“As estatísticas são eloqüentes. Do número insignificante de processos
arbitrais em 96, ano de promulgação da nova lei, passou-se para cerca de
4.000 arbitragens anuais, das quais, aproximadamente 90% realizadas nos
campos trabalhistas e do direito do consumidor, e as demais em questões
20
comerciais, internacionais e doméssticas” WALD (2006)
O desenvolvimento efetivo da arbitragem se deve não apenas à lei federal nº
9.307/96, mas também ao posicionamento de nossos tribunais, em especial do
Supremo Tribunal Federal, quando reconheceu a constitucionalidade da mesma,
mais especificamente dos arts. 18 e 31,respectivamente irrecorribilidade da
sentença arbitral e efeitos de decisão judiciária da sentença arbitral.
A seguir um enfoque do instituto da arbitragem por meio da cláusula
compromissória ou arbitral antes e após o advento desta Lei Federal, vindo a
ressaltar a natureza da mesma.
20
WALD, Arnold; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Dez anos da lei de arbitragem. Revista
Jurídica Consulex, ano X, n. 234, 15 de otubro de 2006, Brasília: Editora Consulex, p. 43. Disponível
no
site:
http://www.stf.gov.br/jurisprudência/IT/frame.asp?PROCESSO-5206&CLASSE-SE%
2DAgR&cod classe=544&ORIGEM-IT&RECURSO=0&TIP JULGAMENTO-M em 13SET07. Acesso
em: 27 de agosto de 2012.
24
CAPÍTULO 2. A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA NA APLICAÇÃO DA LEI DE
ARBITRAGEM
2.1
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA: SUA NATUREZA JURÍDICA ANTES DA
LEI FEDERAL Nº 9.307/96.
Durante muitos anos a clásula compromissória foi compreendida como um
pré-contrato, pelo qual as partes signatárias se comprometiam a celebrar o
compromisso, de forma que se pudesse validamente instituir a arbitragem.
Neste sentido CARLOS ALBERTO CARMONA21cita o entendimento de Clóvis
Beviláqua, para o qual a cláusula compromissória é compreendida como um pacto
preliminar; um pactum de compromittendo, no âmbito do Protocolo de Genebra,
levando assim a doutrina e jurisprudência a admitirem a condenação da parte que a
descumprisse, ao pagamento de perdas e danos, essa, de difícil reparação. Um
verdadeiro pactum nudum.22
Outra postura adotada acerca da cláusula compromissória, sob a regência do
Código de Processo Civil de 1973, era a de negar à mesma (como simples
promessa), o efeito de impedir acesso à justiça estatal: as partes envolvidas
poderiam então pleitear seus direitos perante as cortes estatais: o chamado efeito
vinculante, uma das principais inovações trazidas pela Lei de Arbitragem, como
veremos mais adiante. Uma postura pacífica adotada pela doutrina e jurisprudência
brasileiras.
Nesse sentido se mostra oportuno o entendimento do Judiciário, o qual tem
interpretado a cláusula arbitral ou compromissória como sendo uma simples
21
22
Apud, p.100
Apud, p. 100. Nestes termos a lição de Vicente Greco Filho: “A doutrina e a jurisprudência
têm entendido que a cláusula compromissória não obriga, havendo necessidade posterior de se
firmar o compromisso, interpretação, aliás, que também desencoraja a utilização do Instituto”. (Direito
Processual Civil Brasileiro, v. 3, São Paulo, Ed. SARAIVA, 1985, p. 258. Washington de Barros
Monteiro, por sua vez, foi também peremptório ao afirmar, com apoio em antiga orientação
jurisprudencial, que a cláusula compromissória, entre nós, não teria valor vinculativo (Curso de Direito
Civil, Direito da Obrigações, v. 4, São Paulo, Ed. Saraiva, 1976, p.319).
25
promessa de constituir o juízo arbitral23, entendimento que vem a ser seguido pelo
Supremo Tribunal Federal e adotado pelo Tribunal paulista24
“ Ementa: "Arbitragem – Juízo arbitral – Cláusula Compromissória – Opção
convencionada pelas partes contratantes para dirimir possível litígio oriundo
de inadimplemento contratual – Possibilidade de que o Contratante, caso
sobrevenha litígio, recorra ao Poder Judiciário para compelir o
inadimplemento ao cumprimento do avençado que atende o disposto no art.
5°, XXXV da C.F. – Juiz estatal que, ao ser acionado para compelir a parte
recalcitrante a assinar o compromisso, não decidirá sem antes verificar se a
demanda que se concretizou estava ou não abrangida pela renúncia
declarada na cláusula compromissória – Interpretação dos artigos 4°, 6°, §
único, e 7° da Lei 9.307/96." (Sentença Estrangeira Contestada 5.847-1 –
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte – Sessão Plenária –
j.1°.12.1999 – rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 17.12.1999)”.
Vimos o posicionamento de nossa jurisprudência acerca da cláusula
compromissória antes do advento da Lei de Arbitragem. Vejamos então no plano
doutrinário, em que é oportuno ressaltar o entendimento de CARLOS ALBERTO
CARMONA25
“Era nítida no direito brasileiro anterior à Lei de Arbitragem a posição de
desvantagem que a doutrina reservava à cláusula compromissória, eis que
esta, por si só não gerava efeito negativo algum (não excluía a competência
do juiz togado) e, para gerar efeito positivo (isto é, para instaurar a
arbitragem) dependeria da celebração do compromisso (e, portanto, da
vontade do outro contratante”.
Tal posicionamento não perdurou e foi abandonado, fazendo com que a
nossa doutrina passasse a conceder os mesmos efeitos juridicos tanto à cláusula
compromissória quanto ao compromisso arbitral. A primeira deixa de ser vista como
20.“Arbitragem- Cláusula Arbitral assumida em contrato anterior ao advento da Lei 9.307/96- ato que
representa a simples promessa de constituir o juízo arbitral, sem força de impedir que as partes
pleiteiem seus direitos no juízo comum-Inteligência do art. 5º, XXXV, da CF. (AP. 083.125-4/2-3ª
Câmara-j.1º.12.1998-rel.Des.Ênio
Santarelli
Zulliani-TJSP).<Disponível
em>:
http://www.jus.com.br/revista/texto/3090/distincao/entre-clausula-compromissoria-e-compromissoarbitral.Acesso em: 27.08.2012.
21.Disponível em: http:// www.jus.com.br/revista/texto/3090/distincao/entre-causula-compromissoria-e-
compromisso-arbitral. Acesso em: 27.08.2012
25
ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À LEI Nº 9.307/96, 3ª Ed., São Paulo,
2009, p. 101.
26
um compromisso e passa a ser vista como um negóco jurídico processual, e a
vontade manifestada pelas partes vem a produzir efeitos desde logo (negativos e
positivos), pois com a cláusula atribui-se jurisdição aos árbitros. Nesse sentido
temos o entendimento proferido por FRANCISCO GONÇALVES NETO, que em
artigo publicado na internet compreende que “ A cláusula arbitral tem natureza
juridica de negócio jurídico processual, visto que a vontade das partes, ao eleger a
via privada, nega a estatal para a solução de litígios 26 “ No Brasil nunca atingiu o
mesmo destaque alcançado nos países europeus e EUA, face à exigência legal
vigente na época, de que o laudo arbitral doméstico fosse homologado pelo
Judiciário, antes de se tornar exequível; da obrigatoriedade de que o laudo arbitral
proferido no exterior fosse homologado pela justiça estrangeira, antes de ser
submetido ao STF; da falta de execução específica atribuída à cláusula
compromissória, que representava uma simples obrigação de fazer. O quadro
mudou após o advento da Lei Federal nº 9.307/96 e a diferença entre as duas
convenções arbitrais foi diminuindo; perdendo o interesse. Indistintamente passaram
a ser tidas como acordos, por meio dos quais se renuncia à solução estatal de
litigios, em prol da atuação do juiz escolhido pelos litigantes.
Como veremos, a seguir, quando abordarmos o tratamento legal dispensado
à clausula compromissória, os impecilhos que se apresentavam em relação ao
instituto da arbitragem se afastaram.
2.2
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA APÓS O ADVENTO DA LEI FEDERAL
Nº 9.307/96
Com a edição da Lei Federal 9.307/96 modificou-se por completo a
regulamentação legal da arbitragem, até então existente no Brasil, tendo como um
dos pontos principais a consagração do princípio da autonomia da vontade.
Em conformidade com o art. 1º da lei supracitada as partes capazes de
contratar poderão valer-se do instituto da arbitragem para dirimir conflitos relativos a
26
Arbitragem
e
Jurisdição
Estatal.
Disponível
http://www.santosarbitral.com.br/artigosver.asp?id=37.Acesso em:23.07.2012
em
27
direitos patrimoniais disponíves, mostrando-se como uma faculdade colocada à
disposição das partes para a composição de conflitos, sem ser algo imposto pela
Lei.
Mas outros pontos merecem abordagem, na presente oportunidade, tais como
o laudo arbitral brasieiro (decisão do árbitro), o qual passou a ser considerado título
executivo judicial, equiparando-se à uma sentença; o afastamento da exigência de
homologação judicial estrangeira, podendo assim, o laudo prolatado no exterior
submeter-se diretamente ao STF; a cláusula compromissória tornou-se autônoma e
passível de execução específica, conduzindo à instauração da arbitragem mesmo
contra a vontade de uma das partes; a sua inserção nos contratos passou a ter força
obrigatória entre as partes.
Frente a tantas inovações temia-se a reação do nosso Judiciário, o que veio a
acontecer, ainda em 1996, diante de uma pretensa inconstitucionalidade da Lei de
Arbitragem, ou seja, por compreender que tal legislação ofendia a Carta Magna.
E o resultado de tudo isso foi uma decisão por parte do pleno do Supremo
Tribunal federal, em 2001, pela constitucionalidade da mesma, não prosperando os
argumentos acerca da inconstitucionalidade da Lei de Arbitragem, até porque a
própria Constituição Federal faz previsão sobre o instituto da arbitragem, ao tratar da
mesma em seus arts.114, §§ 1o e 2o 12, § 2o, (do ato das disposições transitórias),
respectivamente, da prescrição ao uso da arbitragem na questão de dissídio coletivo
e ao antevêr o uso da arbitragem na demarcação das linha divisórias entre Estados
e Municípios.
Sob a vigência desta legislação federal as partes poderão solucionar seus
conflitos vindo a submeter-se ao juízo arbitral, mediante convenção de arbitragem, 27
concretizando por meio da cláusula compromissória e do compromisso arbitral,
tratadas, essas, sob a nomenclatura “da convenção de arbitragem e seus efeitos”,
no capítulo II da mesma.
A definição de cláusula compromissória viria logo em seguida, no art. 4º da
mesma legislação, como “(…) a convenção através da qual as partes em um
contrato comprometem-se a submeter à arbitragemos litigios que possam vir a
27
“(...) assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral”.Art. 3º, Lei nº
9.307/96).
28
surgir, relativamente a tal contrato”.
Jurisprudências sobre a cláusula compromissória, sob a proteção desta nova
legislação federal são ainda escassas. O tema é recente e no Brasil não possuimos
qualquer tradição de arbitragem interna, tal como a Inglaterra e Estados Unidos,
sendo parcos os entendimentos de nosso tribunais, os quais, claramente, tem
afastado automaticamente o envio da lide ao Judiciário, uma vez convencionada
pelas partes a via arbitral. Um entendimento louvável pois caso as partes pudessem
escolher a via judiciária para composição do litígio, a convenção de abitragem não
teria valia alguma.
No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal julgou por
unanimidade no agravo de instrumento nº 19990020016095AGI DF, registro do
acórdão nº 121025 de 25/10/1999, da 1ª turma cível, cuja relatora foi a
desembargadora Vera Andrighi.
Ementa técnica: JUÍZO ARBITRAL - CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA HAVENDO CONVENÇÃO DAS PARTES PARA SOLUÇÃO DOS
EVENTUAIS CONFLITOS ATRAVÉS DE ARBITRAGEM, E EM SENDO AS
MESMAS CAPAZES E O DIREITO DISPONÍVEL, EXCLUI-SE A
PARTICIPAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA SOLUÇÃO DE QUALQUER
CONTROVÉRSIA. RECURSO PROVIDO.
A principal característica da nova lei reside na importância que ela confere à
vontade
das
partes,
como
já
mencionamos
ao
abordarmos
a
cláusula
compromissória sob a ótica da Lei de Arbitragem. Uma vontade soberana, desde a
decisão de submeter o litígio ao juízo arbitral – seja na cláusula arbitral, seja no
compromisso arbitral - como na eleição do árbitro – escolhido livremente por elas -, e
mesmo na determinação do critério a ser utilizado pelo árbitro na decisão do conflito.
O elemento volitivo como determinante na formação de acordos e na previsão de
seus efeitos e o ressurgimento da teoria da autonomia da vontade.
Como elemento inovador que a presente lei de arbitragem trouxe à cláusula
compromissória temo a plena autonomia concedida à mesma como podemos
constatar no art. 8º da Lei de Arbitragem: “A cláusula compromissória é autônoma
em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não
implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória”.
29
No entanto, para PHILIPPE FOUCHARD E CARREIRA ALVIM, não significa
que deva ser objeto de uma aceitação distinta da já manifestada no contrato
principal, devendo-se compreender que a validade da convenção de arbitragem não
está condicionada a uma aceitação diferente.28
Com esta nova lei resurge uma teoria da autonomia da vontade para a qual o
elemento volitivo é determinante na formação de acordos na previsão de seus
efeitos. O império da vontade no âmbito da justiça.
Já afirmava Platão que o tribunal escolhido e criado de comum acordo pelas
próprias partes é o mais legítimo dos tribunais. Conjugando-se essa idéia com a
lição de Hugo de Brito Machado temos que a arbitragem "é para os que sabem e
podem ser livres", tem-se que a consolidação do instituto arbitral demonstra a
evolução e amadurecimento dos agentes econômicos. através dessa legislação
federal, passou a ter autonomia.29
Como princípio da cláusula compromissória a autonomia encontra-se
assimilada de forma universal nos planos doutrinário, jurisprudencial e por alguns
ordenamentos jurídicos, vindo a ser admitido em países cuja legislação arbitral não o
contempla, de forma expressa, como elemento importante no pleno funcionamento,
fonte da boa-fé (um elemento ético presente na arbitragem e que abordaremos a
seguir) bem como da autonomia da vontade dos convenentes.
28
Cf. Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem, Pedro A. Batista Martins, Selma M. Ferreira
Lemes e Carlos Alberto disponivel no site:< www.arcos.org.br>:Autonomia da cláusula
compromissória Pedro A. Batista Martins - Professor e CoorDenador de Pós-Graduação e Arbitragem
da Fundação Getúlio Vargas (Rio de Janeiro e São Paulo). Acesso em 23 de agosto de 2012
29
Art. 8º da Lei nº 9.307/96. A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em
que estiver incerta, de tal sorfte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da
cláusula compromissória. “E é natural que assim seja, até porque a nulidade (ou a anulabilidade) do
contrato poderá ser submetida à decisão dos árbitros, tudo a pressupor a separação da cláusula do
restante do contrato. Por conseqüência, se um contrato nulo ( por não ter seguido a forma prevista
em lei, ou porque seu objeto seja ilícito) afetasse a cláusula compromissória nele encaixada, os
árbitros nunca teriam competência para decidir sobre questões ligadas exatamente à nulidade do
contrato.Seria então muito fácil afastar a competência dos árbitros, pois bastaria que qualquer das
partes alegasse matéria ligada à nulidade do contrato para que surgisse a necessidade de
intervenção do juiz togado”. (CARMONA, Carlos Alberto. ARBITRAGEM E PROCESSO. Um
comentário à Lei nº9.307/96. São Paulo: Ed. Atlas S.A.-2009, p.173.).
30
CAPÍTULO 3. A BOA FÉ: UM ELEMENTO ÉTICO NA ARBITRAGEM
Para o ilustre jurista pátrio Cretella Neto ética vem a ser:
“…o estudo dos juízos de apreciação que se referem à conduta humana
suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal em
determinada sociedade. É, portanto, a ciência do comportamento moral dos
homens em sociedade”.
A chamada ética pública, compreendida como “ aquela que tende a congregar a
moralidade ao Direito de caráter prático, partindo do conceito de liberdade social,
complementada pelos valores de igualdade, solidariedade e segurança, e que tem
por objetivo atingir o ideal de Direito eqüitativo”.30
Um elemento ético que deve se fazer presente também na conduta do
advogado, tanto em atuação pública quanto em seu ministério privado. É a chamada
ética profissional, compreendida como sendo o conjunto de princípios que regem o
procedimento funcional de determinado ofício.31
A escolha pela arbitragem como solução para os confltos que se apresentam,
abrindo-se mão da via judiciária para tal, e, portanto, da figura do juiz, entrando em
cena a figura do árbitro, vem a se configurar na escolha mais sensata e ética dentre
as alternativas existentes para a realização do justo; do correto, subtraídas ao
Judiciário. É acolher a “solução arbitada por um técnico desprovida da cultura de
procedimento soberano do estado. Ainda que o árbitro seja o solucionador mais
chegado à figura característica do juiz”.32 É o que se pode constatar em monografia
apresentada por DENILSON RODRIGUES DOS SANTOS, quando cita, em seu trabalho
científico, Nalini (apud GUILHERME, 2006, p.248-249)33
30
SANTOS, Denílson Rodriques dos. O PRINCÍPIO DA BOA FÉ COMO FATOR DECISIVO
PARA
O
SUCESSO
DA
ARBITRAGEM.
Monografia
disponível
em:https://sites.google.com/site/arbitragemdenilson, Acesso em 26.04.2013
31
apud, SANTOS, p.16.
32
apud, SANTOS, p. 17.
33
apud, SANTOS, p.17.
31
A adoção de parâmetros éticos bem definidos é uma das formas de se conferir uma
credibilidade inaquebrantável à solução arbitral. Não se desconhece que a
alternativa pode sofrer descrédito por se afastar da via considerada normal e
apropriada. Bem por isso, aqueles que se dedicam a essa modalidade de resolução
de problemas hão de se esmerar para que não pairem dúvidas sobre sua
honestidade.(grifo nosso)
Sendo assim é necessário que a figura do árbitro leve em consideração o
elemento ético, na acepção em que o mesmo se apresenta no presente trabalho. De
tal modo que, assim como a do juiz, seja uma pessoa incorruptível; uma pessoa
transparente.
A adoção de uma ética irretocável vem a ser obrigação de todo o jurista
adepto das formas alternativas de solução de litigios, de forma a assegurar que toda
a decisão individual ou geral decorra de um mesmo procedimento democrático e que
siga em direção a valores como igualdade, liberdade, solidariedade; uma segurança
e confiabilidade jurídicas às partes envolvidas e que estão em busca de um mesmo
objetivo: a solução para as suas controvérsias, de cujo desempenho dependerá não
apenas o futuro da arbitragem mas das demais formas alternativas de resolução do
justo e da preservação do direito como instrumento de harmonização entre as
pessoas.
Uma regra de conduta qualificadora de uma norma de comportamento leal,
ético, que se impõe às partes, sempre em conformidade com os padrões
estabelecidos pela boa-fé. A boa-fé delineada em nosso ordenamento jurídico, em
suas duas acepções: a subjetiva (estado psicológico) e a objetiva (princípio). A boafé que será objeto de análise, a seguir, sob a ótica do Código Civil bem como do
Estatuto da OAB.
Um dos princípios mais importantes do Direito Privado, especialmente no
Direito Contratual, veio a consagrar-se no ordenamento jurídico brasileiro através de
sua positivação no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) bem como no
Código Civil de 2002 (Lei 10.406/02), esse objeto de análise e discussão no tópico a
seguir, quando se abordará a boa-fé no direito pátrio sob a visão da legislação civil e
Estatuto da OAB.
32
3.1
A BOA FÉ NO DIREITO BRASILEIRO SOB A ÓTICA DO CÓDIGO CIVIL
BRASILEIRO E DO ESTATUTO DA OAB
Em sua acepção objetiva e, sob a influência da doutrina e jurisprudência
germânicas (principalmente), a boa-fé passou a ser inserida nos ordenamentos
jurídicos contemporâneos, por meio do sistema aberto das cláusulas gerais ou
abertas, cuja inserção no Código Civil pátrio busca evitar que a legislação codificada
venha a se tornar obsoleta e, conseqüentemente, passe a exigir mudanças
sucessivas.
Introduzida expressamente no Código Civil pátrio como um dos princípios
norteadores de todas as relações obrigacionais e relevante para a leitura dos
negócios jurídicos:
(…) A regra de boa-fé objetiva configura-se como cláusula geral e,
portanto, corresponde a uma técnica legislative que busca garantir a relação
entre o direito e a realidade social, possibilitando a existência de um sistema
jurídico aberto com constantes adaptações das normas legais às exigências
do mundo das relações e da alteração dos seus valores com o tempo.
Assim, a cláusula geral fornece um ponto de paritda para se alcançar
34
resultados justos e adequados .
Em entendimento proferido pelo ilustre e renomado jurista Miguel Reale, a
construção do Código Civil de 2002 se deu sob a proteção de três princípios: a
eticidade, a socialidade e a operabilidade. Ao discorrer sobre a eticidade, o ilutre
jurista esclarece que freqüente vem a ser “a referência à probidade e à boa-fé, assim
como à correção (corretezza)”, ao contrário do que ocorria com o Codigo anterior,
“demasiado parcimonioso nessa material, como se tudo pudesse ser regido por
determinaçõe de caráter estritamente jurídicas”.35
Para José Augusto Delgado36, “a ética adotada pelo Código Civil de 2002 tem
34
apud. SANTOS, p. 20.
35
REALE, Miguel. Estrutura e espírito do novo Código Civil brasileiro. In: História do novo
Código Civil. São Paulo: RT, 2005. Disponível em:http//www.rkladvocacia.com, p. 16.Acesso
em:28.abril.2013
36
A ética e a boa-fé no novo Código Civil. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueiredo
(Coords). Questões controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Método, 2003.v.1.p.174.
Disponível em:http://www.rkladvocacia.com, p.16. Acesso em: 29.abril.2013
33
por finalidade fazer com que as pessoas, em seus relacionamentos, valorizem, ao
máximo, o culto do aperfeiçoamento de sua convivência social.
Um princípio que deve ser verificado antes, durante e depois da extinção
contratual, como vem a confirmar o Código Civil em seus artigos 113 e 422, ao
determinar que:
Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e
os usos do lugar de sua celebração
Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim, na conclusão do
contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
Como já se mencionou anteriormente, a boa-fé mencionada pelo art. 422 do
supracitado diploma legal vem a corresponder à sua modalidade objetiva, ou seja,
em conformidade com um modelo de comportamento objetivo, construída como uma
regra de conduta, correlacionando-se com a honestidade, a retidão, a lealdade e o
respeito ao interesse da contraparte, no caso concreto. Esse vem a ser o
entendimento adotado por Haroldo Duclerc Verçosa.37
Com a positivação do princípio da boa-fé na legislação civil pátria, todas as
relações
contratuais
passaram
a
ser
afetadas,
igualmente
a
cláusula
compromissória, dada a natureza contratual da mesma como se pôde analisar e
discutir no curso do presente trabalho ao se tratar da natureza da cláusula
compromissória antes e após o advento da Lei Federal 9.307/96. É o que se infere
do ensinamento doutrinário de Saddi (apud. GUILHERME, 2006,p.63)38:
37
A
arbitragem,
a
probidade
e
a
boa-fé
objetiva.
em:http://www.blogdireitoempresarial.com.br/2011/03/arbitragem-probidade-e-boa-feobjetiva.html.,p.1. Acesso em: 29.abril.2013
38
apud. SANTOS, p.20.
Disponível
34
A determinação da matéria pelo juízo arbitral faz-se de duas maneiras:a)
mediante cláusula compromissória ou b) por meio de específico contrato de
compromisso (arts.851 e 853 do Código Civil). Independentemente da
forma pelo qual é estabelecida, no que tange os princípios a ela inerentes, a
arbitragem caracteriza-se por sua natureza contratual.GUILHERME (2006,
P.63)
Diante de tal posicionamento a autonomia do acordo vem a imputar à
arbitragem a condição de “juízo” competente para dirimir determinado conflito. E a
natureza contratual da arbitragem vem condicioná-la no sentido de vir a ser
administrada não apenas pela Lei 9.307/96 como também pelo Código Civil e pelos
princípios da Teoria Geral dos Contratos.
Em artigo publicado por José Emílio Nunes Pinto39, o mesmo traz à tona um
posicionamento legal no qual se vê afirmado que
39
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA À LUZ DO CÓDIGO CIVIL.Jus navigandi,Teresina, ano
9,n.518,7,dez 2004. Disponível em: http://www.jus.com.br/revista/texto/6025>. Acesso em: 20.
mar.2013.
35
“(…) em função da aplicação do princípio da boa fé, a posição das partes
numa relação contratual se modificou de forma substancial. Em razão dos
deveres laterais da boa fé objetiva a que as partes estão vinculadas, em
especial o de colaboração e o de informação, dificilmente se poderá falar
em partes em oposição, mas sim de partes em colaboração mutual.Isso
decorre, sobretudo, de outra alteração substancial do Código Civil, onde se
prestigia e prioriza o adimplemento das obrigações assumidas, punindo-se
severamente o inadimplemento. Dessa maneira, a relação obrigacional
passa a ter como polo o adimplemento, que atrai para si a colaboração
mútua entre as partes”. NUNES PINTO (2004)
Um posicionamento legal que se encontra influenciado pelo princípio da
função social do contrato e que, portanto, vem limitar a liberdade contratual das
partes.
Por buscarem uma identidade de propósito na celebração da cláusula
compromissória, as partes envolvidas encontram-se em situação de colaboração e
não de oposição; elas buscam criar um mecanismo que venha a ser aplicável na
solução de suas controvérsias, se e quando essas vierem a surgir. E, assim, do
ponto de vista da conclusão da cláusula compromissória, estariam então alinhadas
com o princípio da boa fé.
Com o crescimento das formas alternativas de resolução de controvérsias, no
Brasil, aumentam também as preocupações com questões relacionadas ao que é
certo ou errado no uso de tais formas.
Uma preocupação que vem a ser demonstrada pela advogada Jeanlise
Velloso Couto40 em artigo publicado pela mesma, quando diz que “O respeito aos
princípios éticos trazem a confiança na arbitragem e a segurança de que as partes
terão seus direitos preservados e a decisão arbitral cumprida sem risco de nulidade”.
A preocupação ética abrange não apenas as partes e a figura do árbitro mas
também o papel do advogado, que vem representar as partes no procedimento
arbitral. Uma atitude que deve revestir-se de responsabilidade e cooperação.
40
Arbitragem e Ética.: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n. 83, dez
2010.Disponívelem:http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&ar
tigo_id=8655. Acesso em: 28.abril.2013
36
De acordo com Alessandra Gomes do Nascimento Silva41, o advogado
precisa, a todo o momento, negociar, seja com seu cliente, colegas de escritório ou
empresa, advogados da parte contrária ou funcionários públicos. Trata-se de uma
nova realidade que está sendo pouco estudada nas faculdades de direito.
Uma postura que se distancia do que determina o Código de Ética e
Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu art. 2º, parágrafo único, VI,
quando determina que é dever do advogado “estimular a conciliação entre os
litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios”.
Seja através da arbitragem, da conciliação ou da mediação, cabe aos
profissionais do direito e, principalmente, ao advogado, utilizar as técnicas de
negociação, a fim de contribuir para o bom relacionamento entre as partes, para a
conseqüente solução dos conflitos ou o não surgimento do litígio em juízo 42
Um papel que, na atualidade, vai muito além de ensejar uma ação junto aos
poderes competentes, de defender o cliente em juízo, passa pela busca de soluções
cada vez mais rápidas para os conflitos, o que implica, necessariamente, a tentativa
de se evitar que esses conflitos sigam para serem julgados. É o entendimento de
Arnold Wald (citado em artigo jurídico publicado pela advogada Fernanda Holanda
de Vasconcelos Brandão)43, para o qual: “O papel do advogado ganha importância
enquanto negociador, conciliador, que busca soluções rápidas e tenta evitar conflitos
que sigam para o Judiciário”.
Sob a ótica do Estatuto da OAB a boa-fé vem a ser disciplinada no Capítulo
VIII do mencionado diploma legal, ao tratar da ética do advogado em seus ars. 31,
§§ 1º e 2º, 32 e 33, § único.
Ou seja, proceder de forma a torná-lo merecedor de respeito e que contribua
para o prestígio da classe e da advocacia, sempre mantendo a independência, em
41
BRANDÃO, Fernanda Holanda de Vasconcelos. A advocacia como atividade e o papel do
advogado como negociador. SILVA, Alessandra Gomes do Nascimento. Técnicas de Negociação
para Advogados. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 2. Disponível em: http://www.âmbitojuridico.com.br,
p.1. Acesso em: 28.abril.2013.
42
43
BRANDÃO, Fernanda Holanda de Vasconcelos.
A advocacia como atividade e o papel do advogado como negociador.Disponível em:
http://www.âmbitojurídico.com.br.Acesso em: 28.abril.2013.
37
qualquer circunstância, no exercício de sua profissão, vindo a ser responsabilizado
pelos atos que vier a praticar, com dolo ou culpa. Além de ser obrigado a cumprir
com os deveres consignados no Código de Ética e Dsiciplina.
Uma norma de conduta pautada pela ética na condução e desempenho suas
funções enquanto profissional do direito, na defesa dos interesses de um terceiro,
mas que também são exigidas quando o mesmo vem a participar do procedimento
de arbitragem.
Não se pode falar em arbitragem sem levar em consideração a importância do
advogado. Sua conduta ética vem a impor rigidez e transparência, obedecendo-se
as normas previstas em seu código profissional e, pelas carcterísticas do instituto em
tela. É fazer desta profissão um instrumento de segurança e celeridade na busca e
obtenção da solução das controvérsias (litígios), sejam resolvidos pelo juiz togado
ou árbitro, na estrita observância de todas as regras e preceito.
Dada a incidência da eticidade e da boa-fé, o ábitro deve ser independente,
imparcial, competente e diligente; agir com lealdade e discrição. Uma atuação
guiada, conforme dispõe o art. 17 da Lei de Arbitragem.44 É o que passaremos a
discutir e analisar, logo a seguir.
44
“Art. 17. Os árbitros, quando no exercício de suas funções ou em razão delas, ficam
equiparados aos funcionários públicos, para os efeitos da legislação penal”.
38
3.2
A BOA-FÉ APLICADA AO INSTITUTO DA ARBITRAGEM
Em artigo apresentado pela advogada Regina Célia Martinez, ao falar sobre a
Ética como pilar de sustentabilidade na Arbitragem45 a mesma vem destacar o
desempenho da função do árbitro, regulada pelo art.13, § 6º da Lei de Arbitragem,
nos seguintes termos: " No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder
com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição." Uma boafé objetiva mais acentuada pela relação de confiança direta existente em relação aos
árbitros.
E continua:
“A imparcialidade leva o árbitro a suprema conduta objetivando a justiça.
Através da imparcialidade temos a concretização do "dar a cada um o que é
seu", como primado de retidão e valor.
A independência proporciona ao árbitro a liberdade de qualquer laço e
compromisso, sendo este o senhor de suas próprias decisões.
A competência por sua vez, agrega conhecimento, capacidade, habilidade,
aptidão e idoneidade, tendo assim, o árbitro a faculdade de apreciar e julgar
certos pleitos ou questões a ele confiados. Logo, se o árbitro não possuir os
atributos mencionados deverá abdicar do mister em prol da proteção do
instituto.
O cuidado ativo, zelo e aplicação definem a diligência que o árbitro
efetivamente deve ter na condução do procedimento arbitral até a sentença
arbitral.
A discrição por sua vez, se caracteriza pela conduta que o árbitro deve ter
pautada no discernimento, sensatez, prudência, reserva, circunspeção,
modéstia, recato, decência ou seja, na qualidade ou caráter de discreto, não
devendo portanto, em hipótese alguma, comentar ou divulgar suas
atuações”.
E chega à conclusão de que a conduta ética do árbitro envolve não apenas
conhecimento e definição dos pilares da arbitragem na condução para uma attitude
exemplar. A atuação da sensibilidade em cada caso, levando assim o árbitro a
pensar, acompanhar, estudar, analisar e optar pela melhor conduta face o caso
concreto.
O sucesso da arbitragem depende do árbitro ou árbitros, a quem se confia a
solução da controvérsia. Ele vem a ser o centro de todo o procedimento e, o seu
45
Disponívelem:http://www.cartaforense.com.br/conteúdo/artigos/ética-como-pilar-desustentabilidade-da-arbitragem/3650, p.1. Acesso em: 29.abril.2013
39
desempenho, vem determinar o resultado desta solução. Diante de tão relevante
papel surgem questões quanto à conduta do árbitro.
Na medida em que compreendemos a conduta como fator primordial para o
sucesso de qualquer arbitragem, não podemos deixar de abordar a importância da
ética no procedimento arbitral, em prol da melhor compreensão deste intituto.
A Lei de Arbitragem foi cuidadosa ao estabelecer regras aplicáveis à
nomeação e desempenho dos árbitros, a Lei de Arbitragem foi cuidadosa. É o que
vem a afirmar o advogado José Emílio Nunes Pinto46 quando trata da questão,
citando o Capítulo III da Lei nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem), no qual encontram-se
fornecidas as diretrizes de conduta e comportamento, essenciais para a validade da
arbitragem.
Uma conduta que, no caso de violação das regras e mandamentos legais
podem conduzir à nulidade da sentença arbitral, resultado esse não desejado, seja
do ponto de vista econômico, seja da confiabilidade e perenidade do instituto e que
implica na necessidade em se analisar de forma cuidadosa os princípios
informadores dos dispositivos legais que se aplicam à esta questão.
O que se busca, portanto, na presente oportunidade, é destacar o papel da
ética na arbitragem, compreendendo melhor o papel que a mesma vem a
desempenhar, de forma a melhor compreendermos a segurança do procedimento
arbitral. Quanto mais pudermos comprovar a correção da conduta ética dos árbitros,
maior e mais célere será o desenvolvimento deste instituto no Brasil.
Uma atuação em prol da justiça e da eqüidade.
Encerrando a análise e discussão do presente tópico, fica constatado que a
boa-fé incide nas relações arbitrais, devendo, no entanto, ser ponderada scom
outras premissas, num sistema habitado de princípios e valores fundamenais. É que
vem a afirmar, ao final de seu artigo, José Emílio Nunes Pinto, já citado
anteriormente, chegando à concusão de que:
“ A arbitragem tornou-se um dos meios mais eficientes dentro da tendência
de desjudicialização dos conflitos, realidade da pós-modernidade. Nesse
contexto a arbitragem deve ser encarada como forma de jurisdição, como
quer Carlos Alberto Carmona” PINTO (2006)
46
A
IMPORTÂNCIA DA ÉTICA NA ARBITRAGEM. Disponível em: http://www.
camarb.com.br/subáreas_conteudo.aspx?subareano=13, p.1-2. Acesso em: 29.abril.2013
40
Em continua, agora em relação à eticidade, ao afirmar que
“A eticidade, um dos baluartes da atual codificação privada, valorizou
sobremaneira a boa-fé objetiva, aquela que existe no plano da conduta de
lealdade das partes. A boa-fé objetiva, com suas três
funçõesinterpretação, controle e integração-, não só pode como deve ser apicada
ao contrato de comprimisso e à arbitragem. Como decorrência dessa
conclusão, a máxima que veda o comportamento contraditório- venire
contra factum prorium non potest- incide nas questões relativas ao juízo
arbitral. A confiança deve guiar as relações entre as partes e os árbitros”.É
o que se infere do ensinamento doutrinário de Saddi (apud.
GUILHERME, 2006,p.63)47
A determinação da matéria pelo juízo arbitral faz-se de duas maneiras:a) mediante
cláusula compromissória ou b) por meio de específico contrato de compromisso
(arts.851 e 853 do Código Civil). Independentemente da forma pelo qual é
estabelecida, no que tange os princípios a ela inerentes, a arbitragem caracteriza-se
por sua natureza contratual.
Diante de tal posicionamento a autonomia do acordo vem a imputar à arbitragem a
condição de “juízo” competente para dirimir determinado conflito. E a natureza
contratual da arbitragem vem condicioná-la no sentido de vir a ser administrada não
apenas pela Lei 9.307/96 como também pelo Código Civil e pelos princípios da
Teoria Geral dos Contratos. Em artigo publicado por José Emílio Nunes Pinto 48, o
mesmo traz à tona um posicionamento legal no qual se vê afirmado que:
“(…) em função da aplicação do princípio da boa fé, a posição das partes
numa relação contratual se modificou de forma substancial. Em razão dos
deveres laterais da boa fé objetiva a que as partes estão vinculadas, em
especial o de colaboração e o de informação, dificilmente se poderá falar
em partes em oposição, mas sim de partes em colaboração mutual.Isso
decorre, sobretudo, de outra alteração substancial do Código Civil, onde se
prestigia e prioriza o adimplemento das obrigações assumidas, punindo-se
severamente o inadimplemento. Dessa maneira, a relação obrigacional
passa a ter como polo o adimplemento, que atrai para si a colaboração
mútua entre as partes”. NUNES PINTO (2004)
47
48
apud. SANTOS, p.20.
A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA À LUZ DO CÓDIGO CIVIL.Jus navigandi,Teresina, ano
9,n.518,7,dez 2004. Disponível em: http://www.jus.com.br/revista/texto/6025>. Acesso em: 20
mar.2013.
41
Um posicionamento legal que se encontra influenciado pelo princípio da função
social do contrato e que, portanto, vem limitar a liberdade contratual das partes.Por
buscarem uma identidade de propósito na celebração da cláusula compromissória,
as partes envolvidas encontram-se em situação de colaboração e não de oposição;
elas buscam criar um mecanismo que venha a ser aplicável na solução de suas
controvérsias, se e quando essas vierem a surgir. E, assim, do ponto de vista da
conclusão da cláusula compromissória, estariam então alinhadas com o princípio da
boa fé.
Com o crescimento das formas alternativas de resolução de controvérsias, no
Brasil, aumentam também as preocupações com questões relacionadas ao que é
certo ou errado no uso de tais formas.
Uma preocupação que vem a ser demonstrada pela advogada Jeanlise
Velloso Couto49 em artigo publicado pela mesma, quando diz que “O respeito aos
princípios éticos trazem a confiança na arbitragem e a segurança de que as partes
terão seus direitos preservados e a decisão arbitral cumprida sem risco de nulidade”.
A preocupação ética abrange não apenas as partes e a figura do árbitro mas
também o papel do advogado, que vem representar as partes no procedimento
arbitral. Uma atitude que deve revestir-se de responsabilidade e cooperação.
De acordo com Alessandra Gomes do Nascimento Silva50, o advogado
precisa, a todo o momento, negociar, seja com seu cliente, colegas de escritório ou
empresa, advogados da parte contrária ou funcionários públicos. Trata-se de uma
nova realidade que está sendo pouco estudada nas faculdades de direito.
Uma postura que se distancia do que determina o Código de Ética e
Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu art. 2º, parágrafo único, VI,
quando determina que é dever do advogado “estimular a conciliação entre os
49
Arbitragem
e
Ética.:
Âmbito
Jurídico,
Rio
Grande,
XIII,
n.
83,
dez
2010.Disponívelem:http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&ar
tigo_id=8655. Acesso em: 28.04.2013
50
BRANDÃO, Fernanda Holanda de Vasconcelos. A advocacia como atividade e o papel do
advogado como negociador. SILVA, Alessandra Gomes do Nascimento. Técnicas de Negociação
para Advogados. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 2. Disponível em: http://www.âmbitojuridico.com.br,
p.1. Acesso em: 28.abril.2013.
42
litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios”.
Seja através da arbitragem, da conciliação ou da mediação, cabe aos
profissionais do direito e, principalmente, ao advogado, utilizar as técnicas de
negociação, a fim de contribuir para o bom relacionamento entre as partes, para a
conseqüente solução dos conflitos ou o não surgimento do litígio em juízo 51
Um
papel que, na atualidade, vai muito além de ensejar uma ação junto aos
poderes competentes, de defender o cliente em juízo, passa pela busca de soluções
cada vez mais rápidas para os conflitos, o que implica, necessariamente, a tentativa
de se evitar que esses conflitos sigam para serem julgados. É o entendimento de
Arnold Wald (citado em artigo jurídico publicado pela advogada Fernanda Holanda
de Vasconcelos Brandão)52, para o qual: “O papel do advogado ganha importância
enquanto negociador, conciliador, que busca soluções rápidas e tenta evitar conflitos
que sigam para o Judiciário”.
Sob a ótica do Estatuto da OAB a boa-fé vem a ser disciplinada no Capítulo
VIII do mencionado diploma legal, ao tratar da ética do advogado em seus ars. 31,
§§ 1º e 2º, 32 e 33, § único.
Ou seja, proceder de forma a torná-lo merecedor de respeito e que contribua
para o prestígio da classe e da advocacia, sempre mantendo a independência, em
qualquer circunstância, no exercício de sua profissão, vindo a ser responsabilizado
pelos atos que vier a praticar, com dolo ou culpa. Além de ser obrigado a cumprir
com os deveres consignados no Código de Ética e Dsiciplina.
Uma norma de conduta pautada pela ética na condução e desempenho suas
funções enquanto profissional do direito, na defesa dos interesses de um terceiro,
mas que também são exigidas quando o mesmo vem a participar do procedimento
de arbitragem.
51
52
BRANDÃO, Fernanda Holanda de Vasconcelos.
A advocacia como atividade e o papel do advogado como negociador.Disponível em:
http://www.âmbitojurídico.com.br.Acesso em: 28.abril.2013.
43
Não se pode falar em arbitragem sem levar em consideração a importância do
advogado. Sua conduta ética vem a impor rigidez e transparência, obedecendo-se
as normas previstas em seu código profissional e, pelas carcterísticas do instituto em
tela. É fazer desta profissão um instrumento de segurança e celeridade na busca e
obtenção da solução das controvérsias (litígios), sejam resolvidos pelo juiz togado
ou árbitro, na estrita observância de todas as regras e preceito.
Dada a incidência da eticidade e da boa-fé, o ábitro deve ser independente,
imparcial, competente e diligente; agir com lealdade e discrição. Uma atuação
guiada, conforme dispõe o art. 17 da Lei de Arbitragem.53 É o que passaremos a
discutir e analisar, logo a seguir.
53
“Art. 17. Os árbitros, quando no exercício de suas funções ou em razão delas, ficam
equiparados aos funcionários públicos, para os efeitos da legislação penal”.
44
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Poder resolver um conflito sem ter de arcar com os altos custos judiciais, bem
como fugir do longo e cansativo trâmite forense, e obter um resultado satisfatório, é,
com certeza, o maior desejo daqueles que obrigatoriamente necessitam da proteção
do Poder Judiciário.
A busca de um caminho que venha a resolver os conflitos (envolvendo
sempre direitos disponíveis) mas de forma célere e com baixos custos judiciais. Um
método alternativo de solução para as controvérsias que surgem em nosso dia a dia
e que, por vezes são adiadas; proteladas; face ao grande número de processos que
se acumulam e tramitam nas varas e tribunais de nosso País (somando-se a isso, é
claro, as elevadas custas para fazer o processo andar que, muitas vezes, são
desproporcionais aos benefícios obtidos).
Com a nova Lei de Arbitragem um avanço expressivo na pacificação dos
conflitos surgidos e com ele a possibilidade de buscar a solução para os nosso
problemas, abrindo-se mão da via judiciária, sem que venha a significar, com isso,
lutar pelo fim do monopólio estatal acerca do Poder Jurisdicional, através de suas
duas formas: a cláusula compromissória e o compromisso arbitral, destancando o
papel e a importância da cláusula compromissória no procedimento arbitral e o
tratamento normativo dispensado à mesma antes e após o advento desta legislação.
Atrelado a tudo isso uma preocupação com o elemento ético na Arbitragem, A
o qual deve estar presente no procedimento arbitral em toda a sua extensão.(como
pudemos analisar no presente trabalho). Um elemento que se encontra presente, de
forma clara num dos mais consagrados princípios de nosso direito: o Princípio da
Boa-Fé.
Decorrente da conduta requerida e almejada em todas as relações
recíprocas, vem a regrar o comportamento não apenas das partes envolvidas no
procedimento arbitral como do advogado e árbitro, como bem pudemos constatar na
presente explanação, quando da análise da Boa-Fé na arbitragem, sob a ótica do
Código Civil de 2002 e do Estatuto da OAB.
A boa-fé em sentido objetivo, concepção essa adotada pelo Novo Código Civil
45
Brasileiro de 2002, trazendo inovações ao mesmo bem como à sua aplicabilidade no
direito civil, dando assim aos juízes a possibilidade de julgar não apenas os
preceitos que se encontra na fria letra da lei mas de acordo com outros preceitos.
Vemos, portanto, que o objetivo do presente trabalho reside na demonstração
de que tanto o Princípio da Boa-Fé quanto o Instituto da Arbitragem encontram-se
intimamente relacionados. Isso porque a Arbitragem vem a ser uma extensão do
contrato e por encontrar-se inserida nele através de cláusula, a aplicação do
Princípio da Boa-fé deve à ela ser estendida, sendo obrigatório às partes agirem de
boa-fé em todo o decorrer da arbitragem, quer nas fases preliminares, no decurso e
principalmente no que se refere ao cumprimento da sentença arbitral.
Um atrelamento que se faz necessário para que possam ser colocados numa
mesma ótica de análise e, assim, contribuir para que o uso da Arbitragem venha a
ganhar credibilidade e se torne um instrumento auxiliar no desafogamento do Poder
Judiciário.
Um trabalho voltado em demonstrar a importância e o alcance do Instituto da
Arbitragem como meio alternativo de solução para os nossos litigios, de forma mais
célere e econômica, sempre pautado por uma conduta ética, leal, de confiança e
respeito mútuos, seja das partes envolvidas, seja do advogado e do árbitro.
46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
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http://www.âmbitojurídico.com.br.Acesso em: 28.abril.2013.
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Técnicas de Negociação para Advogados. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 2.
Disponível em: http://www.âmbitojuridico.com.br, p.1. Acesso em: 28.abril.2013
CARMONA, Carlos Alberto. ARBITRAGEM E PROCESSO. UM COMENTÁRIO À
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CÓDIGO CIVIL BASILEIRO DE 2002
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43.
Disponível
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