estratégia e execução | reportagem inovação Tire os Vale a leitura porque... ... aborda duas das principais preocupações dos CEOs atuais, segundo diferentes pesquisas: execução e inovação. ... você entende que a sobrevivência e o sucesso dependem da coexistência, em uma mesma organização, de duas culturas aparentemente inconciliáveis: a da inovação e a da performance. ... você enxerga os cinco paradoxos entre essas duas culturas. ... você fica ciente das soluções que têm sido propostas e testadas. P SARADOXOS OXODARAP do armário Cada vez mais, a sobrevivência e o sucesso de um negócio dependem da combinação da cultura da performance com a da inovação. O.k., só que as duas culturas vivem um conflito que raramente é percebido e atacado A estratégia e execução | reportagem A gigante General Electric, do alto de seu faturamento de US$ 148,5 bilhões anuais, está preocupada. Sua preocupação vem da compreensão de que o sucesso de um negócio nos dias atuais exige a combinação de duas culturas conflitantes: a cultura da performance e a cultura da inovação. É o que se deduz de sua decisão, divulgada em 2014, de embutir o conceito de lean startup em toda a sua operação. A premissa da GE agora é fazer com que produtos, serviços e modelos de negócio imperfeitos cheguem mais rápido ao mercado e ir adaptando-os conforme o feedback. O que são essas duas culturas conflitantes? Partindo de uma definição simples de cultura –“é o que os colaboradores fazem quando o chefe não está olhando”–, pode-se dizer que os colaboradores tendem a privilegiar o desempenho ou a inovação, nunca os dois ao mesmo tempo. O professor e pesquisador belga Wim Buekens, da Vlerick Business School, dedicou-se a desconstruir as razões de isso acontecer nas empresas e encontrou, na essência do problema, um conjunto de cinco paradoxos. Alex Osterwalder, o criador do canvas gerador de modelos de negócio, também é um dos nomes, no âmbito internacional, que vêm alertando para a tensão existente entre a execução e a inovação. Silvio Meira, um dos maiores especialistas brasileiros em inovação e autor de Novos Negócios Inovadores de Cres- cimento Empreendedor, observa que essa é a tensão esperada entre fazer o passado e o futuro, ambos no tempo presente. Fica fácil sentir a intensidade dessa tensão fazendo um paralelo com a música: imagine, no ano 2000, você tocar uma canção de Orlando Silva, o seresteiro das multidões, e o funk do morro do Rio de Janeiro para o mesmo público. Não vai funcionar bem, e é isso que as empresas fazem todos os dias. O problema é que o passado e o futuro têm de ser tocados juntos no presente se as organizações quiserem sobreviver [veja matriz abaixo] e ter sucesso. O primeiro passo para conseguir isso, segundo Meira, é realmente entender os paradoxos existentes entre performance e inovação, e o segundo, atacá-los direta e intencionalmente da única maneira possível: por meio das pessoas. GRAU DE COORDENAÇÃO baixo GRAU DE INTERAÇÃO alto baixo CULTURA DA PERFORMANCE CULTURA DA INOVAÇÃO CULTURA DE COMANDO E CONTROLE CULTURA CONTRAPRODUCENTE A SOBREVIVÊNCIA DE UMA EMPRESA DEPENDE DA COMBINAÇÃO DA CULTURA DA INOVAÇÃO COM A CULTURA DA PERFORMANCE” silvio meira, especialista em inovação estratégia e execução | reportagem OS 5 PARADOXOS Em 2013, Wim Buekens publicou um paper intitulado Coping with the Innovation Paradox: the Challenge for a New Game Leadership. Nele, argumenta que a atual formação dos executivos, como nos MBAs, ensina que bons gestores são os que mantêm o controle das coisas e buscam a estabilidade acima de tudo, o que acaba sendo a raiz do problema. Segundo ele, um “sistema tão otimizado que não tenha desperdício dificilmente conseguirá inovar”. No paper, Buekens detalha os cinco paradoxos entre inovação e performance. 1. Paradoxo da inflexibilidade Montam-se estrutura, controles, modelos e sistema na cultura da performance, MAS isso tira a capacidade de adaptação ao contexto emergente própria da cultura da inovação. Não há ISO 9000 e programa 6-sigma que bastem em uma empresa quando ela busca a performance. Até o processo de inovação será estruturado nos mínimos detalhes e... travará. Por quê? Porque controles levam à perda da flexibilidade para fazer diferente da norma e para responder às situações que emergem. “Em sistemas super-regulados, só dá para fazer o que é explicitamente permitido; todo o resto é entendido como proibido”, resume Meira. 2. Paradoxo da falha Premia-se apenas o sucesso na cultura da performance, MAS ninguém aprende com o sucesso na cultura da inovação. É verdade mesmo que não se aprende com o sucesso? Bem, a própria evolução humana é contada como uma história de tentativa e erro e aprendizado com o erro. De fato, costuma ser muito mais difícil identificar as causas de um acerto –que podem incluir sorte, coincidência ou tropeço alheio do qual não se soube– do que as de um erro. Não faltam ferramentas para investigar erros, a começar pela análise da satisfação de clientes. A cultura da performance, que premia o acerto, leva as pessoas a varrer o erro para debaixo do tapete ou a evitá-lo a todo custo ao mínimo sinal de que ele é possível. “Aí não há o aprendizado que pode levar ao sucesso na próxima vez”, comenta Meira. 3. Paradoxo do sucesso A cultura da performance insiste na linha de ação que tem sucesso comprovado, MAS a cultura da inovação prevê que novos caminhos sejam tentados para mudar a cara do sucesso. A máxima futebolística de que “em time que está ganhando não se mexe” ilustra com perfeição essa estratégia e execução | reportagem mentalidade ainda dominante na maioria das empresas. Mantêm-se os mesmos jogadores, com a mesma técnica e usando a mesma tática. Isso acontece até o time perder ante um novo adversário e todos ficarem sem entender o que houve. “Foi assim com a seleção brasileira na Copa do Mundo de 2014, quando perdeu de 7 a 1 para a Alemanha”, explica Meira. 4. Paradoxo do conhecimento Sabe-se muito na cultura da performance, MAS, por isso, acha-se menos necessário aprender –algo que é central na cultura da inovação. Profissionais de qualquer área, e os cientistas e o paradoxo da falha? em particular, tendem a fechar-se em seus silos de conhecimento e execução. É um lugar seguro, onde não recebem questionamentos a que não saibam responder. Porém a contrapartida disso é a não abertura a novos aprendizados. “Aí o bicho pega, porque as respostas para problemas novos frequentemente dependem de aprendizados”, provoca Meira. Wim Buekens sugere ao gestor que desafie esse paradoxo encorajando as pessoas a tomar a iniciativa e falhar –e garantindo, ao mesmo tempo, que o barco bata, mas não afunde Para entender o grande problema que isso representa para um negócio, basta pensar na ponta das ofertas. Iguais às dos concorrentes, viram commodities. “Esse é um território onde é muito mais difícil competir de maneira lucrativa”, lembra Meira. QUAL A SOLUÇÃO? 5. Paradoxo do alinhamento As pessoas têm de rumar na mesma direção na cultura da performance, MAS, quanto mais gente em um rumo, mais difícil é ir em outros, como se espera na cultura da inovação. Esse paradoxo é ilustrado pelo efeito manada: “Vamos fazer o que todo mundo está fazendo”. Alex Osterwalder propôs uma solução: a gestão dual, segundo a qual duas organizações coexistem em uma, com dois CEOs distintos. Isso parece contornar a diferença de mentalidade aparentemente insolúvel entre os protagonistas da cultura da inovação –os criadores– e os da cultura da performance –os gestores: os primeiros priorizam a descoberta de recursos, enquanto os segundos privilegiam a exploração de recursos. Os paradoxos, porém, continuam a existir nesse caso, apenas os caminhos para descobrir e explorar recursos são separados estruturalmente. estratégia e execução | reportagem Paradoxos do empre endedorismo FACILITAM A ACEITAÇÃO Aceitar a existência dos paradoxos, enxergando vantagens neles, é um ponto de partida para as organizações decidirem dedicar-se a conciliar as culturas da inovação e da performance. Compreender os oito paradoxos do empreendedorismo apontados por Peter Lewin, pesquisador e professor da University of Texas, EUA, podem ajudar bastante nessa mudança de mentalidade: 1. P aradoxo da incerteza. As oportunidades de negócios são complicadas pela incerteza, mas elas não existiriam se a incerteza não existisse. O que tanto Wim Buekens como Silvio Meira propõem é diferente: para eles, a solução tem de passar pela inclusão da gestão da criatividade das pessoas na lista de gestões de recursos típicas da cultura da performance. Quem deve fazer essa gestão são os líderes estratégicos capazes de privilegiar, em seus subordinados, cinco características: visão do futuro, iniciativa, talento (maior que o deles, líderes, inclusive), aprendizado e engajamento. Meira sugere, além disso, seis medidas práticas a esses líderes, que influirão justamente na cultura da empresa, ou melhor, no que seus subordinados –até o estagiário– farão quando eles não estiverem olhando: 7. P aradoxo do aprendizado. O empreendedorismo pode ser aprendido, mas não ensinado. 1. Que apoiem as paixões de seus colaboradores, mas exigindo que busquem objetivos concretos relativos a elas. 2. Q ue desafiem seus funcionários o tempo todo e, em paralelo, mostrem confiar mais neles. 3. Que encorajem a iniciativa pessoal e a individualidade, mas promovendo também uma visão compartilhada sobre os negócios. 4. Que estimulem a diversidade de pensamento entre os subordinados, mas sempre reforçando a coesão do time. 5. Que apoiem o aprendizado dos funcionários com o que já passou, mas garantindo que abram espaço para o conhecimento novo. 6. Que permitam que os subordinados promovam inovações incrementais, condicionando-os a, simultaneamente, procurar novos desafios. 8. P aradoxo da unicidade. Cada empreendedor é um ser único; é impossível descrevê-lo como parte de uma categoria, assim como não se consegue repetir suas ações específicas. O que significa um gestor tomar essas medidas, na prática? Avaliar, desenvolver e remunerar os funcionários a partir desse tipo de comportamento, e 2. P aradoxo da oportunidade. As oportunidades que são boas para todos não são boas para ninguém. 3. P aradoxo da existência. Oportunidades são, ao mesmo tempo, subjetivas e objetivas, apresentando-se como perguntas e como problemas. Elas são criadas tanto em teorias como na prática. 4. P aradoxo da dualidade. Empreender é algo que sempre equilibra e desequilibra o negócio, porque sempre há sucesso e fracasso acontecendo. 5. Paradoxo da incompletude. Empreendedores agem sobre planos que nunca têm sucesso completo. 6. P aradoxo da imprevisibilidade. A ação empreendedora pode ser entendida, mas nunca completamente prevista. estratégia e execução | reportagem conflito Fazer as culturas da inovação e da performance coexistirem depende de uma gestão de conflito, que cabe a líderes estratégicos até recrutar novas pessoas com base nisso. Ao adotar a filosofia da lean startup em sua operação, por exemplo, a GE passou a fazer isso: na avaliação de desempenho das pessoas, comporta- Foi esse o armagedom da Nomentos como os sugeridos por kia, por exemplo, na visão de Meira têm peso significativo. Silvio Meira. “Quando Stephen Elop foi colocado no coARMAGEDOM (OU NÃO) mando da empresa, era como O “pai” da administração se um cavalo de troia entrasse moderna, Peter Drucker, di- lá, porque só se acentuaram zia que “qualidade é o que o os paradoxos entre a cultura cliente quer pelo preço que ele da performance, representada pode pagar”. Visionário como por Elop, e a da inovação, que era, conseguiu combinar em era a da Nokia.” uma só frase a cultura da ino- Empresas como a GE e cavação e a da performance. da vez mais estudiosos de neNa prática, contudo, boa gócios estão convencidos: a parte das empresas ainda não sobrevivência e o sucesso escompreendeu a necessidade tão na gestão da criatividade de compatibilização de cul- e, mais profundamente, na turas, principalmente, talvez, gestão do conflito, para que por não reconhecer os para- os paradoxos entre as cultudoxos existentes. ras da inovação e da perfor“Esse é o armagedom das mance possam coexistir. Agoempresas”, já disse certa vez ra, diga: o que seus colaboraRoger Martin, da Rotman dores fazem quando você não School, do Canadá. está olhando? Você aplica quando... ... compreende a necessidade de conciliar os paradoxos entre a cultura da inovação e a cultura da performance. ... começa a mudar a mentalidade em sua empresa, promovendo a aceitação dos oito paradoxos do empreendedorismo. ... prioriza colaboradores que compartilhem cinco características: visão, iniciativa, talento, aprendizado e engajamento. ... toma seis medidas práticas de gestão de criatividade, capazes de influir diretamente na mudança da cultura da empresa.