CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO Curso de Terapia Ocupacional Adriana Miranda de Sousa SINDROME DE BURNOUT: UMA REVISÃO E PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM EMPRESAS São Paulo 2008 2 CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO Curso de Terapia Ocupacional Adriana Miranda de Sousa SINDROME DE BURNOUT: UMA REVISÃO E PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM EMPRESAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário São Camilo orientado pela Profª Adriana Rodrigues Siqueira Cardoso como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Terapia Ocupacional São Paulo 2008 3 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Padre Inocente Radrizzani Sousa, Adriana Miranda de Síndrome de Burnout : uma revisão e proposta de intervenção de terapia ocupacional em empresas / Adriana Miranda de Sousa. -- São Paulo : Centro Universitário São Camilo, 2008. 96 p. Orientação de Adriana Rodrigues Siqueira Cardoso Trabalho de Conclusão de Curso de Terapia ocupacional (Graduação), Centro Universitário São Camilo, 2008. 1. Esgotamento profissional 2. Estresse psicológico 3. Terapia ocupacional 4. Saúde do trabalhador I. Cardoso, Adriana Rodrigues Siqueira II. Centro Universitário São Camilo III. Título CDD : 616.9803 4 Adriana Miranda de Sousa SINDROME DE BURNOUT: UMA REVISÃO E PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM EMPRESAS São Paulo, 17 de novembro de 2008 ________________________ Professor Orientador (nome) ________________________ Professor Examinador(nome) 5 À Adriana, professora dedicada, próxima e paciente com meus devaneios... 6 Agradecimentos Primeiramente à Deus, por me permitir a realização de ser T.O. e transmitir energia para chegar até o final desta etapa; À minha mãe Maria, por me acompanhar dizendo “agüenta firme”, mas também me lembrar sempre do devido descanso; Ao meu pai Francisco, por me inspirar dedicação ao trabalho e por sempre acreditar em mim e em minha profissão; À minha irmã Alessandra, pela paciência e auxilio quando precisava; Ao meu companheiro, amor e amigo Maurício por sempre estar perto, atento e cuidadoso, auxiliando de forma próxima em minhas incertezas desde o início deste trabalho; Às minhas amigas e futuras T.O´s: Mônica, Patrícia, Karine, Luana e Cristiane ( “o grupo da Korônia”) que desde o primeiro semestre, juntas, formamos o grupo mais unido e “feliz” da sala, apoiando até o fim este trabalho mesmo que separadas; À todos os professores que contribuíram indiretamente com suas aulas para a realização deste trabalho e para minha formação como Terapeuta Ocupacional, especialmente à Profª Adriana por me “orientar e aguentar” desde o 5° semestre. 7 "Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco." (Charles Chaplin, 2007) 8 Resumo No Brasil, três em cada dez trabalhadores apresentam quadro crônico de estresse, a chamada “Síndrome de Burnout”. Burnout em português significa “combustão completa” caracterizando-se pelo comportamento autodestrutivo, ou seja, o trabalhador “violenta” sua saúde devido a insatisfações no trabalho. É o grau mais alto do estresse. A partir de referenciais teóricos da Terapia Ocupacional, Ergonomia e Saúde do Trabalhador este trabalho visa compreender e estudar a Síndrome de Burnout para desenvolver um projeto de intervenção de Terapia Ocupacional em empresas a fim de eliminar e/ou minimizar a ocorrência desta Síndrome. Foi realizada revisão bibliográfica em diferentes materiais recentemente publicados e atualizados como: livros, dissertações, artigos, revistas, sites, contatos profissionais, entre outros que embasaram e enriqueceram as propostas citadas. Conhecer a Síndrome e colocar em prática estratégias de prevenção faz-se imprescindível, sobretudo no mundo atual, onde as exigências por produtividade, qualidade, lucratividade, e consequentemente, problemas psicossociais tem feito cada vez mais parte do mundo do trabalho. É chegada a hora de pensar na análise desta atividade (o trabalho) com olhar mais amplo, estimulando aqueles que o organizam e planejam a ter um olhar atento, cuidadoso e sensível pensando que o trabalhador não é apenas a mão de obra, mas aquele que representa e move a empresa. Palavras Chaves: Síndrome de Burnout; Terapia Ocupacional; Saúde do Trabalhador. Abstract In Brazil, three in ten workers have chronic condition of stress, the so-called "Burnout syndrome". Burnout in Portuguese, means "complete burning", characterized by the selfdestructive behavior, the employee "violent" because of his health dissatisfaction at work. It is the highest degree of stress. From the theoretical references of Occupational Therapy, Ergonomics and Worker's Health this work aims to understand and study the Burnout Syndrome to develop an intervention project of Occupational Therapy in companies to eliminate and / or minimize the occurrence of this syndrome. We performed a literature review on different materials recently updated and published as books, dissertations, articles, magazines, Web sites, professional contacts, among others based and enriched the proposals said. Knowing the syndrome and put in place strategies to prevent it is essential, especially in today's world, where the demands for productivity, quality, profitability and, therefore, psychosocial problems has been increasingly part of the world of work. Now is the time to consider examining this activity (work) to look wider, encouraging those who organize and plan to have a watchful eye, more sensitive and careful thinking that the employee is not just the manpower, but that that represents and moves the company. Key Words: Burnout Syndrome; Occupational Therapy; Worker’s Health. 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO................................................................................................11 2 OBJETIVO GERAL.........................................................................................13 2.1 Objetivos específicos................................................................................13 3 METODOLOGIA.............................................................................................13 4 TRABALHO E SUAS IMPLICAÇÕES............................................................14 4.1 Trabalho: do que estamos falando?..........................................................14 4.2 Saúde do Trabalhador e Previdência........................................................17 4.3 Saúde Mental e Trabalho..........................................................................21 4.3.1 Estabelecimento de Nexo Causal em Saúde Mental.......................22 5 ESTRESSE: PONTO DE PARTIDA PARA A SÍNDROME DE BURNOUT...24 5.1 O que é o Estresse?..................................................................................24 5.2 Estresse e Trabalho...................................................................................27 5.3 Reação Fisiológica ao Estresse................................................................28 6 BURNOUT: UMA CRONIFICAÇÃO DO ESTRESSE.....................................32 6.1 Concepções Teóricas................................................................................36 6.2 Sintomas Apresentados na Síndrome de Burnout....................................38 6.1.1 Sintomas Físicos...............................................................................38 6.1.2 Sintomas Psíquicos...........................................................................39 6.1.3 Sintomas Comportamentais..............................................................40 6.1.4 Sintomas defensivos.........................................................................41 6.3 Fatores Multidimensionais da Síndrome de Burnout ................................44 6.3.1 Exaustão Emocional.........................................................................44 6.3.2 Despersonalização...........................................................................45 6.3.3 Redução da Realização Profissional................................................46 6.4 Facilitadores e Desencadeadores da Síndrome de Burnout.....................47 6.4.1 Características do Trabalho.............................................................47 6.4.2 Características da Organização do Trabalho...................................52 6.4.3 Características Pessoais..................................................................55 6.4.4 Características Sociais.....................................................................59 6.5 Consequencias da Síndrome de Burnout..................................................62 6.5.1 No trabalho.......................................................................................62 6.5.2 Na organização do trabalho.............................................................63 6.5.3 Sociais.............................................................................................63 10 6.6. Profissões mais acometidas pela Síndrome de Burnout..........................64 6.7 Diagnósticos da Síndrome de Burnout......................................................66 6.7.1 Modelos de avaliação de Burnout....................................................66 6.8 Formas de Prevenção da Síndrome de Burnout.......................................68 7 TERAPIA OCUPACIONAL E A VISÃO ACERCA DA SÍNDROME...............71 8 PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM EMPRESAS.....................................................................................................73 9 CONCLUSÃO................................................................................................. 89 10 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................. 92 11 1 INTRODUÇÃO O trabalho na contemporaneidade, do ponto de vista físico e psicológico, mesmo com o avanço de tecnologias (envolvendo o conhecimento técnico e científico, ferramentas, processos e materiais) ainda vem se configurando como algo árduo, pesado e, ainda, como fonte de competição. Segundo Brant e Gómez (2005), a busca pela sobrevivência vem fazendo de algumas empresas palco de disputas, onde o conhecimento e a posição ocupada pelo cargo já não oferecem garantia de permanência num mercado de trabalho fortemente competitivo. Diante deste quadro, as conseqüências são os prejuízos à saúde, dentre eles o evidente aumento de queixas de estresse no trabalho. No Brasil, três em cada dez trabalhadores apresentam quadro crônico de estresse, a chamada “Síndrome de Burnout”, como apontam as pesquisas da International Stress Management Association do Brasil (Isma-BR associação que estuda as causas dos efeitos do estresse). (JORNAL DESTAK, 2008) A síndrome de Burnout, como cita Benevides-Pereira (2002), passou a ter protagonismo na área do trabalho na medida em que veio a explicar grande parte das conseqüências do impacto das atividades ocupacionais no trabalhador e deste na organização. Como será visto detalhadamente nos próximos capítulos, Burnout vai além do estresse; está associado mais especificamente ao mundo laboral e ocorre pela cronificação de um processo de estresse acarretando prejuízos físicos, psicológicos e sociais ao trabalhador. O conhecimento da Síndrome aqui apresentado é de especial importância não só para as classes de profissionais que apresentam maior risco de incidência, mas principalmente para aqueles que desenvolvem suas atividades em ambiente de trabalho desgastante. Conhecer a Síndrome e colocar em prática estratégias de prevenção faz-se imprescindível, sobretudo no mundo atual, onde as exigências por produtividade, qualidade, lucratividade, e consequentemente, problemas psicossociais tem feito cada vez mais parte do mundo do trabalho. (MORENOJIMENEZ; SCHAUFELI APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002) 12 Além disso, a saúde do trabalhador é um campo em desenvolvimento na Terapia Ocupacional ainda carente de estudos acerca da relação entre saúde mental e trabalho (principalmente sobre a Síndrome de Burnout). Sendo assim, diante da escassa publicação diretamente nos ambientes de trabalho, surgiu a necessidade de um estudo mais aprofundado e elaboração de um projeto de prevenção para a Síndrome de Burnout. Para a elaboração do presente trabalho, foi realizada revisão bibliográfica contando com livros, jornais, revistas e artigos recentes da área da saúde buscando as diferentes vertentes acerca do tema Síndrome de Burnout e a posterior criação de proposta de prevenção da mesma. A ampla revisão bibliográfica permitiu o estudo dos aspectos diversos que envolvem a Síndrome: definições e as diferentes nomenclaturas; as concepções teóricas que envolvem seu estudo; sintomatologia; fatores multidimensionais da síndrome; facilitadores para desenvolvimento de Burnout; conseqüências físicas, psíquicas e sociais para quem a desenvolve; profissões mais acometidas; método para diagnóstico e formas de prevenção, possibilitando identificar aspectos passiveis de intervenção da Terapia Ocupacional. A partir desta análise de dados, foi elaborado um projeto de intervenção a ser apresentado em empresas para a prevenção da Síndrome de Burnout. A elaboração do projeto foi baseada em pressupostos da Terapia Ocupacional e as atuais exigências do mercado de trabalho para que seja aplicado dentro de uma realidade vigente. Deste modo, este trabalho pretende levar o leitor ao conhecimento a cerca da Síndrome, refletindo sobre as diferentes vertentes que envolvem o trabalhador com suas necessidades e de que forma o trabalho pode se tornar uma ameaça à sua saúde física e mental. Portanto, cabe ao profissional da saúde, terapeuta ocupacional pensar como seu papel pode auxiliar empresa e trabalhador a unirem qualidade de vida no trabalho e eficácia, prevenindo a Síndrome de Burnout. 13 2 OBJETIVO GERAL A partir de referenciais teóricos da Terapia Ocupacional, Ergonomia e Saúde do Trabalhador, este trabalho visa compreender e estudar a Síndrome de Burnout para desenvolver um projeto de intervenção de Terapia Ocupacional visando eliminar e/ou minimizar a ocorrência desta Síndrome. 2.1 Objetivos Específicos Identificar diferentes referenciais teóricos que possibilitem a compreensão da Síndrome de Burnout; Estudar a etiologia da Síndrome e prejuízos para o indivíduo em aspectos físicos, psicológicos, sociais, do trabalho e de seu cotidiano; Estudar métodos com abordagens individuais e grupais que levem ao conhecimento da doença e à sua prevenção; Propor intervenções de Terapia Ocupacional para minimizar ocorrência de Burnout e melhorar condições de trabalho, atendendo às necessidades peculiares humanas, a partir de uma visão holística, envolvendo seus aspectos físicos, psíquicos e sociais. 3 METODOLOGIA Realizar revisão bibliográfica em diferentes materiais recentemente publicados e atualizados como: livros, dissertações, artigos, revistas, sites, contatos profissionais, entre outros que embasem e enriqueçam as propostas citadas, possibilitando a posterior criação de um projeto aplicável a trabalhadores no seu contexto de trabalho. 14 4 TRABALHO E SUAS IMPLICAÇÕES “Ele chegou com dificuldade ao oitavo andar. A respiração difícil centralizava sua preocupação e nosso olhar. Todas as dificuldades estavam voltadas para sua dificuldade mais visível: respirar. [...] ‘Parece preguiça, mas não é. Vai virando falta de ar, cansaço e, daqui a pouco, a gente não consegue mais fazer as coisas direito [...]. O tremor é só quando a doença chega: será que vou me curar? Quem vai sustentar a família? O rendimento diminui muito com o auxílio saúde... E se eu tiver que me aposentar? Dúvidas e dúvidas que aparecem como um realismo dramático com o surgimento da doença.’ [...] Coragem, disposição para os horários alternantes do trabalho em turnos para os riscos de sua atividade cotidiana... Uma certa insensibilidade torna-se necessária para suportar as intempéries no ‘corpo’ e ‘na raça’. Insensibilidade que a doença mostra ser frágil. Frágil como o corpo corajoso. A coragem, não é não ter medo. É ter medo e enfrentá-lo. Então, não há como ser corajoso sem ser frágil. Se a doença assusta, enfrentá-la é um modo de ser corajoso...saudável. [...] ‘É, não é fácil quando a gente fica doente. O pior são os outros, perguntando que é que a gente tem’. ‘Eu gosto de ler e fico em casa. Ligo a luz da garagem e fico lá, quietinho...lendo. Imagina o que os vizinhos vão dizer se virem a gente em casa, sem trabalhar?Já pensou?’. ‘Mas pior são os filhos. O que a gente diz para eles? Trabalhar é bom! Mas pai, pode ficar doente. Pode ficar, se não se cuidar. Não vou dizer para o guri que trabalhar é ruim’. ‘Mas isto passa, não é?’. ‘Se Deus quiser, volto para o trabalho...volto a andar de cabeça erguida...Andar’...”. (TITTONI, 2000, p. 276) 4.1 Trabalho: Do que estamos falando? “É nele [no trabalho] que se desenvolve o significado de pertencimento nas pessoas. O mundo do trabalho é o mundo onde nos organizamos, planejamos o nosso presente e o nosso futuro, adquirimos experiência prática e nos reafirmamos socialmente [...] o sentido de ser está intimamente ligado ao sentido de ter. A menor incompatibilidade entre esses dois sentidos gera o estresse, a desmotivação, o desinteresse, a insatisfação consigo mesmo, a loucura”. (CRUZ APUD LOPES, 2003, p.10). Para que seja discutido o trabalho e suas implicações para a vida do sujeito que o realiza, primeiro faz-se necessário colocar a questão do trabalho em si: algo que enaltece, que diminui, que é prazeroso ou mesmo penoso? Tal discussão é ampla, diante do grande número de estudos acerca do assunto, contudo, cabe uma reflexão a partir das principais idéias dos diferentes autores: 15 De acordo com Ferreira apud Lopes (2003), a palavra trabalho é definida como: “atividade coordenada de caráter físico e/ou intelectual, necessária à realização de qualquer tarefa”, cujo significado provém do latim trabalho – “tripalium”: instrumento de tortura e “tripaliari”: torturar. Os gregos utilizavam um sentido diferente de trabalho - ponos - esforço e penalidade, e ergon – criação, obra de arte. Etimologicamente, o trabalho traz uma conotação negativa, cujo conteúdo e organização, além de suplantar a idéia de maldição e punição, compõe-se de um comportamento que pressupõe a sujeição do corpo por um processo mudo, invisível e que é alienante. (LOPES,2003) Na mesma perspectiva, há que se considerar, conforme Basso apud Lopes (2003), que o trabalho vai além da necessidade de sobrevivência; ele será alienado quando o seu sentido não corresponder ao seu significado, dado pelo conteúdo afetivo dessa atividade prevista socialmente, isto é, quando o sentido pessoal do trabalho separar-se da sua significação. Se o sentido do trabalho do operário for apenas o de garantir sua sobrevivência, logo não haverá significado social do trabalho. Marx apud Hitomi, Ruiz e Sampaio (1995), por sua vez, demonstra o aspecto voltado à produtividade, definindo o trabalho como: 1) Atividade humana de intertransformação com a natureza. 2) Parte de um projeto concebido idealmente em resultado prático-material que expressa objetivamente a subjetividade do produtor. 3) Implica tanto em realização da identidade, como em mercadoria, coisa a ser vendida em troca de acesso à sobrevivência. 4) Tem natureza de atividade material (realização de produto necessário ao homem) e o trabalho abstrato, expresso através do tempo comprado pelo capital ao trabalhador. A partir de tal definição, podemos repensar como atualmente é considerado o trabalho: partindo da premissa de que se trabalhe 8 horas por dia, o trabalho ocuparia diretamente metade do nosso tempo em vigília, um terço de nossas vidas, servindo equivalente universal para nos identificarmos uns perante os outros: (“-Quem é você? Ah, sou fulano, mecânico”). Mas o trabalho significa mais: é força, tempo e habilidade que se vende para obter condições de morar, vestir, comer. (HITOMI, RUIZ E SAMPAIO, 1995). 16 Para os mesmos autores, o trabalho situa o homem na hierarquia social de valores, visível no prestígio social de algumas profissões frente a outras (médicos e garis, advogados e borracheiros, metalúrgicos e auxiliares de creche). Assim, o trabalho nos remete para a possibilidade de consumo, felicidade, adoecimento e morte. Neste ponto, pode-se afirmar que existe uma onipresença do trabalho humano em todas as expressões da vida social. Contudo, o que observamos atualmente nas sociedades capitalistas, é que as pessoas estão tão prisioneiras do trabalho como mero negócio desigual, da venda de força do trabalho por salários humilhantes, da dolorosa negociação de um preço suportável para a sobrevivência, do medo crônico do desemprego, que nem se percebem as inúmeras possibilidades realizadoras do trabalho, como definido anteriormente. “Muitas vezes, não se encontra prazer na atividade realizada, por perceber a necessidade de passar pelo trabalho como ‘inferno’, pela negociação salarial como ‘purgatório’, para alcançar o paraíso do consumo. O trabalho transforma-se em maldição que, se não pode ser afastada, pode pelo menos ser diminuída. O salário, não cumpre função promotora de existência através do consumo, mas de mera e cansativa subsistência”. (HITOMI, RUIZ E SAMPAIO,1995). Sato (1995) refere o termo “trabalho penoso” encontrado nos estudos da área de Saúde do Trabalhador, existindo basicamente três tendências: a primeira que engloba a maioria dos estudos ligados à Fisiologia do Trabalho e Ergonomia, para os quais o trabalho é penoso quando demanda esforço físico. A segunda onde os estudos adjetivam como penosas, as condições de trabalho que geram esforço e sofrimento mental e, por ultimo, alguns estudos que entendem ser o trabalho penoso, aquele que acarreta sofrimento físico e mental. A mesma autora cita que a medicina do trabalho, engenharia de segurança, a psicologia do trabalho e a ergonomia recortam as condições de trabalho em somatório de agentes (físicos, químicos, biológicos entre outros). Este todo não é o somatório de partes ou agentes sendo ele identificado como bom ou ruim apenas pela presença ou ausência de determinados fatores, mas a combinação entre eles. 17 Sendo assim, um determinado contexto de trabalho é identificado como bom ou ruim, na relação que o trabalhador pode com ele manter, quer seja ele de maior ou de menor controle. (SATO, 1995) O desafio atual é dimensionar esta complexidade, reconhecer os valores sociais que o trabalho gera, reconhecer que o trabalho desvalorizado produz nova natureza de valores sociais. O trabalho desvalorizado desvaloriza o trabalhador, fragilizando-o de modo irrecuperável, mesmo na presença de um “ambiente saneado” e de “perfeitos ajustes anatômicos corpo/instrumento”. (HITOMI, SAMPAIO E CODO, 1995). “O trabalho em si é uma orientação que não cura e nem faz adoecer; o que cura, enriquece a personalidade ou faz adoecer são as condições humanas e inumanas em que o trabalho é realizado”. ( ELEGER APUD SATO, 1995, P. 65). 4.2 Saúde do Trabalhador e Previdência É certo que as condições e ambientes de trabalho tenham melhorado sensivelmente nos últimos anos reduzindo as altas taxas de mortalidade dos trabalhadores. Contudo, os agravos à saúde, permanecem resultando em taxas elevadas de acidentes e doenças ocupacionais, em sua maioria entre trabalhadores desprotegidos pelas leis previdenciárias, além do problema da não notificação de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. O Ministério da Previdência do Brasil (2001) define: Doenças relacionadas ao trabalho: as doenças adquiridas ou desencadeadas em função das condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente; Doenças profissionais: as doenças produzidas ou desencadeadas pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; 18 O Ministério da Previdência Social (2006) define o acidente de trabalho como aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou redução da capacidade para o trabalho permanente ou temporária. Consideram-se acidente do trabalho, as doenças profissionais e as doenças relacionadas ao trabalho. Equiparam-se também ao acidente do trabalho: o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a ocorrência da lesão; certos acidentes sofridos pelo segurado no local e no horário de trabalho; a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade; e o acidente sofrido a serviço da empresa ou no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado e vice-versa. (MINISTÉRIO DA PREVIDENCIA SOCIAL, 2006). Os registros estatísticos brasileiros apresentados a seguir envolvem, como foi explicado anteriormente, não só acidentes de trabalho mas também as doenças profissionais e relacionadas ao trabalho diagnosticadas, o que de alguma forma trata-se de um equivoco ainda na forma de considerar tais registros numa mesma categoria. Segundo o Ministério da Previdência Social (2006), o Resumo de Acidentes de Trabalho demonstrou aumento de 17% nos índices de acidentes de trabalho registrados entre 1999 e 2006. Durante o ano de 2006, no Brasil, foram registrados no INSS cerca de 503,9 mil acidentes do trabalho. Comparado com 2005, o número de acidentes de trabalho registrados aumentou 0,8%. Os acidentes típicos (decorrentes da característica da atividade profissional desempenhada) representaram 80% do total de acidentes, os de trajeto 14,7% e as doenças do trabalho 5,3%. Nos acidentes típicos e nos de trajeto, a faixa etária com maior incidência de acidentes foi a constituída por pessoas de 20 a 29 anos com, respectivamente, 39,1% e 40,9% do total. Nas doenças de trabalho a faixa de maior incidência foi a de 30 a 39 anos, com 31,7% do total. (MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2006) 19 Os 503.890 acidentes e doenças do trabalho entre os trabalhadores assegurados da Previdência Social registrados em 2006, já é um número alarmante sendo que não inclui os trabalhadores autônomos (contribuintes individuais) e as empregadas domésticas. Estes eventos provocam enorme impacto social, econômico e sobre a saúde pública no Brasil. O Ministério da Saúde (2007) por sua vez, complementa que os dados referem-se somente à parcela dos trabalhadores cujo vínculo empregatício e a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que corresponde a apenas aproximadamente 30% da População Economicamente Ativa (PEA) do país. O próprio Ministério da Previdência Social (2006) admite que há um “mascaramento” na notificação de acidentes e doenças do trabalho e sugere novas propostas como o NTEP – Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário. Este, faz o cruzamento das informações de código da Classificação Internacional de Doenças – CID-10 e de código da Classificação Nacional de Atividade Econômica – CNAE que aponta a existência de relação entre a lesão ou agravo e a atividade desenvolvida pelo trabalhador, embasada em estudos científicos baseados nos fundamentos da estatística e epidemiologia. O Jornal AGENCIA BRASIL (2008) também salienta que segundo o Ministério da Saúde, a média de 500 mil acidentes de trabalho por ano, registrada pela Previdência deve ser, na prática, pelo menos três vezes maior, chegando a 1,5 milhões de casos no país. Em entrevista para o mesmo jornal, o coordenador da área de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde desta data (22/01/08), Marco Perez, comenta que a responsabilidade pela saúde, inclusive dos trabalhadores, é do poder público. Entretanto, a falta de dados inviabiliza que as empresas sejam obrigadas a ressarcir as despesas de saúde em caso de culpabilidade comprovada em acidentes de trabalho, como é previsto em lei. 20 O coordenador conclui que: “O SUS tem que ter estrutura para atender os trabalhadores, mas deveria investigar os casos em que se sentir lesado por arcar com custos de acidentes causados em função de condições inadequadas de trabalho. Para isso, são necessários os registros que hoje não temos”. (AGÊNCIA BRASIL, 2008) O VIASEG PORTAL DE NEGÓCIOS (2007) comenta que, na maioria das vezes, as empresas tentam enganar a Justiça do Trabalho mandando o trabalhador vítima de acidente de trabalho para a Previdência Social em busca de auxílio doença, na tentativa de se livrar das multas da Justiça do Trabalho, quando o correto seria fazer o requerimento para auxílio de acidente de trabalho. Outro motivo para as empresas não comunicarem o acidente de trabalho é o direito que o trabalhador tem de um ano de instabilidade quando retorna, após o afastamento por acidente. Lamentavelmente, as empresas não arcam com suas responsabilidades legais perante a Lei e preferem cometer atos ilegais. “Os trabalhadores [...] precisam de orientação adequada sobre os riscos das suas atividades e também conhecimento sobre seus direitos em relação à garantia da saúde. Devem exigir que, quando ocorrer um acidente de trabalho, seja notificado, pois isso a longo prazo vai gerar políticas e melhorias das condições de saúde nos ambientes de trabalho [...]”. (MARCO PEREZ APUD AGENCIA BRASIL, 2008) Como foi observado nas estatísticas apresentadas, há uma dificuldade em reconhecer e notificar as doenças relacionadas ao trabalho e acidentes em geral, seja pelo numero de registros inferiores no ato do acidente, seja pelo numero de trabalhadores descobertos pelo seguro. Além disso, nos deparamos com outra problemática relacionada ao diagnóstico e estabelecimento de um nexo causal com o trabalho: tratam-se dos transtornos mentais, uma vez que muitas vezes o diagnóstico não se dá através de meios visíveis ou palpáveis. 21 4.3 Saúde Mental e Trabalho O trabalho também está em um lugar fundamental na dinâmica do investimento afetivo das pessoas, e, uma vez sendo satisfatório, traz prazer, alegria e saúde. Já quando desprovido de significação, sem reconhecimento ou fonte de ameaças à integridade física e/ou psíquica, traz sofrimento. Segundo Glina e Jardim (2000), em decorrência do lugar de destaque que o trabalho ocupa na vida das pessoas, sendo fonte de subsistência e posição social, a falta de trabalho gera sofrimento psíquico, pois ameaça a manutenção material da vida do trabalhador e sua família, ao mesmo tempo em que abala o valor subjetivo que a pessoa atribui, trazendo o sentimento de menos-valia, angústia, insegurança, desânimo e desespero, caracterizando quadros ansiosos e depressivos. Borges et. al (2002) citam que à medida que se focaliza a relação como usuário e novas competências do trabalhador, a tendência é necessitar da criatividade, da capacidade reflexiva, de seu efetivo envolvimento e, em ultima análise, de sua saúde. Em outras palavras, a saúde mental deste trabalhador passa então a ser necessidade da organização para atingir seus objetivos, quando por necessidade de redução de custo, diminui-se a atenção ao trabalhador e aumenta-se a ameaça ao desemprego. Diante deste quadro, como aponta Fiancini e Fiancini (2003), as pessoas estão trabalhando cada vez mais, competindo ferozmente com a máquina, esquecendo-se de si mesmas. Dispõem menos tempo para a família e para o lazer e estão tornando-se cada vez mais estressadas. Estes quadros observados em nossa sociedade preocupam grande número de cientistas, pois constata sintomas que envolvem o indivíduo como o todo, em sua saúde mental e física: inatividade, estresse, fadiga muscular, obesidade e conseqüente desenvolvimento de doenças, associadas a um trabalho exaustivo, maus hábitos alimentares, ou vícios como fumo e álcool. 22 Os transtornos Mentais e do Comportamento Relacionados ao Trabalho podem ser definidos como aqueles determinados pelos lugares, pelo tempo e pelas ações no trabalho, uma vez que as ações implicadas no ato de trabalhar podem não só atingir o corpo físico dos trabalhadores (acarretando lesões e disfunções biológicas), como também reações e efeitos psíquicos nas situações de trabalho patogênicas: processos psicopatológicos especificamente relacionados ao trabalho realizado. (GLINA E JARDIM, 2000). Podemos observar finalmente, que as transformações técnicas e organizacionais no trabalho têm suscitado um acentuado desgaste no trabalhador, revelado através de distúrbios orgânicos, psíquicos ou mistos: hipertensão, doenças coronárias e digestivas, neuroses e psicoses classificadas, genericamente, como doenças do stress ou tensão. Uma análise mais apurada revela uma íntima relação entre essas doenças e as situações de trabalho, embora nem sempre reconhecida pela legislação específica. (JAQUES & CODO, 2002) 4.3.1 Estabelecimento do Nexo Causal em Saúde Mental Os transtornos mentais, de acordo com Mendes apud Glina e Jardim (2000) estão crescendo como problema em todo o mundo, principalmente nas áreas metropolitanas onde se estima que 18% da população necessitam de algum tipo de ajuda psiquiátrica. Cardilhe et al. apud Glina e Jardim (2000) apontam os transtornos mentais como as doenças que afastam por mais tempo os trabalhadores do trabalho. ”Entre os segurados da Previdência Social, as ‘doenças mentais’ ocupam segundo lugar entre as causas de auxilio doença, e o segundo e terceiro lugar entre as causas de incapacidade permanente e invalidez” (INPS, 1986 APUD GLINA E JARDIM, 2000, p.17). Segundo Glina e Jardim (2000), os transtornos mentais e do comportamento relacionados ao trabalho podem ser classificados em grupos, de acordo com o tipo de relação causal entre o trabalho e o quadro clinico apresentado pelo trabalhador, utilizando a Classificação de Schilling: 23 Grupo I da Classificação de Schilling: O trabalho ou ocupação desempenham papel de “causa necessária”, excluídas outras causas ocupacionais, ou seja, sem eles, seria improvável que o paciente desenvolvesse a doença. Nestes incluem-se: Demência, Delirium, Transtorno Orgânico de Personalidade, entre outros. Grupo II: O trabalho ou ocupação são considerados como fatores de risco associados com a etiologia multicausal da doença. Está incluído neste grupo, por exemplo, a Síndrome de Burnout. Grupo III: Circunstâncias ligadas ao trabalho ou à ocupação podem eventualmente desencadear, agravar ou contribuir para o desenvolvimento da doença. Está incluído neste grupo, por exemplo, a Neurose profissional. Como apontam as mesmas autoras, o nexo com o trabalho não é simples. O processo de adoecer é específico de cada individuo e envolve sua história de vida e de trabalho. Só o estudo detalhado de cada caso pode oferecer uma visão da articulação dos diversos quadros clínicos, em seu desenvolvimento e dinâmica com a vida laboral. Depende de uma descrição do contexto organizacional, do próprio trabalho, salientando os fatores problemáticos no trabalho que poderiam potencializar os transtornos mentais e do comportamento de acordo com a vivência do trabalhador. Como apontam também Sampaio e Codo (1995) a relação entre saúde mental e Trabalho é mais difícil de se detectar do que parece devido à incerteza de que os seus resultados das investigações nesta área se relacionam com o trabalho propriamente dito. Além disso, o problema se torna difícil de pesquisar, porque permite que os sintomas se escondam, por todos os lugares: quem garante que os desafetos familiares, o nervosismo ao entrar em casa não se devem a razões profissionais? Por ser onipresente, o trabalho e seus efeitos são difíceis de detectar. Os mesmos autores acrescentam: é muito difícil reconstruir os nexos indivíduosociedade, particularmente quando falamos de sofrimento psíquico, que por definição, se esconde do portador e do outro. 24 5 ESTRESSE: O PONTO DE PARTIDA PARA A SÍNDROME DE BURNOUT 5.1 O que é o estresse? Dentre as doenças ligadas ao estresse, terá enfoque neste trabalho a Síndrome de Burnout, decorrente das más condições do ambiente de trabalho, propiciando pouca satisfação pessoal do trabalhador que adquire prejuízos a saúde em seus aspectos biopsicossociais. Como apontam Glina e Jardim (2000), deve-se diferenciar o Burnout de Estresse já que o primeiro seria uma resposta ao estresse laboral crônico, diferente de outras formas de estresse. A Síndrome de Burnout envolve atitudes e condutas negativas em relação à organização, ambiente e pessoas ligadas ao trabalho, acarretando prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e para a organização. Já o quadro tradicional de estresse não envolve tais atitudes e condutas, sendo um esgotamento pessoal, que interfere na vida do indivíduo, mas não de modo direto, na sua relação com o trabalho. Como apontam Glina e Rocha (2000), o termo “estresse” tem significados diversos para diferentes pessoas. Mesmo entre pesquisadores, não há consenso na compreensão do que seja estresse, e, tão pouco, preocupação em definir este conceito, embora haja em inúmeros trabalhos científicos os termos: estresse, estresse psíquico, estresse psicossocial, estresse ecológico, estresse ocupacional; há mais de 110.000 publicações que abordam diferentes aspectos do conceito estresse na medicina, psicologia e filosofia. (SELYE APUD GLINA E ROCHA, 2000). A introdução do termo estresse num sentido técnico ocorre em 1936, através de Selye apud Ferreira, (2000) que caracteriza a natureza do estresse como uma síndrome de adaptação geral, constituída de três fases: a) reação de alarme b) fase de adaptação; c) fase de exaustão. Nesta formulação, encontra-se implícita a inespecificidade das demandas ambientais e a importância da intensidade e duração da pressão na relação com a resposta do organismo. A palavra estresse designava 25 todos os efeitos não específicos de fatores que podem agir sobre o corpo. Estes agentes são chamados estressores, dada sua capacidade de produzir estresse. Como Salienta Lipp apud Benevides-Pereira, (2002), os estudos sobre estresse se proliferaram, passando do referencial biológico para o biopsicológico, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, quando se notou que os transtornos apresentados pelos soldados não eram apenas devido às condições físicas a que foram submetidos, mas também às pressões psicológicas. Os trabalhos de Selye foram muito influenciados pelas descobertas de dois fisiologistas que causaram impacto na época: Bernard, que em 1879 havia sugerido que o ambiente interno dos organismos deve permanecer constante, apesar das mudanças no ambiente externo, e Cannon, que em 1939 sugeriu o nome "homeostase" para designar o esforço dos processos fisiológicos para manter um estado de equilíbrio interno no organismo. Selye, utilizando-se desses conceitos, definiu o estresse como uma quebra neste equilíbrio. (FIAMONCINI & FIAMONCINI, 2008) De fato, ele utilizou o termo estresse com a conotação que se conhece hoje em dia: estresse é a maneira como o organismo responde a qualquer estímulo - bom, ruim, mal ou imaginário - que altere seu estado de equilíbrio. Como cita Fiamoncini & Fiamoncini, (2008), o estresse está diretamente relacionado com a homeostase, que é estado de equilíbrio dos vários sistemas do organismo entre si e do organismo como um todo com o meio ambiente. “Stress” é o termo derivado do Latim sendo empregado popularmente no século XVII com o significado de fadiga, cansaço. A partir dos séculos XVIII e XIX, o termo aparece relacionado com o conceito de força, esforço e tensão. (BENEVIDESPEREIRA-PEREIRA, 2002). Segundo Lipp apud Fiancini & Fiancini (2008), atualmente estresse é definido como “uma reação do organismo, com componentes físicos e/ou psicológicos, causadas pelas alterações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa se confronta com 26 uma situação que, de um modo ou de outro, a irrite, amedronte, excite, confunda ou mesmo que a faça imensamente feliz". Já em definição do dicionário Aurélio (citado por Fiancini & Fiancini, 2008) amplia a definição: "Estresse é um conjunto de reações do organismo e agressões de ordem física, psíquica, infecciosa e outras, capazes de perturbar-lhe a homeostase”. Foi citado também por Glina e Rocha (2000) o termo utilizado por Bernar: “Distress”, para designar as reações psicofisiológicas que podem desencadear doenças, sendo que este aparece quando não tem escolha e deve-se aceitar a situação. Faz-se necessário distinguir o Agente Estressor e Estresse. O agente estressor, como mostra Benevides-Pereira, (2002), é um elemento que vem a interferir no equilíbrio homoestático do organismo, podendo ter um caráter físico, cognitivo ou emocional. Já o estresse é uma resposta a este estimulo, isto é, a necessidade de vir a aumentar o ajuste adaptativo, para retornar ao estado de equilíbrio para readquirir a homeostase inicial ou os recursos que a pessoa vem a despender para fazer frente às demandas. O estresse tem a função de ajustar a homesostase e de melhorar a capacidade do indivíduo, para garantir-lhe a sobrevivência ou sobrevida. Glina e Rocha (2002, p.55) complementam a relação com a busca do equilíbrio do corpo: “Estresse não é doença e, sim, tentativa de adaptação: o organismo lança mão de suas energias preparando-se ou para a luta ou para a fuga”. Ele ocorre no dia-a-dia, faz parte de todas as atividades. Nesse sentido, Frankenhauser apud Glina e Rocha (2000) utiliza a expressão “happy estresse” para situações em que os estímulos do ambiente estão em equilíbrio com as capacidades pessoais de lidar com situações difíceis sem efeitos prejudiciais à saúde. Estresse, ao contrário da crença popular, não é meramente fadiga nervosa ou conseqüência da intensa emoção. Qualquer atividade normal - um jogo de xadrez ou um abraço carinhoso - pode produzir considerável estresse sem maiores conseqüências. Assim, o estímulo pode ter origem agradável ou desagradável, agudo ou crônico, mas a reação do organismo segue um mesmo padrão (Nahas, 2001). 27 Lazarus & Folkman apud Glina e Rocha (2000) ressaltam que se deve considerar, portanto, que os eventos em si não são estressantes. É a forma como interpretamos e reagimos a eles que os torna estressantes; nem sempre o que é estressante para um, seja para o outro, devido as diferentes histórias de vida, diferentes personalidades e diferentes modos de interpretar os eventos cotidianos. Além disso, complementam as mesmas autoras, as avaliações cognitivas e formas de enfrentamento vão se modificando diante de novas informações, novos fatos. Ou seja, o indivíduo não é um ser que responde passivamente a estressores, mas alguém que interage com eles ativamente. Desta forma, o estresse é um processo temporário de adaptação que envolve alterações físicas e mentais. A palavra estresse adquiriu tamanha difusão, que acabou por se transformar quase que em um sinônimo para qualquer tipo de alteração, geralmente negativa, sentido pelo individuo. O menor sentimento de ansiedade ou tensão se atribui ao estresse e no emprego cotidiano (e por vezes até no meio científico). Observa-se uma confusão no emprego do termo que é encarado tanto como o elemento desencadeante como o resultado da evolução, gerada pelas modificações ocasionadas pelo estresse. (BENEVIDES-PEREIRA, 2002) 5.2. Estresse e Trabalho Foi observado nos capítulos anteriores que o estresse fisiologicamente possui um aspecto muitas vezes benéfico e necessário inclusive para a adaptação do homem ao seu ambiente como um todo. Contudo, é observado que quando relacionado ao trabalho, este possui uma conotação negativa associada ao desconforto e ao mal estar. Como apontam os autores, há uma relação desvantajosa entre ambientes de trabalho altamente estressantes e padrões de comportamento e o funcionamento mental propenso ao stress, comportamento este que é valorizado e estimulado no meio empresarial e pela sociedade, pois “produz” verdadeiras “máquinas laborais”, com um nível de rendimento profissional elevado. Neste caso, os indivíduos são expostos a um risco maior de doenças coronarianas, devido a importantes mudanças fisiológicas nos sistemas cardíaco e vascular, em função do aumento da 28 produção de substâncias como adrenalina e noradrenalina, da alteração da concentração de gordura no sangue e do tempo de coagulação sanguínea. Este risco é ainda maior se o indivíduo possui outros recursos de enfrentamento deficientes. (JACQUES & CODO, 2002) Da frustração emocional aos sintomas psicossomáticos são poucos passos: insônia, dores de cabeça, palpitações e hipertensão, além do abuso do álcool ou outras substâncias químicas e o aumento de conflitos tanto familiares quanto sociais. Rodrigues, (2000) observou que a amplitude do esforço mental (exigência cognitiva) requisitado por uma tarefa, influencia o estado psíquico e o comportamento do trabalhador. Tarefas que exigem uma grande sobrecarga física ou subcarga individual do trabalho (carga quantitativa) acarretam reações neuroendócrinas de estresse agudo, como a liberação de hormônios glicocorticóides e catecolaminas com efeitos negativos sobre o bem-estar, a satisfação no trabalho e a saúde. A dinâmica psíquica do indivíduo também sofre alterações. A dificuldade em lidar com a afetividade se traduz numa lógica depressiva em contraste com aquele perfil animado inerente ao inicio de carreira. O que antes impulsionava o profissional a agir, é substituída por uma inquietação, no sentido de reclamação. O sentimento presente é de que o mundo é mau porque nada que se faça parece ser o suficiente ou traz resultados. Enfim, tudo vai mal. (JACQUES & CODO, 2002) 5.3 Reação fisiológica ao estresse (Segundo FIAMONCINI & FIAMONCINI, 2008) O processo de estresse tem início com os receptores, que espalhados por todo o corpo captam as alterações no ambiente. Os sinais captados chegam até o tálamo cerebral, que repassa a mensagem ao hipotálamo. Este libera uma substância chamada CRF (Fator Liberador de Corticotrofina), que estimula a glândula hipófise a liberar ACTH (Hormônio Adenocorticóide). O principal destino do ACTH são as glândulas supra-renais que passam a distribuir diferentes substâncias químicas para diferentes destinos, como a adrenalina, os mineralocorticóides e os glicocorticóides, todos com o objetivo de estimular o organismo para "luta ou fuga", desencadeando assim os sintomas referentes ao estresse. 29 Aumento dos batimentos cardíacos e conseqüentemente elevação momentânea da pressão arterial, são as manifestações básicas do estresse agudo, ativado pela ação da adrenalina e noradrenalina via Sistema Nervoso Simpático. Já no estresse crônico, a pressão arterial se mantém elevada, tornando a pessoa hipertensa, e as conseqüências desse estado podem ser o acidente vascular encefálico (AVE), ruptura de aneurismas ou mesmo parada cardíaca. Este efeito hipertensivo do estresse crônico é mediado pela liberação continuada de cortisol pelo córtex suprarenal (OLIVEIRA, 1996). Segundo Fiamoncini & Fiamoncini (2008), o cortisol atua no metabolismo dos carboidratos, proteínas e gorduras. Quando a pessoa está sob um alto nível de estresse, a adenohipófise (componente do sistema endócrino que produz vários hormônios peptídeos reguladores de vários processos fisiológicos, entre os quais o estresse, o crescimento e a reprodução) ativa, por meio da corticotrofina (ACTH), a produção de cortisol, que atua no auxílio de tecidos lesados, diminuindo o estresse. Porém, o aumento de cortisol inibe a produção de proteínas, o que explica o malestar físico que sentimos durante o estresse. Em uma primeira fase, nossos músculos se contraem, o coração e os pulmões aumentam o ritmo de funcionamento, o estômago interrompe a digestão dos alimentos, a pressão arterial aumenta, a circulação do sangue é desviada predominantemente para os músculos e para o encéfalo, e mais substratos (glicose e ácidos graxos) são colocados na circulação para produzir energia para a contração muscular. Essa primeira fase depende essencialmente da ação da adrenalina e é referida como a preparação para luta ou fuga. (FIAMONCINI & FIAMONCINI, 2008) Depois de 10 minutos, e persistindo a situação de estresse, o organismo entra numa segunda fase, onde são liberados os hormônios glicocorticóides (cortisona, cortisol e corticosterona). Essas substâncias em dose adequadas estimulam o centro nervoso da memória e da aprendizagem, mas quando produzidos em grande quantidade, como nos casos de estresse crônico, são prejudiciais à saúde, diminuindo a ação do sistema imunológico e tornando o organismo mais vulnerável a infecções (Nahas, 2001). 30 A reação fisiológica é acompanhada de sintomas psíquicos e comportamentais, que tomam formas diferentes, de acordo com cada indivíduo (Ururahy & Albert, 1997). Quando nos deparamos com uma situação de estresse, nossas reações seguem um padrão descrito por Selye (1936), chamado de Síndrome Geral de Adaptação, que, consiste em três fases: Reação de Alarme Fase de Resistência Fase de Exaustão A Reação de Alarme assemelha-se à Reação de Emergência de Cannon, célebre fisiologista americano responsável pelo desenvolvimento das noções de homeostase. Cannon percebeu que, quando um animal era submetido a estímulos ameaçadores, o seu equilíbrio orgânico, inclusive medo, fome, dor e raiva, apresentavam uma reação que ele denominou de Emergência, em que o animal se preparava para luta ou para fuga. 1ª Fase= Reação de Alarme Aumento da freqüência cardíaca Aumento da Pressão Arterial Aumento da Concentração de Glóbulos Vermelhos Redistribuição do Sangue Aumento da Freqüência Respiratória Dilatação dos Brônquios Dilatação das Pupilas Aumento da Concentração dos Glóbulos Brancos Ansiedade Aumento da concentração de açúcar no sangue Quadro 1. Principais alterações fisiológicas da Fase de Alarme- França & Rodrigues, 1999 Após esta primeira fase, segue-se outra, a de Resistência, caso o agente estressor mantenha sua ação; a duração desta fase depende da intensidade do estresse e da adaptabilidade (inata ou desenvolvida) do indivíduo. 31 2ª Fase= Fase da Resistência Aumento do córtex da supra renal Ulcerações do aparelho digestivo Irritabilidade Insônia Mudanças no humor Diminuição do desejo sexual Atrofia de algumas estruturas relacionadas à produção de células do sangue Quadro 2. Principais alterações fisiológicas da Fase de Resistência - França & Rodrigues,1999. A 3ª Fase, a de Exaustão, representa muitas vezes a falha dos mecanismos de adaptação; há, em parte, um retorno à fase de alarme e, posteriormente, se o estímulo estressor permanecer potente, o indivíduo pode morrer. 3ª Fase= Fase da Exaustão Retorno Parcial e breve à Reação de Alarme Falha dos mecanismos de adaptação Esgotamento por sobrecarga fisiológica Morte do indivíduo Quadro 3. Principais Alterações Fisiológicas da Fase de Exaustão - França & Rodrigues, 1999 Nesta 3ª fase, da Exaustão, começam a aparecer: afecções da mucosa bucal (aftas), herpes, gripes e resfriados, dores no corpo, tensão muscular, irritação, falta de concentração, insônia, falta ou excesso de apetite, são alguns sintomas que podem estar associados a situações de estresse. Mantendo-se níveis altos de estresse por muito tempo, problemas mais sérios podem ocorrer de dores de cabeça e problemas de relacionamento até doenças graves (NAHAS, 2001). Os níveis de tolerância ao estresse, são diferentes para cada indivíduo. Pessoas com limites maiores possuem maior resistência a ele. Porém, ao serem submetidos à tensão constante e crescente, tendem ao desgaste, o que significa que corpo e mente adoecem. Quanto melhor for a reação de um indivíduo ao estresse, menos sintomas físicos relacionados a ele ocorrerão (DELBONI, 1997). 32 6 BURNOUT: UMA CRONIFICAÇÃO DO ESTRESSE Herbert J. Freudenberger lançou o termo Burnout em 1975, seguido de Maslach em 1976. Estes primeiros trabalhos pioneiros tiveram como foco principal a exaustão emocional (detalhada nos próximos capítulos), a fadiga e a frustração em profissionais, decorrentes, ou do desgaste resultante do contato com as pessoas, ou da não satisfação das expectativas e projetos que o indivíduo tem em relação à profissão. (RODRIGUES, 2000) Borges et. al (2002) por outro lado citam o pioneirismo do estudo de Burnout iniciado por Freudenberger em 1974 em meio a estudos sobre o estresse. A partir daí, os estudos foram tornando-se numerosos, sendo que a partir da década de 80 observase o desenvolvimento conceitual focando a evolução dos fenômenos nas categorias profissionais que envolvem o cuidado com o outro, como profissionais da saúde e educação. A partir da década de 80, como aponta Rodrigues (2000), Burnout deixou de ser considerado um campo isolado de pesquisa e incorporou-se a imensa área de estudos sobre estresse, diferenciando-se das demais por estar relacionada ao trabalho dentro de uma perspectiva psicossocial. Benevides-Pereira (2002) em seu estudo mostra outras denominações para Burnout: Alguns autores preferem a manutenção do termo estresse e, para diferenciá-lo de Burnout, o denominam estresse profissional tendo este, o caráter do trabalho assim como estresse laboral, para demonstrar que não se trata de uma síndrome específica, mas um tipo de estresse que se dá no contexto do trabalho. Outros vão mais além, denominando estresse laboral assistencial, como típica de algumas profissões, aquelas que exigem um contato mais próximo com as pessoas, com o cuidado. Estresse Ocupacional tem sido empregado para salientar que não seria propriamente o trabalho ou a profissão responsáveis pelos transtornos, mas o tipo de atividade desempenhada. 33 Burnout pode ser encontrado no Dicionário Michaelis (1998), originado pelas palavras do inglês burn: (queimar, arder, ascender, destruir pelo fogo, ferir, cauterizar, corroer, dissipar) e out (1.subst.masc.: saída, espaço; 2. adj.: ausente, remoto, apagado, desligado, terminado; 3.adv.: fora, sem, extinto, apagado). O termo Burnout é uma composição de burn = queima e out = exterior, sugerindo assim que a pessoa com esse tipo de estresse consome-se física e emocionalmente, passando a apresentar um comportamento agressivo e irritadiço. Tal definição aproxima-se da mencionada pelo JORNAL DESTAK (2008): Burnout em português significa “combustão completa”, caracterizando-se pelo comportamento autodestrutivo, ou seja, o trabalhador “violenta” sua saúde devido a insatisfações no trabalho. É o grau mais alto do estresse. Para França & Rodrigues apud Jacques & Codo (2002), contrariando o termo “out”, apresenta Burnout como uma “queimadura interna”, constituindo-se no desgaste do indivíduo na luta constante pelo sucesso para satisfazer os ideais de excelência determinados pela sociedade. Considera também a síndrome como uma das principais conseqüências do estresse profissional, se aproximando de Maslach & Jackson apud Jacques & Codo (2002) que definem Burnout como uma reação à tensão emocional crônica gerada a partir do contato direto e excessivo com outros seres humanos, particularmente quando estes estão preocupados ou com problemas. Segundo Benevides-Pereira (2003), O Burnout é a resposta a um estado prolongado de estresse, ocorre pela cronificação deste, quando os métodos de enfrentamento falharam ou foram insuficientes. Enquanto o estresse pode apresentar aspectos positivos ou negativos, o Burnout tem sempre um aspecto negativo estando sempre relacionado com o mundo de trabalho gerando uma alteração de comportamento em dimensão social e inter-relacional. O trabalhador pode apresentar a sensação de estar “queimado”, “desgastado”, “consumido” e apresentando entre suas principais características a despersonalização, a exaustão emocional e redução da realização profissional. 34 Os diferentes autores que defendem a Síndrome de Burnout como sendo diferente do estresse, alegam que esta doença envolve atitudes e condutas negativas com relação aos usuários, clientes, organização e trabalho, enquanto o estresse apareceria mais como um esgotamento pessoal com interferência na vida do sujeito e não necessariamente na sua relação com o trabalho. Entretanto, julga-se, que a Síndrome de Burnout seria a conseqüência mais depressiva do estresse desencadeado pelo trabalho. Como estudou Benevides-Pereira (2002), a expressão “estar queimado” é utilizada coloquialmente por espanhóis, que faz mais sentido do que no português, em que tal jargão não possui esta conotação. Entre estudos brasileiros, podemos encontrar a expressão Neurose Profissional ou Neurose por Excelência, denominando os transtornos psíquicos agregados ao trabalho. Há também a expressão Síndrome de Esgotamento Profissional em referência ao Burnout, contudo Maslach, Schufeli & Leiter apud Benevides-Pereira (2002), advertem que o esgotamento é apenas um dos fatores desta síndrome, não considerando os aspectos sociais envolvidos. A Síndrome de Burnout também encontrada como Síndrome do esgotamento profissional / estafa por Ferreira (2000), é um dos tipos mais insidiosos no trabalho. Caracterizada pela exaustão emocional, despersonalização e sentimento de pouca realização e satisfação pessoal, ocorrendo frequentemente em profissões de ajuda (enfermeiras, assistentes sociais, médicos, psicólogos). Contudo, cita também a ocorrência em executivos, embora qualquer um que faça um trabalho tedioso, sob pressão, cujas exigências são grandes e as recompensas pequenas, possa sofrer Burnout. Glina e Jardim (2000, p.40) também preferem utilizar o termo Burnout como Síndrome de Esgotamento Profissional como um “tipo de resposta prolongada a estressores emocionais e interpessoais crônicos do trabalho”. O trabalhador antes muito envolvido afetivamente com o trabalho e pessoas relacionadas a este, desgasta-se, e, em dado momento, desiste, perde a energia ou “queima completamente”, perdendo o sentido de sua relação com o trabalho, desinteressa-se e qualquer esforço parece inútil. 35 No Brasil, a Lei 3048/99, de 6 de maio de 1996, que dispõe sobre a Regulamentação da Previdência Social, ao referir aos transtornos mentais e do comportamento relacionados ao trabalho (Grupo V da CID-10), no inciso XII aponta a (“Síndrome de Esgotamento Profissional”, “Síndrome de Burnout” (Z73.0). como doença de trabalho, síndrome esta entendida como sensação de estar acabado. (BENEVIDES-PEREIRA, 2002) Glina e Jardim (2000) por outro lado citam que consta no CID-10 como “Síndrome de Burnout” ou “Esgotamento Profissional”, como na seção “problemas relacionados ao emprego ou desemprego: Ritmo de trabalho penoso (Z56.3); ou “Circunstância relativa às condições de trabalho”. Embora as colocações das autoras não sejam unânimes em relação ao CID-10 (2008), é consenso de que a Síndrome é classificada como doença relacionada ao trabalho, seja ele por um trabalho penoso, ou com má organização do trabalho ou mesmo voltada a pouca auto-estima ou autonomia do trabalhador. Diante destas definições, podemos ver as disparidades encontradas na nomeação e classificação da Síndrome o que pode refletir inclusive na dificuldade do estabelecimento de um diagnóstico. Observamos também que dentre os termos utilizados por diversos autores, estes apresentam de forma parcial a síndrome, o que poderia levar à equívocos. Contudo, não se encontrou a necessidade também de adicionar mais uma expressão a esta que já oferece uma diversificada nomenclatura existente, o que tem levado mais a dificuldades do que a esclarecimentos. Neste trabalho, o termo “Burnout” será mantido por não haver uma palavra em português que represente o conceito desta síndrome envolvendo todas as suas características. 36 6.1 Concepções Teóricas A literatura apresenta diversas definições, concepções e modelos explicativos, propiciando diferentes enfoques sobre como a Síndrome se desenvolve sendo que, dentre eles, há a dificuldade de se estabelecer um consenso entre os autores. Gil Monte & Peiró apud Borges et al. (2002), definiram Burnout a partir de duas perspectivas de conceituação: a clinica e a psicossocial. Benevides-Pereira (2002) por sua vez, divide em três diferentes perspectivas: clinica, sócio-histórica e sóciopsicológica.Nestas diferentes concepções podemos encontrar diferentes visões sobre Burnout: É um estado ou um processo? Uma doença ou uma disfunção? Como apontam os autores, esta resposta dependerá de cada uma das concepções: A concepção Clínica: Gil Monte & Peiró apud Borges et al. (2002) refere esta concepção como a pioneira: define a Síndrome de Burnout como um estado relacionado às experiências de esgotamento, decepção e perda do interesse pelo trabalho. Tal esgotamento resultaria na persistência de um conjunto de expectativas inalcançáveis. Nestes termos, a etiologia da Síndrome teria como causas principais aspectos individuais. Já Benevides-Pereira (2002), considera a Síndrome como um estado e não um processo, como estuda o psicanalista Freudenberger (1974). Nesta perspectiva Burnout é caracterizado como um conjunto de sintomas (fadiga física e mental, falta de entusiasmo pelo trabalho e pela vida, sentimento de impotência e inutilidade, baixa auto-estima), podendo levar o profissional à depressão e até mesmo ao suicídio. Jacques & Codo (2002), a partir de uma perspectiva clínica, definem o Burnout como um estado de exaustão resultante de trabalho extenuante onde é deixado de lado as necessidades do sujeito. A concepção Sócio-Histórica: Esta vertente prioriza mais o papel da Sociedade, cada vez mais individualista e competitiva do que os fatores pessoais e institucionais. Sendo assim, ocupações 37 voltadas para a ajuda e o desenvolvimento do próximo são comuns de uma perspectiva comunitária e incompatível com os valores predominantes na sociedade atual. (CARLOTTO, 1999) A Concepção Sócio-Psicológica: As psicólogas Christina Maslach e Susan Jackson (1977) evidenciam as variáveis sócio-ambientais como coadjuvantes do processo de desenvolvimento do Burnout. Desta forma, os aspectos individuais junto às condições e relações do trabalho formam um todo que propicia o aparecimento dos fatores multidimensionais da Síndrome: a Exaustão Emocional, a Despersonalização e a Reduzida Realização Profissional, que serão estudados posteriormente nos capítulos adiante. Já a abordagem psicossocial, como definem Gil Monte & Peiró apud Borges et al. (2002), mostra que o Burnout como processo, se desenvolve na interação de características físicas do ambiente e características individuais. Nesta perspectiva, incluem-se maior atenção aos profissionais voltados ao cuidado com o outro, exigindo freqüentes mudanças emocionais. Esta concepção tem sido a perspectiva mais aceita e compartilhada pela maioria dos autores, como mostra BenevidesPereira (2002), sendo por este motivo a adotada neste trabalho e estudada mais detalhadamente. A concepção Organizacional: Baseado na Teoria das Organizações, para Golembbiewski, Hiller e Dale (1987), Burnout é uma conseqüência de um desajuste entre as necessidades apresentadas pelo trabalhador e os interesses da instituição. Chernis (1980) considera os agentes estressores organizacionais como desencadeantes do processo de Burnout, sendo que a Despersonalização, Exaustão Emocional e Reduzida realização no trabalho tratam-se de mecanismos de enfretamento. De uma maneira geral, todos os autores reconhecem a importância do papel desempenhado pelo trabalho, assim como a dimensão social relacionada à Síndrome de Burnout. As referidas revisões pelos diferentes autores demonstram uma tendência a incluir na etiologia do desenvolvimento aspectos amplos como a cultura organizacional e valores humanos. 38 6.2 Sintomas Apresentados na Síndrome de Burnout “Funcionário em geral se irrita com freqüência, alternando momentos de agressividade e depressão. Só reclama da vida e acha que tudo vai dar errado. Vive exausto e não se envolve com os projetos da empresa. Fica exausto o tempo todo, sempre pronto a explodir ou chorar”. (JORNAL DESTAK, 2008, P. 4) Segundo o JORNAL DESTAK (2008), em pesquisa realizada pela Isma-BR pela psicóloga-diretora Ana Maria Rossi, os sintomas mais comuns entre os mil profissionais participantes foram: exaustão, irritabilidade, falta de concentração e dificuldade no relacionamento. A pesquisa mostra inclusive que 47% dos funcionários com Burnout também demonstram sintomas depressivos. Na literatura, podemos encontrar uma lista extensa de diversos sintomas associados ao Burnout (Barona; Calvete & Villa; Cooper; Forney, Walace-Schutsman & Wiggers; Freundenberger ; Harris; Looney; MacEwen & Barling; Maslach & Leitter; Rosemann, apud Benevides-Pereira, 2002). Estes, subdividem-se em Sintomas Físicos, Psíquicos, Comportamentais e Defensivos: 6.2.1 Sintomas físicos Fadiga Constante e Progressiva: a sensação de falta de energia é o sintoma mais referido na literatura e pela maioria das pessoas acometidas pelo Burnout. Muitas vezes, as pessoas relatam acordarem cansadas e sem ânimo para nada, mesmo após uma longa noite de sono. Dores Musculares ou Osteomusculares: as mais freqüentes são dores na nuca e ombros. As dores na coluna cervical e lombar também apresentam alta incidência, sendo comum os trabalhadores sentirem-se “travados” por dias. Distúrbios do sono: sono agitado, pesadelos. Mesmo com o sentimento das pálpebras pesadas e cansaço constante, a pessoa tem dificuldades em conciliar o sono ou dorme imediatamente, acordando poucas horas depois e permanecendo acordada. 39 Cefaléias, enxaquecas: em geral, as dores de cabeça são do tipo tensional. Há relatos desde o latejar das têmporas até as dores persistentes e intensas em que a pessoa não suporta ouvir o mínimo de som ou luz. Perturbações Gastrintestinais: podem ter intensidade que variam desde uma “queimação” até a gastrite e úlcera. São referidos também: náuseas, diarréias e vômitos, além da perda do apetite que pode levar a um emagrecimento considerável enquanto outros podem apresentar um aumento no consumo de alimentos, tendo conseqüência oposta. Imunodeficiência: diminuição da capacidade de resistência física, favorecendo resfriados ou gripes constantes, afecções na pele como pruridos, alergias, herpes, queda de cabelo, aparecimento ou aumento de cabelos brancos. Transtornos cardiovasculares: há desde relatos na literatura de hipertensão arterial, palpitações, insuficiência cardiorespiratória, até mesmo enfartos e embolias. Disfunções sexuais: diminuição do desejo sexual, dores nas relações e anorgasmia (no caso das mulheres) e ejaculação precoce ou impotência (no caso dos homens). Alterações menstruais nas mulheres: atraso ou até suspensão da menstruação. 6.2.2 Sintomas psíquicos Falta de atenção e concentração: a pessoa demonstra dificuldade em concentrar-se no que está fazendo, parecendo “distante”. Muitas vezes, sua atenção é “seletiva”, concentrando-se por poucos instantes quando o assunto é de seu interesse, mas voltando ao estado anterior em seguida. Alterações de memória: tanto a memória de evocação quanto de fixação é prejudicada. Apresenta lapsos de memória interrompendo sua atividade por não lembrar o que e para quê estava fazendo com a sensação de “O que foi mesmo que vim fazer aqui?” Lentificação do Pensamento: os processos mentais e o tempo de resposta do organismo tornam-se mais lentos. 40 Sentimento de alienação: a pessoa sente–se distante e não pertencente ao ambiente ou ao grupo em que está inserida, como se nada tivesse a ver com ela, como se fosse irreal. Sentimento de solidão: muitas vezes devido o sentimento anterior, a pessoa sente-se só e não compreendida pelos demais. Impaciência: há uma constante pressão no que diz respeito a tempo, sentindo que o tempo é sempre menor do que gostaria. Torna-se, portanto, intransigente com atrasos e a espera passa a ser insuportável. Sentimento de Impotência: há a sensação de que nada é capaz de fazer para alterar sua atual situação, sentindo-se vítima de algo superior às suas capacidades. Labilidade emocional: ocorrem constantes mudanças de humor. Em um momento pode estar bem e rindo, passando a um estado de tristeza ou agressividade em pouco período de tempo, por vezes sem motivo aparente ou por algum evento aparentemente insignificante. Dificuldade de auto-aceitação, baixa auto-estima: sente-se distante da imagem idealizada e da percepção de si e seus ideais perto do que vem se apresentado. Com isso, tem a sensação de insuficiência, fracasso, deteriorando sua auto-imagem. Astenia, desânimo, disforia, depressão: realizar uma atividade, mesmo de pouca complexidade, é sempre custosa. Há um decréscimo do estado do ânimo, perda do entusiasmo, levando à disforia que, sem a devida intervenção, pode evoluir para uma depressão. Desconfiança, paranóia: sentimento de não poder contar com os demais, de que as pessoas aproveitam de si e de seu trabalho, recebendo muito pouco ou nada em troca. Por vezes, esta desconfiança leva à paranóia, crendo que os demais armam situações para prejudicá-lo intencionalmente. 3.2.3 Sintomas comportamentais Negligência ou escrúpulo excessivo: como há dificuldade de atenção, pode negligenciar certos cuidados ocupacionais, podendo causar ou ser vítima de acidentes. Outros, ao perceber esta dificuldade, passam a ser mais detalhistas, lentificando suas atividades para evitar equívocos. Pode também haver a tendência de voltar a rever várias vezes o que já foi realizado. 41 Irritabilidade: demonstra pouca tolerância com demais pessoas, perdendo com rapidez a paciência. No caso das pessoas que dormem mal, esse sintoma é comum e tende a aumentar com o tempo. Incremento da agressividade: apresenta dificuldade em se conter, apresentando comportamento agressivo e hostil mesmo que o evento desencadeante não seja de grande importância. Incapacidade para relaxar: apresenta o tônus constantemente rígido, inclusive em situações prazerosas, está sempre em alerta, como se a qualquer momento algo pudesse acontecer. Não consegue descansar ou tirar férias, sendo que mesmo quando se propõe a descansar, não consegue parar o curso intenso do pensamento. Dificuldade na aceitação de mudanças: demonstra dificuldade em aceitar e se adaptar a novas situações, pois isso demandaria um investimento de energia que não dispõe mais. O comportamento torna-se mais rígido, estereotipado. Perda da Iniciativa: também decorrente do sintoma anterior, a pessoa prefere situações rotineiras, conhecidas, evitando tomar iniciativas que lhe exigiriam doses extras de energia, seja esta física ou mental. Aumento do consumo de substâncias: há uma tendência ao aumento do consumo de álcool, ou mesmo do “cafezinho”, tranqüilizantes, cigarros, substâncias lícitas ou até mesmo ilícitas. Comportamento de alto risco: pode vir a buscar atividades de alto risco, procurando sobressair, de forma a minimizar o sentimento de insuficiência. Alguns autores citam tratar-se de uma manifestação inconsciente no intuito de dar fim à vida, que vem sendo sentida como tão conturbada. Suicídio: existe maior incidência de casos de suicídios em profissionais da área da saúde do que na população em geral. 3.2.4 Sintomas defensivos Tendência ao isolamento: seja pela sensação do fracasso, pela não-aceitação da situação como vem se apresentando ou pelo sentimento de que os outros (clientes, colegas) é que são os responsáveis pela atual circunstância, o que tende ao distanciamento como forma a amenizar a influencia destes e a percepção de insuficiência. 42 Sentimento de onipotência: ainda para compensar o sentimento de frustração e incapacidade, alguns reagem passando a imagem de auto-suficiência. Perda de interesse pelo trabalho (ou até pelo lazer): toda a demanda de energia passa a ser custosa, principalmente quando se atribui a esta atividade que vem sentindo. Absenteísmo: significa a falta ao trabalho, ou ainda, ausência no serviço por inúmeros motivos: propositais ou por circunstâncias alheias à vontade do trabalhador. Enquanto sintoma defensivo, passa a ser uma trégua, um alívio na tentativa de minimização dos transtornos sentidos. Ímpetos de abandonar o trabalho: a intenção de abandonar o trabalho ou mudar de atividade passa a ser uma alternativa cada vez mais cogitada e, em alguns casos, concretizada. Ironia, cinismo: são comuns estas atitudes tanto para com os colegas como em relação às pessoas a quem o profissional presta serviços (clientes). Funciona como uma “válvula de escape” de seus sentimentos de insatisfação e hostilidade para com os demais, na medida em que atribui aos outros as sensações de mal estar que vem experimentando em seu trabalho. 43 Resumo Esquemático da sintomatologia do Burnout apresentado por BenevidesPereira (2002, p.44) SINTOMATOLOGIA DO BURNOUT Físicos Comportamentais Fadiga constante e progressiva Negligência ou excesso de escrúpulos Distúrbios do sono Irritabilidade Dores musculares e osteomusculares Incremento da agressividade Cafaléias, enxaquecas Incapacidade para relaxar Perturbações gastrointestinais Dificuldade na aceitação de mudanças Imunodeficiência Perda de iniciativa Transtornos cardiovasculares Aumento no consumo de substâncias Distúrbios do sistema respiratório Comportamento de alto risco Disfunções sexuais Suicídio Alterações menstruais nas mulheres Psíquicos Defensivos Falta de atenção, de concentração Tendência ao isolamento Alterações de memória Sentimento de onipotência Lentificação do pensamento Perda do interesse pelo trabalho (e até lazer) Sentimento de alienação Absenteísmo Sentimento de solidão Ironia, cinismo Impaciência Sentimento de insuficiência Baixa auto-estima Labilidade emocional Dificuldade de auto-aceitação Astenia, desânimo, disforia, depressão Desconfiança, paranóia 44 6.3 Fatores Multidimensionais da Síndrome Benevides-Pereira (2002) cita que a visão do Burnout como um processo multidimensional é compartilhada pela maioria dos autores, mas a diferença está na ordem do aparecimento de cada uma das dimensões no desenvolvimento do processo. Jacques & Codo (2002) mencionam que, além do desgaste físico, outros sintomas podem ser encontrados assim como Maslach & Jackson apud Jacques & Codo (2002): 6.3.1 Exaustão emocional Benevides-Pereira (2002) refere o sintoma à sensação de esgotamento tanto físico como mental, ao sentimento de não dispor mais de energia para absolutamente nada, ou seja, de ter chegado o limite das possibilidades. Maslach & Jackson apud Jacques & Codo (2002) relacionam tal esgotamento de energia e dos recursos emocionais próprios devido ao contato diário com problemas. Tal definição voltada à falta de energia se aproxima da definição de Rodrigues (2000, p105), que inclusive amplia os prejuízos para fora do trabalho: “[...] o profissional se sente esgotado, com pouca energia para fazer frente ao dia seguinte de trabalho e a impressão que ele tem é que não terá com recuperar estas energias. Este estado de carência de energia costuma deixar os profissionais pouco tolerantes, facilmente irritáveis, ‘nervosos’, ‘amargos’ no ambiente de trabalho e fora dele, com familiares e amigos”. Jacques & Codo (2002) relacionam o sintoma com aparecimento de cansaço, irritabilidade, propensão a acidentes, sinais de depressão e/ou ansiedade, susceptibilidade a doenças, abuso de álcool cigarros e outras drogas; Os mesmos autores salientam ainda a condição daqueles que tem a profissão voltada ao trabalho: “A tensão entre a necessidade de estabelecimento de um vínculo afetivo e a impossibilidade de concretizá-lo é uma característica estrutural dos trabalhos que envolvem cuidados”. 45 O sentimento de exaustão emocional vem do desgaste provocado por essa tensão. Muitas vezes, o esgotamento pode ser visto quando o profissional, mesmo querendo, percebe que já não pode dar mais de si. Sofre e nesta ação se sente totalmente exaurido emocionalmente. O desgaste diário ao qual é submetido no relacionamento com seus clientes, chefes ou colegas de trabalho é grande. (JACQUES & CODO, 2002). 6.3.2 Despersonalização Jacques & Codo (2002) citam o sentido sociológico do termo, correspondendo a uma atividade insensível em relação às pessoas do convívio no trabalho. A despersonalização ocorre quando o vínculo afetivo é substituído por um vínculo racional. O trabalho passa a ser lido pelo seu valor de troca, é a “coisificação” do outro ponto da relação, ou seja, o paciente sendo tratado como objeto, forma fria. Maslach & Jackson apud Jacques & Codo (2002) também citam o desenvolvimento de sentimentos e atitudes negativas e de cinismo às pessoas destinatárias do trabalho (clientes) num endurecimento afetivo; “coisificação” da relação. Como aponta Rodrigues (2002), há um distanciamento emocional evidenciado pela frieza, indiferença diante das necessidades dos outros e insensibilidade. Os contatos com as pessoas são impregnados por uma visão e atitudes negativas, frequentemente desumanizados. Benevides-Pereira (2002) por outro lado, ressalta que não significa que o indivíduo perdeu sua personalidade, mas que esta sofreu ou vem sofrendo modificações, levando o profissional a um contato frio e impessoal com os usuários de seus serviços (pacientes, alunos, clientes, entre outros), passando a denotar atitudes de cinismo e ironia em relação às pessoas e indiferença ao que pode acontecer aos demais. 46 6.3.3 Diminuição da realização profissional Jacques & Codo (2002) relatam a diminuição da realização e da produtividade profissionais como fatores de Burnout. Baixo envolvimento/realização pessoal no trabalho ocorre nesta relação afeto-trabalho, com a perda do investimento afetivo. Não conseguir atingir os objetivos os quais o profissional se propõe, pode trazer um sentimento de impotência, incapacidade pessoal para realizar algo. Segundo Borges et al. (2002), refere-se à percepção de deteriorização da auto-competência e falta de satisfação com as realizações e os sucessos de si próprio no trabalho. É comentada por Maslach & Jackson apud Jacques & Codo (2002) como Falta de desenvolvimento pessoal no trabalho: tendência de uma “evolução negativa” no trabalho, afetando a habilidade para realização do trabalho e o atendimento, ou contato com as pessoas usuárias do trabalho, bem como a organização. A Reduzida Realização Profissional, como denomina Benevides-Pereira (2002), evidencia o sentimento de insatisfação com as atividades laborais que vem realizando, baixa auto-estima, fracasso profissional, desmotivação, revelando baixa eficiência no trabalho, sendo que por vezes, o trabalhador apresenta ímpetos de abandonar o emprego. Rodrigues (2000) cita que diante da despersonalização e da exaustão emocional, a realização profissional fica extremamente comprometida e todas suas conseqüências podem trazer sentimento de decepção e frustração, queda da autoestima, podendo chegar à depressão. A Síndrome de Burnout acaba por manifestarse principalmente nas áreas que as pessoas acreditam ser as mais promissoras para suas realizações (FREUNDEMBERGER APUD RODRIGUES, 2000). Diante desses fatores, o trabalhador que entra em Burnout sofre com ansiedade, melancolia, baixa auto-estima, sofrimento de exaustão física e emocional, comprometendo suas relações afetivas e sociais e sua vida. Quando está em casa, pensa no trabalho e quando está no trabalho não vê a hora de sair daquela sensação de impotência. 47 6.4 Facilitadores e Desencadeantes da Síndrome de Burnout Gil-Monte e Peiró apud Borges et al. (2002) ao apresentarem a etiologia da Síndrome, definem os facilitadores como as variáveis de caráter pessoal que têm uma função facilitadora ou inibidora da ação dos estressores sobre o indivíduo enquanto os desencadeantes são os estressores percebidos como crônicos, no ambiente de trabalho. Já Benevides-Pereira (2002) não faz distinção entre facilitadores e desencadeantes do Burnout optando por nomear ambos conceitos numa única definição. Vários estudos têm sido realizados buscando a etiologia para a Síndrome de Burnout, dentre elas estão: 6.4.1 Características do trabalho Como aponta Ferreira (2000), a combinação das inovações tecnológicas e novos métodos gerenciais têm sido responsáveis pela intensificação do trabalho devido ao aumento do ritmo, responsabilidades e complexidade. Também contribuem para o envelhecimento precoce, o aumento de doenças cardiovasculares e outras doenças crônico-degenerativas, como os Distúrbios Oesteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) e um conjunto de sintomas na esfera psíquica, como a síndrome da fadiga crônica, síndrome de “Burnout”, outros distúrbios ainda desconhecidos, como a morte súbita por excesso de trabalho, por exemplo. Dejours apud Ferreira (2000), reconhece que a existência de agressões cumulativas no trabalho, em que se juntam ações tóxicas, ruídos intensos, trabalho repetitivo, com a duração e o conforto do transporte, qualidade da habitação, equilíbrio da dieta, entre outros podem interferir na saúde dos trabalhadores. As condições e organização do trabalho somam-se; As condições de vida intervêm no sentido de favorecer, ou frear a recuperação dos efeitos do trabalho sobre as capacidades de adaptação do indivíduo às agressões do ambiente. 48 Acrescentando os fatores organizacionais, Glina e Jardim (2000) complementam: o trabalho ocupa grande parte do tempo em que os trabalhadores estão em vigília. Jornadas de trabalho longas, com poucas pausas destinadas ao descanso e/ou refeições de curta duração e em locais desconfortáveis, turnos em trabalhos noturnos, ritmos intensos ou monótonos, controle do tempo através de máquinas, ou sob pressão de supervisores ou chefias, impedem que o trabalhador detenha controle do tempo sob seu trabalho, gerando quadros ansiosos, de fadiga crônica, distúrbios do sono, entre outros. Como aponta Benevides-Pereira, (2002), trabalhar sob intenso calor, frio, com ruídos excessivos, iluminação deficiente, ambiente com pouca higiene ou alto risco tóxico, interferem na saúde física e mental das pessoas, vinda gradativamente a apresentar os sintomas da síndrome. Benevides-Pereira (2002) pontua alguns aspectos relacionados à organização que podem interferir no desencadeamento de Burnout: Tipo de ocupação: a maioria dos autores concorda que, apesar de qualquer pessoa de qualquer área profissional poder desenvolver a síndrome, as profissões mais afetadas são aquelas relacionadas aos que ajudam, prestam assistência a outras pessoas tais como médicos, psicólogos, enfermeiros, professores, assistentes sociais, bombeiros, enfim, cuidadores em geral. Rodrigues (2000) salienta também que sujeitos que apresentam um grande número de horas no trabalho tendem a apresentar maiores índices de frustração e Burnout. Glina e Jardim (2000) citam também que os trabalhos que exigem altos níveis de atenção e concentração combinados com a pressão exercida especialmente pelas novas tecnologias de organização do trabalho, podem gerar tensão e outros sinais de ansiedade, favorecendo o Burnout. Tempo de profissão: neste aspecto ainda não há consenso entre autores: alguns acreditam que enquanto maior o tempo de trabalho, maior o desgaste através dos anos. Contudo outros acreditam que há maior incidência entre os que ingressam no mercado de trabalho (Rodrigues, 2000), por ver que suas expectativas ligadas à profissão não são atendidas. Além disso, pode ser 49 devido a pouca experiência na profissão (e imaturidade pela idade) e por não ter ainda desenvolvido formas de enfrentamento adequadas à situação.(OUBINA; SCHAUFELI APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Não há inclusive especificação dos autores quanto à mensuração do tempo considerado maior ou menor na profissão, que caracterize a predisposição para a Síndrome. Tempo na Instituição: Freudenberger apud Benevides-Pereira, (2002) afirma que a Síndrome começa a se manifestar a partir do primeiro ano na instituição, sendo que este tempo deve se agregar aos efeitos do tempo na profissão. Trabalhos por Turnos ou Noturnos: Segundo Peiró apud Benevides-Pereira (2002), 20% dos trabalhadores que trabalham em turnos e noturnos são afetados, acarretando diversos transtornos físicos e psicológicos. Estão mais propensos, aqueles que se submetem às trocas de turnos por períodos curtos de tempo, como a cada 2 ou 3 dias, alternando de período diurno para noturno e vice-versa. Sobrecarga e Subcarga: a sobrecarga tem sido uma das variáveis mais apontadas como causa de Burnout. Diz respeito à quantidade ou qualidade do trabalho cobrada de forma excessiva, que ultrapassam a capacidade de desempenho, por insuficiência técnica, de tempo ou de infra-estrutura organizacional. (MONTE & PEIRÓ; KUROWSKI BEGA & URDÁNIZ APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Peiró apud Benevides-Pereira (2002) salienta que o contrário também é prejudicial, sendo que poucas tarefas durante o dia, ou atribuição de tarefas simples, repetitivas, rotineiras e aborrecidas em relação às habilidades e capacidades do trabalhador também podem acarretar o estresse. Relação Profissional – Cliente: esta tem sido a variável mais referida entre os diversos autores. Quanto maior e próxima for a relação entre profissional e a pessoa que atende, maior a possibilidade de desenvolver Burnout. Entretanto, nem todos os estudos são unânimes quanto à quantidade de atendimento e sua influencia no desenvolvimento da Síndrome (FERNANDEZ & NUNES; KAHN APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Ao que tudo indica, características individuais permeiam este processo, já que Farber & Heifetz apud Benevides-Pereira (2002), apontam o fato de que alguns terapeutas 50 sentem-se exaustos após 4 a 6 pacientes atendidos (67%), enquanto outros depois de 7 a 8 (18,2%) e os 7,3% que sentem-se exaustos após 9 ou 10 pacientes no dia. Tipo de Cliente: como mostra Carlotto apud Benevides-Pereira (2002), algumas características relativas ao cliente e dos cuidados envolvidos podem favorecer o Burnout. O tipo de problema, natureza da relação entre eles, posição e reação do cliente podem afetar a pessoa que com ele trabalha bem como clientes multiqueixosos, agressivos, disfóricos, depressivos, grupos de risco ou que tentaram suicídios são tidos como difíceis e trazem maior desgaste ao profissional. (ACKERLEY, BURNELL, HOLDER & KURDEK, MASLACH APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). No entanto, segundo Schaufeli & Enzman apud Benevides-Pereira (2002) médicos relatam maior estresse diante de pressões do trabalho do que no contato com pacientes difíceis. Relacionamento entre colegas de trabalho: segundo Folkman apud Benevides-Pereira (2002), 60% dos eventos identificados como estressores num grupo de trabalhadores foram atribuídos ao relacionamento entre colegas de trabalho. Oubina apud Benevides-Pereira (2002,p.122) cita que “colegas que proporcionam apoio são um antídoto importante para os acontecimentos carregados de ansiedade, ao passo que colegas competitivos, distantes, excessivamente críticos ou preguiçosos somente contribuirão para piorar situações difíceis”. Conflito e ambigüidade de Papel: o conjunto de funções, expectativas e condutas que uma pessoa deve desempenhar, constitui seu papel específico como profissional. O conflito advém quando ocorre um embate entre as expectativas do trabalhador e o que os demais (colegas ou supervisores) esperam dele. A ambiguidade é decorrente de normas, diretrizes ou objetivos pouco delimitados ou claros na organização gerando um ambiente propício ao conflito. Quanto maior o conflito de papéis, maior a probabilidade do desencadeamento de Burnout. (GIL-MONTE & PEIRÓ; KUROWSKI; MASLACH APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Suporte organizacional: O suporte ou apoio organizacional é definido pelos colegas ou superiores e tem a ver com o sentimento de união, de que os demais estarão disponíveis para dar suporte uns aos outros, num clima de 51 respeito e consideração. Quanto menor o suporte sentido por um profissional, maior a possibilidade do desencadeamento de Burnout. (GIL-MONTE & PEIRÓ; KUROWSKI; SHAUFELI APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Satisfação no trabalho: não há concordância quanto à insatisfação do trabalho ser causa ou efeito do Burnout. O que pode ser afirmado com certeza é que há uma relação inversa, sendo que Burnout pode interferir na satisfação durante as atividades ocupacionais desempenhadas. (CARLOTTO APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Controle: diz respeito ao grau em que a pessoa pode controlar suas atividades ou os acontecimentos do trabalho que interferem no seu bemestar. Quanto maior for o nível de controle e participação nas decisões, maior a satisfação no trabalho e menores as chances de ocorrência de Burnout. (KUROWSKI; MASLACH & LEITER; SHAUFELI APUD BENEVIDESPEREIRA, 2002). Segundo o JORNAL DESTAK (2008), profissionais que têm muita responsabilidade e pouco controle para desenvolver suas atividades apresentam até 67% mais chances de adoecer. Responsabilidade: a categoria dos médicos são os que mais apontam esta característica como desencadeadora de Burnout. A responsabilidade pelo poder de manter a vida do outro, as conseqüências civis do erro médico bem como a cobrança por parte da população que exige maior atenção e tem menos indulgência com equívocos, são uma ameaça constante para estes profissionais. (VEGA & URDANIZ APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Pressão no Trabalho: estudos indicam que as pressões advindas do trabalho repercutem negativamente, favorecendo o aparecimento gradativo de exaustão emocional. (CARLOTTO; MASLACH; SHAUFELI APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Percepção de Iniqüidade: o sentimento de injustiça ou falta de igualdade nas relações laborais é fator relevante para o desencadeamento de Burnout. Esta desigualdade pode estar atrelada aos salários diferentes no mesmo cargo ou função, carga de trabalho, na ascensão por formas ilícitas ou direitos e deveres distintos dependendo da pessoa. (MASLACH & LEITE; MASLACH, SCHAUFELI & LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Falta de Feedback: segundo Garcia apud Benevides-Pereira (2002), a falta de retorno ou feedback quanto aos serviços realizados, tanto dos clientes 52 quanto dos colegas e funcionários também tem sido apontada como fator desencadeador de Burnout. Conflito com Valores Pessoais: muitas vezes o trabalhador entra em conflito com seus valores pessoais, com noções éticas e o profissional sente-se impelido de atuar em desacordo com seus princípios, gerando desconforto e mal estar. Em muitas situações os funcionários trabalham em ambientes maquiavélicos, em que os fins justificam os meios. A subseqüente erosão moral pode ser intensa. As pessoas dão o melhor de si quando acreditam no que estão fazendo e quando podem manter seu orgulho e seu amor próprio (MASLACH & JACKSON APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002; P. 65) 6.4.2 Características Organizacionais Por organização do trabalho, Dejours (1992) designa “a divisão do trabalho, o conteúdo da tarefa (na medida em que ela se deriva), o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações de poder, as questões de responsabilidade. Já Davis, apud Bresciani (1991) define como a "especificação do conteúdo, métodos e inter-relações entre os cargos, de modo a satisfazer os requisitos organizacionais e tecnológicos, assim como os requisitos sociais e individuais do ocupante do cargo". A organização do trabalho influencia diretamente no desenvolvimento da Síndrome como demonstram os autores. Organizações de trabalhos rígidas, onde a existência de um único modo de operação prescrito e imposto deixa poucas margens ao gerenciamento do sofrimento mental e à adaptação, são extremamente nocivas podendo levar à paralisação da atividade psíquica espontânea, à repressão do funcionamento psicológico [e consequentemente afetando o corpo físico]. Borges et al. (2002) citam Maslach e Leiter destacando como principais causas da Síndrome os seguintes aspectos organizacionais: o excesso de trabalho (em 53 quantidade e qualidade), a falta de controle, remuneração insuficiente, colapso da união, ausência de equidade e valores conflitantes. Os mesmos autores mostram que os seis aspectos destacados na etiologia da síndrome estão associados aos processos e estrutura na administração das organizações como: as definições de funções e objetivos, conduta de administração central, estilo de supervisão, processo de comunicação, avaliação de desempenho, políticas de saúde e segurança. Benevides-Pereira (2002) pontuou alguns dos aspectos organizacionais que podem facilitar o desenvolvimento de Burnout: Mudanças Organizacionais: alterações freqüentes de regras e normas confundem e predispõem o trabalhador a erros, além de deixá-los inseguros, com o sentimento de alienação e desvalorização quando não são devidamente informados e consultados das alterações e dos objetivos que envolvem as atividades. (CARLOTTO; MASLACH & LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Normas Institucionais: como cita Carlotto apud Benevides-Pereira (2002), normas rígidas impedem que os trabalhadores tenham flexibilidade para inovar ou sentir controle de suas atividades. Estudos mostram que normas e políticas bem definidas, aliadas a um fluxo de comunicação livre, estão associadas ao baixo nível de Burnout. Clima: o clima social implica em um ambiente em que o trabalhador sinta-se respeitado, confiante e consideração pelos outros. O clima laboral está diretamente associado à saúde organizacional. (GIL MONTE & PEIRÓ; KUROWSKI APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Burocracia: excessos de normas impedem a participação do trabalhador de forma autônoma, assim como a conseqüente tomada de decisões, emperrando as atividades que deveriam ser realizadas. Por outro lado, como mostra Vega & Urdaniz apud Benevides-Pereira (2002), despende-se tempo e energia na manutenção da burocracia, mais do que nas funções ocupacionais propriamente ditas. 54 Comunicação: Segundo Benevides-Pereira (2002), os estilos de comunicação de uma instituição podem desempenhar um papel importante. Uma comunicação direta e ágil pode garantir que não haja distorções da mensagem e permitam maior disseminação da informação. Autonomia: esta característica está relacionada ao controle e à possibilidade de tomadas de decisões com liberdade de ação e independência profissional, sem necessidade de consulta ou autorização de outrem. Em estudos de Correia apud Benevides-Pereira (2002), verificou-se que quanto maior for o comprometimento e autonomia envolvida na atividade, maiores os níveis de Realização Profissional e menores o de Despersonalização. Recompensas: o trabalhador pode sentir-se confuso ou desanimado quando não são claras as formas de ascensão a postos ou níveis hierarquicamente ou quando não há possibilidade disto na empresa. A baixa remuneração também tem sido apontada como variável importante bem como a desvalorização do trabalho realizado. (KUROWSKI; MASLACH & LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Segurança: Alguns ambientes de trabalho ou profissões predispõem o trabalhador a riscos físicos e de vida, quando o bom desempenho de suas funções podem vir a causar danos ou a morte como no caso de policiais, bombeiros e funcionários em hospitais. Atualmente, professores também têm trazido a dificuldade em trabalhar em periferias, onde convivem com ameaças e possíveis agressões, o que gera ansiedade, medo e impotência. (BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Glina e Jardim (2000) salientam que em geral, os fatores relacionados ao trabalho estão mais fortemente relacionados ao transtorno do que os fatores biográficos ou pessoais. Os mais importantes fatores no trabalho, predisponentes para a Síndrome são: papel conflitante, perda de controle ou autonomia e ausência de suporte social. Há também de se considerar entre os predisponentes de Burnout, o número insuficiente de funcionários para uma função ou com qualificação insuficiente, excesso de responsabilidade sem respaldo da autonomia para agir frente às situações inesperadas, bem como o contágio pelo contato com os colegas em Burnout. 55 6.4.3 Características pessoais Como aponta Gil-Monte & Peiró apud Benevides-Pereira (2002), as características pessoais não são necessariamente as causas do Burnout, mas sim facilitadoras da ação dos agentes estressores. Idade: Observa-se maior incidência em profissionais jovens, geralmente abaixo dos 30 anos. Alguns acreditam que este fato ocorra devido a pouca experiência e ao choque diante da dificuldade do trabalhador jovem em perceber que a realidade de seu trabalho é diferente da almejada. Há também os que acreditam tratar-se de uma crise diante das dificuldades de socialização diante de um novo grupo. (MASLACH, SCHAUFELI & LEITER; GONZÁLEZ APUD BENEVIDES-PEREIRA , 2002). Sexo: Não há um consenso sobre a maior incidência dos sexos para a Síndrome. Contudo, de um modo geral, as mulheres tendem a demonstrar maiores manifestações psicossomáticas, como aponta Rodrigues (2000). Mulheres também têm demonstrado maior pontuação em exaustão emocional e os homens em despersonalização. Tais diferenças podem estar ligadas aos papéis culturalmente aceitos, já que as mulheres têm uma liberdade maior em expressar suas angustias e sentimentos, ao passo que os homens tendem a demonstrar estes sentimentos somente quando o estresse chegou a um nível insuportável. A elevação de exaustão emocional para as mulheres pode estar relacionada à dupla jornada de trabalho, que a maioria se sujeita. (MASLACH, SCHAUFELI & LEITER; SCAUFELI; LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA , 2002). Nível Educacional: segundo Benevides-Pereira (2002) há maior incidência em pessoas que possuem um nível educacional mais elevado que nas de nível mais baixo. Maiores responsabilidades, maior nível de expectativas, atrelados a idéia de status e reconhecimentos podem justificar a maior incidência nos profissionais que gozam de nível superior. Estado Civil: Como mostram Burke & Greenglass, Leiter, Maslach, Shaufeli apud Benevides-Pereira (2002), pessoas casadas ou com um relacionamento afetivo estável tendem a apresentar menor propensão ao Burnout, ao passo que há maior tendência entre solteiros, viúvos ou divorciados. Contudo, 56 estudos apontam que não há interferência significativa entre os casos, sendo que também deve se avaliar a qualidade do relacionamento, bem como questões psicossociais e de idade no casal. (SCHAUFELI & ERZMANN, 1998). Por outro lado, Rodrigues (2000) cita que há maior incidência de ansiedade em profissionais em estado civil separado de seus cônjuges do que em solteiros. Filhos: O fato de ter ou não filhos, bem como o número destes também é variável. Vega & Urdaniz apud Benevides-Pereira (2002), afirmam que a paternidade equilibra o profissional, auxiliando com melhores estratégias de enfrentamento diante dos estressores. Personalidade: Como aponta Benevides-Pereira (2002), as variáveis apresentadas a seguir, interferem no desencadeamento de Burnout, uma vez que interagem de forma complexa com os agentes estressores: − Hardness, (a personalidade resistente ao estresse): como elaborado por Kobasa apud Benevides-Pereira, (2002), é a capacidade de algumas pessoas em interpretar os agentes estressores como passivos de controle e que permitam um desafio, ou seja, que representam uma oportunidade para o desenvolvimento de experiências que possibilitam o crescimento pessoal. Três dimensões envolvem esta personalidade: o Comprometimento e envolvimento em tudo o que se faz, sentindo que mantém sempre o controle da situação, e mesmo diante de adversidades, demonstra-se disposto para mudanças para encarar como um desafio. Estes aspectos em conjunto demonstram, que pessoas com personalidade resistente têm menor propensão ao Burnout. − Lócus de Controle: O lócus de controle externo está associado à capacidade da pessoa em atribuir os acontecimentos da vida à sorte ou ao destino e têm maior probabilidade de sofrer de Burnout; Ao contrário, de pessoas que possuem lócus de controle interno, isto é, que atribui aos seus esforços, o sucesso de sua vida. (GIL MONTE & PEIRÓ; KUROWSKY; SCHAUFELI & ENZMANN APUD BENEVIDES-PEREIRA , 2002). − Padrão de Personalidade Tipo A: Como cita Benevides-Pereira (2002), são as pessoas mais competitivas, esforçadas, com estilo de vida em função do tempo, com excessiva necessidade de controle e dificuldade em tolerar frustração. 57 − Variáveis do “self” – auto-estima, autoconfiança e auto-eficácia: Estes conceitos dizem respeito às percepções que a pessoa tem de si mesma. Pessoas com elevada auto-estima, autoconfiança e auto-eficácia têm demonstrado menor propensão à Síndrome de Burnout. (GIL MONTE & PEIRÓ; SCHAUFELI & ENZMANN, APUD BENEVIDES-PEREIRA , 2002). − Estratégias de enfrentamento: Pessoas que tendem a agir passivamente, mantendo-se na defensiva, que tendem à evitação, têm apresentado maiores chances de desenvolver Burnout do que as pessoas mais ativas e que enfrentam as dificuldades. (GIL MONTE & PEIRÓ; SCHAUFELI & ENZMANN; SCHAUFELI & LEITER APUD BENEVIDESPEREIRA , 2002). − Neuroticismo: O neuroticismo tem como características a ansiedade, hostilidade, depressão, autoconsciência e vulnerabilidade, sendo que tais aspectos propiciam a instabilidade emocional e, consequentemente, ao Burnout. (MASLACH, SCHAUFELI & LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). − Otimismo x Pessimismo: Como cita Mendes & Nunes apud BenevidesPereira (2002), o otimismo tem relação positiva em relação à escala de Realização Profissional do Burnout, sendo um preditor desta síndrome. − Perfeccionismo: Burns e Mendes & Nunes apud Benevides-Pereira, (2002), demonstram que o perfeccionista tende a preocupar-se excessivamente com os erros, evitando-os não por uma realização pessoal, mas por insegurança e medo de falhar. O perfeccionismo tem sido apontado como uma característica que traz maior vulnerabilidade para a Síndrome de Burnout e à depressão. Sentido de Coerência: maneira de enfrentar tem a ver com o posicionamento diante a vida e as dificuldades, utilizando principalmente os componentes cognitivos. Procura-se dar ênfase nos aspectos positivos e não aos negativos implicados em cada situação. Estudos têm demonstrado que estes aspectos estão relacionados ao alto nível de bem estar e, consequentemente, baixo nível de Burnout. (MORENO-JIMENEZ, BENEVIDES-PEREIRA; GARROSA & GONZALES; SÖRDERFELDT APUD BENEVIDES, 2002) 58 Motivação: Carlotto, apud Benevides-Pereira (2002) mostra o paradoxo de que, pessoas com alto nível de motivação podem apresentar maior propensão ao Burnout. Idealismo: quanto maior o idealismo quanto à profissão e as possibilidades de realização, maior a possibilidade de apresentar a Síndrome. Um alto nível de idealismo pode estar relacionado às expectativas elevadas e muitas vezes incompatíveis com a realidade, contudo, quando estas são associadas ao otimismo, pode levar a um menor índice de Burnout. As expectativas irrealistas podem se referir tanto à profissão quanto à Instituição. (GIL MONTE & PEIRÓ; KIRK & KOESKE; MASLACH, SHAUFELI & LEITER, APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002). Firth apud Benevides-Pereira (2002) ressalta que outras características de personalidade facilitam o desenvolvimento de Burnout, como pessoas que possuem altas expectativas ou ainda apresentem insegurança, preocupação excessiva, que tenham dificuldade em delegar funções aos demais ou dificuldade no trabalho em grupo. Benevides-Pereira (2002) cita que o Burnout apresenta-se em geral, em pessoas entusiasmadas e idealistas, que no contato com o mundo profissional vão mudando seu modo de ser e apresentando transtornos que acabam por interferir em nível pessoal, social e institucional. Pessoas que carregam dentro de si um nível de ansiedade muito intensa, que se “acostumaram” a lidar com o estresse utilizando o trabalho como um meio de descarga desta tensão, caracterizam os Workaholics. Estes, fora do ambiente e das funções de trabalho, têm dificuldades de desfrutar de seu tempo livre, seja no convívio com familiares, seja no lazer ou na vida social. São relacionadas a uma personalidade “tipo A”, definida pelo esforço crônico e incessante de melhorar cada vez mais, em períodos de tempo pequenos, mesmo que encontre obstáculos do ambiente ou de pessoas. (FRANÇA & RODRIGUES apud JACQUES & CODO, 2002, p.125) 59 Quando o trabalho envolve o cuidado com o outro, como no caso de profissionais da saúde, educação e outros, o cuidar exige tensão emocional constante, atenção, dedicação e entrega. Tal como menciona Jacques & Codo (2002), o trabalhador se envolve afetivamente e por um lado se desgasta na tensão gerada entre envolver-se afetivamente e não completar o circuito afetivo, por outro, sente-se incapaz de modificar as situações à sua frente. Num extremo, sente-se derrotado, não agüenta mais, desiste simbolicamente, e desenvolve Burnout. De certa forma, faltam recursos pessoais, para atender as demandas, ou pior, os recursos pessoais utilizados não proporcionam retornos esperados. Na falta de estratégias internas de enfrentamento, a desistência simbólica passa a ser uma boa alternativa, contudo ainda há sofrimento. 6.4.4 Características Sociais Como características sociais, Benevides-Pereira (2002) aponta os fatores macro e micro sociais envolvidos. É importante que haja a possibilidade de poder contar com colegas e amigos de confiança para prover um suporte social que tem sido referido como um moderador afetivo no processo de Burnout, assim como o suporte familiar. A cultura também tem um papel relevante, uma vez que suas normas, valores e influencia na coletividade pode vir a aumentar ou amenizar o impacto dos agentes estressantes no desencadeamento de Burnout. Diferentes estudos na mesma categoria de profissionais exercendo o mesmo tipo de atividade têm denotado resultados distintos em diferentes meios sociais. O prestígio social que envolve uma profissão tem demonstrado maior peso na manifestação da Síndrome do que fatores como o salário, por exemplo. Muitas profissões que tinham tradicionalmente um status social vêm sofrendo uma considerável queda nas condições salariais, o que implica nestes profissionais trabalharem em diferentes postos de trabalhos para suprirem as condições econômicas compatíveis ao seu status. Desta forma, observa-se uma propensão ao Burnout, pela sobrecarga de trabalho, pelo pouco tempo para descanso e lazer, inclusive para a atualização profissional, levando à insatisfação e insegurança nas atividades desempenhadas. (BENEVIDES-PEREIRA, 2002). 60 Resumo Esquemático da sintomatologia dos facilitadores e/ou desencadeantes de Burnout apresentado por Benevides-Pereira (2002, p.69) FACILITADORES E/OU DESENCADEANTES DO BURNOUT Características Pessoais Características do Trabalho Idade Tipo de Ocupação Sexo Tempo de Profissão Nível Educacional Tempo na Instituição Filhos Trabalho por Turnos ou Noturnos Personalidade: Hardness, a personalidade resistente ao estresse Sobrecarga Relacionamento entre os colegas de Trabalho Lócus de Controle Padrão de Personalidade Tipo A Variáveis do Self Tipo de Cliente Estratégias de Enfrentamento Conflito de Papel Neuroticismo Ambigüidade de Papel Otimismo x Pessimismo Suporte Organizacional Perfeccionismo Satisfação Relação Profissional-Cliente Sentido de Coerência Controle Motivação Responsabilidade Idealismo Características Organizacionais Ambiente Físico Mudanças Organizacionais Normas institucionais Pressão Possibilidade de Progresso Percepção de Iniqüidade Conflito com valores Pessoais Falta de Feedback Clima Burocracia Características Sociais Comunicação Suporte Social Autonomia Suporte Familiar Recompensas Cultura Insegurança Prestigio 61 Resumo Esquemático dos facilitadores e desencadeantes de Burnout apresentado por Maslash e Leiter apud Borges et al.,(2002, p.7) FACILITADORES E DESENCADEANTES DO BURNOUT Desencadeantes Facilitadores Ambiente físico de trabalho e conteúdo do Variáveis demográficas: posto: a . pontuações masculinas mais elevadas a . nível de ruído, vibrações e iluminação em despersonalização b. conforto físico percebido b. variações inconscientes por gênero c. turnos c. incidência maior entre jovens d. riscos e perigos percebidos d. menor incidência entre casados e. sobrecarga percebida f. previsibilidade percebida das tarefas ou filhos de seu controle* *Relacionados papéis, as ao interpessoais desenvolvimento da relacionados adoção tecnologias dos Variáveis de personalidade desempenho relações à e. Maior incidência em pessoas sem carreira de e a . Mais propensão entre os empáticos, e/ou sensíveis, humanos, idealisyas novas b. lócus de controle externo e aspectos da estrutura organizacional, incluindo as questões referentes ao acesso decisório. c. sentimentos de auto-eficácia d. centralidade no trabalho Tipos de estratégias de afrontamento utilizadas Apoio social 62 6.5 Consequências do Burnout Diferentes autores demonstraram os variados prejuízos causados pela Síndrome, seja na saúde física e mental do trabalhador, em seu trabalho e em sua vida social. 6.5.1 No trabalho: “Os indivíduos que estão neste processo de desgaste estão sujeitos a largar o emprego, tanto psicológico quanto fisicamente. Eles investem menos tempo e energia no trabalho, só fazem o que é absolutamente necessário e faltam com mais freqüência. Além de trabalhar menos, não trabalham tão bem. Trabalho de alta qualidade requer tempo e esforço, compromisso e criatividade, mas o indivíduo desgastado já não está disposto a oferecer isso espontaneamente [...]”. (MASLACH & LEITER APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002 P. 72). Benevides-Pereira (2002) cita a diminuição na Qualidade do trabalho: devido à exaustão, o trabalhador necessitará de mais energia para concentrar-se no que está realizando. Com a baixa satisfação no trabalho, vem a desmotivação, além da despersonalização que prejudica seu relacionamento com a clientela. A conseqüência natural é a diminuição na qualidade dos serviços prestados e poderá refletir em mau atendimento, prescrições ou administração de procedimentos equivocados, negligência, imprudência e imperícia. Há também, segundo a mesma autora, a predisposição aos acidentes devido à falta de atenção e concentração (sintomas comuns, responsáveis pela maioria dos acidentes). Outro prejuízo ao trabalho está no abandono do emprego ou profissão, o que produz grandes perdas tanto pessoais, (pelo desperdício de tempo e dinheiro investidos no trabalho), quanto para a instituição que deverá arcar com a seleção e treinamento de novo funcionário, perdendo muitas vezes em tempo, dinheiro e produtividade. (BENEVIDES-PEREIRA, 2002) 63 6.5.2 Na organização Benevides-Pereira (2002) cita os seguintes aspectos: - Absenteísmo: O número de faltas aumenta proporcionalmente ao avanço da Síndrome. As faltas passam a ser uma fuga, uma forma de alívio para tentar levar adiante uma situação cada vez mais insustentável. Rotatividade: Muitas vezes, como forma de não abandonar a profissão, mas solucionar o problema, a pessoa pode mudar de instituição ou de setor dentro da organização, ocasionando o remanejamento de pessoal ou nova contratação acarretando transtornos, despêndio de tempo e dinheiro. Baixa Produtividade: O estado de esgotamento, desatenção, lentidão, irritabilidade e insatisfação entre outros são incompatíveis com a produtividade. Esta preocupação tem trazido inclusive grandes evidências em executivos. Acidentes de Trabalho: Os acidentes de trabalho estão associados à dificuldade em manter a atenção e concentração estável. Alguns autores acreditam poder estar associados um componente disfórico e tratar-se de uma tentativa de suicídio. Como apontam Glina e Jardim (2000), as conseqüências mentais diretas dos acidentes, podem afetar diretamente o sistema nervoso central, como nos traumatismos crânio-encefálicos com concussão e/ou contusão. 6.5.3 Sociais Benevides-Pereira (2002) cita o isolamento apontado em várias pesquisas embora alguns autores indiquem a preexistência e tendência do mesmo. Outra conseqüência social muito apontada em suas pesquisas diz respeito ao divórcio, uma vez que nem sempre a família suporta as sensações dos sintomas já descritos, além do que, alguns estudos denunciam o ciúme ao cliente e ao trabalho por parte do cônjuge. (CRAY & CRAY APUD BENEVIDES-PEREIRA,2002) 64 6.6 Profissões mais acometidas pela Síndrome A Síndrome de Burnout, segundo Jacques & Codo (2002), afeta principalmente, profissionais da área de serviços quando em contato direto com seus usuários e em atividade de cuidado. Como clientela de risco, são apontados os profissionais da saúde e educação, policiais e agentes penitenciários entre outros. Trabalhadores da área de saúde são freqüentemente propensos ao Burnout. Cordes and Doherty (1993), em seus estudos sobre esses profissionais, encontraram que aqueles que têm freqüentes interações intensas ou emocionalmente carregadas com outros estão mais suscetíveis. Os estudantes são também propensos ao Burnout nos anos finais da escolarização básica (ensino médio) e no ensino superior, curiosamente, este não é um tipo de burnout relacionado com o trabalho, talvez isto seja melhor compreendido como uma forma de depressão. Glina e Jardim (2000) também apontam os profissionais da área de serviços ou “cuidadores” como mais propensos ao Burnout, pelo maior contato direto com os usuários como trabalhadores da educação, saúde, policiais, assistentes sociais, agentes penitenciários, professores entre outros. Segundo Borges et al. (2002, p.6), tais categorias ocupacionais têm comprovado a ocorrência endêmica da Síndrome. “É o caso do Brasil [...] com professores e outros servidores de instituições de educação fundamental e básica, [...], com profissionais de enfermagem [...]”. Nos últimos anos, têm proliferado muitos estudos com caráter epidemiológico, explorando a incidência da Síndrome em muitas profissões: corretores de bolsa ou executivos, empregados de transportes públicos, comerciários/vendedores, empregados de empresas de informática, técnicos de softwares, controladores de aéreos, entre outros. (CADIZ ET AL. APUD BORGES ET AL., 2002) O JORNAL DESTAK (2008) por sua vez também demonstra que a incidência extrapola os profissionais voltados ao cuidado. Os trabalhos com altos níveis de estresse podem ser mais propensos a causar Burnout do que trabalhos em níveis 65 normais de estresse. Taxistas, bancários, controladores de tráfego aéreo, músicos, professores e artistas parecem ter mais tendência ao Burnout do que outros profissionais. Os médicos parecem ter a proporção mais elevada de casos de Burnout, de acordo com um estudo recente no Psychological Reports, nada menos que 40% dos médicos apresentavam altos níveis de Burnout. Recentemente, a atribuição da possibilidade de maior incidência de Burnout em profissionais que envolvem questão de ajuda e cuidado vem sendo questionada e ampliada a outras categorias profissionais (Maslach, Schaufeli & Leiter apud Benevides-Pereira, 2001). O fato de a maioria das pesquisas terem tido como amostra grupos de profissionais voltados ao cuidado, pode ter levado a alguns pesquisadores a acreditarem que isto possa ter sido um viés. Contudo, tais conclusões podem ser precipitadas, mesmo porque há incidências maiores em profissionais de áreas assistenciais, como aponta Kurowski, (1999). Também Moraes (2001), relata maior exaustão em técnicos de saúde do que nos trabalhavam em cargos administrativos na mesma instituição. De fato, esta síndrome foi observada, originalmente, em profissões predominantemente relacionadas a um contato interpessoal mais exigente, tais como médicos, psicólogos, carcereiros, assistentes sociais, comerciários, professores, atendentes públicos, enfermeiros, funcionários de departamento pessoal, teleatendimento e bombeiros. Hoje, entretanto, as observações já se estendem a todos profissionais que interagem de forma ativa com pessoas, que cuidam e/ou solucionam problemas de outras pessoas, que obedecem técnicas e métodos mais exigentes, fazendo parte de organizações de trabalho submetidas à avaliações. Como aponta Glina e Jardim (2000), ultimamente, têm sido descritos aumentos na prevalência de Burnout em trabalhadores provenientes de ambientes de trabalho que passam por transformações organizacionais, como: dispensa temporária do trabalho, diminuição da semana de trabalho sem reposição de substitutos, enxugamento (downzing),a chamada reestruturação produtiva. O risco da Síndrome de Burnout é maior para aqueles que vivem a ameaça de mudanças compulsórias na jornada de trabalho e declínio significativo na situação econômica. 66 Diante destas afirmações, observa-se que todos os fatores de insegurança social e econômica associadas às predisposições pessoais e do trabalho, pode provocar o Burnout além das profissões que envolvem cuidados, estendendo-se a qualquer área profissional. 6.7 Diagnóstico de Burnout O diagnóstico da Síndrome de Burnout implica em: fazer a história de trabalho característica subjetiva relacionada com o trabalho, função, profissão ou empreendimento assumido que muitas vezes ganha o caráter de missão sentimento de desgaste emocional e esvaziamento afetivo (exaustão emocional); queixa de reação negativa, insensibilidade ou afastamento excessivo do público que deveria receber os serviços ou cuidados do paciente (despersonalização); queixa de sentimento de diminuição da competência e do sucesso no trabalho. (GLINA E JARDIM, 2000) O diagnóstico envolve a presença de sintomas como insônia, fadiga, irritabilidade, tristeza, desinteresse, apatia, angústia, tremores, inquietação, caracterizando síndrome depressiva e/ou ansiosa. Pode estar associada a uma susceptibilidade aumentada para doenças físicas, uso de álcool ou outras drogas para obtenção dos sintomas e suicídio. (Jardim e Gina, 2000) O JORNAL DESTAK (2008) cita que o diagnóstico de Burnout ainda é difícil, pelo fato da Síndrome abarcar vários sintomas, mas sugere que as empresas comecem a prestar mais atenção ao problema. Sugere-se que as empresas promovam uma sensação de justiça entre os funcionários, mostrando que não existe favorecimento nem politicagem. 6.7.1 Modelos de Avaliação do Burnout Segundo Benevides-Pereira (2002), os questionários de auto-informe têm sido os instrumentos mais utilizados para avaliar Burnout. Dentre estes o MBI (Maslach Burnout Inventory) vem sendo traduzido e adaptado em diversos idiomas. Há 67 também citação sobre o BM (Burnout Measure), SBS (Staff Burnout Scale), BAI (Burnout Assessment Inventory) e FBS (Freundemberger Burnout Scale). O MBI, criado por Maslach & Jackson em 1981 nos EUA é um questionário de autoinforme para ser respondido através de uma escala de 7 pontos, indo de 0 (nunca) até 7 (todos os dias). De seus 22 itens, 9 são relativos à dimensão Exaustão Emocional, 5 à Despersonalização e 8 à Realização Profissional. No resultado, considera-se em Burnout uma pessoa que revele altas pontuações em Exaustão e Despersonalização e baixos valores em Realização Profissional. (BENEVIDESPEREIRA , 2002). Há três versões do MBI: a HSS (Human Services Survey) que se destina aos profissionais do serviço humanos (médicos, enfermeiros, psicólogos, entre outros); a ED (Educators Survey) para os educadores; e a GS (General Survey), indicado a todos os trabalhadores em geral. A diferença está na terminologia aplicada à pessoa que recebe os serviços do profissional que está sendo avaliado. No caso do HSS “cliente”, ED “aluno” e GS “pessoa”. Segundo Benevides-Pereira (2002), a dificuldade da aplicabilidade do questionário está no impacto que as afirmações possam ter para o profissional, por exemplo: Não me preocupo realmente com as pessoas que atendo, o que demonstra um desacordo do que é esperado de um bom profissional e de difícil aceitação. Pode haver também a preocupação dos trabalhadores ao responderem o questionário quanto a suas imagens sociais enquanto profissionais de serviços humanos. (TAMAYO APUD BENEVIDES-PEREIRA, 2002) O fator cultural também deve ser levado em conta, como cita Benevides-Pereira (2002), uma vez que diferentes nações têm demonstrado resultados diversos bem como em categorias diferentes de profissionais, o que justifica a necessidade de estudos específicos para cada população. Como cita Benevides-Pereira (2002), o MBI ainda não está disponível no Brasil, as primeiras investigações ocorreram somente a partir de 1990 e, talvez por isso, 68 observa-se um grande número de traduções para o Português, além do fato desta Síndrome ter sido pouco estudada e divulgada entre os brasileiros. No Brasil, há estudos de tradução, adaptação e validação desenvolvidos por: Lautert (1995), Tamayo (1996) descrito em Hitomi, Sampaio e Codo (1997) e Roazzi, Carvalho & Guimarães (2000). (BENEVIDES-PEREIRA, 2002) Robayo-Tamayo apud Borges et al. (2002) adaptou o MBI para a língua portuguesa. O segundo questionário é de autoria de Tamayo e Gondin (1996) e compõe-se de 66 itens (cada um correspondendo a um valor), os quais medem os valores organizacionais segundo os seis pólos axiológos: Conservação x Autonomia, Hierarquia x Igualitarismo e Harmonia x Domínio. Os profissionais respondem a este questionário atribuindo pontos de 0 a 6, indicando o nível de importância do item (de “Nada Importante” a “Muito Importante”). No caso de avaliação institucional, não se tem informação de instrumentos de avaliação validados para Burnout. O que ocorre geralmente é um levantamento através de avaliação individual dos funcionários ou uma investigação de Burnout em determinada organização ou em determinado grupo de empregados. Vários aspectos são observados incluindo: Número de afastamento por doenças, absenteísmo, acidentes de trabalho, horas extras, solicitação de transferências, entre outros. (HARRIS APUD BENEVIDES-PEREIRA,2002). 6.8 Formas de prevenção do Burnout Como foi apresentado, a Síndrome de Burnout demonstrou-se estar mais voltada à má organização do trabalho do que aos aspectos relacionados ao ambiente de trabalho em seus aspectos ergonômicos. Contudo, a combinação de ambos os estudos são necessárias para que possa ter uma intervenção global, tendo como foco o sujeito e suas necessidades. Como formas de prevenção do Burnout, França & Rodrigues apud Jacques & Codo (2002) recomendam aumentar a variedade de rotinas, evitando a monotonia, 69 prevenir o excesso de horas, melhorar a qualidade das relações sociais e das condições físicas no trabalho e investir no aperfeiçoamento profissional e pessoal dos trabalhadores. A partir do pressuposto de que Burnout é uma Síndrome relacionada ao trabalho, faz-se necessário tomar como foco de intervenção a organização do trabalho e suas relações sociais. Como mostra Codo, apud Jacques e Codo (2002), controle sobre o trabalho realizado, carga de trabalho, rotinas, turnos, escalas, espaços para expressar a emoção sentida, ou quem sabe sofrida são aspectos a serem discutidos e olhados ao nível do trabalho. Benevides-Pereira (2002) cita que a informação sobre as causas e conseqüências e formas de prevenção são o primeiro passo para que o profissional fique alerta ao problema. A informação faz-se necessária, para que o profissional não se culpabilize pela situação que se encontra o que incrementa o problema, deixando um processo que tende a agravar-se cada vez mais. Como apontam Hitomi, Ruiz e Sampaio (1995), o processo de trabalho não se restringe aos elementos mais concretos. É preciso ver qualificações, funções, cooperação, hierarquia, sociabilidade, disciplina, a relação entre um trabalhador e outro, tanto no que se refere aos objetivos do trabalho, como para a possibilidade do “papo camarada”, da sociabilidade civil. É preciso ver a acumulação de competência humana dentro de uma máquina, transformando trabalhador em fiscal de visores, alavancas, tomadas, botões. Os mesmos autores citam que é necessário também entender as possibilidades que o trabalhador tem de se identificar ou não com o produto, de reconhecê-lo como seu. É preciso que o trabalhador, enquanto cidadão e consumidor possa gozar de todos os bens sociais produzidos, possa entender que há realização no seu produto realizado, mas na massa organizada do trabalho humano, voltada para a satisfação de quem trabalha e não só dos que detêm os meios de produção. Mais especificamente, Maslach e Leiter apud Borges et al. (2002), discorrem sobre os custos implicados na indiferença ao problema por parte da organização e 70 defendem que a melhor forma de preveni-lo e tratá-lo e considerá-lo como problema coletivo e não individual. Em relação ao nível social, França & Rodrigues apud Jacques & Codo (2002) propõem a revisão e o redimensionamento das formas de organização de trabalho, tais como: mudança no sistema de poder, aperfeiçoamento dos métodos de trabalho, melhoria das condições socioeconômicas, investimento na formação pessoal e profissional, aprimoramento do conhecimento, pela população em geral, dos problemas médicos e sociais, e, por fim, desenvolvimento e atenção conjunta dos planos econômico, social e de saúde. Como vimos até aqui, a multicausalidade do estresse necessita que deixemos de lado soluções simplistas para o seu controle, impondo ações organizacionais e pessoais. Com base neste estudo acerca da Síndrome, foi desenvolvido um projeto de intervenção em Terapia Ocupacional visando à prevenção e promoção da saúde dos trabalhadores que possa ser aplicado em empresas que apresentem o risco ao Burnout. 71 7. TERAPIA OCUPACIONAL E A VISÃO ACERCA DA SÍNDROME Na literatura brasileira, poucos estudos foram observados sobre o papel da Terapia Ocupacional na prevenção, tratamento ou reinserção ao trabalho das pessoas com Síndrome de Burnout. Os materiais nacionais existentes em livros de terapia ocupacional davam enfoque à Síndrome como uma das doenças relacionadas ao trabalho a que se expõe esta área atrelada aos cuidados e contato constante com o outro em suas demandas tão específicas e variadas. Em bibliografia internacional, foi encontrado um número maior de estudos, mas em sua maioria voltada também à incidência de Burnout em profissionais da Terapia Ocupacional e não na intervenção desta às outras classes de trabalhadores. Os estudos encontrados em bibliografia internacional que focaram a intervenção de Terapia Ocupacional não demonstraram métodos específicos, mas o enfoque sob a qualidade do ambiente de trabalho junto ao olhar para o aspecto psíquico do sujeito. (BOT, 2008). Blount (1995) aponta os grupos terapêuticos como forma de intervenção em saúde mental e dá enfoque ao Burnout para análise da percepção pessoal do sujeito em seu ambiente de trabalho numa investigação que envolve o nível de exaustão emocional, despersonalização e conseqüente redução da realização profissional. Um grande número de profissionais da psicologia desenvolveu trabalhos para tratamento como sessões de relaxamento, respiração, atividade física, reeducação alimentar e, principalmente, estratégias emocionais para trabalhar a auto-estima da pessoa, como cita a psicóloga Neves, (2008). A Terapia Ocupacional com sua importante atuação em saúde mental também contribui através de atividades (expressivas ou artísticas) nesse processo, buscando a conscientização do trabalhador e auxiliando na criação de métodos de enfrentamento para lidar com os agentes estressores. 72 Tais medidas citadas são corretivas, uma vez que já está desenvolvida a patologia e os conseqüentes prejuízos ao trabalho e a vida do trabalhador. Contudo, terá enfoque neste trabalho a proposta de prevenção do desenvolvimento da Síndrome de Burnout no seu ambiente de trabalho, uma vez que esta tem um custo beneficio maior para o trabalhador, mais saudável e para a empresa sem que sejam necessários prejuízos com afastamento do profissional e treinamento de novos funcionários. Uma das formas mais utilizadas seja para a prevenção ou tratamento de agravos à saúde em trabalhadores ou mesmo para reinserção profissional são as abordagens grupais. Segundo Siqueira e Queiróz (2001) o trabalho com os grupos buscam uma reflexão acerca do trabalho, de forma ativa neste processo de tratamento, na definição de metas e resolução de problemas por eles enfrentados. Para isso, podese contar com uma equipe interdisciplinar, respeitando a contribuição específica de cada área. No caso do projeto a seguir, visando a prevenção da Síndrome de Burnout, os grupos de reflexão citados por Siqueira e Queiroz (2001) demonstram um exemplo de abordagem possível para este caso. Os grupos possibilitam a discussão e reflexão dos trabalhadores através de construção coletiva de mudanças de formas de trabalho que possam minimizar os agravos à saúde e facilitar as relações no ambiente de trabalho. Os grupos de reflexão visam entre outros objetivos: o conhecimento dos postos de trabalho e da cultura organizacional da empresa pelo ponto de vista dos trabalhadores (produção e administração); discussão com os trabalhadores sobre os possíveis adoecimentos a que estão expostos no ambiente de trabalho e formas de preveni-las; facilitar as comunicações e relações durante o trabalho e assim compreender e transformar as relações de poder entre empregadores e empregados e nos postos de trabalho (SIQUEIRA E QUEIRÓZ, 2001). “ [...] A Terapia Ocupacional atual, que se desenvolve na área ocupacional, não somente avalia a participação e o desempenho de um indivíduo, mas também busca eliminar, prevenir ou diminuir os transtornos pelo mesmo ato de trabalho.” (SBRILLER APUD NABERGOI E BOTTINELLI, 2004) 73 8. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM EMPRESAS 1. Introdução Nos dias atuais, a qualidade é essencial para a sobrevivência das empresas. Essa qualidade pode ser alcançada se forem observados alguns aspectos como: o adequado reconhecimento ao trabalhador, melhoria das condições de trabalho, promoção do desenvolvimento pessoal, prevenção da saúde dos trabalhadores e a consideração da relevância social no trabalho. Felizmente, várias empresas buscam a melhoria da qualidade do trabalho dos funcionários e estabelecem uma série de programas como forma de preservar a saúde do trabalhador. Nas grandes capitais e áreas mais industrializadas, os empresariados conscientes dos futuros problemas estão investindo nestes programas, como também, em estudos sobre as vantagens de um ambiente de trabalho saudável. A revista Época, na sua edição das 100 melhores empresas para trabalhar, cita entre seus critérios, a qualidade no ambiente de trabalho. Entres os 7 segredos dos melhores ambientes de trabalho está a qualidade de vida nas empresas, uma necessidade fundamental para os trabalhadores: “Preservar a Saúde dos empregados é apenas uma das razões que levam as melhores empresas a dar atenção ao tema. Profissionais estressados e esgotados fisicamente cometem mais erros, perdem parte de seu poder de inovação e da capacidade criativa além de correrem mais riscos de sofrer acidentes”. (ÉPOCA, 2008, P. 80). A revista Você S/A em sua edição especial de 2007 sobre as 150 melhores empresas para trabalhar, também dá atenção especial ao assunto, quando considera entre os critérios para classificação entre as melhores, a atenção à saúde. Cita o cuidado das empresas com espaços para pausas ou até mesmo do acompanhamento de profissionais da saúde aos trabalhadores com cunho preventivo. 74 Neste contexto, o objetivo desta proposta é a prevenção da saúde dos trabalhadores para que não tenham sua saúde afetada em função da organização do trabalho e seu ambiente. Um dos problemas observados em grande parte dos trabalhadores nas instituições é o estresse decorrente das condições do trabalho. O estresse, diferente do conceituado pelo senso comum é a maneira como o organismo responde a qualquer estímulo - bom, ruim, mal ou imaginário - que altere seu estado de equilíbrio. O estresse está diretamente relacionado com a homeostase, que é estado de equilíbrio dos vários sistemas do organismo entre si e do organismo como um todo com o meio ambiente. O estresse constante no trabalho, por sua vez, ultrapassa o limite da busca do equilibro, chegando a provocar desde insônia, dores de cabeça, palpitações e hipertensão, abuso no uso do álcool ou outras substâncias químicas e o aumento de conflitos familiares e sociais. A Síndrome de Burnout, conhecida também como Síndrome do Esgotamento Profissional, surge quando o nível de estresse torna-se crônico. Enquanto o estresse pode apresentar aspectos positivos ou negativos, o Burnout tem sempre um aspecto negativo estando relacionado com o mundo de trabalho gerando uma alteração de comportamento em dimensão social e inter-relacional. O trabalhador pode apresentar a sensação de estar “queimado”, “desgastado”, “consumido” e apresentando entre suas principais características a falta de disposição para o trabalho (exaustão emocional), a dificuldade na relação com o cliente e com os demais colegas de trabalho (despersonalização) e a redução de sua realização profissional. As conseqüências ao trabalhador, quando desenvolve a Síndrome de Burnout envolve prejuízos à sua saúde física, emocional, cognitiva, bem como ao desequilíbrio em sua vida pessoal, familiar e social, incluindo o trabalho. 75 A Terapia Ocupacional com seu conhecimento na área da saúde auxilia o indivíduo na sua atividade, desenvolvendo-a da melhor forma para sua saúde física e mental, considerando suas habilidades, desejos e necessidades contribuindo para o ganho de qualidade de vida. O trabalho, por ser uma atividade inerente ao cotidiano do homem e por ocupar muitas vezes a maior parte do seu dia, é também “um fazer” alvo de intervenção da terapia ocupacional na análise da atividade do trabalho. O terapeuta ocupacional intervém no trabalho na prevenção de agravos à saúde do trabalhador, tratamento de suas doenças ocupacionais e reabilitação no caso de afastamento do trabalho. A presente proposta tem a finalidade da prevenção de agravos à saúde, principalmente dos prejuízos causados pelo Estresse e a Síndrome de Burnout. A partir do estudo e análise do trabalho, a Terapia Ocupacional propõe atividades que visam uma nova reflexão acerca das condições de trabalho através de grupos com uma amostra de trabalhadores, propiciando um ambiente/condição de trabalho mais saudável, com trabalhadores mais satisfeitos e, consequentemente, uma empresa mais produtiva. Se por um lado, a atenção à saúde do Trabalhador (prevenção) possa sugerir maior gasto financeiro, por outro, ela representa uma economia de tempo e dinheiro para a empresa e como conseqüência, a melhoria da saúde do trabalhador, do trabalho e da sociedade. 76 2. Objetivo geral A partir dos pressupostos da Terapia Ocupacional, Ergonomia e Saúde do Trabalhador este projeto visa a promoção da saúde nos trabalhadores de empresas visando eliminar e/ou minimizar a ocorrência de possíveis distúrbios físicos e mentais originados por agentes estressores provindos da atividade profissional e, principalmente, da organização do trabalho que possam desencadear a Síndrome de Burnout. 3. Objetivos específicos Avaliar grupo de trabalhadores a fim de obter média das condições do nível de estresse e propensão à Síndrome de Burnout gerando um perfil para a intervenção; Realizar grupos de atividades com trabalhadores dos diferentes setores para discussão acerca dos agravos à saúde visando sugestões de intervenção na organização do trabalho; Orientar os trabalhadores quanto a possíveis agravos relacionados à saúde incluindo o estresse e sua cronificação: a Síndrome de Burnout; Estimular a reflexão e levantamento de sugestões para minimizar conflitos entre os diferentes grupos, buscando soluções para transformação do ambiente/condição de trabalho em comum aos diferentes níveis hierárquicos, através de atividades (dinâmicas, dramatizações, conversas); Criar novas formas conjuntas para realizar o trabalho, atendendo às necessidades peculiares humanas a partir de uma visão holística, envolvendo seus aspectos: físicos, psíquicos e sociais a fim de evitar o desenvolvimento da Síndrome de Burnout. 4. Justificativa O desequilíbrio na saúde do profissional traz conseqüências na qualidade dos serviços prestados e no nível de produção. Os lucros também são afetados na medida em que os custos se incrementam em absenteísmo, auxílio-doença, 77 reposição de funcionário, transferências, novas contratações e treinamento. Devida a estas e outras conseqüências, tem crescido as perspectivas de investir na qualidade de vida do trabalhador de uma forma preventiva. O método a ser utilizado foi criado a partir da junção e adaptação das teorias dos grupos operativos de Pichon Riviére (1999) e grupos de reflexão criado por Siqueira et al. (1998). Os grupos operativos visam um espaço para discussão, obtendo dentro do grupo uma comunicação ativa, ou seja, criadora. O propósito geral é o esclarecimento, a aprendizagem da comunicação, as decisões através de um desenvolvimento progressivo a tomar a forma de um espiral, na qual coincidem didática, aprendizagem, comunicação e operatividade. Nesta abordagem, são realizados grupos contando com um coordenador que conduz a atividade e um observador que faz as considerações e traz uma devolutiva ao grupo. O grupo de reflexão por sua vez, tem o objetivo de conhecer os postos de trabalho a fim de proporcionar o entendimento da cultura organizacional e do processo do trabalho a partir da percepção do trabalhador. A partir da discussão com os trabalhadores acerca do modo que é realizado o trabalho, são tratadas as formas de adoecimento possíveis em seus ambientes de trabalho permitindo a comunicação em diferentes níveis hierárquicos facilitando a comunicação e as relações nos postos de trabalho. No método, é previsto reuniões com representantes de trabalhadores do setor de produção, em outro momento com representantes da administração para posteriormente realizar um terceiro grupo “tripartite” com representantes destes dois grupos. Devido o presente projeto se tratar de um estudo e método a partir da prevenção em empresas da Síndrome de Burnout, houve uma adaptação destes métodos para que seja adequado a esta patologia e suas características empresariais. Será utilizado o instrumento da terapia ocupacional que é a atividade. 78 Serão realizados grupos entre os diferentes níveis hierárquicos visando a aprendizagem da comunicação, propiciando uma discussão em equipe que possa auxiliar no processo de decisão e na relação do trabalho. Os grupos contarão com um observador e um coordenador. Contudo, neste projeto as atividades terão como foco específico os determinantes para a ocorrência da Síndrome de Burnout. “As atividades possibilitam a busca de novas formas de conhecimento, relacionamento e ação do sujeito no mundo; [...], modificam e constroem sua rede de relações; procedem a experiência vivida, ampliam esse campo e permitem o sujeito agir sobre seu próprio meio”. 5. Desenvolvimento 5.1. Recursos Humanos O projeto envolve os seguintes profissionais: 1 Terapeuta Ocupacional (coordenação) 1 Observador (psicólogo ou Terapeuta Ocupacional) Representantes dos trabalhadores: operacionais, gerentes e diretores. 5.2. Critérios de Participação A participação deverá ser voluntária (não há qualquer obrigatoriedade na participação); Cada setor (operacional/gerencia/diretoria) deverá conter 20% dos trabalhadores de cada posto de trabalho, sendo que estes deverão ser escolhidos e apontados democraticamente pelos demais trabalhadores deste setor. Deverão conter entre os representantes de cada grupo: trabalhadores de ambos os sexos, diversas faixas etárias, diferentes turnos de trabalho bem como diferentes tempos de serviço na empresa; 5.3. Metodologia Papel do Coordenador e observador (es) O terapeuta ocupacional irá conduzir e estimular as reflexões, coordenando as dinâmicas grupais. A sua função consiste em criar, manter e fomentar a 79 comunicação, a partir da análise da atividade do trabalho e das necessidades e características do grupo de trabalhadores. Cabe ao coordenador também atuar como orientador, favorecendo a comunicação intragrupal procurando evitar a discussão frontal. O observador deverá observar e registrar tudo o que acontece no grupo através de um enfoque panorâmico. Sem influenciar na coordenação do grupo, observa o ocorrido e faz uma devolutiva a respeito do observado no grupo anterior. Organização dos grupos O primeiro grupo será constituído por representantes do setor operacional visando a discussão, (através de atividades) referente aos aspectos que envolvem seus trabalhos prescritos (a forma prevista pela organização de como deve ser feito o trabalho) e reais (a forma que é realizada pelo trabalhador). Após os encontros semanais com o grupo operacional, serão convidados os representantes do grupo da gerência para reflexão e discussão do processo de trabalho da mesma forma. Ao final do encontro com representantes da Diretoria, haverá a junção de ambos os grupos, formando o grupo tripartite, de forma a discutir possíveis modificações no processo de trabalho, facilitando suas relações e propiciando um espaço de trocas de diferentes visões acerca do trabalho desenvolvido. Cada grupo terá 2 horas de duração, com encontro em uma vez por semana. Serão necessários 5 encontros para cada grupo, acrescentando-se mais um dia anterior para avaliação. 80 Cada grupo contará com as seguintes etapas: Coleta de dados: Avaliação dos possíveis níveis de estresse existentes e predisposição para desenvolvimento da Síndrome de Burnout nos trabalhadores do grupo formado (amostra), a fim de nortear a intervenção para a prevenção. O modelo de avaliação (em anexo) permite observar o grau de estresse que se encontra o trabalhador e consequentemente se pode estar desenvolvendo o processo de Burnout. Discussão e Análise das possíveis riscos à saúde do trabalhador: Análise dos aspectos do trabalho que possam demonstrar maior risco para desenvolvimento de Burnout; Devolutiva ao grupo focando a demanda observada do coletivo. Orientação acerca das atividades desenvolvidas visando a prevenção do avanço dos níveis de estresse e consequentemente o Burnout. Grupo de Atividades Preventivas de Burnout: Levantamento de idéias a partir da avaliação (anônima) e sugestões para melhoria do ambiente/condição de trabalho – Discussão. Utilização de atividades (dinâmicas, jogos, dramatizações, atividades expressivas) envolvendo os seguintes temas voltados aos aspectos relacionados aos fatores de risco para o Estresse e Síndrome de Burnout: O que é Estresse? O que é a Síndrome de Burnout?; Representação grupo de trabalho (grupo operativo); Hierarquia no trabalho; Significação do trabalho; Comunicação; O papel de si e do outro no trabalho; Sobrecarga e subcarga no trabalho; Responsabilidade e complexidade da tarefa; Ambiente de trabalho e seus diversos aspectos: físicos, químicos, biomecânicos, organizacionais, cognitivos, antropométricos, biológicos e psicossociais; Pressões externas no trabalho (clientes e fornecedores); Espaços para pausas, lazer e cuidados com a saúde do trabalhador; Recompensas e valorização ao trabalhador; Auto-estima. 81 Os temas também podem variar de acordo com a demanda específica do grupo, focando mais em um ou outro assunto. Após cada dinâmica, serão estimuladas as reflexões e discussões acerca do que foi vivenciado pela atividade, trazendo aspectos voltados às situações relacionadas ao processo ou ambiente/condição de trabalho. Ao final, após os grupos dos diferentes níveis hierárquicos realizando as mesmas atividades, será feito o terceiro grupo para trocas de experiências ocorridas em cada encontro, sendo que o terapeuta oferecerá um feed back a cerca das diferenças observadas e intervenções no ambiente/condição de trabalho em cada posto de trabalho. Conclusão Fazer o feed back para a empresa acerca do que foi desenvolvido e com as discussões e sugestões de melhoras decorrentes do grupo a fim de que possam estimular mudanças na organização de trabalho atingindo aos demais trabalhadores da empresa. 6. Materiais utilizados Os materiais serão utilizados de acordo com a atividade variando desde aparelho de som, materiais de papelaria, materiais artísticos, entre outros que serão inclusos no valor do investimento no decorrer das visitas à empresa. 7. Resultados Esperados Espera-se que com esta intervenção, a diminuição da incidência de trabalhadores sofrendo com os prejuízos do estresse bem como a diminuição na incidência da Síndrome de Burnout. É esperado também que os trabalhadores possam refletir e discutir aspectos voltados aos fatores de riscos possivelmente presentes no processo do trabalho causadores de estresse e a Síndrome de Burnout. Aqueles que participaram do processo grupal, poderão também contribuir com a melhora 82 do ambiente/condição de trabalho, transmitindo as informações aos demais trabalhadores e modificando o trabalho e suas relações de forma consciente. O sentimento de participação ativa e de que estão trabalhando em equipe também é esperado uma vez que terão espaço para reflexões muitas vezes nunca compartilhadas entre a chefia e outros níveis hierárquicos. Com isso, abre-se uma oportunidade de trocas para a elaboração de um novo processo de trabalho visando um ambiente mais saudável. A empresa, propiciando este espaço para escuta e participação dos trabalhadores, transforma o trabalho, promovendo satisfação e mudança nas relações de trabalho entre os diferentes setores. Previnem-se futuros agravos à saúde do trabalhador (que geram gastos em tempo e dinheiro com afastamento ou mesmo treinamento de substitutos) enquanto ganha com trabalhadores motivados e saudáveis para contribuir com seu papel na empresa. É chegada a hora de se pensar na análise do trabalho com olhar mais amplo, estimulando aqueles que o organizam e planejam a ter um olhar atento, mais cuidadoso e sensível pensando que o trabalhador não é apenas a mão de obra, mas aquele que representa e move a empresa. “Cuidar dos funcionários é importante. Não se trata de uma postura paternalista ou assistencialista, mas sim dar às pessoas a certeza de que o empregador de preocupa com elas. As empresas que adotam esta postura geralmente têm o ambiente mais tranqüilo e o nível de satisfação dos funcionários maior que a média”. (REVISTA ÉPOCA, 2008, P. 80) 83 AVALIAÇÃO INDIVIDUAL DE ESTRESSE E BURNOUT A avaliação a seguir tem o objetivo de identificar possíveis fatores de risco à saúde, presentes no seu ambiente de trabalho, especificamente para desenvolver o Estresse e a Síndrome de Burnout. Seja o mais sincero possível, pois estas informações serão importantes para as atividades desenvolvidas no grupo de prevenção de agravos à saúde, incluindo o estresse e seus prejuízos. Não é necessário colocar seu nome nesta avaliação. A. O indivíduo e relação com seu trabalho: 1. Qual seu cargo/função?______________________________________________________ _ 2. Qual seu horário de trabalho?___________________________________________ 3. Realiza horas extras?_______Se sim, especifique em n° de horas/mês:_________________ 4. Há quanto tempo trabalha nesta empresa? _________________________ ___ 5. Há quanto tempo trabalha nesta atividade? _______________________ __ 6. Qual a maior representação do trabalho em sua vida?_______________________________ 7. O que espera de sua profissão?____________________________ _______________ _ 8. O que espera de sua empresa?_________________________ ______ _ ____ 9. Como observa seu papel na empresa?_______________________________________ __ 10. Já sofreu algum acidente ou doença relacionada ao trabalho? Qual? _ Descreva sua atividade: ________________________________________________ _ ______________________________________________________________________ _____ B. Avaliação da existência e nível de estresse: Marque um X na frequência a qual ocorrem as seguintes sensações no período de trabalho ou em relação a ele: 11. Sente dores Musculares? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 12. Percebe aumento do batimento cardíaco? Nunca Raramente Às vezes 84 13. Nota aumento da freqüência respiratória? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 14. Sente ansiedade? Nunca Raramente 15. Refere dores no estômago? Nunca Raramente 16. Sente irritabilidade? Nunca 17. Tem insônia? Nunca 18. Percebe mudanças constantes de humor? Nunca Raramente 19. Sente esgotamento físico? Nunca Raramente 20. Sente dores no corpo? Nunca Raramente 21. Apresenta rigidez muscular? Nunca Raramente 22. Percebe dificuldade em concentrar-se? Nunca Raramente Às vezes C. Marque um X na frequência que ocorrem as seguintes sensações em relação à satisfação, disposição e realização profissional: 23. Nota sensação de “Falta de Energia” para realizar atividade? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 85 24. Sente-se esgotado mentalmente? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 25. Percebe distração? Nunca Raramente 26. Refere vulnerabilidade a sofrer acidentes de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 27. Sente-se deprimido? Nunca Raramente 28. Tem ficado doente? Nunca Raramente 29. Tem consumido álcool/cigarro/drogas por causa do trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 30. Nota tensão ao se comunicar com pessoas de outros níveis hierárquicos? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 31. Tem sido indiferente às dificuldades dos colegas de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 32. Tem dificuldade em lidar com o cliente? Nunca Raramente Às vezes 33. Sente impaciência para lidar com demais colegas de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 34. Vem tratando o trabalho numa relação de frieza, sem valor afetivo? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 35. Tem observado as pessoas de forma negativa? Nunca Raramente Às vezes 86 36. Tem agido de forma irônica ou cínica perante um cliente ou colega de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 37. Acredita que tem tomado atitudes diferentes da sua personalidade quando está no trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 38. Apresenta insatisfação no trabalho? Nunca Raramente Às vezes 39. Vem sentindo vontade constante de faltar ao trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 40. Percebe diminuição da produtividade? Nunca Raramente Às vezes 41. Tem se sentido pouco realizado profissionalmente? Nunca Raramente 42. Tem se sentido desvalorizado? Nunca Raramente 43. Percebe dificuldade em entusiasmar-se com o trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 44. Nota dificuldade em atingir os objetivos esperados em sua função? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 45. Sente-se impotente e incapaz para realizar o trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 46. Sente pouca vontade de lidar com o outro (cliente / colega de trabalho)? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 47. Sente-se cansado de forma progressiva? Nunca Raramente Às vezes 87 48. Sente-se desmotivado? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 49. Tem vontade de abandonar o trabalho? Nunca Raramente Às vezes D. Organização do trabalho: Em relação à sua forma de trabalhar na empresa, o que você vivencia? 50. Percebe excesso de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 51. Não consegue terminar o trabalho no prazo estipulado? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 52. Considera seu trabalho repetitivo? Nunca Raramente 53. Seu trabalho é monótono? Nunca Raramente 54. Há necessidade de maior número de funcionários para realizar a tarefa? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 55. Existe controle do tempo para atingir metas? Nunca Raramente Às vezes 56. Há pouca colaboração dos colegas de trabalho? Nunca Raramente Às vezes 57. Há presença de trabalhos de grande responsabilidade? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 58. Sente-se injustiçado? Nunca Raramente 88 59. Seu trabalho exige que aja de maneira contrária aos seus valores? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Às vezes Frequentemente Sempre 61. Sua remuneração é insuficiente? Nunca Raramente 62. Há conflitos na comunicação com colegas de trabalho? Nunca Raramente Às vezes 63. Há conflitos na comunicação com chefia? Frequentemente Sempre 89 Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 64. Há conflitos na comunicação com clientes ou fornecedores? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre Frequentemente Sempre 65. Refere falta de autonomia para realizar o trabalho? Nunca Raramente Às vezes 66. Recebe recompensas pelo bom trabalho (aumentos salariais/prêmios / bônus/ promoções)? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre 67. Percebe clima de consideração e respeito no ambiente de trabalho? Nunca Raramente Às vezes Frequentemente Sempre E. Ambiente de Trabalho Quanto ao ambiente do seu posto de trabalho, o que você identifica? 68. Ruídos constantes e intensos: Sim Não 69. Mobiliário mal adaptado ao trabalhador: Sim 70. Iluminação precária: 71. Riscos químicos: Sim Sim Não Não Não 72. Temperaturas muito quentes ou frias, excesso ou falta de umidade ou pouca ventilação? Sim Não 90 9 CONCLUSÃO Ao pesquisar os aspectos que envolvem o trabalho e suas características, foi observado desde a origem do trabalho, sua etimologia e os seus diferentes significados para o homem: prazer, sonhos, expectativas alcançadas ou não, até mesmo a identificação do trabalho com os valores pessoais e sociais, identificando os sujeitos muitas vezes, uns dos outros. A partir da discussão dos significados do trabalho, foi observado que, na verdade, não é o trabalho que é bom ou ruim, prazeroso ou prejudicial, mas sim o que determina um trabalho saudável ou não é a relação que o sujeito tem com ele e com a organização da empresa. Ao fazer a associação entre o papel do trabalho, a relação com a saúde mental e seus prejuízos, bem como a dificuldade do nexo causal (diagnóstico) e a subnotificação, foi observado o quanto o trabalho é uma questão não só de preocupação da Saúde Publica, mas de cada profissional de área da saúde e de empregadores que possam minimizar suas causas. Ao realizar a pesquisa sobre o estresse e o estresse no trabalho, muito foi encontrado, confirmando a idéia de que o estresse não é doença, mas uma busca natural do corpo em readquirir a homeostase, readequando o corpo diante de diferentes situações. Isto ocorre quando lidamos com agentes estressores, sejam eles bons ou ruins. Por outro lado, o estresse constante no trabalho, trouxe uma conotação negativa, uma vez que está associado ao desconforto, nervoso e conseqüências prejudiciais à saúde do trabalhador. No levantamento bibliográfico, foi observado que os estudos a respeito deste assunto ultrapassam 100.000 pesquisas, tamanha sua incidência. A Síndrome de Burnout, como foi observado, constitui-se em uma fase final ou um tipo específico de reação ao estresse ocupacional prolongado, que envolve atitudes e comportamentos negativos com respeito aos clientes, ao trabalho e à organização. 91 Associa-se à busca de significado existencial para o trabalho, quando há uma discrepância entre os interesses e capacidade do trabalhador e as exigências do trabalho. Diferentemente do estresse, a Síndrome de Burnout, sempre tem um caráter negativo, trazendo prejuízos físicos, psicológicos, emocionais e sociais para o indivíduo que sofre com a despersonalização, exaustão emocional e redução da realização profissional. A cronificação do estresse apesar de ocorrer com maior freqüência em algumas profissões (cuidadores em geral), todas as classes profissionais estão expostas (seja pela própria profissão ou pela organização do trabalho) podendo desencadear a Síndrome de Burnout. As causas encontradas para o desencadeamento da Síndrome de Burnout, estão relacionadas com a organização do trabalho, sua relação com o mesmo e também à uma predisposição de trabalhador para trabalhador, considerando: idade, tempo na profissão, estado civil, tipo de personalidade, disposição de mecanismos de defesa, entre outras que somadas às mas condições do ambiente de trabalho podem desencadear a Síndrome. Para prevenir o desenvolvimento da Síndrome ou mesmo auxiliar o trabalhador a lidar com os seus sintomas, pode-se contar com a intervenção do terapeuta ocupacional, seja numa abordagem voltada para o sujeito em si, seja para uma proposta diretamente na causa: no ambiente de trabalho (como aqui apresentado). No ambiente de trabalho, foi pensado que a prevenção possa ser uma alternativa importante, uma vez que inibindo o agente estressor, o coletivo poderá beneficiar-se, havendo uma predisposição individual ou não dos trabalhadores no seu coletivo. Além disso, cabe à empresa tornar o ambiente/condição de trabalho mais saudável ao trabalhador, com uma boa remuneração e reconhecimento, redução de trabalhos monótonos, repetitivos ou com sobrecarga, uma comunicação efetiva, treinamento adequado para uma boa relação com os clientes ou mesmo colegas de trabalho, 92 entre outros que propiciem reconhecimento ao trabalhador num ambiente de trabalho mais saudável. Foi observado, portanto, que partindo do olhar da Terapia Ocupacional sob o fazer humano e sua significação para o sujeito, pode-se dizer que o trabalho é responsável pela maior parte do seu tempo em vigília. É chegada a hora de pensar na análise desta atividade (o trabalho) com olhar mais amplo, estimulando aqueles que o organizam e planejam a ter um olhar atento, mais cuidadoso e sensível pensando que o trabalhador não é apenas a mão de obra, mas aquele que representa e move a empresa. 93 10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BENEVIDES-PEREIRA, Ana Mª. Teixeira. 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