XXIII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de outubro à 01 de novembro de 2014 Todas as informações contidas neste trabalho, desde sua formatação até a exposição dos resultados, são de exclusiva responsa bilidade dos seus autores ANÁLISE DAS ALTERAÇÕES OCASIONADAS PELO CONGELAMENTO E DESCONGELAMENTO EM MAIONESE LUCIANA AFFONSO JUNQUEIRA1, VANELLE MARIA DA SILVA 2, JAIME VILELA DE RESENDE3 RESUMO: O congelamento permite a conservação de alimentos por longos períodos, contudo depois de descongelados estes alimentos podem apresentar diminuição de sua qualidade devido a alterações em sua estrutura. A maionese é um tipo de emulsão óleo em água, na qual as gotículas de óleo encontram- se dispersas da água que é a fase continua. Foram realizadas análises do teor de água, reologia e da microestrutura da amostra de maionese antes e após o congelamento, a fim de avaliar os danos causados pelo congelamento e posterior descongelamento em maionese comercial adquirida em um supermercado da cidade de Lavras, MG. O congelamento da amostra foi realizado por ar estático a -18°C e o descongelamento foi realizado à temperatura de 20°C em sala climatizada. Concluiu- se que a maionese é desestabilizada pelo congelamento e descongelamento sofrendo coalescência entre as gotículas de óleo, perdendo as características de uma emulsão. Além da perda de estabilidade, através dos dados reológicos, concluiu- se que o processo causou diminuição na viscosidade aparente do produto. Palavras-chave: Emulsão, Microestrutura, Reologia, Estabilidade. INTRODUÇÃO O congelamento é uma operação unitária em que a temperatura do alimento reduz abaixo do seu ponto de congelamento, uma porção elevada de água contida no alimento muda de estado formando cristais de gelo. A conservação por congelamento é conseguida por um efeito combinado das baixas temperaturas e uma atividade de água (aw) mais baixa. Quando o congelamento e armazenamento se realizam adequadamente, as características organolépticas e o valor nutritivo dos alimentos podem não ser comprometidos. O congelamento ocorre devido à retirada de calor do meio, em alimentos frescos, deve-se eliminar também o calor gerado pela respiração metabólica. A quantidade de calor extraída, denominada carga calórica, é importante para determinar o tamanho da instalação para uma produção determinada (FELLOWS, 2000). Emulsão é um sistema heterogêneo que consiste em um líquido imiscível, completamente difuso em outro, na forma de gotículas ou glóbulos com diâmetro de 0,1 a 10 mµ. A formação de uma emulsão, portanto, requer energia para manter as gotículas dispersadas na fase contínua. Deduz-se, no entanto, que isso é termodinamicamente desfavorável e, por esse motivo, tal processo mostra estabilidade mínima, que pode ser aumentada pela adição de agentes tensoativos de superfície (ARAÚJO, 1995; JAFELICCI, 1999; SHAW, 2000). De acordo com a ANVISA (Resolução RDC n.º 276 -ANVISA, 2005) Maionese é o produto cremoso em forma de emulsão estável, óleo em água, preparado a partir de óleos vegetais, água e ovos podendo ser adicionado de outros ingredientes desde que não descaracterizem o produto. O produto deve ser acidificado. Maionese é uma emulsão estável formada basicamente por óleo vegetal, gema de ovo ou ovo inteiro, vinagre ou suco de limão. Como ingredientes opcionais a maionese pode conter mostarda, sal, açúcar, ervas e outros temperos. Fisicamente a maionese é formada por gotículas de óleo dispersas em uma fase aquosa continua e o principal agente emulsificador é a gema de ovo. O pH da maionese varia de 3,6 a 4,0, com o ácido acético como principal ácido (ARAÚJO, 1995) Quando uma emulsão óleo em água, é armazenada a uma temperatura abaixo da temperatura de cristalização, ambas as fases (óleo e água) podem cristalizar. Estas transições de fase podem causar 1 Doutoranda, UFLA/DCA, [email protected] Doutoranda, UFLA/DCA, [email protected] 3 Professor orientador, UFLA/DCA,[email protected] 2 XXIII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de outubro à 01 de novembro de 2014 Todas as informações contidas neste trabalho, desde sua formatação até a exposição dos resultados, são de exclusiva responsa bilidade dos seus autores desestabilização da emulsão. O mecanismo de desestabilização provocado por cristalização do óleo é a coalescência das gotículas de gordura (PALANUWECH, COUPLAND, 2003). Além disto, o congelamento pode desestabilizar as emulsões, nas quais as proteínas dissolvidas e responsáveis por estabilizar as emulsões precipitam devido ao processo (FELLOWS, 2000). A coalescência é um processo de desestabilização de emulsões que ocorre devido a supressão das cargas elétricas, com a conseqüente inibição das repulsões eletrostáticas causadas pelo agente emulsificante. As gotas, então se unem umas as outras ocorrendo a ruptura da película superficial levando à separação das duas fases em duas camadas por uma interface de superfície mínima (ORDÓÑEZ, 2005). MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado no Laboratório de Refrigeração de Alimentos do Departamento de Ciência dos Alimentos (DCA) da Universidade Federal de Lavras (UFLA). A maionese utilizada na avaliação foi adquirida em um supermercado da cidade de Lavras, MG. Determinação do teor de água do produto fresco O teor de água do produto fresco foi determinado por diferença de peso entre os produtos originais e após secagem em estufa à temperatura de 65ºC até peso constante. Congelamento das amostras O congelamento das amostras foi realizado em freezer doméstico horizontal com temperatura de -18ºC por um período de sete dias. Propriedades Reológicas As medidas reológicas da maionese foram realizadas usando reômetro oscilatório (HAAKE RheoStress 6000, Alemanha) equipado com um sistema de controle de temperatura (UTM Controller, Alemanha). As medições foram efetuadas utilizando o sensor cone-placa de 35 mm de diâmetro e ângulo igual a 2 º. A curva de escoamento foi obtida aplicando uma rampa contínua de taxa de deformação na faixa de 0 a 100 s-1, na temperatura de 25 ºC, em duas varreduras (ciclos de subida e descida), a fim de eliminar a tixotropia. A tixotropia do material foi calculada pela diferença entre as áreas das curvas. Os dados obtidos na segunda varredura foram ajustados a diferentes modelos de escoamento (Newtoniano, Lei da Potência e Herschel-Bulkley), para obtenção do melhor ajuste de modelo. A viscosidade aparente (η ap) foi determinada a uma taxa de deformação de 10, 30, 50 e 100 s -1. Análise microestrutural Para a análise da microestrutura foram preparadas lâminas com amostras antes do congelamento e após o congelamento e descongelamento. As lâminas para a análise da microestrutura da maionese foram preparadas por esfregaço. A análise da microestrutura foi realizada utilizando- se microscópio de luz (ML Meiji 5000, Meiji Techno América, Santa Clara, CA, EUA), com uma câmera de vídeo em anexo (Cole-Palmer 49901-35, Cole-Palmer, Vernon Hills, IL, EUA). Todas as análises foram realizadas em triplicatas XXIII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de outubro à 01 de novembro de 2014 Todas as informações contidas neste trabalho, desde sua formatação até a exposição dos resultados, são de exclusiva responsa bilidade dos seus autores RESULTADOS E DISCUSSÃO Teor de água Foi obtido um valor de 70,26%+0,52 para o teor de água da maionese analisada. Este valor apresentou elevada discrepância em relação ao valor de 39,90 % definido na tabela de composição química de alimentos (USDA, 2001). Essa alta diferença pode ser associada as variações que podem ocorrer nas formulações dos produtos de acordo com a marca do mesmo. Propriedades reológicas As curvas de escoamento para a maionese antes e após o congelamento estão apresentadas na figura 1. Tensão de Cisalhamento (Pa) 200 150 100 50 0 0 20 40 60 80 100 Taxa de Defomação (1.s-1) Figura 1. Gráfico taxa de deformação x tensão de cisalhamento da maionese antes e após o congelamento. O modelo Herschel-Bulkley foi o que apresentou o maior valor do coeficiente de determinação (R²) para ambos os produtos (antes e após o congelamento). Para a maionese antes do congelamento o valor obtido foi igual a 0,90 enquanto que para a maionese após o congelamento o valor foi igual a 0,93. No entanto, o modelo Herschel-Bulkley não apresentou um bom ajuste aos dados, assim não podemos caracterizar que a maionese apresenta tal comportamento representado pelo modelo. Isso pode ser explicado pelo comportamento de semisólido e viscoelástico de emulsões óleoem-água como a maionese (MARUYAMA et al., 2006). Deste modo, as medidas reológicas mais adequadas para se estudar o comportamento reológico de maioneses são os testes dinâmicos XXIII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de outubro à 01 de novembro de 2014 Todas as informações contidas neste trabalho, desde sua formatação até a exposição dos resultados, são de exclusiva responsa bilidade dos seus autores oscilatórias (MUNOZ & SHERMAN, 1990; PERESSINI et al., 1998), creep compliance-time (STERN et al, 2001), e tensão de fluência (STERN et al, 2001). O processo de congelamento resultou em uma diminuição da resistência ao escoamento do produto, conforme apresentado na figura 1 e indicado na tabela 1. Após o congelamento houve uma redução da viscosidade aparente do produto em diferentes taxas de deformação (tabela 1). Tabela 1. Valores médios de viscosidade aparente em diferentes taxas de deformação Produto: Viscosidade Aparente (Pa.s) η10 η30 η50 Maionese Antes do 11,42 5,06 3,26 Congelamento Maionese Após o 10,72 4,57 2,96 congelamento η100 1,87 1,67 Além disso, houve um aumento da tixotropia do produto após o congelamento. A tixotropia antes do congelamento foi 1141 Pa.s e após o congelamento foi de 1259 Pa.s, evidenciando a diminuição da resistência ao escoamento. A viscosidade aparente diminui reversivelmente com o tempo sobre aplicação de altas taxas de cisalhamento em fluidos tixotrópicos (MØLLER et al., 2006). A explicação usual para a tixotropia é que a viscosidade de tais fluidos é principalmente causada pela microestrutura das partículas no fluido que se interconectam e resistem aos rearranjos. Quando cisalhadas, estas estruturas são quebradas ao longo do tempo e a viscosidade consequentemente diminui no tempo. Quando deixadas em repouso, a microestrutura vagarosamente se reconstitui e a viscosidade aumenta (MØLLER et al., 2006). Microestrutura A Figura 2 representa o efeito do congelamento e descongelamento sobre a microestrututa da maionese. A maionese é caracterizada como uma emulsão óleo em água, sendo as gotículas observadas nas figuras gotículas de óleo. Na Figura 2.a., as gotículas apresentam- se bem distribuídas e com tamanho uniforme, caracterizando uma perfeita emulsão. Com o processo de congelamento e descongelamento, a emulsão é totalmente desestabilizada, perdendo a repulsão esférica e eletrostática entre as gotículas que sofrem coalescência. Figura 2. a) Fotomicrografia da maionese fresca com aumento de 40X; b) Fotomicrografia da maionese após congelamento e descongelamento com aumento de 40X. XXIII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de outubro à 01 de novembro de 2014 Todas as informações contidas neste trabalho, desde sua formatação até a exposição dos resultados, são de exclusiva responsa bilidade dos seus autores Estes resultados são semelhantes aos encontrados por DEGNER, et al., (2013) ao estudar o efeito do congelamento lento e rápido sobre emulsões de óleo em água com a adição de sucralose, cloreto de sódio e goma xantana. Foi verificado que durante qualquer um dos tipos de congelamento, ocorre a desestabilização da emulsão, fazendo com que as gotículas de óleo sofram aglomeração e coalescência. CONCLUSÃO Podemos concluir através das análises que, assim como os vários tipos de emulsões existentes no mercado, a maionese foi desestabilizada com o processo de congelamento e descongelamento aplicados. Pelas análises reológicas concluiu- se que o processo de congelamento reduz a viscosidade aparente do produto, facilitando seu escoamento. REFERÊNCIAS ANVISA. Resolução De Diretoria Colegiada – RDC Nº. 276, de 22 de Setembro de 2005.Disponível em: <http://www.suvisa.rn.gov.br/contentproducao/aplicacao/sesap_suvisa/arquivos/gerados/resol_276_set _2005.pdf> Acesso em: 10 setembro/2014. ARAÚJO, J. Química de alimentos: teoria e prática. 2ª ed. Viçosa: editora UFV, p.335, 1995. FELLOWS, P. J. Tecnología del processado de los alimentos: Principios e prácticas. 2ª ed, Zaragosa- Es, p. 708, 2000. JAFELICCI Jr., M.; VARANDA, L. C.; Química Nova na Escola, nº 9, 1999, p. MARUYAMA, K.; SAKASHITA, T,; HAGURA, Y. and SUZUKI, K. Relationship between Rheology, Particle Size and Texture of Mayonnaise. Food Science and Technology Researche, v.13, n.1, p.1-6, 2007. MØLLER, P. C. F.; MEWIS, J.; BONN, D. Yield stress and thixotropy: on the difficulty of measuring yield stresses in practice. Soft Matter, v. 2, p.274–283, 2006. MUNOZ, J. & SHERMAN, P. Dynamic viscoelastic properties of some commercial salad dressings. 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