X Encontro Nacional de Educação Matemática
Educação Matemática, Cultura e Diversidade
Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010
DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO GEOMÉTRICO NA VISUALIZAÇÃO
DE FIGURAS ESPACIAIS, POR MEIO DA METODOLOGIA DE OFICINAS
Lúcia Helena da Cunha Ferreira
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG
[email protected]
João Bosco Laudares
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG
[email protected]
Resumo: Este artigo é parte de pesquisa no Mestrado em ensino de Ciências e Matemática.
A metodologia utilizada foi a de “Oficinas Pedagógicas” e a proposta de pesquisa
objetivou a aquisição do pensamento geométrico buscando contribuir com o
desenvolvimento de uma importante habilidade cognitiva: a visualização espacial. A
vivência se efetivou com 35 alunos da 2ª série do Ensino Médio. Nessa experiência houve
a exploração da Geometria Espacial, a partir de atividades que abordavam a visualização
com observação das formas geométricas no espaço com sua descrição e comparação
resgatando as suas semelhanças e diferenças. O referencial dessa pesquisa teve como base
teórica o modelo de Van Hiele, como um recurso metodológico, que visou buscar
resultados para desenvolvimento cognitivo do aluno na compreensão de conceitos
geométricos. Um método usado foi a construção das figuras por meio do processo de
exploração de “vistas” das suas várias faces na busca do esboço das mesmas.
Palavras -chave: Visualização; Pensamento geométrico; Oficinas.
INTRODUÇÃO:
Devido à insatisfação em relação a nossa prática docente, investigamos diferentes
formas de trabalhar a Geometria para atingirmos um dos principais objetivos instrucionais
dessa disciplina: a visualização. Essa habilidade possibilita ao aluno pensar no objeto
geométrico, na sua ausência, distinguindo as suas características. Para desenvolver tal
competência, elaboramos atividades que possibilitassem a aquisição da habilidade da
visualização para a formação do pensamento geométrico e assim minimizar as dificuldades
apresentadas pelos alunos na manipulação de sólidos geométricos. É equivocado o ensino
de geometria com o uso mecânico de fórmulas. A utilização de fórmula pouco favorece a
compreensão de conceitos.
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Para NASSER (1991, p.35), “(...)nas últimas décadas, uma necessidade de
modificações no ensino da geometria cresceu ao redor do mundo, devido às dificuldades
encontradas e ao fraco desempenho mostrado por alunos secundários em geometria”.
Preocupados,
professores
pesquisadores
têm
desenvolvido
maneiras
que
possibilitem ao educando desenvolver o interesse e o envolvimento no estudo da
Geometria.
Essa pesquisa teve, pois, como objetivo rever, formular e/ou aprofundar conceitos e
procedimentos matemáticos, por meio do uso de materiais concretos, novas tecnologias
com uso de software e atividades tipo “lápis e papel”. Os sujeitos da pesquisa foram
alunos da 2ª série do Ensino Médio.
A opção pela metodologia de oficinas teve como pressuposto o fato que elas
favorecem a aprendizagem dos mais variados conteúdos, por ser uma metodologia
essencialmente “ativa”, que concretizava a aprendizagem a partir da tríade ação-reflexãoação. Há que se destacar que foi utilizado o Software POLY.
A TEORIA DE VAN HIELE
A teoria de Piaget, durante décadas, influenciou o currículo escolar. Enquanto
analisavam a sua prática docente, um casal de holandeses, os Van Hieles (Pierre M. Van
Hiele e Dina Hiele- Geldof), considerando as dificuldades de seus alunos em relação aos
conceitos de Geometria, propôs um modelo para organizar o ensino de acordo com a
maturidade cognitiva dos alunos.
Van Hiele, em sua época de estudante, teve muitas dificuldades e também percebeu
o mesmo problema com seus alunos:
Quando eu comecei minha carreira como professor de Matemática, eu
logo percebi como era difícil essa profissão. Havia partes do conteúdo
que eu poderia explicar e explicar, e ainda assim os alunos não
entendiam. Eu poderia ver que eles realmente tentavam, mas não
obtinham sucesso. Especialmente, no começo da Geometria, quando
coisas simples tinham que ser provadas, eu podia ver que eles faziam o
máximo, mas o assunto parecia muito difícil.
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(VAN HIELE, 1986, p.39)
Assim, fomos buscar no trabalho dos Van Hiele não só uma referência para o
ensino de Geometria como, também, esse começo de história de vida, tão parecida com o
de todo professor iniciante. No Brasil, o modelo obteve a divulgação a partir de 1990,
trazido pela professora Lílian Nasser (Universidade Federal do Rio de Janeiro) que
defendeu tese com este referencial, em Londres.
Na tentativa de entender melhor e de procurar explicações para o desencontro entre
o ensino de Geometria e sua compreensão por parte dos alunos, o casal Van Hiele, apoiado
em experiências educacionais apropriadas, elaborou um método teórico que afirmou que o
processo de desenvolvimento do pensamento geométrico perfaz uma seqüência de cinco
níveis hierárquicos: de compreensão:”visualização” (ou reconhecimento), “análise”,
“dedução informal” (ou ordenação, ou síntese, ou abstração), “dedução formal” e “rigor”.
Sugeriu que os alunos progrediam através dessa seqüência hierárquica enquanto aprendiam
geometria.
O trabalho ficou conhecido como “o Modelo de Van Hiele” ou “a Teoria de Van
Hiele”. Nesse modelo, o desenvolvimento das habilidades de cada nível está relacionado
com as instruções e maturidade do aluno e não com a idade, série a que ele pertence, pois
um aluno pode estar raciocinando em níveis diferentes em conceitos de Geometria, apesar
dessas serem diferentes.a que ele pertença. Esse modelo é uma referência para o ensino de
Geometria, na medida em que proporciona ao professor um olhar mais reflexivo do
processo de aprendizagem.
A VISUALIZAÇÃO POR MEIO DE OFICINAS
Nesta última década, diversas pesquisas em Educação Matemática apontam para a
importância de se incentivar, nos meios educacionais, o desenvolvimento da habilidade de
visualização em Geometria. Isto porque há um reconhecimento da importância de se
compreender a percepção das informações visuais, tanto para a formação matemática do
educando quanto para sua educação geral. As pesquisas realizadas por MESQUITA (1989)
e PADILLA (1992) procuraram chamar a atenção para o papel heurístico das figuras
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geométricas na resolução de problemas matemáticos, comprovando que sua utilização
exige um “aprender a ver e a ler” estas figuras.
Nesse contexto, as oficinas podem ser tratadas como uma metodologia que
promove o processo da habilidade de desenvolvimento da visualização, pois favorece a
descoberta, a observação, a exploração e a construção do conhecimento. No processo de
ensino e aprendizagem tem-se constatado dificuldades de aprendizado em conteúdos onde
não é possível presenciar o processo da forma que o mesmo acontece. Nesses casos a
inserção de oficinas pedagógicas no ensino de Matemática constitui um instrumento de
grande valia no processo. Essa metodologia possibilita explorar não só as possibilidades
dos materiais manipuláveis, como também criar um ambiente propício que oportunize a
construção do conhecimento, no sentido de proporcionar significativa melhoria na
aprendizagem dos estudantes nos conteúdos matemáticos. Assim é necessário que o
professor elabore atividades criativas e dinâmicas que estimulem a participação dos alunos,
que devem ser motivados a buscar os seus conhecimentos, por meio de sua própria ação do
fazer, no levantamento de conjecturas e sua justificação.
O aluno é chamado a agir como um matemático, não só na formulação de
questões e conjecturas e na realização de provas e refutações, mas
também na apresentação de resultados e na discussão e argumentação
com seus colegas e o professor.
( PONTE et al, 2003,p.23)
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) enfatizam a importância de oferecer
uma geometria que não prioriza apenas definições e cálculos. O desenvolvimento do
pensamento geométrico dos alunos é aguçado através de situações que evidencia as formas
geométricas vivenciadas pelos mesmos em seu cotidiano:
Usar as formas geométricas para representar ou visualizar partes do
mundo real é uma capacidade importante para a compreensão e
construção de modelos para resolução de questões da Matemática e de
outras disciplinas. Como parte integrante desse tema, o aluno poderá
desenvolver habilidades de visualização, de desenho, de argumentação
lógica e de aplicação na busca de soluções para problemas.
(PCN’s, 1999, p.123)
Nas atividades propostas em oficinas, a visualização tornou-se uma forma mais
efetiva para uma melhor compreensão da Geometria. Uma imagem que pode ser utilizada
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para ensinar conceitos matemáticos abstratos ajuda a esclarecer e simplificar a
aprendizagem de conceitos geométricos, FISCHBEIN (1993).
O DESENHO DA OFICINA E AS ATIVIDADES
SEQUÊNCIA 1
Apresentaremos, a seguir, parte de cada seqüência das atividades que elaboramos,
pois elas foram divididas em quatro etapas: a primeira etapa de atividades foi do tipo “lápis
e papel” e abordava uma revisão dos principais conceitos geométricos pertinentes ao
estudo da Geometria Espacial e Plana. Procuramos elaborar atividades voltadas para a
construção do conceito de área, mas focado na Investigação Matemática. Inicialmente,
orientamos os estudantes sobre a realização da tarefa pois, o conceito iria ser trabalhado de
forma intuitiva. Veja-se, abaixo, a estratégia utilizada por um aluno para resolver uma das
atividades propostas:
Figura 1: Estratégias usadas por um aluno no cálculo de área de algumas figuras
Foi necessário, apesar dos alunos já terem visto esse conteúdo anteriormente, uma
boa revisão em alguns conceitos geométricos das principais figuras planas, que seriam
trabalhados a todo o momento no estudo dos Sólidos Geométricos.
SEQUÊNCIA 2
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A segunda sequência de atividades, abordou questões relativas a “vistas” e
“perspectiva” com o objetivo de explorar a visualização para favorecer o aquisição do
pensamento geométrico.
Um problema que constatamos em relação ao desenho foi o de trabalhar o olhar no
tridimensional e no bidimensional, pois os alunos tiveram dificuldades em ver no papel o
que está no espaço, como podemos verificar com a fala de um aluno: “Devemos desenhar
o que está na frente primeiro e depois o que está nas beiradas?”.
Figura 2: Desenho de um aluno para identificação das arestas de alguns sólidos
Orientamos que nessa etapa os alunos deveriam tentar representar o que realmente
estavam “vendo”, exatamente o que está a sua frente, esquecendo o nome daquilo que está
desenhando, buscando o relacionamento entre as dimensões, ângulos e formas.
SEQUÊNCIA 3
A terceira etapa de atividades contemplou o uso de materiais manipulativos e tinha
o objetivo de fazer o reconhecimento de sólidos de revolução e de poliedros. Nessa
seqüência os alunos confeccionaram algumas bandeirinhas, a pedido do professor, e
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também trouxeram de casa várias embalagens. As bandeirinhas foram confeccionadas com
papel colorsete, em formas variadas de polígonos, círculo e de semicírculos, pregadas em
palitos. Os alunos deveriam fixar essas bandeirinhas em um isopor, rotacioná-la 360° e
descrever o sólido que era formado. Depois eles deveriam relacionar esses sólidos com as
embalagens que trouxeram de casa e agrupá-los de acordo com o seguinte critério: as que
rolam ( sólidos que arredondados) e as que não rolam( poliedros). Para essa classificação
eles usaram o caderno e colocaram os sólidos para rolarem.
Figura 3: Escrita de alunos identificando os sólidos que são formados pela rotação de bandeirinhas
Com o desenrolar das atividades, notamos que os alunos passaram a perceber as
características dos poliedros e dos sólidos arredondados e passaram a descrever algumas de
suas propriedades, deduzindo-as informalmente.
SEQUÊNCIA 4
A quarta etapa contou com atividades com o software POLY. Distribuímos os
cadernos de atividades e dividimos os alunos em trios ou duplas, devido ao formato da sala
de informática. Com o software que possibilita o movimento dos poliedros, a idéia de
aresta, vértice e face tornou-se clara para cada aluno. Um dos objetivos da atividade: a
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contagem do número de faces, vértices e arestas dos poliedros, teve a finalidade de
enunciar a relação de Euler.
Figura 4: Escrita de um aluno da sua observação entre a relação de vértices, arestas e faces de um
poliedro.
Após cada etapa das atividades foi feita uma plenária com todos estudantes para
socialização dos resultados obtidos para reafirmação e formalização dos conceitos
geométricos.
Ressaltamos que os conceitos matemáticos a serem adquiridos pelos sujeitos, com o
auxílio do professor, bem como as representações destes conceitos não estão nos materiais
didáticos, mas nas ações interiorizadas pelo sujeito, pelo significado que dão às suas ações,
às formulações que enunciam, às verificações e relações que realizam, necessitando para
isso o estabelecimento de abstrações e generalizações (NEHRING, POZZOBON, 2007).
Quando saímos da construção no papel ou no quadro negro para a representação
com o software POLY, mudamos de um referencial estático para um referencial dinâmico.
Com a visualização e a movimentação permitidas, pelo uso do POLY, tivemos a
possibilidade de explorar as figuras com suas propriedades, possibilitando sua visualização
em várias posições e no trabalho com poliedros e seus elementos (arestas, vértices e faces)
conseguimos chegar na relação de Euler.
NASSER(1991) aponta a visualização como uma forma de guiar os alunos no
processo de dedução, facilitando a exploração e as conseqüentes justificativas.
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Sendo assim, pesquisas realizadas indicam que a aprendizagem geométrica é
necessária ao desenvolvimento do aluno, pois como afirma FAINGUELERNT (1999), a
geometria ativa as estruturas mentais, possibilitando a passagem do estágio das operações
concretas para o das operações abstratas. E se este ensino, enfocar os aspectos topológico,
projetivo e euclidiano, o estudante terá possibilidades de conhecer, fazer descobertas,
identificar as formas geométricas e explorar o espaço onde vive.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essa pesquisa ainda está em desenvolvimento, mas, já é possível fazer alguma
validação das atividades realizadas, pois conseguimos observar várias mudanças
referentes à postura dos alunos frente a uma atividade de investigação
matemática.
Entendemos que após essa intervenção, que foi a implementação das oficinas, houve uma
melhora significativa no desempenho dos alunos, levando a crer que a Teoria de Van
Hiele, o uso de recursos didáticos diversificados e a interação social foram facilitadores na
aprendizagem do reconhecimento e propriedades dos sólidos geométricos.
Ainda constatamos que o caráter dinâmico do software POLY, gerou algumas
vantagens para o ensino, como a de acelerar o tempo de muitas construções, encorajar a
tentativa e erro. Um importante recurso desse software no estudo de poliedros é
disponibilizar modos de visualização diferenciados para um poliedro e seus elementos –
faces, arestas e vértices, e como os poliedros podem ser relacionados interativamente.
Além disso, o software permite a realização do movimento de abrir/fechar o poliedro, isto
é, “abrir” obtendo a forma planificada, e “fechar”, voltando ao poliedro inicial
Os alunos demonstraram curiosidade e interesse para trabalhar com os recursos
concretos e o software nas oficinas. A interação entre alunos e pesquisador proporcionou
aulas mais dinâmicas que levaram a uma melhor compreensão do objeto de estudo.
A implementação de metodologias inovadoras de ensino no trabalho de sala de aula
traz um grande desafio ao professor que, ao construir propostas de trabalho adequadas à
realidade do aluno, está inserindo-o em uma nova maneira de pensar a matemática não
restrita à aplicação de procedimentos.
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REFERÊNCIAS:
BRASIL. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Matemática. Brasília: MEC/ SEF, 1999.
FAINGUELERNT, Estela kaufman. Educação Matemática : Representação e Construção
em Geometria. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
FISCHBEIN, E. The Theory of Figural Concepts. Education Studies in Mathematics,
1993.
MESQUITA, Ana. L'influence des aspects figuratifs dans l'argumentation des élèves
en géométrie. Strasbourg: Thèse-Université Louis Pasteur, 1989.
NASSER, Lílian. Níveis de van Hiele: Uma explicação definitiva para as dificuldades em
Geometria? Boletim GEPEM nº 29, p.21-25, 1991.
NEHRING, C. M; POZZOBON, M. C. C. Refletindo sobre o material manipulável e a
ação docente. EREM, Ijuí, 2007.
PADILLA , V. L’influence d’une acquisition de traitements purement figuraux pour
l’apprentissage dês mathématiques. Strasbourg: Thèse-Université Louis Pateur, 1992.
PONTE, J. P.; BROCARDO, J. ; OLIVEIRA, H. Investigações Matemáticas na Sala de
Aula. 1 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
VAN HIELE, P.M. Structure and Insight: A Theory of mathematics Education, Orlando,
FL: Academic Press, 1986.
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