X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 UMA ANÁLISE DA FORMAÇÃO CONCEITUAL EM GEOMETRIA ESPACIAL DOS ALUNOS DO CURSO DE PEDAGOGIA Carlos Eduardo Petronilho Boiago1 Universidade Federal de Uberlândia (UFU-FACIP) [email protected] Odálea Aparecida Viana2 Universidade Federal de Uberlândia (UFU-FACIP) [email protected] Resumo: Este trabalho analisa o nível de conhecimento que alunos do curso de pedagogia tem sobre as figuras tridimensionais mais comuns. Baseado no modelo Van Hiele de formação conceitual em geometria, foi elaborada uma prova que solicitava nomeação de figuras espaciais e a descrição de propriedades. Foram sujeitos 81 alunos, sendo 28 do noturno e 53 no diurno. A análise estatística indica que a maioria dos alunos não nomeou nem descreveu propriedades das figuras espaciais mais utilizadas no ensino fundamental e teve dificuldades para desenhar a planificação das mesmas. O trabalho aponta para a necessidade dos estudantes, enquanto futuros professores, ter um nível mínimo de conhecimento em geometria espacial para ensinarem seus alunos, já que desde o final dos anos oitenta as propostas de ensino sugerem a geometria espacial nas series iniciais do Ensino Fundamental. Palavras - chave: Ensino de Geometria; Formação de conceitos; Geometria espacial. 1. Introdução Os Parâmetros Curriculares Nacionais nos mostra a importância dos conteúdos e o tratamento que a eles deve ser dado, já que por meio deles os propósitos da escola são operacionalizados (BRASIL, 1997). Dando-lhes uma nova concepção, o documento classifica os conteúdos em três grandes categorias: conteúdos conceituais, que envolvem conceitos, fatos e princípios; conteúdos procedimentais e conteúdos atitudinais, que envolvem os valores, normas e atitudes. 1 2 Graduando do Curso de Matemática da Universidade Federal de Uberlândia (UFU-FACIP) Professor Adjunto da Universidade Federal de Uberlândia (UFU-FACIP) Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 1 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Este trabalho enfoca a formação conceitual em geometria espacial de futuros professores, lembrando que os PCN sugerem o estudo das formas tridimensionais desde as séries iniciais do ensino fundamental. O conteúdo de geometria – principalmente a geometria espacial - é, muitas vezes, considerado complexo pelos professores e alunos do Ensino Básico. Os professores, produto de uma geração que não estudou este conteúdo, em geral apresentam dificuldades para ensinar os conceitos, o que acaba gerando desinteresse por parte dos alunos. Diante desse quadro, objetivou-se verificar qual é o conhecimento apresentado por alunos do curso de Pedagogia, futuros professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, com relação às principais características dos sólidos mais comuns, como pirâmide, cone, cubo, cilindro etc. A pesquisa aqui relatada tem por base o modelo de Van Hiele (1986) que consiste em cinco níveis de compreensão: “visualização” (ou reconhecimento), “análise”, “dedução informal” (ou ordenação, ou síntese, ou abstração), “dedução formal” e “rigor”, sugerindo que os alunos progridem através dessa seqüência hierárquica enquanto aprendem geometria. Sendo assim, este trabalho procura investigar a formação conceitual de alunos do curso de Pedagogia, verificando se eles reconhecessem as formas tridimensionais mais comuns e se conseguem explicitar algumas propriedades destas figuras. Investiga também a habilidade de reconhecer as superfícies dos sólidos geométricos, desenhando a sua planificação. 2. Os níveis de formação conceitual O modelo de Van Hiele (1986) tenta explicar as fases do aprendizado em geometria, descrevendo algumas características apresentadas pelos alunos neste processo. A teoria implica em níveis de formação conceitual, descritos a seguir.No Nível 1, chamado também de estágio inicial ou de nível básico, o aluno percebe os conceitos geométricos como entidades totais, não vê componentes ou atributos. A aparência física é determinante para reconhecer figuras e não suas partes ou propriedades. O aluno consegue aprender um vocabulário geométrico, identificar formas específicas e reproduzir um desenho com papel Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 2 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 quadriculado. Por exemplo, pode reconhecer um dado, chamá-lo de cubo, mas não é capaz de reconhecer as seis faces quadradas. Este nível mais elementar de raciocínio é decorrente da forma como normalmente a geometria parece ser ensinada na pré-escola e no ensino fundamental, ou seja, baseada em atividades que têm por objetivo o reconhecimento nos dois sentidos: nome ↔figura. No nível 2, de análise, o aluno reconhece as partes de uma figura, começa a analisar as suas propriedades e utiliza algumas propriedades para resolver certos problemas. Não é capaz de explicar relações entre propriedades, não vê inter-relações entre as figuras e não entende definições. Pode perceber que as faces opostas de um paralelepípedo são paralelas, mas não notará como os paralelepípedos se relacionam com os cubos. O Nível 2 é o primeiro que oferece um raciocínio chamado “matemático”, pois nesta fase os alunos são capazes de descobrir e generalizar propriedades (necessariamente a partir da manipulação e da observação). Esta capacidade de generalização é, no entanto, limitada, pois usarão as propriedades como se fossem independentes entre si. Acrescente-se que, neste nível, o aluno dá mais importância à existência de algumas propriedades diferenciadoras nas figuras que à existência de propriedades comuns. É no Nível 3, da ordenação, que o aluno ordena logicamente figuras e entende interrelações de propriedades tanto das figuras quanto entre elas. É capaz de formar classes de figuras, e a inclusão de classes é entendida. Assim, consegue entender que todo cubo é paralelepípedo e reconhece a importância de definições acuradas, acompanha e formula argumentos informais. No Nível 4, da dedução, o aluno compreende o significado da dedução como maneira de estabelecer a teoria geométrica no contexto de um sistema axiomático. No último, Nível 5, o aluno é capaz de descrever com vários sistemas axiomáticos da geometria espacial. Muitos trabalhos no Brasil e no mundo tomaram como referência o modelo de Van Hiele e há várias criticas ao modelo, conforme pode ser visto em citado por Viana (2000),Nasser (1992) e Viana. Estudos mais recentes ainda utilizam o modelo para classificar estudantes nos níveis ou para avaliar propostas didáticas que têm como objetivo favorecer o desenvolvimento do pensamento geométrico dos alunos (SANTOS 2007). 3. Objetivo da pesquisa Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 3 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Avaliar a formação conceitual em geometria espacial de alunos do curso de graduação em pedagogia, da universidade onde atuamos, quanto a: a) reconhecimento e nomeação das principais figuras geométricas tridimensionais; b) nomeação das propriedades das referidas figuras; c) planificação das referidas figuras. 4. Metodologia Foram sujeitos da pesquisa 81 alunos do 1º e 3º períodos do curso de pedagogia,o que caracterizou uma amostra de conveniência. Os sujeitos tinham entre 18 e 52 anos, sendo 2 homens e 79 mulheres. Os discentes responderam às questões de uma prova elaborada especialmente para a pesquisa. O instrumento foi aplicado em horário de aula, com autorização da professora. A prova era composta por questões em que se apresentavam as figuras geométricas e eram solicitados seus nomes, o que implicaria no reconhecimento e nomeação das figuras. Além disso, era solicitada a descrição de propriedades, características do nível 2 de Van Hiele. Também faziam parte da prova questões que solicitavam as planificações de algumas figuras espaciais mais comuns. 5. Resultados As questões foram pontuadas, sendo que o máximo de pontos na prova era de 57 pontos. O desempenho dos alunos é mostrado na Tabela 1 e na Figura 1. Tabela 1. Desempenho dos sujeitos na prova. Estatísticas Nº de sujeitos Média Desvio padrão Mínimo Máximo Valores 81 7,209877 5,887945 0 26 Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 4 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Histogram of Numeros de acertos Normal 25 Mean StDev N 7,210 5,888 81 Frequency 20 15 10 5 0 -5 0 5 10 15 Numeros de acertos 20 25 Figura 1. Histograma do desempenho dos sujeitos na prova Verifica-se que houve um fraco desempenho na prova, já que a média ficou em torno de 7 pontos e poucos sujeitos apresentaram boa pontuação. Houve diferenças de desempenho por turno e período. Assim, alunos do noturno tiveram uma média maior que os alunos do diurno (p < 0,05) e os do 1º período obtiveram melhor desempenho que os do 3º período (p < 0,05), conforme mostra a Tabela 2. Tabela 2. Desempenho por turno e período Variáveis Turno Periodo Grupos Diurno Noturno 1º 3º N 53 28 23 58 Média 5,339622 11,607142 8,070175 5,500000 Des.padrão 3,064978 7,929778 6,786310 2,574953 O Quadro 1 mostra o número de alunos que acertou cada questão. Nota-se que não existe o item (h), que foi anulado, pois a figura não estava nítida. Foram considerados corretos vários nomes para a mesma figura. Assim, uma mesma figura poderia ser nomeada como prisma ou octaedro, por exemplo. Conforme pode ser verificado no Quadro 1, poucos alunos acertaram o nome de figuras elementares como paralelepípedo, esfera, cubo. Nenhum aluno acertou a letra (j) prisma de base triangular. Verifica-se também a diferença entre as porcentagens de acerto para os cilindros das figuras (a) e (n), assim como para os cubos (d) e (i) e para as pirâmides (b) e (m), o que indica que a posição da figura interfere no reconhecimento da Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 5 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 mesma. Pode-se observar o bom número de acertos da figura cilindro (a) e da letra (q) lata de óleo. O Quadro 2 mostra o número de alunos que acertou o desenho da planificação de cada sólido geométrico. Destaca-se que apenas três alunos acertaram a planificação do cone e apenas cinco estudantes fizeram a do prisma pentagonal. O paralelepípedo foi a figura com maior porcentagem de acertos, seguida do prisma de base hexagonal e da pirâmide. Destaca-se que o cone foi planificado por apenas três alunos e os que planificaram o prisma pentagonal pertenciam ao turno noturno. Quadro 1 . Acertos na nomeação das figuras Nomearam Nº de sujeitos % Figura Figura Nomearam Nº de % sujeitos a) 56 69,13 i) 11 13,58 b) 47 58,02 j) 0 0 c) 5 6,17 l) 2 2,47 d) 28 34,56 m) 10 12,34 e) 59 72,84 n) Moeda 2 2,47 f) 7 8,64 o) Bola 7 8,64 g) 4 4,94 p)Caixa de sapato 2 2,47 q) Lata de óleo 51 62,96 Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 6 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Quadro 2. Acertos na planificação de figuras espaciais. Figura Planificaram corretamente % 29 Figura Planificaram corretamente % 35,80 16 19,75 3 3,70 15 18,52 5 6,17 22 27,16 6. Considerações finais Desde o final dos anos oitenta sugere-se que o ensino de geometria se inicie – já nas primeiras séries – a partir da exploração das formas dos objetos tridimensionais. Mas, para que as crianças consigam estabelecer relações entre as formas é necessário um bom material, que pode ser feito de cartolina. É necessário, principalmente, que o professor domine os conceitos, pelo menos em um nível 2 de formação conceitual. Neste nível ele poderá analisar as propriedades das figuras e confeccionar seu próprio material. Os sujeitos desta pesquisa tiveram dificuldade em reconhecer as figuras tridimensionais mais comuns. Isto indica que a formação conceitual para algumas figuras não se encontrava ainda no Nível 1, que é o do reconhecimento. A maioria não conseguiu descrever propriedades geométricas das figuras, sendo que, em muitas vezes, os termos utilizados pelos alunos não caracterizavam o Nível 2 de formação conceitual. O reconhecimento e a nomeação, características do Nível 1, parecem ser relativas apenas às figuras familiares aos alunos, como cilindro e cone. Mesmo o paralelepípedo, forma bastante comum nos objetos do cotidiano e figura muito utilizada pelos livros didáticos, não é reconhecido e nomeado como conceito geométrico pela maioria dos alunos. A presente pesquisa encontrou que a maioria dos sujeitos teve dificuldades em elaborar os desenhos de planificação, o que parece indicar uma habilidade pouco desenvolvida. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 7 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Este trabalho mostrou que, para os sujeitos analisados, no contexto da pesquisa, a formação conceitual relativa às figuras tridimensionais não se mostrou adequada para um curso de formação de professores. Considera-se importante uma atuação pedagógica que possa ajudar no desenvolvimento dos conceitos geométricos em alunos de cursos de formação de professores, dando assim maior autonomia para que os futuros professores possam exercer sua prática pedagógica com mais autonomia, contemplando as sugestões dos PCN acerca do trabalho com geometria espacial nas séries iniciais do ensino fundamental. Referências Bibliográficas BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA/ SECRETARIA DA EDUCAÇÃO MÉDIA E TECNOLÓGICA. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Ensino Fundamental. Brasília, 1997. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA/ SECRETARIA DA EDUCAÇÃO MÉDIA E TECNOLÓGICA. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília, 1998. CROWLEY. M. L. O modelo Van Hiele de desenvolvimento do pensamento geométrico. In LINDQUIST. M. M; SHULTE A. A. (org.) Aprendendo e ensinando geometria .Tradução de Hygino H. Domingos. São Paulo: Atual, 1994. OLIVEIRA, E.A.MORELATTI, M.R.M. Os conhecimentos prévios de alunos da quinta serie do ensino fundamental: um caminho para a aprendizagem significativa de conceitos geométricos In: Anais do Seminário Internacional de Pesquisa em Educação Matemática, Águas de Lindóia, 2006. PIROLA, N. A. Solução de Problemas Geométricos: Dificuldades e Perspectivas. Tese de Doutorado. Universidade Estadual de Campinas, 2000. PIROLA, N. A; BRITO, M.R.F. A formação de conceitos de triângulo e de paralelogramo em alunos da escola elementar. In BRITO, M.R.F. Psicologia da Educação Matemática: Teoria e Pesquisa. Florianópolis: Insular, 2001. PROENÇA, M. C. Um estudo exploratório sobre a formação conceitual em geometria de alunos do ensino médio. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”. Bauru, 2008. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 8 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 REZI, V. Um estudo exploratório sobre os componentes das habilidades matemáticas presentes no pensamento em geometria. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, 2001. SANTOS, M.R. Teoria de Van Hiele: Uma alternativa para o ensino da geometria no 2ºciclo. Anais do IX Encontro Nacional de Educação Matemática. Belo Horizonte, MG, 2007. VAN HIELE, P.M Structure and Insight - A Theory of Mathematics Education, Orlando: Academic Press, 1986. VIANA, O. A. O conhecimento geométrico de alunos do Cefam sobre figuras espaciais: um estudo das habilidades e dos níveis de conceito. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, 2000. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Pôster 9