DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 118 DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA TRANSFERABILITY OF THE RIGHT TO BRANDS PROPERTY Charlene Maria C. de Ávila Plaza1 Resumo Discute-se a transmissibilidade da propriedade imaterial e o problema dos bens imateriais quando transferidos ou cedidos sem o atendimento às especificidades da legislação especial, caso confirmar a mutação objetiva ou subjetiva de caráter acessório ou acidental que “legitima” o beneficiário a demandar judicialmente terceiros. Palavras-chave: transmissão, legitimação, marcas, anotação. Abstract This paper discusses the transmissibility of intangible property and the specific problem of intangible property when transferred or assigned without the specific care of special legislation, if the mutation confirmed objective or subjective character accessory or accidental that "legitimizes" the beneficiary to sue third parties. Keywords: transmission, legitimization, brands, annotation. Introdução Já abordei o tema em publicação anterior2, sob outra vertente, quando analisei um Case entre duas empresas de medicamentos, cujo litígio iniciou-se em 1999 através de Ação de preceito cominatório cumulada com indenização por perdas e danos por suposta usurpação de marca registrada e que tramita em juízo até o presente momento em que se escreve o texto. Entretanto, naquela oportunidade, questionei se o ato inter-partes relativo à titularidade de direito de propriedade industrial, sem as devidas anotação e publicação em tempo hábil da respectiva mutação subjetiva do ato registral pelo Órgão Administrativo – INPI confere ao beneficiário a legitimidade processual para atuar em defesa do direito em face de terceiros? 1 Mestre em Direito na área de Integração e Relações Empresariais pela Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP-SP. E.mail: [email protected] 2 PLAZA, Charlene Maria C. de Ávila. Efeitos da averbação em propriedade intelectual - um estudo de caso. XX Congresso Nacional do CONPEDI – Vitória em 16, 17, 18 e 19 de novembro de 2011 ISBN: 978-85-7840-070-5. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 119 Os atos processuais praticados antes da anotação da transferência da marca e a competente publicação na RPI faz com que sejam considerados nulos? Aqui, continuarei a problemática, mas atenta para a transmissibilidade da propriedade imaterial e o problema específico dos bens imateriais quando transferidos ou cedidos sem o atendimento às regras específicas da legislação especial, caso confirmar a mutação objetiva ou subjetiva de caráter acessório ou acidental que “legitima” o beneficiário a demandar judicialmente terceiros. Assim, vejamos: A Constituição Federal de 1988, em seu enunciado do artigo 5º, XXIX, assegurou aos autores de inventos industriais, privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País. Embora se tratando de objetos de criação não corpórea, fruto da atividade intelectual do homem, as marcas são consideradas como um direito de propriedade. Mas, não a propriedade exercida sobre o signo, mas sobre seu uso no mercado, com finalidades específicas de garantir retorno do investimento na imagem do produto ou serviço em questão, ou na sua qualidade. Desta forma, entende-se que a marca é definida como direito de propriedade e tal conceito está expresso na Lei de Propriedade Industrial, em seu artigo 129: A propriedade da marca adquire-se com o registro validamente expedido, conforma as disposições desta lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional (...). E assim o é quando se analisa os efeitos da anotação das mutações societárias realizada pelo Órgão Administrativo competente – INPI para fins de transferência e/ou cessão de marcas e a oponibilidade contra terceiros na sistemática da Lei 9.279/96. I. AS ESPECIFICIDADES DAS “PROPRIEDADES” MARCÁRIAS E SUA NÃO IDENTIFICAÇÃO COM O DIREITO COMUM Pergunta-se: No caso dos direitos protetivos em Propriedade Industrial, os efeitos da anotação seriam idênticos dos de Direito Comum? Não há uma sistemática uniforme de relação entre o “direito comum” e a “propriedade intelectual”. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 120 Na verdade, cada modalidade de Propriedade Intelectual entretece vínculos muito singulares com o seu direito geral: as regras de aquisição da propriedade por acessoriedade e por especificação operam distintamente no tocante aos direitos autorais conexos e os direitos de patente e de marcas – nos ensinamentos de Pontes de Miranda3 “o registro é que transfere, entre vivos, o direito real, à semelhança do que se passa com a transferência de imóveis”. Barbosa4 atenta para as especificidades das “propriedades” marcárias e sua não identificação com o instituto correspondente do direito comum: Identificando “propriedade” (i.e., direito exclusivo) e “monopolio” (i.e., posição singularizada na concorrência), dentro do campo específico do direito positivo brasileiro, não excluimos, porém, a ação dos preceitos que regem, no direito comum, a propriedade das coisas físicas. É fácil entender. Pelo processo integrativo do sistema jurídico (jus aborte vacu um) a carência de normas num setor da juridicidade é suprida pelas normas mais adequadas, do setor mais compatível. Ora, as “propriedades” das patentes, direitos autorais e marcas são direitos reais, exclusivos, de caráter patrimonial. Onde encontraremos normas relativas às figuras jurídicas similares, senão nas disposições referentes com direitos reais sobre bens móveis físicos? Na inexistência de normas específicas e na proporção em que as regras aplicáveis a coisas tangíveis o são a atividades humanas, os direitos reais serão, intuitivamente, o paradigma dos direitos de propriedade industrial5. É necessário enfatizar, pois, que só serão aplicáveis às normas de direito real mobiliário se compatíveis com a natureza própria dos direitos de propriedade intelectual. Onde são incompatíveis, é vedada a aplicação. Em sua faceta de propriedade, a marca registrada compreende as faculdades elementares do domínio. A aproximação entre os dois regimes é marcante, como demonstram os art. 129 e 130. Nota a doutrina que, de todos os direitos da propriedade intelectual, a marca é o mais assimilável à propriedade comum6, mesmo por ser a única modalidade que não é limitada no tempo. 3 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, § 1.942. Registro. BARBOSA, Denis Borges. Proteção das Marcas. 6.2.5. Peculiaridades da aplicação das normas de direito comum às marcas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. 5 [Nota do original] Caio Mário da Silva Pereira anota que a Parte Especial atinente ao Direito das Coisas abrange indistintamente os bens corpóreos e incorpóreos, o que também chega a suceder na Parte Geral do Código (“Instituições de Direito Civil”, vol. I/237, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1966, p. 112). 6 [Nota do original] Vide Pollaud-Dullian, § 1.297. «La qualification de propriété se traduit par diverses règles : 1'opposabilité absolue (dans le cadre de la spécialité toutefois), la consécration de l’action en revendication, le principe de la cession libre de marque c'est-à-dire la possibilite de ceder la marque indépendamment du fonds de commerce ou de 1'entreprise qui 1'exploite, la possibilite de licence et mise en gage, de copropriété (laquelle, à la différence du droit des brevets, n'est pas soumise à un regime spécial) ou de constitution d'usufruit. En outre, à la différence du droit des brevets et du droit des dessins et modeles, la propriété de la marque a vocation à la perpetuité, sous reserve quele propriétaire procede aux formalités de renouvellement et exploite sa marque. II s'agit cependant d'une propriété d'un type três particulier, comme on l'a souligné dans 1'introduction générale. Non seulement elle porte sur un bien incorporel et a un caractere relatif en raison de la règle de spécialité, mais encore sa protection est subordonnée à une procédure d'enregistrement et son maintien à une obligation d'exploitation». 4 PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 121 Assim, seja por ser objeto de propriedade, seja pelo fato de os registros terem natureza análoga aos direitos de propriedade sobre bens físicos, justifica-se a aplicação do paradigma dos direitos reais sobre bens móveis às marcas registradas. Na sua faceta concorrencial, no entanto, a marca registrada fica sujeita a uma série de condicionantes que singularizam seu regime em face do paradigma mobiliário. O direito de propriedade é o mais amplo dos direitos reais. “É um direito complexo, se bem que unitário, constituindo num feixe de direitos consubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa que lhe serve de objeto7”. Assim, a propriedade como o direito de usar, gozar e dispor dos bens, e de reavê-los de quem injustamente o possua, o Código Civil emprega a palavra bens, cuja significação é mais lata do que a expressão coisa compreendendo não só as coisas corpóreas, como as incorpóreas8. Nota a doutrina que, de todos os direitos da propriedade intelectual, a marca é o mais assimilável à propriedade comum9, mesmo por ser a única modalidade que não é limitada no tempo10. Deste modo, seja por ser objeto de propriedade, seja pelo fato dos registros terem natureza análoga aos direitos de propriedade sobre bens físicos, justifica-se a aplicação do paradigma dos direitos reais sobre bens móveis ás marcas registradas. Na sua faceta concorrencial, no entanto, a marca registrada fica sujeita a uma série de condicionantes que singularizam seu regime em face do paradigma imobiliário11. Sobre o conjunto de exceções e condicionantes entre um instituto e outro, Barbosa12 apregoa que: 7 GOMES, Orlando. Direitos Reais, 10° edição. Forense, p.85 CERQUEIRA, Gama. Tratado de Propriedade Intelectual, vol. I, parte I, p. 147. 9 Vide Pollaud-Dullian § 1.279. La qualification de propriété se traduit par diverses règles;l´opposabilité absolute (dans lecadre de la spécialité toutefois), la consécration de l´action em revendication, le príncipe de la cession libre de marque c´est-à-dire la possibilite de ceder la marque indépendamment du fonds de commerce ou de l´entreprise qui l´exploite, la possibilite de licence et mise em gage, de copropriété (laquelle, à la différence du droit des brevets, n´est pás soumise à um regime spécial) ou de constitution d´usufruit. Em outre, `la différence du droit du brevets et du droit des dessins et modeles, la propriété de la marque a vocation à la perpetuité, sous serve quelle propriétaire procede aux formalités de renouvellement et exploite as marque. Il s´agit cependant d´une propriété dún type três particulière, comme on lá souligné dans l´ introduction générale. Non seulement elle porte sur un bien incorporeal et a un caractere relative en raison de la régle de spécialité, mais encore sa protection est subordonnée à une procedure d´enregistrement et son maintien à une obligation d´exploitation. 10 BARBOSA, Denis Borges. Nota sobre a noção de propriedade da marca na lei ordinária brasileira, 2005. Disponível em: http://denisbarbosa.addr.com/notamarca3.pdf. 11 BARBOSA, op. cit. Nota sobre a noção de propriedade da marca na lei ordinária brasileira, 2005. 12 BARBOSA, op. cit, 2005. 8 PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 122 O registro só constitui propriedade em relação ao emprego do signo em um mercado específico. Tanto subjetivamente, quanto objetivamente, a propriedade só se adquire e se exerce em relação a este segmento especializado no mercado e para seus propósitos. Em segundo lugar, a constituição e a transferência da propriedade não se identificam com as formas similares da propriedade mobiliária do direito comum. Nem a ocupação, nem a tradição perfazem a função constitutiva ou translativa da propriedade, pois é o registro, após o procedimento administrativo que dá a privativa, e só a anotação constitui o efeito erga omnes da transferência, (grifamos). A propriedade, além disso, é territorial, em nenhuma hipótese, seja no direito interno, seja no direito internacional aplicável, se tem eficácia internacional da propriedade das marcas. Apenas como poder de oposição ao direito formativo gerador de terceiros, certas marcas estrangeiras têm efeito no sistema jurídico interno, mas nunca com efeito positivo de constituir propriedade. As faculdades intrínsecas ao domínio, no caso de marca registrada, são sujeitas ao requisito de uso efetivo; o não uso após certo tempo faz perecer a propriedade. Em quinto lugar, o direito se estende apenas até que se tenha a oportunidade de recuperar o investimento relativo a cada produto ou serviço, exaurindo-se a propriedade após a primeira venda. Dentro de tais limitações e exceções, as normas relativas á propriedade mobiliária se aplicam em integridade, sujeitas apenas ás eventuais peculiaridades da dupla natureza da propriedade marcária13, vez que, as leis da propriedade industrial não são leis de exceção, não constituem direito excepcional, mas, simplesmente, direito especial; e os direitos que assegura, por sua vez, não constituem privilégios, no sentido próprio desta palavra, isto é, no sentido de vantagens outorgadas em benefício de certa pessoa, com exclusão de outras e com derrogação do direito comum, de modo a admitir a interpretação restritiva de norma jurídica ou dos próprios direitos por ela reconhecidos. O artigo 5º da Lei 9.279/96 diz que “Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade industrial”. Conquanto a transferência de direitos no direito comum se aperfeiçoe com a tradição, a transmissibilidade dos direitos em propriedade intelectual se opera de modo distinto. Com efeito, se no direito comum a transferência inter vivos de direitos reais se opera e se perfaz com a tradição da coisa, a transferência do registro em propriedade marcaria ou qualquer outra exclusiva em propriedade intelectual se concretizará a partir de publicada a anotação da mutação subjetiva em periódico oficial da União. Assim, a constituição e a transferência da propriedade não se identificam com as formas similares da propriedade mobiliária do direito comum. Nem a ocupação, nem a 13 BARBOSA, op. cit, 2005. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 123 tradição perfazem a função constitutiva ou translativa da propriedade, pois é o registro, após procedimento administrativo, que dá a privativa, e só a anotação constitui efeito erga omnes da transferência14. II. DA TRANSFERÊNCIA DO REGISTRO DA MARCA A transferência de marcas se dá por todas as formas de direito. Já dizia Noronha e Fischer no regime anterior ao Código Civil de 1916 “o direito Francês e no das nações em que é facultada a transferência da marca independentemente do fundo comercial ou industrial, a propriedade da marca é coisa móvel e, portanto, a sua transferência pode operar-se conforme as prescrições do direito civil e comercial sobre tal propriedade”15. Embora o objeto da alienação seja a própria marca, como objeto de propriedade que é o modo usual de sua transferência é a cessão do registro, pela qual se transferem para o cessionário todos os direitos dele resultantes. A natureza da marca não impede que ela seja objeto de outros contratos translatícios da propriedade, como a venda, a permuta, a doação, a transferência como entrada de capital, etc16. Cabanellas em sua obra Derecho de Marcas faz importante consideração: La cesión de marcas es una cesión de derechos. (..) Este encuadramiento de la figura de cesión marcaria no deja de suscitar ciertas dificultades. Debe tenerse en cuenta que el Código Civil incluye bajo un mismo Título disposiciones sobre la cesión de derechos en general, como es el citado artículo 1444, y en mucho mayor medida, sobre cesión de créditos, que es un caso particular de la cesión de derechos. Dado que la cesión de marcas es una cesión de derechos, pero no una cesión de créditos, las normas del Título del Código Civil correspondientes a esta última cesión solo le son aplicables parcialmente en forma directa; las normas de dicho título referidas a la cesión de créditos que constituyen la mayor parte del citado Título solo son aplicables a la cesión de marcas en forma analógica17. A jurisprudência nacional corrente confirma tais ponderações: Quanto à Carta-Patente nº 9202950-7, cabe notar que o depósito no INPI ocorreu em nome da American Cyanamid Company, isso em 30-7-92 (fl. 62), sendo que a BASF alega ter comprado desta os ativos do agronegócio, e por decorrência os direitos da mencionada Patente, a qual lhe confere exclusividade sobre a denominada Tecnologia Clearfield. Porém, há referir 14 BARBOSA, Denis Borges. Nota sobre a noção de propriedade da marca na lei ordinária brasileira, 2005. Disponível em: http://denisbarbosa.addr.com/notamarca3.pdf. 15 [Nota do original] Almeida De Nogueira & Fischer, Guilherme, Tratado Theorico e Pratico de Marcas Industriais e Nome comercial. São Paulo: Hennies Irmãos, 1910, p. 122. 16 CERQUEIRA, Gama. Tratado de Propriedade Intelectual, vol. I, parte I, p. 101. 17 BERTONE, Luis Eduardo e CUEVAS, Guillermo Cabanellas de las. Derechos de Marcas. Buenos Aires: Heliasta, 1989, p. 423. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 124 duas questões relevantes. A primeira diz respeito à formalização da cessão da mencionada Patente, uma vez que, conforme os arts. 58-9 da Lei 9.279/96 é necessário haja contrato de cessão. Denis Borges Barbosa comenta que a cessão de patente pressupõe um contrato de cessão pelo qual ocorre “a mudança do titular dos direitos sobre a patente”, e como o Código da Propriedade Industrial não define o regime jurídico, prossegue ele dizendo que a doutrina remete a regulação ao Código Civil, “aplicando-lhe o regime geral das cessões de crédito; subsidiariamente as disposições relativas à compra e venda ou da doação.” (Uma Introdução à PROPRIEDADE INDUSTRIAL, Ed. Lumen Juris, 2ª ed., 2003, p. 1049). No caso, não houve um contrato de cessão da norte-americana Cyanamid para a BASF, tendo por objeto os direitos da Patente nº 9202950-7. Pelo quanto se deduz, a BASF tem-na inserida no – digamos – pacote dos ativos do agronegócio." TJRS, AI Nº 70021344197, Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, Des. Irineu Mariani, 12 de dezembro de 2007. Uma vez constituído o registro de marca, o seu titular pode transferir a terceiros a propriedade e uso exclusivo dela independente do fundo de comércio. No entanto, em nosso sistema, assim como a propriedade das marcas nasce do registro, assim também a transferência de titularidade implica em Ato Registral Derivado regulado por Lei Especial. Esta condicionante de eficácia e validade, também estava prevista na Lei anterior de Propriedade Intelectual n° 5.772/71 conforme jurisprudência abaixo: TRF2 - APELAÇÃO CIVEL AC 9002119887 RJ 90.02.11988-7 (TRF2) Data de Publicação: 11/04/1991 Ementa: ADMINISTRATIVO. INPI. CESSÃO DE MARCA. I - Para que a empresa tenha legitimidade ativa para propor ação contra o INPI e terceiro, na qualidade de cessionária da marca ''NIK NIK'', é necessário que essa cessão seja anotada na autarquia (art. 88 da Lei nº 5772 /71), o que não ocorreu no caso. II - Recurso improvido. Unanimidade, Desprovimento. LEG-F Lei- 5772 Ano-1971 Leg-F Ant-51 Ano-1981 (INPI) CPC-73 LEGF Lei- 5869 Ano-1973 Código de Processo Civil Além dessas premissas, o pedido de registro ou o registro poderão ser cedidos a terceiros que estejam legitimados na forma do § 1° do artigo 128 da nova lei de propriedade intelectual, e a cessão somente produzirá seus efeitos após a publicação de sua anotação pelo INPI, conforme apregoado no artigo 137 da mesma Lei. Detalha o clássico Gama Cerqueira18 que “três momentos distintos nos apresentam para a transferência de uma marca de indústria de comércio ou de serviço”, quais sejam: Primeiro, a assinatura do documento de cessão e transferência; 18 CERQUEIRA, Gama. Caducidade do registro e marca. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 62 a 64. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 125 Segundo o requerimento do pedido de averbação da transferência perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial e; Terceiro, a averbação feita pelo INPI, mercê da publicação do deferimento da anotação na Revista da Propriedade Industrial, sendo que a devolução do Certificado de registro com a respectiva averbação é consequência desta última. A análise de Gama Cerqueira continua inteiramente aplicável, como graficamente descreve julgado recente do TJRS: Desta forma, a cessão do registro de desenho industrial, apesar de protocolado perante o INPI o pedido de transferência, não produz efeitos perante terceiros até que seja publicada a anotação. Com efeito, a alegação de que a propriedade é transferida através da firmatura do instrumento negocial de cessão não está sendo negada, evidenciada a produção de seus efeitos desde o momento em que cedente e cessionário realizam o ato jurídico. O que ocorre, no entanto, é que tais efeitos somente operam-se entre as partes que o celebraram, ficando a eficácia perante terceiros condicionada à referida publicação, constituindo requisito indispensável para que o cessionário possa defender os interesses relativos ao objeto da cessão, diante de eventual violação a direito subjetivo (...) Apelação Cível nº 70004177135 de 2002, Décima Quarta Câmara Cível. Neste sentido assim se manifestou o TJRJ em acórdão de lavra justamente do mesmo magistrado que prolatou a sentença neste processo; Dr. Pedro Freire Raguenet: Assim é que a transferência dos direitos de propriedade relativamente à marca se opera e se conclui no momento da assinatura do contrato próprio (leia-se: Documento de Cessão e Transferência); contudo e em relação a terceiros, a transferência em questão só se opera e produz efeitos depois de regularmente averbada no INPI. (...) Este contrato deverá se revestir das formalidades legais, como, e.g., denominação das partes, prazo de vigência, indicação do direito do titular do registro e assim por diante. (J. C. T. Soares, op. cit., pg. 1243 e ss.), o que, como já visto, não existe entre partes. (...). Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, 18ª Câmara Cível, Des. Pedro Freire Raguenet, AC 2007.001.02182, Julgado em 20.03.2007. (Grifamos) A Lei da Propriedade Industrial assim preceitua quanto às cessões (transferências) de marcas e patentes: Art. 136. O INPI fará as seguintes anotações: I - da cessão, fazendo constar a qualificação completa do cessionário; II - de qualquer limitação ou ônus que recaia sobre o pedido ou registro; e III das alterações de nome, sede ou endereço do depositante ou titular. Art. 137. As anotações produzirão efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. (Grifamos) PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 126 O sistema jurídico nacional reconhece e consigna em Registro, mediante lei especial a competente Anotação, a transferência de titularidade de uma marca e, diga-se: condição sine qua non para que se legitime a titularidade e, eventual oposição contra terceiros. Desta forma, a transferência de titularidade da marca está vinculada e condicionada em um Ato Registral Derivado, qual seja – a Anotação ou Averbação realizada pelo INPI – Instituto Nacional de Propriedade Intelectual. A averbação do ato ou contrato no Órgão Administrativo torna-se necessária para comprovar que a transferência de titularidade da marca apresenta as condições legais especificadas em registro e de sua exploração por terceiros, respeitando as demais condicionantes estipuladas na lei especial. Assim é que a transferência dos direitos de propriedade relativamente à marca se opera e se conclui no momento da assinatura do contrato próprio (leia-se: Documento de Cessão e Transferência); contudo e em relação a terceiros, a transferência em questão só se opera e produz efeitos depois de regularmente averbada no INPI. No âmbito administrativo, a cessão foi - em tempos - regida pela Resolução INPI n° 083/200119. Vale a pena citar o normativo, por seu propósito didático: 10. Sobre Cessão de Direitos 10.1 A cessão poderá ser comprovada por qualquer documento hábil que demonstre a transferência da titularidade do pedido ou do registro da marca, tais como por incorporação, cisão, fusão, sucessão legítima ou testamentária ou determinação judicial. 10.2 O INPI fará a anotação da cessão, fazendo constar a qualificação completa do cessionário, e a publicará, para que produza efeitos em relação a terceiros. 10.3 No caso de cessão de registro de marca que se encontre em fase de exame de prorrogação ou concessão de registro, o certificado já será expedido em nome do cessionário. 10.4 Da decisão que indeferir a anotação de cessão ou que cancelar registro ou arquivar pedido, nos termos do art. 135 da LPI, caberá recurso, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da respectiva publicação, cuja decisão encerrará a instância administrativa. 10.5 O pedido de anotação da cessão será instruído com os documentos previstos no Manual do Usuário. Atualmente, os procedimentos de anotação se transferência subjetiva do registro se acham regulados pelo capítulo & das Diretrizes de Exame do INPI. 19 Vide a Resolução 128/2006, que, em seu Art. 4º dispõe: Fica revogada a Resolução nº 083 de 14.12.2001. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 127 Parte da doutrina entende que com a incorporação o simples ato societário perfaz a tradição de todos os vínculos obrigacionais, dos direitos reais, dos direitos sobre bens imateriais, transmitidos e subsumidos globalmente20. Entretanto, comungamos com a assertiva apregoada em lei especial do enunciado do artigo 137 de que a transferência do registro da marca exige um ato translatício específico, i.e, assevera sem margens para outra interpretação que “as anotações produzirão efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação no órgão Oficial”. E mais, não apenas os contratos translatícios, mas também os atos judiciais pelos quais se transmitem direitos, seja por cessão, ou por transferência de marca, estarão sujeitos à anotação e a devida publicação na Revista de propriedade intelectual pelo órgão administrativo – INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual). Desta maneira, o sistema jurídico nacional, reconhece e consigna em registro, mediante anotação, a mudança de titularidade de uma marca, conforme dispõe o mencionado artigo 137 da LPI. Há uma condicionante de validade e eficácia perante terceiros, há assim, um ato registral derivado prescrito em lei especial. Havendo uma dinâmica na vida da marca, os novos elementos que surgem devem constar no registro, (...) tudo é anotado em registro – a mudança de propriedade através de cessão, os acréscimos nas marcas, às alterações no nome e sede ou endereço dos titulares ou das empresas, as limitações e ônus que recaírem sobre a marca, as medidas judiciais, as ocorrências em relação aos bens objeto das marcas, os aperfeiçoamentos e acréscimos da marca, de modo a tudo ficar inserido ou registrado no INPI. Assegurados os direitos relativos à propriedade intelectual pelas garantias constitucionais “seu conteúdo e seus limites serão definidos na lei especial que lhe normatiza o exercício”, i.e, o INPI prevê a necessidade imperativa de ato específico para a configuração dos efeitos de validade e eficácia erga omnes, ou seja, legitimidade ad causam perante terceiros, ou oponibilidade. Por mais que a averbação seja considerada pela doutrina21 como elemento acessório ao registro e, por sua vez, não constituindo condição para a eficácia do ato principal, a sua 20 MARTINS, Fran. Comentários á Lei das Sociedades Anônimas. Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1976, artigos 206 a 300. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p.139. BULGARELLI, Waldírio. Fusões, incorporações e cisões de sociedades. São Paulo: Atlas, 2000, p.109. BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. 21 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo, vol. 01, 1998. Declaração necessária para a ressalva de direitos que se processa na matrícula ou à margem do registro, com o escopo de informar terceiro da existência de determinado fato superveniente, que, não sendo constitutivo de domínio, de PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 128 ausência fulmina a possibilidade daqueles que se arrogam titulares da marca de se opor contra terceiros. Por ser uma alienação especialíssima e não uma sucessão a título universal há a imperiosa necessidade no que tange a transferência do registro marcário ser anotada e publicada em órgão competente. Assim não sendo, o adquirente não poderá exercer seus direitos contra terceiros, nem perante a Administração Pública. Portanto, antes de cumprida a formalidade da lei especial, o adquirente não poderá agir contra terceiros que infrinjam o seu registro, requerer perante a administração pública a sua renovação, nem opor a concessão do registro de marca idêntica ou semelhante, como também não poderá demandar judicialmente a anulação do que for concedido. A averbação ou registro não se destina a dar eficácia absoluta ao contrato. Pela lei de propriedade intelectual, tal eficácia já existe antes da averbação; o que carece ao contrato é a eficácia relativa a terceiros, ou oponibilidade. Entre as partes vale o contrato, não para com terceiros. Afirma e reitera a jurisprudência abaixo: APELAÇÃO CÍVEL Nº 0261.463-3 7ª Vara Cível da Comarca de Curitiba. APELANTE: LINDOMAR OLIVEIRA DO AMARAL E OUTRO APELADO: GHALI COMÉRCIO DE FERRAGENS LTDA. RELATOR: JUIZ CONV. LUIZ A. BARRY APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA DE PRECEITO COMINATÓRIO - Pretensão de proibição de produção e comercialização de tipo de parafuso denominado "pitão". Alegação de ser o detentor da patente por transferência de anterior proprietário, detentor da patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial, INPI - Extinção do feito sem julgamento de mérito. Ilegitimidade ativa 'ad causam “-” Art. 267, Inciso VI, do Código de Processo Civil - Ausência de comprovação de cessão ou transferência da patente junto ao órgão regulamentador e falta de demonstração de publicação do ato junto ao INPI - Correção - Sentença mantida - Apelação improvida. ônus reais ou de encargos, venha a atingir o direito real ou às pessoas nele interessadas e, consequentemente, o registro, alterando-o, por modificar, esclarecer ou extinguir os elementos dele constantes. A averbação modifica o registro sem, contudo, alterar a sua essência. Consiste, portanto, no lançamento de todas as ocorrências ou fatos que, não estando sujeitos a assento, venham a alterar o domínio, afetando o registro relativamente à perfeita caracterização e identificação do prédio ou do titular da propriedade. Depois de feito o registro podem ocorrer fatos que o modifiquem ou o tornem de nenhum efeito. Estes fatos são lançados nos livros de registro com o nome de averbação. A averbação é considerada como elemento acessório ao registro ou à matrícula. Não constitui condição para a eficácia do ato principal. Não pode modificar elemento essencial do registro ou matrícula, representando, em geral, medida complementar a este. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 129 Paralelamente as marcas, para a concessão de patentes (Art. 59 da Lei 9.279/96) a cessão deverá constar a qualificação completa do cessionário; qualquer limitação (por exemplo – a nulidade parcial determinada judicialmente) ou ônus que recaia sobre o pedido ou a patente (como, por exemplo, a penhora); e as alterações de nome, sede ou endereço do depositante ou titular. Segundo o art. 60, as anotações produzirão efeito em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. Assim no capítulo referente às marcas. O art. 136 da mesma lei diz que o INPI fará as anotações da cessão, fazendo constar a qualificação completa do cessionário; de qualquer limitação ou ônus que recaia sobre o pedido ou registro; e das alterações de nome, sede ou endereço do depositante ou titular. Segundo o art. 137, as anotações produzirão efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação. Desta feita, o paralelismo importa em convergência de efeitos para as anotações de marcas e patentes. Importante salientar que, conquanto o artigo 136 refira-se tão somente a cessão como fundamento da transferência do registro, se entende que outros atos jurídicos também legitimam a mutação subjetiva da titularidade. Já dizia Gama Cerqueira que “dentro destas mesmas condições versadas sobre a cessão e transferência de marca, podem ser enquadradas as outras formas de aquisição de direitos quer sejam através da incorporação, da fusão, da absorção, da encampação, da junção, etc., de empresas (..)22”. Ressalta-se igualmente que, as mutações societárias não são exceções – ao se transferir o registro presume-se a análise do INPI dos elementos substantivos dos atos societários. Dessa forma, o ato voluntário inter partes – cessão, mutação societária- passa a ter substância e vínculo desde sua perfeição obrigacional, mas os efeitos perante terceiros, erga omnes ou pro omnes, só se darão no momento em que a “propriedade” marcária se transfira mediante a anotação, publicada na Revista da Propriedade Industrial. Nota o precedente: 22 CERQUEIRA, João da Gama. Caducidade do registro de marca. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p 62-4. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 130 O direito do inventor, nos ensina Gama Cerqueira,"... é um direito privado patrimonial, de caráter real, constituindo uma propriedade temporária e resolúvel que tem por objeto um bem material - a invenção. O Código Civil, no art. 48, equipara aos bens móveis os direitos de autor, entre os quais se incluem os do inventor. A propriedade do inventor, portanto, é de caráter mobiliário. Daí resulta que os direitos do inventor estão sujeitos às normas do direito comum relativos à propriedade móvel e por elas se regulam, quando omissa a lei especial. “Como propriedade móvel o direito do inventor é transmissível por ato “inter vivos” ou “causa mortis”, a título gratuito ou oneroso”. (Tratado da PROPRIEDADE INDUSTRIAL, Ed. Forense, 1946, vol. I, pág. 226). Portanto, conquanto o contrato de cessão de direitos celebrado com os autores não tenha sido levado a registro junto ao INPI, tal situação, não tem o condão de invalidar o pacto celebrado entre as partes. Também irrelevante que o contrato devia ser inscrito no INPI, uma vez que tal ato não é requisito para sua validade jurídica no âmbito do direito das obrigações.” TJMG, Processo 2.0000.00.4367880/000(1), Relator: ELIAS CAMILO, Data do acórdão: 19/08/2004, Data da publicação:03/09/2004 O TJSP, por outro lado, faz uma análise interessante, cujo efeito do ato voluntário é de suspender a legitimidade do transmitente do direito, mesmo antes da publicação da anotação: Assim, tem-se como correto o entendimento do juízo de primeiro grau ao acolher a arguição de ilegitimidade ativa que, tratando-se de matéria de ordem pública, pode ser a qualquer momento apreciada. Nos termos da lei 9279/96, art. 136, cabe ao INPI proceder a anotações nos casos de cessão e transferência e, a partir do instante em que as partes formalizam o contrato, mediante ato formal, a transmissão se consolida. Ainda e nos termos do art. 137 da mesma lei, "As anotações produzirão efeitos em relação a terceiros a partir da data de sua publicação". No presente caso, observa-se que em 1997 foi elaborado documento de cessão e transferência, com protocolo no INPI em 11.06.1997. Portanto, a partir de tal circunstância, tem-se que a propriedade da marca não mais pertencia à autora, motivo pelo qual a ilegitimidade ativa é evidente. Ainda e no tocante ao art. 137, como salientado na sentença "o fato é que o efeito erga omnes da relação absoluta estabelecida entre o titular e a propriedade é negativo, vale dizer, deve ser oposto em sentido contrário por terceiro que se julgue prejudicado, não pelo cessionário do direito, que se demitiu, com a cessão, de qualquer poder jurídico para invocar proteção sobre o que não mais possui". TJSP. AC 155.327-4/3-00, Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Des. A. C. Mathias Coltro, 27 de junho de 2007. III. ANOTAÇÕES OU AVERBAÇÕES? PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 131 Mas, o que são averbações23: Pontes de Miranda, ao mencionar sobre a legislação registral, propõe uma noção do que sejam averbações 24: “…. seriam averbadas, nas respectivas inscrições, todas as alterações supervenientes, que importassem em modificação das circunstâncias constantes do registro, atendidas as exigências das leis especiais em vigor”. Apregoa também que o negócio jurídico de transferência tem de ser anotado. De regra, compõe-se de negócio jurídico básico, do acordo de transmissão e do Registro. O Registro é que transfere, entre vivos, o direito real, à semelhança do que se passa com a transferência de imóveis. Quanto à transmissão a causa de morte, rege o art. 1.572 do Código Civil (saisine); de modo que a transmissão se opera com a morte do titular da patente de invenção. A eficácia da anotação, em se tratando de transmissão a causa de morte, é apenas a que teria a transcrição do ato adjudicatório ou de partilha, a respeito da herança ou do quinhão em que houvesse bem imóvel. Assim, não obstante a declaração do art. 5º da Lei 9.279/96 25, a transmissão da exclusiva não se dá, como em outros bens móveis, pela tradição26. Já anotações seriam: As transcrições ou observações que se fazem de transferências ou ocorrências que acontecem relativamente às marcas, junto ao registro no INPI. Não é suficiente o mero instrumento de cessão, ou de alteração da marca. No registro leva-se a termo a mudança verificada, a fim de que fique sempre constando a realidade sobre a marca. Havendo uma dinâmica na vida da marca, os novos elementos que surgem devem constar no registro. (....) Tudo é anotado no registro: a mudança de propriedade através de cessão, os acréscimos nas marcas, as alterações no nome e sede ou endereço dos titulares ou das empresas, as limitações e ônus que recaírem sobre a marca, as medidas judiciais, as ocorrências em relação aos bens objeto das marcas, os aperfeiçoamentos e acréscimos da marca, de modo a tudo ficar inserido ou registrado no INPI27. IV. ANOTAÇÃO DA TRANSFERÊNCIA DA MARCA COMO ELEMENTO CONSTITUTIVO DE DIREITOS ERGA OMNES 23 É necessário enfatizar que o ato registral translatício, em Propriedade Industrial, denomina-se anotação, e não averbação ou registro. 24 Pontes de Miranda, atualizado por Vilson Rodrigues Alves, Tratado de Direito Privado - Tomo 1, p. 505, 2a. Ed., Bookseller, Campinas, 2000, mencionando o Decreto nº 4.857, de 9 de novembro de 1939, art. 132. 25 Art. 5º Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade industrial. 26 (Denis Borges Barbosa comenta:) Não entendo, como o fez o normativo do INPI, que a cessão de patentes, sendo de bem móvel, se faz como a de automóveis, parâmetro invocado, eis que não há posse do bem físico inexistente; nem, com a vênia de Gama Cerqueira em seu entendimento de 1946, posteriormente alterado, vejo na carta patente uma verdadeira cártula. Pelo contrário, permaneço com o entendimento do PARECER/PROC/N9 026/81, 02 de setembro de 1981, que seguia o magistério de Pontes de Miranda. 27 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 25. Num sentido similar, vide Diogo de Figueiredo Moreira Neto. Curso de Direito Administrativo. 14ª. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 144. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 132 A propriedade da marca se perfaz com o registro no órgão administrativo competente. Uma vez que há a transferencia ou a cessão desta propriedade marcária, a titularidades só e tão somente atingirá terceiros a partir da data da publicação da respectiva anotação da mutação subjetiva. Desta feita, o novo titular da marca somente poderá gozar de legitimidade a fim de defende-la face terceiros desde que: Anotada a mutação subjetiva do registro da marca e publicada a anotação na Revista do INPI. Assim, os efeitos relativos a cessão ou transferencia do registro da marca podem ser pontuados da seguinte maneira: Antes da anotação e a respectiva publicação os efeitos restaram adstritos ao cedente e cessionário não podendo haver a inoponibilidade perante terceiros por ausencia de legitimidade da titularidade da marca. Depois de anotado e publicado a mutação subjetiva da marca seus efeitos decorrerão erga omnes, (artigo 60 e artigo 137 da Lei 9.279/96). Como observa Pontes de Miranda28 as mutações de qualquer caráter da propriedade marcária deberá ser anotada com “todas as alterações supervinientes que importem em modificações das circunstancias constantes no registro”. Acrescenta o autor que “as anotações a que se refere o CPI correspondem as averbações de registro de imóvel; come las, o que se visa é a correspondencia entre o registro e a verdade das relações jurídicas”. Vide decisão recente do TRF2: É de se inferir, portanto, do texto da lei, que a protocolização de pedido administrativo não tem o condão de consolidar a transferência de titularidade, posto que só a decisão deferitória do INPI, publicada na RPI, é que pode ter esse efeito jurídico. Até porque o pedido poderia ser indeferido e a transferência não se efetivar, a teor do disposto no parágrafo único do art. 87, acima transcrito. Afinal, se a titularidade da marca é conferida com o registro, não há como se inferir que a sua transferência se poderia dar apenas com ato firmado entre as partes. Tendo em vista, ainda, regra insculpida no art. 42 do CPC, que dispõe que “a alienação da coisa ou do direito litigioso, a título particular, por ato entre vivos, não altera a legitimidade das partes”, não é de restar dúvida quanto à legitimidade passiva da ré CINDAM, posto que titular de 04 (quatro – processos nºs 811.059.634, 811.021.882, 811.059.650 e 811.059.669) das 05 (cinco) 28 Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado. Tomo I, Campinas: Bookseller, 2000, p. 505 atualizado por Vilson Rodrigues Alves. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br Charlene Maria C. de Ávila Plaza 133 marcas impugnadas, na data do ajuizamento da ação." TRF2, AC 8800232450, Primeira Seção Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Des. Maria Helena Cisne, 23 de agosto de 2007. 29 De novo: POSSE E PROPRIEDADE. DESENHO INDUSTRIAL. REGISTRO NO INPI. CESSÃO E TRANSFERÊNCIA. ILEGITIMIDADE ATIVA. A cessão do registro de desenho industrial, apesar de protocolada perante o INPI o pedido de transferência, não produz efeitos perante terceiros até que seja publicada a anotação, evidenciada a produção de seus efeitos entre cedente e cessionário no momento em que realizam o ato jurídico, ficando a eficácia perante terceiros condicionada à referida publicação, constituindo requisito indispensável para que o cessionário possa defender os interesses relativos ao objeto da cessão, diante de eventual violação a direito subjetivo, o que, diante do conjunto probatório existente nos autos, verifica-se não ter sido feito. (...). Trata-se de alteração subjetiva de negócio jurídico como esclarece Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, Parte Especial, Tomo XXIII, Editora Revista dos Tribunais, 3ª edição, 2ª reimpressão, São Paulo, 1984, pág. 402): "Não há negócio jurídico transferido, mas sim posição jurídica transferida no negócio jurídico. O que se transfere é a titularidade e a passividade; o que se muda é o sujeito. Mais uma vez Pontes de Miranda (ob. cit., pág. 404) quem bem elucida o objeto da transferência: "A regra é transferir-se toda a eficácia (cessão de direito é transferência de efeito, como é assunção translativa de dívida) mais a posição, toda, de declarante unilateral ou de contraente. Direitos presentes, direitos futuros, pretensões presentes e futuras, ações presentes e futuras, dívidas presentes e futuras, obrigações presentes e futuras, passam ao outorgado - não, porém, com efeitos realizados e previstos, mas sim porque se transmite a própria posição subjetiva no negócio jurídico, com seus elementos irradiadores, ativos e passivos. (...) Desta forma, a cessão do registro de desenho industrial, apesar de protocolado perante o INPI o pedido de transferência, não produz efeitos perante terceiros até que seja publicada a anotação. Com efeito, a alegação de que a propriedade é transferida através da firmatura do instrumento negocial de cessão não está sendo negada, evidenciada a produção de seus efeitos desde o momento em que cedente e cessionário realizam o ato jurídico. O que ocorre, no entanto, é que tais efeitos somente operam-se entre as partes que o celebraram, ficando a eficácia perante terceiros condicionada à referida publicação, constituindo requisito indispensável para que o cessionário possa defender os interesses relativos ao objeto da 29 Entendimento diverso, de corte estadual, no entanto: “Temos, assim, que o juiz do feito reconheceu a legitimidade ativa da empresa América do Sul Distribuidora de Alimentos para ajuizar a presente ação, sob o fundamento de ser esta sociedade cessionária da marca. Razão assiste ao douto dirigente do processo, sendo certo que a ausência de averbação no INPI não afasta a validade do contrato de cessão, a um porque, conforme afirma o recorrido, já existe pedido de averbação junto ao INPI, que só não se concretizou até o momento em face dos trâmites burocráticos que lhe são inerentes, e a dois porque o apelado já exerce todos os direitos que lhe foram atribuídos no contrato de cessão, sendo, dessa forma, de seu maior interesse a preservação da sua marca”. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, 2ª Câmara Cível, Des. Maria Nogueira, AC 34199-33.2005.8.06.0001/1, Julgado em 21.01.2009. PIDCC, Aracaju, Ano II, Edição nº 02/2013, p.118 a 135 Fev/2013 | www.pidcc.com.br DA TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO EM PROPRIEDADE MARCÁRIA ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 134 cessão, diante de eventual violação a direito subjetivo, o que, diante do conjunto probatório existente nos autos, verifica-se não ter sido feito. "TJRS, AC 70004177135, Décima Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, Des. João Armando Bezerra Campos, 27 de novembro de 2003. Desta feita, considera-se que a legitimidade para a defesa da marca decorre da titularidade. E essa titularidade decorre de um ato registral derivado e especialíssimo condicionado a anotação e a respectiva publicação. Referencias ALMEIDA De Nogueira & Fischer, Guilherme, Tratado Theorico e Pratico de Marcas Industriais e Nome comercial. São Paulo: Hennies Irmãos, 1910, p. 122. BARBOSA, Denis Borges. Proteção das Marcas. 6.2.5. Peculiaridades da aplicação das normas de direito comum às marcas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. __________. Nota sobre a noção de propriedade da marca na lei ordinária brasileira, 2005. Disponível em: http://denisbarbosa.addr.com/notamarca3.pdf. BERTONE, Luis Eduardo e CUEVAS, Guillermo Cabanellas de las. Derechos de Marcas. Buenos Aires: Heliasta, 1989, p. 423. BORBA, José Edwaldo Tavares. 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