TRIBUTOS Lei do Bem em debate Mesmo concedendo benefícios fiscais às empresas que investem em inovação, a chamada Lei do Bem (Lei 11.196/05) ainda não é amplamente utilizada no Brasil. Por se tratar de uma legislação relativamente nova, complexa e que depende bastante de interpretação, muitas companhias têm receio de buscar o incentivo. Colocar a Lei do Bem em discussão foi o objetivo do evento realizado pela Telefonica em São Paulo, em maio, que reuniu gestores de diversas empresas e que contou com a participação do sócio da KPMG no Brasil na área de Tax, Sérgio Schuindt, além de Luiz Roberto Peroba, sócio do Pinheiro Neto Advogados. Na ocasião, foi realizada uma pesquisa entre os gestores presentes, que mostrou, por exemplo, que 33% das empresas representadas ainda não utilizam benefícios fiscais para inovação tecnológica. “As companhias ainda têm dúvidas operacionais sobre como proceder para usufruir dos benefícios. Uma vez que não existe a pré-aprovação 18 Tributos Legislação que l Quando sua empresa iniciou o uso dos benefícios fiscais para inovação tecnológica? concede benefícios 2006 fiscais para inovações pode contribuir no 2007 2008 18% 33% 2009 21% 2010 avanço tecnológico Ainda não usa 5% 11% das empresas 11% Fonte: Pesquisa em evento da KPMG, Telefonica e Pinheiro Neto do projeto candidato aos incentivos, muitas companhias receiam utilizar os incentivos, avalia o sócio da KPMG no Brasil na área de Tax, Sérgio Schuindt. Os incentivos fiscais para inovação são uma forma de os governos estimularem a criação de parques tecnológicos em seus territórios. Essas inovações têm capacidade de agregar valor aos produtos e serviços. A Lei do Bem, por exemplo, promulgada em 2005, concede deduções fiscais para empresas que inovem em produtos ou mesmo em processos. Trata-se de uma tendência mundial. E os números no Brasil indicam que as empresas aos poucos começam a aproveitar. Em 2006, a renúncia fiscal total a partir da Lei somou R$ 229 milhões. Em 2008, esse valor alcançou R$ 1,54 bilhão. É um crescimento considerável, bem acima do aumento do PIB no mesmo período. “Da mesma forma, houve um incremento no total de empresas que usufruíram dos benefícios. De 130 companhias, em 2006, o número passou para 552, em 2008. Isso mostra que o Brasil está desenvolvendo seu próprio modo de lidar com incentivos fiscais para inovações tecnológicas. No entanto, acredito que o número de companhias que utilizam a Lei do Bem poderia ser bem maior caso a dedução fiscal não fosse restrita àquelas empresas que apuram impostos e contribuições pelo lucro real. Isso vai contra o que é feito nos países mais desenvolvidos”, comenta Schuindt. Diante dessa exigência legal, a aplicação da Lei do Bem acaba sendo limitada. Companhias que estejam em prejuízo fiscal em determinado período, por exemplo, não podem usufruir do benefício. Sérgio Schuindt, sócio da KPMG no Brasil na área de Tax Pontos críticos Outra grande dificuldade para a aplicação do incentivo é a dúvida quanto ao conceito de inovação – cuja definição deve ser suficientemente ampla para poder abarcar tanto um novo produto como um aprimoramento no processo de Tributos 19 TRIBUTOS l A decisão de sua empresa na escolha do país onde irá desenvolver nova tecnologia leva em consideração potenciais incentivos fiscais? l Em sua empresa, qual é a área interna responsável pela análise e identificação dos projetos de inovação tecnológica? Fiscal e Contabilidade Jurídico 61% Sim 39% Não Engenharia Outras P&D l Sua empresa se sente confortável em utilizar os benefícios fiscais para inovação tecnológica? 43% 17% 52% Sim 9% 48% Não l Sua empresa tem departamento específico de Pesquisa e Desenvolvimento? 71% Sim Não 8% 29% 23% l Sua empresa contrata consultoria técnica especializada para identificação e apoio na classificação de projetos como sendo P&D? 68% Sim Não 32% Fonte: Pesquisa em evento da KPMG, Telefonica e Pinheiro Neto fabricação que resulte em maior competitividade. E isso vale para todos os setores econômicos: indústria, comércio e serviços. O sócio da KPMG chama a atenção para os gastos com mão-de-obra. “Geralmente, em torno de 85% das despesas elegíveis para benefício dizem respeito à mão-de-obra. Por isso, é fundamental ficar atento para evitar problemas, principalmente sobre o que incluir em termos de encargos e/ou salários”, analisa Schuindt. Também são pontos relevantes para o usufruto da Lei do Bem: 20 Tributos • • • • Controle (apontamento) de horas por projeto Utilização de sistemas eletrônicos Valoração do número de horas por funcionário e de acordo com a folha de pagamento Observação de quais são as verbas e o caráter remuneratório “Existe também uma grande discussão a respeito da responsabilidade e/ou competência para fiscalizar a aplicação da Lei; se ela é somente da Receita Federal ou se o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) pode desempenhar algum papel”, alerta o sócio da KPMG. Essa questão ganha importância porque não existe uma pré-aprovação dos projetos candidatos às deduções fiscais. As companhias devem preencher o formulário com detalhes do projeto. Depois, ele será enviado ao ministério. A partir daí, as empresas ficam sujeitas à fiscalização posterior da Receita Federal. “Exatamente por isso, recomendamos sempre o devido cuidado para evitar problemas nos períodos seguintes”, explica Schuindt. Quanto à possibilidade de retificação do formulário enviado ao MCT, não há previsão regulamentar para que ela seja efetuada. Entretanto, o MCT também não veda o procedimento. Já houve casos em que o ministério permitiu e/ou solicitou a retificação das informações prestadas. l Sua empresa enfrenta restrições internas na implementação dos incentivos, uma vez que reduz preponderantemente os impostos sobre o lucro? 61% Sim 39% Não Sim 10% Sim l Sua empresa está sob fiscalização da Receita Federal devido à utilização desses benefícios? Sim 90% l O auditor de sua empresa reportou os riscos relacionados à Lei do Bem? Não 52% 48% Sim Não l Sua empresa foi autuada em razão da fruição dos benefícios fiscais da Lei do Bem? Não l Sua empresa é favorável à apresentação de consultas à Receita Federal do Brasil sobre o uso dos benefícios? 13% 4% 96% Não l Sua empresa faz contabilização segregada das operações afetadas pela Lei do Bem? 59% Sim 87% Não 41% Fonte: Pesquisa em evento da KPMG, Telefonica e Pinheiro Neto Nessas situações, o formulário foi disponibilizado para que as mudanças fossem feitas no prazo determinado. A exigência legal de regularidade fiscal para a concessão do benefício também gera dúvidas. É importante fazer a distinção entre regularidade fiscal e exigência de Certidão Negativa de Débitos (CND). Não é necessário possuir a CND durante todo o tempo. Ou seja, a existência de pequenos períodos descobertos não deve invalidar a solicitação do incentivo. Outro aspecto importante é um termo da Lei do Bem que impõe o controle contábil em contas específicas dos projetos candidatos ao incentivo. Trata-se de um ponto fundamental para a apresentação à Receita de um controle adequado de gastos. “Antes, era uma regra normativa. Agora, é uma exigência legal. Recomendamos fortemente que essa regra seja cumprida”, afirma Schuindt. De acordo com o sócio da KPMG, é possível utilizar o incentivo para redução do custo de aquisição de máquinas e equipamentos, desde que o bem seja adquirido visando o desenvolvimento da inovação. identificação de projetos com potencial para se adequar às exigências da Lei do Bem, cuidados com a documentação comprobatória (resumo e cronograma de projetos, business plan, razões contábeis, ordens de compra, contratos, notas fiscais, ordens de serviço interdepartamental, apontamento de horas por projeto), definição do escopo, contabilização adequada e estar preparado para a fiscalização. A oportunidade está aí. As empresas, agora, têm que aproveitá-la. Para diminuir os riscos, recomendase às companhias que pretendem requerer o benefício atenção especial aos seguintes pontos: Tributos 21