1 INSTITUTO DE APLICAÇÃO FERNANDO RODRIGUES DA SILVEIRA (CAp/UERJ) MATEMÁTICA – ENSINO MÉDIO - PROF. ILYDIO SÁ CÁLCULO DE PROBABILIDADES – PARTE 1 1. Origem histórica É possível quantificar o acaso? Para iniciar, vamos considerar algumas hipóteses: Rita espera ansiosamente o nascimento de seu filho, mas ela ainda não sabe qual será o sexo da criança. Em outro caso, antes do início de um jogo de futebol, o juiz tira "cara ou coroa" com uma moeda para definir o time que ficará com a bola. Numa terceira hipótese, toda semana, milhares de pessoas arriscam a sorte na loteria. Problemas como os acima são, hoje, objeto de estudo das probabilidades. Os primeiros estudos envolvendo probabilidades foram motivados pela análise de jogos de azar. Sabe-se que um dos primeiros matemáticos que se ocupou com o cálculo das probabilidades foi Cardano (1501-1576). Data dessa época (na obra Liber Ludo Alae) a expressão que utilizamos até hoje para o cálculo da probabilidade de um evento (número de casos favoráveis dividido pelo número de casos possíveis). Posteriormente tal relação foi difundida e conhecida como relação de Laplace. Com Fermat (1601-1665) e Pascal (1623-1662), a teoria das probabilidades começou a evoluir e ganhar mais consistência, passando a ser utilizada em outros aspectos da vida social, como, por exemplo, auxiliando na descoberta da vacina contra a varíola no século XVIII. Laplace foi, certamente, o que mais contribuiu para a teoria das probabilidades. Seus inúmeros trabalhos nessa área foram reunidos no monumental Tratado Analítico das Probabilidades, onde são introduzidas técnicas poderosas como a das funções geradoras, que são aproximações para probabilidades com o uso do cálculo integral. Atualmente, a teoria das probabilidades é muito utilizada em outros ramos da Matemática (como o Cálculo e a Estatística), da Biologia (especialmente nos estudos da Genética), da Física (como na Física Nuclear), da Economia, da Sociologia, das Ciências Atuariais, da Informática, etc. A roleta, um dos jogos de azar preferidos pelos apostadores nos cassinos, teve sua origem na França do século XVIII. É formada por 36 elementos dispostos em três colunas de 12 números e um espaço reservado para o zero. As chamadas apostas simples são: sair par ou sair ímpar, sair vermelho ou sair preto, e sair números menores (de 1 a 18) ou sair números maiores (de 19 a 36) Exemplo: De acordo com a relação de Laplace, a probabilidade de ao lançarmos um dado sair um número ímpar é 1/2. Esta definição apenas pode ser usada quando o conjunto dos casos é finito sendo que todos têm a mesma possibilidade ocorrer (equiprováveis). 2. Definições Experimento Aleatório: Dizemos que um experimento qualquer é aleatório quando, se repetido diversas vezes nas mesmas condições, pode gerar resultados diferentes. Experimentos aleatórios acontecem a todo momento no nosso cotidiano perguntas do tipo: será que vai chover? Qual será o resultado da partida de futebol? Quantos serão os ganhadores da Mega-Sena da semana? São questões associadas a experimentos aleatórios e que dependem do acaso. Experimentos aleatórios são os objetos de estudo do cálculo de probabilidades. 2 Espaço Amostral (S): (ou de casos ou resultados): de uma experiência é o conjunto de todos os resultados possíveis para um experimento aleatório. Acontecimento ou evento (E): é qualquer subconjunto do espaço amostral. Se um espaço amostral tem n elementos, sabemos da teoria dos conjuntos que ele terá 2n subconjuntos, ou seja, 2n eventos associados a esse espaço amostral. Exemplo 1: Lança-se uma moeda e observa-se a face que cai voltada para cima. O espaço amostral é S = {cara, coroa} e há 4 eventos associados a esse espaço: φ, A = {cara}, B = {coroa} e S = {cara, coroa}. φ é um evento que não ocorre nunca e é chamado de evento vazio ou impossível. O evento A ocorre se e somente se o lançamento resulta em cara. S ocorre sempre e é chamado evento certo. Usando as definições anteriores, a definição de probabilidade de ocorrência de um evento (E) em um espaço amostral S, de resultados igualmente prováveis (equiprováveis), pela relação de Laplace, é: = () () OBS: n(E) e n(S) representam, respectivamente, as quantidades de elementos do evento E e do espaço amostral S. Simplificadamente algumas pessoas representam a relação acima por: p(A) = F , onde F indica o P número de casos favoráveis ao evento e P indica o número total de casos possíveis. Exemplo 2: a) Qual a probabilidade de, ao lançarmos dois dados cúbicos distintos, a soma dos dois pontos obtidos ser igual a 7? Solução: O Espaço amostral será aqui representado pelos 36 pares ordenados representativos das pontuações possíveis desses dois dados, ou seja, n (S) = 36. Poderemos representá-lo por uma tabela de dupla entrada, vejamos: O evento desejado, que está representado pelos pares ordenados sombreados (que atendem à condição proposta - soma 7), ou seja, n (E) = 6. Logo, a probabilidade solicitada será igual a: = = ≅ , , % 3 Exemplo 3: Sabemos que na Mega Sena o prêmio maior é destinado aos jogadores que acertarem as 6 dezenas sorteadas, dentre as 60 disponíveis para aposta. Determine a probabilidade de ganhar na Mega Sena, uma pessoa que fizer o jogo mais barato (marcar apenas 6 dezenas). Solução: Nesse caso só temos um caso favorável ao jogador, que são as 6 dezenas que ele escolheu. (C6,6 =1). O total de sorteios possíveis, que constitui o número de elementos do espaço amostral S é dado por C60,6 = 60 ! 60 . 59 . 58 . 57 . 56 . 55 . 54 ! = = 50 063 860 (das 60 dezenas disponíveis, o 54 !. 6! 54 !. 720 jogador escolherá apenas 6). Logo, a probabilidade procurada é: p= 1 = 0,00000001 997 ≅ 0,000002 % . 50 063 8 60 OBSERVAÇÃO: Se A e B são eventos em um mesmo espaço amostral S, A ∪ B é o evento que ocorre se e somente se ocorre o evento A ou ocorre o evento B, isto é, ocorre pelo menos um dos eventos A ou B; A ∩ B é o evento que ocorre se e somente se ocorrem simultaneamente os eventos A e B; A – B é o evento que ocorre se e somente se ocorre o evento A, mas não ocorre o _ evento B; A , chamado de evento oposto ou complementar ao evento A, é o evento que ocorre se e somente se o evento A não ocorre. Associaremos sempre a cada evento um número, que chamaremos de probabilidade do evento (p) e que traduzirá nossa confiança na capacidade do evento ocorrer. Definição axiomática de probabilidade: Uma probabilidade é uma função que associa a cada evento A, de um espaço amostral S, um número p (A), de forma que: 1. Para todo evento A, 0 ≤ p(A) ≤ 1 2. p(S) = 1 3. Se A e B são eventos mutuamente excludentes, isto é, eventos que não podem ocorrer simultaneamente (A ∩ B = φ) então p(A ∪ B) = p(A) + p(B) Como consequência, temos as seguintes propriedades: 1. p(φ) = 0 _ 2. p( A ) = 1 – p(A) 3. p(A – B) = p(A) – p(A ∩ B) 4. p(A ∪ B) = p(A) + p(B) – p(A ∩ B) Exemplo 3: Qual a probabilidade de um número inteiro positivo selecionado aleatoriamente do conjunto dos inteiros positivos menores ou iguais a 100 ser divisível por 2 ou por 5? Solução: Sabemos que no Universo dos inteiros positivos, inferiores ou iguais a 100, teremos (n(S) = 100), a quantidade de números divisíveis por 2 é 50 (os pares) - evento A - e a quantidade dos números divisíveis por 5 é 20 (os terminados em zero ou em cinco) - evento B - Sendo que os que são divisíveis ao mesmo tempo por 2 e por 5 (os múltiplos de 10) – evento A ∩ B, são 10. Logo, teremos: 4 p(A) = ; p(B) = e p (A ∩ B) = , logo: p(A ∪ B) = p(A) + p(B) – p(A ∩ B), ou seja: p(A ∪ B) = + = ou 60%. Eventos independentes Dizemos que dois eventos de um mesmo espaço amostral são independentes quando a probabilidade de que eles ocorram simultaneamente é igual ao produto de suas probabilidades individuais, ou seja se p(A ∩ B) = p(A) . p(B). A noção de eventos independentes será ampliada quando estivermos trabalhando com probabilidade condicional. Exemplo 4: Num grupo de jovens estudantes a probabilidade de que um jovem, escolhido ao acaso, tenha média acima de 7,0 é 1/5. Nesse mesmo grupo, a probabilidade de que um jovem saiba jogar futebol é 5/6. Qual a probabilidade de escolhermos um jovem (ao acaso) que tenha média maior que 7,0 e saiba jogar futebol? Solução: Considere os eventos: A: ter média acima de 7,0. B: saber jogar futebol. O fato de ter média maior que 7,0 não depende do fato de saber jogar futebol, e vice-versa, logo, p(A ∩ B) = p(A) . p(B) = . = . Exemplo 5: Um lote contém 10 peças, sendo 7 boas e 3 defeituosas. Retiramos duas peças, ao acaso e com reposição, para inspeção. Qual a probabilidade de se obter duas peças defeituosas? Solução: Denominando de D1 o sorteio de uma primeira peça defeituosa e de D2 o sorteio de uma segunda peça defeituosa, teremos: p(D1 ∩ D2) = p(D1) . p(D2) = . = = 9% Exemplo 6: Qual a probabilidade de obtermos 25 caras, nos 25 lançamentos consecutivos de uma moeda honesta? Solução: Probabilidade de obter cara num lançamento da moeda: p = ½ . Probabilidade de obter cara nos 25 lançamentos consecutivos: 1 2 p = ( ) 25 = 1 ≅ 0,00000002 98 ≅ 0,000003 % 33 554 432 DICA: Existem casos que é mais fácil calcular indiretamente uma probabilidade, através do cálculo da probabilidade complementar e depois subtraindo de 1 ou de 100 % o resultado obtido. Exemplo 7: Qual a probabilidade de, num grupo de 20 pessoas, ao menos uma delas ter nascido no mês de julho? Solução: Vamos primeiro determinar a probabilidade de nenhuma das pessoas ter nascido em julho e, em seguida, pela probabilidade complementar, determinar a probabilidade pedida. Note que calcular diretamente o que o problema pede, seria muito trabalhoso, pois poderíamos ter duas ou três, ou quatro, ou cinco....até 20 pessoas nascidas em julho e todos esses casos seriam considerados favoráveis ao problema. 5 Primeiramente, calculemos a probabilidade de UMA das pessoas do grupo, não ter nascido em julho. p = 11 . Pois todos os demais 11 meses do ano são considerados favoráveis ao evento. 12 Agora, aplicando o princípio multiplicativo, para o grupo de 20 pessoas, a probabilidade de 11 20 ) , que vale aproximadamente 17,55%. 12 NENHUMA delas ter nascido em julho é: p = ( Finalmente, a probabilidade pedida (pelo menos duas pessoas terem nascido em julho) será igual 11 20 ) , que vale, aproximadamente, 82,45%. 12 a1- ( Exemplo 8: O PROBLEMA DA COINCIDÊNCIA DOS ANIVERSÁRIOS Em um grupo de 8 pessoas, determine a probabilidade de que duas dessas pessoas, pelo menos, aniversariem no mesmo dia. Vamos primeiro determinar a probabilidade de que todas as oito pessoas façam aniversários em datas diferentes, e depois calcular o que se pede pelo complementar. Número de possibilidades das oito pessoas aniversariarem em datas diferentes = 365. 364. 363. 362. 361. 360. 359. 358 (de acordo com o princípio multiplicativo). Note que o último fator corresponde a 365 – 8 + 1 ou 366 – 8. (casos favoráveis). Número total de possibilidades das oito pessoas aniversariarem (em qualquer dada, num ano não 8 bissexto) = 365 x 365 x 365 x ...x 365 = 365 (ainda de acordo com o princípio multiplicativo). Probabilidade das 8 pessoas aniversariarem em datas distintas: p= 365. 364. 363. 362. 361. 360. 359. 358. = 0,9257 = 92,57%. 365 8 Finalmente, a probabilidade pedida no problema será: 100% - 92,57% = 7,43% O resultado obtido não costuma assustar às pessoas e é considerado razoável, mas, se generalizarmos o resultado obtido e montarmos uma tabela de acordo com o número de pessoas do grupo, teremos uma boa surpresa...vejamos: A probabilidade de, num grupo de k pessoas, encontrarmos pelo menos duas com a mesma data de aniversário é dada por: p = 1− 365 x 364 x ....x (366 − k) 365 k Calculando essa fórmula, para alguns valores de k, teremos: 6 Pessoas Probabilidade 20 41% 25 57% 30 71% 40 89% 45 94% 50 97% Verifique o surpreendente fato de que, num grupo de 50 pessoas é praticamente certo que duas delas, ao menos, terão a mesma data de aniversário. EXERCÍCIOS PROPOSTOS 1. Três meninos e três meninas sentam-se em fila. Encontre a probabilidade das três meninas sentarem juntas. 2. Joga-se um dado branco e um dado preto. Calcule a probabilidade de: a) ocorrer soma 6 b) ocorrer soma 11 c) ocorrer soma 2 d) não ocorrer nem soma 2 e nem 8. 3. Uma carta é retirada de um baralho comum de 52 cartas. Qual a probabilidade de: a) sair uma carta vermelha b) sair uma carta de copas c) sair um rei ou uma carta de copas. 4. Um número inteiro é escolhido ao acaso dentre os números 1,2,3,...,30. Qual a probabilidade desse número sorteado: a) ser divisível por 3 b) ser divisível por 5 c) ser divisível por 5 ou por 3 d) não ser divisível nem por 3 e nem por cinco. 5. Duas bolas são retiradas, consecutivamente e sem reposição, ao acaso de uma urna que contém 20 alaranjadas, 7 verdes , 10 pretas e 5 brancas. Qual a probabilidade delas serem: a) alaranjadas b) pretas c) verdes d) brancas e) ambas da mesma cor