CANCELLI, Elizabeth. O Poder da polícia e o mundo da
prisão na Era Vargas (1930-1945). História &
Perspectivas, Uberlândia, (7): 47-64, jun/dez/1992.
Neste texto O poder de polícia e o mundo da prisão..., a
autora inicia a discussão sobre o primeiro período
Vargas, com a repercussão alcançada por Memórias de
Cárcere, publicada em 1953 (2º governo Vargas).
Observa que o relato trazido por Graciliano Ramos não
era desconhecido das elites dirigentes e da opinião
pública. Mas a obra colocava a nu, por um escritor já
famoso durante a prisão, e numa linguagem literária, as
mazelas do regime autoritário sob o comando de
Vargas. Além de denunciar a barbárie, envolvia o leitor
psicologicamente.
CANCELLI, Elizabeth. O Poder da polícia e o mundo da
prisão na Era Vargas (1930-1945). História &
Perspectivas, Uberlândia, (7): 47-64, jun/dez/1992.
O artigo resume a tese da autora, (desenvolvida em
livro já publicado), que discute o papel da Polícia na Era
Vargas. Cancelli caracteriza o período de 1930-1945 de
violento e estruturado para dar respaldo ao ditador,
sustentado por ações do Estado policial e totalitário.
“O governo, a população, o sistema penitenciário, o
judiciario, e a Polícia eram os protagonistas de um
período em a agrura dos inimigos escolhidos justificavase sempre de uma forma circular. Isto é, os inimigos
supostamente traçavam o seu destino e faziam com que
as instituições e a população necessitassem
estabelecer múltiplas estratégias de ação para subjugar
o agente perturbador” (p. 47).
O papel da Policia
• Em sua análise, a Polícia se constituía no
principal suporte do regime > cujas estratégias
visavam submeter o homem e a sociedade
como um todo.
• A polícia, sob esses princípios, não limitava sua
ação ao esquadrinhamento das cidades e do
país. Do interior das prisões projetava-se a
todos os indivíduos a imagem degradada e
supérflua da vida humana (p.47)
O papel da Polícia: as prisões e seus significados
A Polícia no seu dia-a-dia agia a partir de estratégias >
que deixavam as pessoas definitivamente excluídas da
proteção da lei.
As prisões, em conseqüência, foram tornando-se
lugares de exclusão, dor e suplício (p. 48).
A autora lista as prisões existentes no país que ficaram
famosas ao abrigarem presos políticos e, sobretudo, por
revelarem os maus tratos infringidos aos encarcerados
em geral, em decorrência das péssimas qualidades de
suas instalações e das condições sub-humanas a que
estavam submetidos os detentos.
PRISÕES
• PENITENCIÁRIAS: MANAUS/
SALVADOR/MACEIÓ/VITÓRIA/NITERÓI/OURO
PRETO/UBERABA/CARANDIRU(SP)CURITIBA E
FLORIANÓPOLIS
..CASA DE CORREÇÃO DO DISTRITO FEDERAL
• COLONIA CORRECIONAL DE DOIS RIOS (ILHA GRANDE)
• CASAS DE DETENÇÃO DO CEARÁ//RIO GRANDE DO
NORTE/PERNAMBUCO/RIO GRANDE DO SUL/ CASA DE
DETENÇÃO DO DISTRITO FEDERAL/SÃO PAULO E NITERÓI
.PRESÍDIO ESPECIAL DE FERNANDO DE NORONHA;
.PRESÍDIOS MILITARES DE SANTA CRUZ E FORTALEZA DAS COBRAS
.CADEIAS PÚBLICAS
• MANICÔMIOS
O papel da polícia e as prisões
A autora dar as cifras, mesmo que subestimadas, das
pessoas detidas ao longo desse período, indicando a
não separação entre presos políticos e comuns,
inclusive adolescentes que viviam em condições
degradadas e sofrendo todo tipo de flagelo, inclusive
tornando-se moeda corrente do comércio sexual. Todos
estavam submetidos as precárias condições de higiene,
má alimentação, superlotação das celas, contato com
outros presos portadores de doenças contagiosas tais
como tuberculose, sífilis, etc.
Os médicos e as autoridades prisionais alertaram para o
problema. Porém, segundo a autora, não havia nenhum
interesses do governo em promover qualquer reforma
que possibilitasse a melhoria de vida dos presos
comuns ou políticos (p. 50).
Cancelli - O inferno da impotência
Para Cancelli, o número de pessoas encarceradas dava
margem à Polícia política para operar a partir de
duas perspectivas:
1. A primeira perspectiva > era a repressão de tudo e
todos que se opusessem ou que haviam se
transformado em inimigos potenciais de Vargas e do
regime;
2. A segunda perspectiva > ação supostamente secreta
> visava fazer com que todos na sociedade
sentissem ou imaginassem os perigos e a violência
a que poderiam ser expostos através da exclusão
impetrada pela Polícia aos considerados
inoportunos pelo Estado (p. 50).
Cancelli - O inferno da impotência (2)
O governo usava > instrumentos de violência >
para assegurar sua existência legal. Era um
estado forte, uno e idealista > que forjava um
projeto político > visava transformar todos em
guardiães deste ideário.
A superlotação das prisões e as péssimas
condições de habitabilidade > eram uma mostra
da onipotência e onipresença do Estado e de seu
principal agente de sustentação: a Polícia. Na
prisão, os indivíduos eram levados a perder
todos os contornos de civilidade, assumindo cada
vez mais sua condição animal (p.50).
Cancelli - O inferno da impotência
Diz a autora que além da censura, da vigilância, do
terror e das ameaças, a Polícia introduziu novas
técnicas de tortura nas prisões > não visavam obter
informações.
¬
Ela existia para esclarecer aos presos que o homem
das prisões vivia agora em um mundo sem qualquer
individualidade >onde toda sua impotência como ser
humano estava exposta.
- A lista de táticas de tortura aplicadas pela Polícia
Política era ampla: arrancar unhas com alicate; extração
de dentes com alicates; enfiar alfinetes sob as unhas,
queimar as pontas dos seios com cigarros ou charutos;
introduzir duchas de mostarda na vagina; colocar
máscaras de couro que impedia a respiração, etc (p.51)
Cancelli - O inferno da impotência
Essa brutalidade > pretendia mostrar que existia uma
maneira de penetrar no interior da mente através da dor.
¬
Houve alguns pedidos de esclarecimentos por parte de
deputados (antes de 1937) sobre a situação dos presos.
Porém, o governo não deu sinais de que melhoraria as
condições das prisões.
“A ação policial caminhava como se fosse um poder
independente, paralelo e despersonalizado. A repressão
e o sofrimento não eram atribuídos ao Presidente ou ao
Chefe de Polícia. Brotavam como fruto de uma ação
impessoal, como algo que acontecesse por si, à revelia
de qualquer fato ou vontade”(p. 52).
Cancelli – O mundo das súplicas e o fim da
existência jurídica
Em meio a brutalidade > algumas criaturas
buscavam na súplica minorar as suas condições de
sobrevivência nas prisões. Várias petições feitas
por prisioneiros e suas famílias assumiam o tom de
súplicas e esperança de justiça, através do apelo a
autoridade maior.
A lei permitia que a Polícia prendesse todo e
qualquer indivíduo e o mantivesse à sua disposição.
O que a lei não permitia era que o Chefe de Polícia
fosse a autoridade máxima dos presídios federais.
ESTA ERA A REALIDADE DOS ANOS DO
GOVERNO VARGAS. Além da transferência e do
trancafiamento era a Polícia quem dava a última
palavra sobre a conveniência ou não de soltar os
detentos (p.56).
Cancelli – O mundo das súplicas e o fim da
existência jurídica
Porém, tais demandas nunca eram atendidas, mesmo quando
a Justiça ou o Tribunal de Segurança decidiam a favor do
sentenciado. Não era, portanto, nem o Ministério da Justiça
nem o Tribunal de Segurança os órgãos a selarem a sorte
dos presos. Ao contrário, a Polícia só dava explicações
quando solicitada, uma vez que detinha autonomia absoluta
para decidir sobre os detentos (p. 57).
A documentação consultada indica que a variação da pena
dava-se na realidade, segundo critérios de vontade das
autoridades policiais.
Existia de fato um jogo jurídico que o regime utilizava para
continuar sua farsa e para colocar ainda mais à mostra a
impotência de toda a sociedade perante o Estado e seu
aparato policial. Nesse contexto, era a vontade pessoal e não
a lei que imperava (p.58).
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Apresentação E Cancelli.