Budget Watch Orçamento do Estado 2013 “O melhor, o pior e que alterações” Financiamento da Economia e Sustentabilidade da Dívida A insustentável natureza desta dívida 26 de Novembro de 2012* Ricardo Cabral Universidade da Madeira [email protected] Tel: 291 705 049 Image from Google Maps. © 2012 NASA, Terrametrics Conteúdo • Sustentabilidade da dívida – – – – Níveis Dívida pública ou dívida externa? Como se relacionam? Projecções do FMI e sua robustez • Financiamento da economia – Fluxos – Stocks – Papel chave do estado e do sector bancário • Papel das grandes empresas e do IDE • Conclusões Níveis • Dívida pública – 108,1% do PIB em 2011 – Números mais recentes apontam para 120% do PIB em 2012 • Dívida externa líquida (em 2011) – Estatísticas deturpadas pela queda do valor de mercado da dívida pública e privada nacional – De acordo com o BdP: • Administrações Públicas (~50% do PIB) • Sector bancário (~25% do PIB) • Banco de Portugal (~25% do PIB, excl. reservas), substituindo-se ao sector bancário • Grandes empresas (??) • IDE Sustentabilidade de qual dívida? • Condição fundamental de sustentabilidade: – Taxa de juro seja inferior à taxa de crescimento da economia • Problema mais grave é o da sustentabilidade da dívida externa – Nível de dívida externa líquida em % do PIB pelo menos 2 vezes o nível registado pela Argentina em 2001 – Níveis de dívida externa sem precedentes, em tempos de paz, internacionalmente • Ou seja, país enfrenta já há vários anos uma crise de balança de pagamentos e de dívida externa • Crise da dívida pública nacional é sintoma dessa crise de balança de pagamentos e de dívida externa – Porque dívida pública constitui parte dessa dívida externa – Porque a dívida externa – através da despesa com juros - resulta num aumento das necessidades líquidas de financiamento da economia Projecções do FMI* para a evolução dos níveis de dívida pública 140.0% 130.0% 120.0% -1 p.p. growth, +1 p.p. int. rates (% of GDP) Author's projection (% of GDP) 110.0% 5th review (% of GDP) 4th review (% of GDP) 100.0% 3rd review (% of GDP) 2nd review (% of GDP) 90.0% 1st review (% of GDP) 80.0% 70.0% 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2020 2025 2030 Fonte: FMI “Country Reports” *Nota: Projecções do FMI, i.e., “objectivos” para o programa de ajustamento Pequenas alterações da taxa de juro ou da taxa de crescimento tornam dívida insustentável Premissas do FMI sobre a evolução da taxa de crescimento económico nominal 5.0% 4.0% 3.0% 2.0% 5th review 4th review 1.0% 3rd review 0.0% 2nd review 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2020 2025 2030 1st review -1.0% -2.0% -3.0% -4.0% Fonte: FMI “Country Reports” Premissas do FMI sobre a evolução da taxa de juro média 5.50% 5.00% 5th review 4th review 4.50% 3rd review 2nd review 1st review 4.00% 3.50% 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2020 2025 2030 Fonte: FMI “Country Reports” Financiamento da economia no seu todo tem dois tipos de componentes • Fluxos – Determinados pela identidade fundamental da balança de pagamentos, i.e., necessidades líquidas de financiamento da economia – Negativamente influenciados por défice da balança de combustíveis (~5% do PIB) e pelo défice da balança de rendimentos (~5% do PIB) • Stocks – Necessidade de refinanciar stocks de dívida externa do país que chegam à maturidade – Gigantesca fuga de capital, que levou estado português a recorrer à “ajuda do sector oficial” • Dívida doméstica é, em teoria, menos problemática porque despesa com juros de uns constitui rendimentos de outros – Na prática, no contexto actual, contribui para agravar crise – Pode causar problemas se existir excessivo endividamento por parte de alguns agentes económicos – Acresce que banca não discrimina entre dívida doméstica e externa. Em resultado, alguns agentes económicos podem ficar incapazes de refinanciar o seu stock de dívida Plano de ajustamento da troika • Ajustamento orçamental e externo – Saldo primário (antes de despesa com juros) passa de –7,2% do PIB (média 2009-2010 para +3,2% do PIB (média 2015-2030) • -0,6% do PIB em 2008 – De uma vida 4,4% acima das possibilidades – definição corrente - (média 2007-2010) o país passa a viver 7% abaixo das possibilidades em 2017 – Ou, contabilizando juros, passa de uma vida 10,9% acima as possibilidades em 2009 para uma vida 0,6% abaixo das possibilidades em 2017 • Ou seja, objectivo é melhoria dramática dos fluxos externos, i.e., autofinanciamento da economia em termos de fluxos • Que se espera resulte numa queda das taxas de juros nos mercados financeiros • Que permitam à economia refinanciar os seus stocks de dívida externa nos mercados (i.e. parar a fuga de capitais) Papel do estado e da banca neste processo • Estado e banca estão a agir de forma paralela no mesmo sentido – Procurar melhorar os seus próprios fluxos, retirando liquidez (dinheiro) à actividade económica doméstica – Que utilizam em parte significativa para pagar juros sobre a sua dívida externa (fluxos) – E para amortizar dívida externa que vence (stocks) • Algumas grandes empresas com elevada dívida externa e em sectores não transaccionáveis agem de forma similar • Subsidiárias de empresas estrangeiras (IDE) igualmente direccionam fluxos para o exterior Estado, banca, grandes empresas, subsidiárias de IDE actuam no mesmo sentido • Tentam fazer algo fisicamente impossível – Utilizar receitas de actividade real doméstica para pagar despesa relativa a actividade real externa, a qual só pode ser paga com exportações líquidas – País teria de passar a registar excedentes da balança comercial de 5% do PIB • Ora, em 236 anos de História, o país só registou excedentes da balança comercial em 7 anos • Últimos excedentes em 1941-1943 devido às exportações de Volfrâmio para a Alemanha nazi – Retiram liquidez à actividade económica doméstica, que em resultado cessa – Ou seja, a tentativa de melhorar substancialmente os fluxo externos, coloca a actividade económica doméstica sob grande tensão. • Resulta no atrofiamento da actividade económica doméstica por interrupção dos fluxos (circulação monetária) domésticos O ajustamento externo assumido pelo FMI é enorme Fonte: Gráfico de Joshua Aizenman (2012), com alterações relativas a Portugal introduzidas pelo autor O país teria de registar excedentes da balança comercial muito superiores à média histórica da Alemanha. Para voltar a ter níveis negligíveis de dívida externa líquida o país teria de registar excedentes de 6% do PIB e crescimento económico de 4% durante mais de uma década (Cabral, 2011), ao mesmo tempo que numerosos países na periferia da UE adoptam estratégia idêntica devido a orientações das instituições de governo da UE. Conclusões • Ajustamento orçamental significativo – • Estratégia (da troika) baseia-se em retracção da procura interna para obrigar a economia do país a “viver abaixo das suas possibilidades” – – – – • Saldo primário passa de -0,6% do PIB em 2008 para +3,2% do PIB entre 2015 e 2030 O ajustamento externo é enorme: De acordo com esse plano, o saldo da balança corrente sem juros passaria de -4,4% do PIB (média 2007-2010) a +7,1% do PIB em 2017, uma melhoria de 11,5% do PIB Este ajustamento externo faz-se exclusivamente através da melhoria da balança comercial de um défice de 7,7% do PIB em 2007-2010 para um excedente de 5,1% do PIB em 2017 (12,8% do PIB) Ou seja, o plano da troika para o país – que sempre viveu acima das possibilidades – é que passe a viver sistematicamente “abaixo das suas possibilidades”, e que passe a poupar todos os anos a partir de 2013 “mais de 5% das suas possibilidades” antes da despesa com juros, um nível superior à média histórica da Alemanha (antes do euro), que poupava “1% a 2% das suas possibilidades” Isto ao mesmo tempo que se exige que vários países da periferia da Europa passem também a viver “abaixo das possibilidades” Plano irrealista e inexequível – – – – Subtrai ao financiamento à economia (interrupção dos fluxos monetários) Resgate torna ajustamento muito maior do que ocorreria se não houvesse qualquer ajuda externa As economias da Grécia, Irlanda e Portugal estariam hoje muito melhor se não tivessem beneficiado de qualquer ajuda da UE, ou seja, se as instituições de governo da UE não tivessem feito nada Estratégia contraproducente e particularmente destrutiva da actividade do sector privado Agradeço a vossa atenção e as questões que queiram colocar Projecções “FMI” 5th review 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2020 2025 2030 184,7 170,9 198 166,3 206,9 166,8 214,2 170,4 217,8 175,6 220,2 180,9 234,7 208,6 253,1 253,8 271,6 308,7 0,5% -2,7% 4,1% -0,2% 0,3% 3,9% 0,5% -2,4% 2,2% 4,1% -0,1% -3,1% 3,0% 4,2% -0,8% -3,2% 3,0% 4,3% -1,1% -3,2% 4,0% 4,5% 0,1% -3,2% 4,0% 4,8% -3,2% 4,0% 5,0% Calculations Interest expenditure (€ bn) Interest expenditure (% GDP) 7,6 4,6% 7,7 4,6% 8,5 5,0% 9,0 5,1% 9,4 5,2% 10,4 5,0% 12,0 4,7% 13,4 4,3% Budget deficit (€ bn) Budget deficit (% of GDP) 8,4 5,1% 7,4 4,4% 4,4 2,6% 3,6 2,0% 3,6 2,0% 3,7 1,8% 3,8 1,5% 3,5 1,1% 119,1% 119,1% 123,7% 124,1% 123,6% 125,7% 121,2% 124,0% 118,4% 121,8% 109,2% 112,5% 96,6% 99,7% 84,8% 88,0% Debt levels (€ bn) GDP (€ bn) Assumptions Primary deficit (% GDP) Nominal GDP growth rate Nominal interest rate Ad-hoc flows (privatizations, other) (% of GDP) Debt projections IMF Debt projection (% of GDP) Author's projection (% of GDP) 108,1% 108,1% Nota: Cálculos do autor com base em premissas do FMI. Desvio até 2015 explica 94% da diferenças de previsões em 2030 Pequenas alterações da taxa de juro ou da taxa de crescimento tornam dívida insustentável 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2020 2025 2030 184,7 170,9 200 165,4 208,9 164,3 216,3 166,2 220,0 169,6 224,9 173,0 250,9 191,9 290,5 222,5 340,7 257,9 0,5% -3,2% 4,1% -0,2% -0,7% 3,9% 0,5% -2,4% 1,2% 4,1% -0,1% -3,1% 2,0% 5,2% -0,8% -3,2% 2,0% 5,3% -1,1% -3,2% 3,0% 5,5% 0,1% -3,2% 3,0% 5,8% -3,2% 3,0% 6,0% Calculations Interest expenditure (€ bn) Interest expenditure (% GDP) 7,6 4,6% 7,8 4,7% 8,6 5,2% 11,2 6,6% 11,7 6,7% 13,4 7,0% 16,3 7,3% 19,8 7,7% Budget deficit (€ bn) Budget deficit (% of GDP) 8,4 5,1% 7,5 4,5% 4,6 2,8% 6,0 3,5% 6,1 3,5% 7,3 3,8% 9,2 4,1% 11,5 4,5% 119,1% 120,9% 123,7% 127,2% 123,6% 130,1% 121,2% 129,7% 118,4% 130,0% 109,2% 130,8% 96,6% 130,6% 84,8% 132,1% Debt levels (€ bn) GDP (€ bn) Assumptions Primary deficit (% GDP) Nominal GDP growth rate Nominal interest rate Ad-hoc flows (privatizations, other) (% of GDP) Debt projections IMF Debt projection (% of GDP) Author's projection (% of GDP) 108,1% 108,1% Nota: Alterações nas premissas marcados a vermelho e consistem alteração no nível de dívida de 2012, taxa de crescimento económica é 1 p.p. mais baixa do que projectado pelo FMI a partir de 2013, taxa de juro média é 1 p.p. mais alta do que projectada pelo FMI a partir de 2015