Introdução à Geometria Enumerativa via
Teoria de Deformações
Dan Avritzer
2a bienal da sociedade brasileira de matemática
Salvador- Outubro de 2004
Aos participantes da II bienal da SBM
Estas notas foram inicialmente escritas para ser utilizadas na 11a Escola de Álgebra
realizada em São Paulo em julho de 1990. Elas pretenderam ser uma introdução
à geometria enumerativa que fosse elementar e rica em exemplos. Uma boa parte
delas versa sobre Grassmannianas e as utilizamos para resolver alguns problemas de
geometria enumerativa. Elas foram editadas nas atas da escola que como se sabe
têm uma edição limitada. Desde então, apesar de há muito esgotadas, estas notas
têm sido solicitadas por vários colegas e alunos a procura de um texto elementar
sobre Grassamannianas e geometria enumerativa. Por outros lado, nos últimos anos,
o assunto evoluiu muito, com os desenvolvimentos que ocorreram na última década
do século passado, notadamente os trabalhos de Kontsevich de 1994 [13], seguidos de
outros (veja a introdução ao último capı́tulo). Surgiu então a idéia de reeditar para
esta bienal as notas da 11a escola de álgebra, acrescidas de uma material mais atual.
É isto que você tem em mãos onde apenas o último capı́tulo foi escrito recentemente
para dar uma idéia dos desenvolvimentos que ocorreram nos últimos 13 anos. Como
a 1a versão, este texto é elementar e não aborda o assunto com a sofisticação que ele
adquiriu nos últimos 30 anos. Pretende ser apenas uma primeira aproximação para que
o aluno interessado seja motivado para estudos posteriores. Gostaria de agradecer a
organização da II bienal da sociedade brasileira de matemática pela oportunidade de
ensinar este mini-curso e escrever estas notas.
Salvador, Outubro de 2004.
ii
Introdução
O aluno que resolve estudar Geometria Algébrica costuma se deparar com duas
dificuldades iniciais. Por um lado, a Geometria Algébrica possui uma vasta história e
os livros textos atuais costumam omitir a maior parte dela, ou remetê-la aos exercı́cios,
mesmo por que é difı́cil tratar em um único texto a Geometria Algébrica Clássica e a
Geometria Algébrica Contemporânea.
Por outro lado, a teoria moderna é sofisticada exigindo uma formação sólida que,
sejamos realistas, não é oferecida pelas universidades brasileiras. Estas notas pretendem
ser um compromisso entre a necessidade de estudar o material clássico (já que é daı́ que
vêm os exemplos que justificam os desenvolvimentos da teoria verificados nos últimos
40 anos ) e o gosto apressado do leitor atual que não tem tempo de estudar os grossos
manuais, em vários volumes, do passado.
Para isto escolhemos um tópico, a Geometria Enumerativa, que, também ela, tira
seus exemplos e seus problemas do passado, mas que, nos dias atuais, conheceu um
desenvolvimento extraordinário, desesembocando na chamada Teoria de Interseção.
Daremos uma ideia mais concreta do que é a Geometria Enumerativa ao final do
Capı́tulo 1. Neste capı́tulo faremos também uma revisão do Plano Projetivo, do Espaço
Projetivo e das propriedades dos conjuntos algébricos nestes espaços. Propositalmente
omitimos a conexão entre este assunto e a Álgebra Comutativa. Fazemos referência
a alguns dos resultados de Álgebra Comutativa habitualmente citados neste contexto
nos exercı́cios. O objetivo é chegar o mais rapidamente possı́vel às Variedades
Grassmannianas.
É o que fazemos no Capı́tulo 2, com o estudo da Grassmanniana de Retas de IP3 .
O estudo destas variedades data da metade do século XIX(1844) e foi iniciado pelo
matemático que lhes deu o nome, Hermann Grassmann. A Grassmanniana de Retas
de IP3 (C) é o conjunto dos planos de C4 . Pode também ser pensada como uma quádrica
de IP5 e como tal possui uma rica geometria. O estudo desta geometria e sua relação
com as retas de IP3 será levado a cabo nos capı́tulos 2 e 3. Resolvemos neste ponto um
primeiro problema enumerativo: Quantas retas do espaço interceptam 4 retas dadas?
Durante todo o texto tentei manter a um mı́nimo os pré-requisitos necessários. Estas
notas pretendem ser accessı́veis a um aluno em final de bacharelado.
Gostaria de agradecer aos colegas Israel Vainsencher, Eliana Farias e Soares , Maria
Cristina Ferreira, Sylvie Marie Kamphorst Leal da Silva e Maria Elasir Gomes Seabra.
Ao primeiro por ter me apresentado a um assunto tão instigante e repleto de motivações quer clássicas, quer modernas;quer geométricas, quer algé bricas. A Eliana
e Cristina, pelo cuidado com que leram versoẽs iniciais deste texto e pelas numerosas
iii
INTRODUÇÃO
iv
sugestões que ofereceram. A Sylvie e Elasir por terem me apresentado ao maravilhoso
mundo do LATEXe pela ajuda que me deram no uso deste programa para escrever
este texto. Gostaria de agradecer especialmente a Paulo Antônio Fonseca Machado,
que inicialmente como aluno, elaborando uma dissertação de mestrado sobre o tema,
e mais tarde como colega, muito contribuiu para minha compreensão deste assunto
e consequentemente para estas notas, inclusive oferecendo muitas sugestões para o
aprimoramento do texto. Finalmente, gostaria de agradecer a comissão organizadora
da décima primeira Escola de Álgebra pela oportunidade de lecionar este mini-curso.
Belo Horizonte,junho de 1990.
SUMÁRIO
Aos participantes da II bienal da SBM
ii
Introdução
iii
1
1
1
3
7
12
O Espaço Projetivo
1.1 Curvas Afins . . . . . . .
1.2 Curvas Projetivas Planas
1.3 Variedades Projetivas . .
1.4 Exercı́cios . . . . . . . . .
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2
A Grassmanniana de Retas de P3
14
2.1 Coordenadas de Plücker . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2 Subespaços Lineares da Grassmanniana de Retas . . . . . . . . . . . . . . . 17
3
Cônicas da Grassmanniana de Retas
3.1 Quádricas em P3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3.2 Produto de Espaços Projetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3.3 O Régulo de P3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
21
21
22
25
4
Métodos degenerativos em geometria enumerativa
4.1 A evolução da geometria enumerativa na década dos anos 90 do século XX
4.2 Cônicas interceptando 8 retas no espaço . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.3 Multiplicidade das soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.4 Cúbicas racionais de IP3 interceptando 12 retas . . . . . . . . . . . . . . . .
4.5 Algumas questões pendentes; perspectivas . . . . . . . . . . . . . . . . . .
27
27
28
29
30
32
v
vi
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
O Espaço Projetivo
1.1
Curvas Afins
A História da álgebra se confunde com o estudo das raı́zes de polinômios. Se em
um primeiro momento este estudo se fixou na busca de fórmulas que expressassem
as raı́zes de um polinômio de uma variável em função dos seus coeficientes , com o
estudo de polinômios de duas variáveis fica definitivamente selado o enlace da Álgebra
com a Geometria. Ao perceber que uma equação do tipo f ( X, Y ) = 0 descreve uma
curva no plano, Descartes inventou um novo ramo da matemática conhecido hoje como
Geometria Algébrica. Neste capı́tulo estudaremos as primeiras propriedades das curvas
planas, vistas como raı́zes de polinômios de duas variaáveis.
Seja R o corpo dos números reais , R2 o plano real e R[ X, Y ] o anel dos polinômios
com coeficientes reais nas variáveis X e Y. Dado f ∈ R[ X, Y ] um ponto ( a1 , a2 ) ∈ R2 é
chamado um zero de f se f ( a1 , a2 ) = 0.
Se f é não constante o conjunto dos zeros de f , denotado por V ( f ), será chamado
(provisoriamente) de curva plana afim associada a f .
Exemplo 1 Seja f ( X, Y ) = X 2 + Y 2 − 1 ∈ R[ X, Y ]. A curva plana afim associada é o cı́rculo
de raio 1 e centro na origem.
Exemplo 2 Seja f ( X, Y ) = Y 2 − X ( X 2 − 1) ∈ R[ X, Y ]. A curva plana afim associada é a
cúbica não singular.
Exemplo 3 Seja f ( X, Y ) = X 2 + Y 2 ∈ R[ X, Y ].
X 2 + Y 2 = 0 → X = Y = 0 e a curva associada é constituida pela origem do plano.
Exemplo 4 Seja f ( X, Y ) = X 2 + Y 2 + 1 ∈ R[ X, Y ]. A Equação X 2 + Y 2 + 1 = 0 não possui
soluções reais e a curva neste caso é vazia.
Exemplo 5 Sejam f ( X, Y ) = X e g( X, Y ) = X 2 . Neste caso temos, V ( f ) = V ( g) =Eixo dos
y’s.
Os exemplos 3 e 4 acima mostram a incoveniência de, no estudo das curvas planas,
nos restingirmos aos zeros reais de polinômios, já que nestes casos verificamos uma
1
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
2
escassez de pontos. Daqui por diante, a menos de menção explı́cita em contrário
trabalharemos com polinômios em C[ X, Y ], o anel de polinômios nas variáveis X, Y com
coeficientes complexos e estudaremos seus zeros em C2 , o plano complexo. O Exemplo
5 indica que mesmo considerando zeros de polinômios em C2 a mesma curva pode
corresponder a polinômios muito distintos. Faremos então a seguinte definição:
Definição 1 Uma Curva Plana Afim é o conjunto dos zeros F = V ( f ) em C2 de um polinômio
irredutı́vel não constante f ∈ C[ X, Y ] . O grau de F (Notação: ∂F) é o grau do polinômio f .
Observação:A boa definição do grau é uma consequência do Teorema dos Zeros de
Hilbert. (Veja exercı́cio 1.4)
Nosso primeiro resultado afirma que considerando zeros de polinômios em C2 não
acontecem anomalias como as verificadas nos exemplos 3 e 4 acima.
Proposição 1 Seja f ∈ C[ X, Y ] um polinômio iredutı́vel não constante. Então F = V ( f ) é
constituida por um número infinito de pontos.
Demonstração: Seja
f ( X, Y ) = a0 (Y ) + a1 (Y ) X + a2 (Y ) X 2 + ... + an (Y ) X n
um polinômio qualquer não constante. ( ai (Y ) ∈ C[Y]). Seja i > 0 tal que ai naõ é
identicamente nulo. Como C é algebricamente fechado, dado y ∈ C tal que ai (y) 6= 0
existe x ∈ C tal que f ( x, y) = 0. Como existem infinitos tais y’s existem infinitos pontos
( x, y) ∈ C2 tais que f ( x, y) = 0, terminando a demonstração.
Dadas duas curvas F, G ⊂ C2 uma primeira pergunta que se pode fazer é a cerca
do conjunto F ∩ G. É finito?Em caso afirmativo, quantos pontos possui?Para isto
consideremos alguns exemplos.
Exemplo 6 Sejam F = V ( X 2 + Y 2 − 1√
) e G = V ( X − Y ). Substituindo a segunda equação
2
na primeira temos 2X = 1 =⇒ X = ± 2/2. Donde :
√
√
√
√
F ∩ G = {( 2/2, 2/2), (− 2/2, − 2/2)}
é constituido por dois pontos. (2 = ∂F.∂G )
Exemplo 7 Sejam F = V ( X 2 − Y − 1) e G = V (4X 2 + Y 2 − 4).
F é a parábola X 2 = Y + 1 e G é a elipse X 2 + Y 2 /4 = 1.
Fazendo os cálculos para encontrar F ∩ G temos porém uma surpresa:
Y + 1 = 1 − Y 2 /4,
é satisfeita para dois valores de Y, Y = 0 ou Y = −4.Para
√ Y = 0,temos dois valores de
X, X = ±1(como esperado).Quando Y = −4 =⇒ X = ± 3i. Ou seja, F ∩ G é constituida
de quatro pontos. Observe que 4 = ∂F.∂G. (Este exemplo aponta mais uma das razoẽs porque
estamos trabalhando sobre C. )
1.2. CURVAS PROJETIVAS PLANAS
3
Exemplo 8 Sejam F = V ( X.Y ) e G = V ( X ( X − Y )). (Atenção!Pela definição acima, F e G
não são curvas)
XY = 0 ⇐⇒ X = 0 ou Y = 0; X ( X − Y ) = 0 ⇐⇒ X = 0 ou X = Y.
Vemos que F e G possuem uma reta em comum a reta V ( X ).
Os últimos três exemplos parecem indicar que quando consideramos polinômios
irredutı́veis f , g ∈ C[ X, Y ] as curvas F = V ( f ) e G = V ( g) possuem um número finito
de pontos em comum e este número é dado por ∂F.∂G. Sabemos, no entanto, que isto
não é verdade. Por exemplo duas retas paralelas F e G não se interceptam e ∂F.∂G = 1.
Intuitivamente porém gostarı́amos de dizer que duas retas paralelas se encontram no
’infinito’. Assim, se pudéssemos trabalhar com pontos no infinito talvez pudéssemos
afirmar que duas curvas se interceptam em um número finito de pontos e este número é
dado pelo produto de seus graus. Na próxima seção, introduziremos o Espaço Projetivo
e poderemos trabalhar com pontos no infinito.
1.2
Curvas Projetivas Planas
Seja K=R ou C.
Em K3 \ {0} considere a seguinte relação de equivalência:
x ∼ y ⇐⇒ se existe k ∈ K, k 6= 0 tal que y = kx.
Definição 2 :O Plano Projetivo é o conjunto das classes de equivalência de K3 \ {0} pela relação
de equivalência acima e é denotado por IP2 (K).
Cada uma destas classes corresponde a uma reta de K3 passando pela origem
e reciprocamente. Dado um ponto P = ( x0 , x1 , x2 ) ∈ K3 \ {0}, sua classe
−
de equivalência P em IP2 (K) é denotada por ( x0 : x1 : x2 ).
Dizemos que
−
( x0 : x1 : x2 ) são as coordenadas homogêneas do ponto P. (usamos ’:’ como um lembrete
para o fato que o terno acima está definido a menos de multiplicação por constante não
nula.)
O plano R2 (resp. C2 ) pode ser pensado como um subconjunto de IP2 (R)(resp.
IP2 (C)). Ponhamos K=R para fixar ideias. Sejam X, Y, Z as coordenadas do R3 e
consideremos o plano Z = 1. Podemos identificar este plano com o plano euclidiano
da seguinte maneira: Observe que dado um ponto P de Z = 1 existe uma única reta
passando pela origem e por P, ou seja, cada ponto P de Z = 1 está associado a um único
−
P de IP2 . Por outro lado, dada uma reta L do R3 passando pela origem temos duas
possibilidades:
• L está contida no plano Z = 0.
• L corta o plano Z = 1 em um único ponto.
4
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
Assim podemos identificar os pontos do plano Z = 1 com o subconjunto de IP2 (R)
formado pelas retas do R3 que não estão contidas no plano Z = 0. As retas do R3 que
estão contidas no plano Z = 0 são chamadas de pontos no infinito de IP2 (Notação: H∞ ).
Temos:
IP2 (R) = R2 ∪ H∞
Tudo o que foi dito acima vale para K = C. Em particular, temos:
IP2 (C) = C2 ∪ H∞
Os exemplos seguintes ilustram o porque desta nomenclatura.
Exemplo 9 Considere as retas L, L0 ⊂ R2 dadas por L = V ( X − Y ) e L0 = V ( X − Y + 1).
Pensando no R2 ⊂ IP2 (R) como acima temos:
A maneira natural de estender L a P2 (R) é considerar L=V(X-Y), onde agora estamos
considerando os pontos ( x, y, z) ∈ R3 tais que x − y = 0, ou seja o plano X = Y. No
caso de L0 não poderemos proceder da mesma maneira pois dado um ponto ( x, y, z) tal que
x − y + 1 = 0, k( x, y, z) não pertence ao plano X − Y + 1 = 0 para qualquer k ∈ R, k 6= 0. Ou
seja, dado um ponto qualquer de IP2 (R) não podemos decidir se ele anula ou não X − Y + 1! A
extensão natural de L0 a IP2 (R) é L0 = V ( X − Y + Z ), pois quando Z = 1 temos a reta original
e se ( x, y, z) ∈ R3 com x − y + z = 0, k( x, y, z), k ∈ R, k 6= 0 também satisfaz a equação
X − Y + Z = 0. Os dois planos acima se interceptam na origem e portanto ao longo de toda
uma reta a saber a reta dada por Z = 0, X = Y. Vemos assim que as retas L e L’ paralelas em R2
quando estendidas a IP2 (R) se encontram no ponto no infinito cujas coordenadas homogêneas
são (1 : 1 : 0).
Observe qua as retas L, L0 ⊂ R2 quando estendidas a IP2 (R) foram acrescidas
de exatamente um ponto: o ponto no infinito. De uma maneira geral sejam L1 =
AX + BY + C e L2 = A0 X + B0 Y + C 0 duas retas do R2 . Se L1 , L2 não são paralelas
sua interseção pode ser calculada pela regra de Cramer:
¯
¯ ¯
¯
¯ B C ¯ ¯ A B ¯
¯
¯
¯
¯
X=¯ 0
/
B C 0 ¯ ¯ A0 B0 ¯
¯
¯ ¯
¯
¯ C A ¯ ¯ A B ¯
¯/¯
¯
Y = ¯¯ 0
C A0 ¯ ¯ A0 B0 ¯
Em coordenadas homogêneas o ponto P = L1 ∩ L2 é dado por
¯
¯ A B
¡ 0
¢
0
0
0
BC − B C/∆ : AC − A C/∆ : 1 , onde ∆ = ¯¯ 0
A B0
¯
¯
¯.
¯
Se L1 , L2 são, paralelas ∆ = 0 . As extensões de L1 , L2 a IP2 (R) são dadas por
L10 = V ( AX + BY + CZ ), L20 = V ( AX + BY + CZ )
(1.1)
respectivamente. Como ∆ = 0 as equações possuem uma solução comum que é dada
por ( BC 0 − B0 C, A0 C − AC 0 , ∆)
Vemos assim que a extensão de uma reta do R2 a IP2 (R) acrescenta um ponto no
infinito a reta de tal forma que todas as retas paralelas passam por um mesmo ponto no
infinito.
1.2. CURVAS PROJETIVAS PLANAS
5
Exemplo 10 Considere f
=
X − Y2 , g
=
Y
∈
R[ X, Y ].
Em R2 ,
F = V ( f ) e G = V ( g) possuem um único ponto de interseção:a origem, enquanto aqui
∂F.∂G = 2. Ao contrário do exemplo 7, olhando para os zeros em C2 não obtemos nenhum
outro ponto. Consideremos a extensão de F e G a IP2 (R). Pelas mesmas razoẽs do exemplo
anterior as extensoẽs de F e G a IP2 (R) são dadas respectivamente pelos zeros de F 0 = Y,
G 0 = ZX − Y 2 . Calculando a interseção obtemos o ponto que faltava :
Y = 0, Z = 0, que corresponde ao ponto (1 : 0 : 0) em coordenadas homogêneas.
Os
polinômios
F0
e
G0
considerados
acima
são
exemplos
do que chamamos de polinômios homogêneos. Mais precisamente, um polinômio
F ( X0 , X1 , ..., Xn ) ∈ K [ X0 , X1 , ..., Xn ] é chamado um polinômio homogêneo de grau d
se
F (λX0 , λX1 , ..., λXn ) = λd F [ X0 , X1 , ..., Xn ] para todo λ ∈ K \ {0}.
Observe
que
esta
condição
implica que esteja bem definido o anulamento de um polinômio F ao longo de uma reta
(λX0 , λX1 , ..., λXn ) ⊂ K n+1 . Um polinômio F é homogêneo de grau d se e somente se
seus monômios são todos de grau d. (Ver exercı́cio 1.5 )Dado um polinômio homogêneo
F ( X0 , X1 , X2 ) um ponto ( x0 : x1 : x2 ) ∈ IP2 é um zero de F se F ( x0 , x1 , x2 ) = 0.
Definição 3 Uma Curva Projetiva Plana é o conjunto dos zeros em IP2 (C) de um polinômio
homogêneo ,irredutı́vel e não constante. O grau de uma curva projetiva F = V ( f ), f polinômio
homogêneo ,irredutı́vel e não constante é definido como sendo o grau de f.
Exemplo 11 Uma cônica de IP2 (C) é dada pelos zeros de um polinômio homogêneo de grau 2,
ou seja, um polinômio da forma:
F ( X, Y, Z ) = a0 X 2 + a1 XY + a2 XZ + a3 Y 2 + a4 YZ + a5 Z2 .
Dada uma cônica afim qualquer:
f ( x, y) = aX 2 + bXY + cX + dY 2 + eY + f ,
podemos obter sua extensão F ∗ = V ( f ∗) da seguinte maneira. Considere a identificação natural
de C2 com o plano Z = 1 em C3 . Dado um ponto ( x, y, 1) ∈ V ( f ) a reta determinada
por ( x, y, 1) e a origem deve pertencer a F ∗. Assim vemos que o polinômio f ∗ procurado é o
polinômio cujos zeros são o cone em C3 de vértice na origem e cuja diretriz é a cônica f. Este cone
é dado pelo polinômio
f ∗ = aX 2 + bXY + cXZ + dY 2 + eYZ + f Z2 ,
como se vê fazendo Z = 1 na equacão acima.
Trata-se de um fato geral que não será demostrado aqui:Dada uma curva afim F =
−
V ( f ) ⊂ C2 definimos seu fecho projetivo como sendo a menor curva projetiva F tal
que sua restrição a C2 é a curva F. O fecho projetivo de F = V ( f ) pode ser obtido
homogeneizando o polinômio f(X, Y) para obter o polinômio f*(X,Y,Z), e em seguida
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
6
tomando F*=V(f*(X,Y,Z)). Para isto, seja n o grau do monômio de f de grau máximo.
Obtemos f* multiplicando cada monômio não nulo de grau i pela potência Z n−i de Z.
Assim se
n
f ( X, Y ) =
∑ fi (X, Y ), onde
f i ( X, Y ) homogêneos de grau i, temos:
i =0
n
f ∗ ( X, Y, Z ) =
∑ Zn−i fi (X, Y ).
i =0
Os zeros em C3 do polinômio f ∗ formam o que denominamos cone afim associado a
curva projetiva F ∗ = V ( f ∗) ⊂ IP2 (C).
Voltemos ao problema inicial que abordamos no inı́cio do capı́tulo. Dadas duas
curvas projetivas F = V ( f ) e G = V ( g) é verdade que o número de pontos de F ∩ G
é dado por ∂F.∂G?A resposta ainda é não, pois podemos ter, por exemplo, uma reta
tangente a uma cônica interceptando-a em apenas um ponto. Intuitivamente porém
vemos que o ponto de tangência deveria ser contado como 2 pontos pois se considerarmos uma reta secante à cônica tendendo à reta tangente, vemos que os dois
pontos de interseção da secante com a cônica tendem ao ponto de tangência. O mesmo
acontece se considerarmos a interseção da cúbica V (Y 2 − X 2 ( X + 1)) com uma reta
passando pela origem. Apesar da interseção ser apenas um ponto vê-se que este
ponto deveria ser contado duas vêzes. É possı́vel formalizar estas ideias definindo os
conceitos de multiplicidade de interseção e de pontos múltiplos de uma curva . Isto
não será feito aqui. O leitor interessado poderá consultar ([7] ou [21]) . Diremos apenas
que se contarmos multiplicidades adequadamente vale o chamado Teorema de Bézout
segundo o qual o número de pontos de interseção de duas curvas F e G é dado por
∂F.∂G(contadas as multiplicidades).
1.3. VARIEDADES PROJETIVAS
7
1.3 Variedades Projetivas
O Espaço Projetivo Pn é a generalização natural para n dimensões do plano
projetivo. Seja V um espaço vetorial sobre C de dimensão n+1(não necessariamente
Cn+1 ). Consideremos em V \ {0} a seguinte relação de equivalência:
x ∼ y ⇐⇒ existe k ∈ C, k 6= 0 tal que y = kx
Definição 4 O Espaço Projetivo Pn (V ) é o conjunto das classes de equivalência de V \ {0}
pela relação acima.
Observe que x ∼ y se e somente se x, y estão em uma mesma reta.Portanto, Pn (V ) é o
conjunto dos sub-espaços vetoriais de V de dimensão 1. Fixada uma base de V podemos
identificar V com Cn+1 e representar cada elemento de x ∈ V por suas coordenadas
−
−
x = ( x0 , x1 , ..., xn ). Se x ∈ Pn (V ) e x = ( x0 , x1 , ..., xn ) é um representante se x então
escrevemos
x = ( x0 : x1 : ... : xn ) e dizemos que as coordenadas cartesianas de x são as coordenadas
−
homogêneas de x. Assim como no caso do plano projetivo, já estudado, as coordenadas
−
homogêneas de x de Pn (V ) só estão determinadas a menos de multiplicação por um
escalar não nulo.
Quando introduzimos o plano projetivo observamos que C2 ⊂ IP2 da seguinte
maneira: Seja x ∈ IP2 então x = ( x0 : x1 : x2 ) ;se x2 6= 0, x corresponde a um único
ponto de C2 ,que é identificado com ( x0 : x1 : 1), via a aplicação
φ2 ( x0 , x1 ) = ( x0 : x1 : x : 1); se x2 = 0, x é chamado de ponto no infinito. Observe que a
escolha do plano x2 = 1 como o plano a ser identificado com C2 é arbitrária.Poderı́amos
fazer o mesmo com o plano x0 = 1 considerando a aplicação:
φ0 : ( x1 , x2 ) −→ (1 : x1 : x2 ),
ou ainda com o plano x1 = 0,considerando uma aplicação análoga.
Em geral, seja Ui = {( x0 , x1 , ..., xn ) ∈ Pn (V ), xi 6= 0}. Cada x ∈ Ui possui um único
conjunto de coordenadas homogêneas da forma:
x = ( x0 /xi : x1 /xi : ... : xi−1 /xi : 1 : ... : xn /xi )
(tome x ∈ Ui qualquer e considere (1/xi ) x ).
Vamos definir
φi : Cn −→ Pn (V ) por
φi ( a1 , a2 , ..., an ) = ( a1 : a2 : ..., ai−1 : 1 : ai+1 : ... : an ).
φi define uma correspondência biunı́voca entre Cn e os pontos de Ui ⊂ Pn (V ). Observe
que
Pn ( V ) =
n
[
i =0
Ui ,
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
8
portanto Pn pode ser coberto por n+1 subconjuntos cada um dos quais é essencialmente
Cn .Por isto chamamos Pn de Espaço Projetivo de n dimensões. Se, como fizemos para
IP2 (C) , notarmos
H∞ = { x = ( x0 : x1 : ... : xn )Pn (V )/xn = 0},
então podemos escrever
Pn (C ) = Cn ∪ H∞
H∞ é chamado o hiperplano no infinito. Se V = C4 o espaço projetivo Pn (C4 ) será
denotado por P3 . Este caso particular terá grande importância na sequência por isto
o examinaremos mais de perto. Dado f ∈ C[ X0 , X1 , X2 , X3 ] homogêneo, um ponto
( x0 : x1 : x2 : x3 ) ∈ P3 é chamado um zero de f se f ( x0 , x1 , x2 , x3 ) = 0.Assim como nos
primeiras duas seções notaremos o conjunto dos zeros de f por V(f). Uma superfı́cie
de P3 é o conjunto dos zeros de um polinômio homogêneo, não constante e irredutı́vel
f ∈ C[ X0 , X1 , X2 , X3 ]. O grau da superfı́cie F = V ( f ), denotado por ∂F, é o grau do
polinômio f. Se ∂ f = 1, F é chamado um plano, se ∂ f = 2, F é chamado uma quádrica.
Exemplo 12 Considere os dois planos
F = V ( aX + bY + cZ + d), G = V ( a0 X + b0 Y + c0 Z + d0 ) ⊂ C3 . A maneira natural de
estender F, G a P3 é considerar F 0 = V ( aX + bY + cZ + dW ), G 0 = V ( a0 X + b0 Y + c0 Z +
d0 W ). Os planos F 0 , G 0 possuem interseção não vazia em qualquer caso. Se F, G se interceptam
a interseção de F 0 , G 0 é a reta projetiva fecho projetivo da reta de interseção de F, G. Se F, G são
paralelas a interseção de F 0 , G 0 é uma reta contida no plano no infinito.
Em geral, um conjunto algébrico de Pn (V ) é o lugar dos zeros comuns de um
conjunto de polinômios homogêneos e irredutı́veis e não constantes f 1 , f 2 , ..., f r ∈
C[ X0 , X1 , X2 , ..., Xn ]. Se F = V ( f ), F é dita uma hipersuperfı́cie e seu grau é o grau
de f. Se ∂ f = 1 a superfı́cie é chamada um hiperplano. Se ∂ f = 2 a hipersuperfı́cie é
chamada uma quádrica. Se F é a interseção de k hiperplanos linearmente independentes
a superfı́cie é chamada um (n-k)-plano.
Exemplo 13 Considere o conjunto algébrico C = F ∩ G dado pelos zeros comuns dos seguintes
polinômios:
f ( X, Y, Z, W ) = XY − ZW, g( X, Y, Z, W ) = Z.
F = V ( f ) é a chamada quádrica não singular. Fazendo W = 1 e considerando sua interseção
real temos a superfı́cie que nos cursos de cálculo é conhecida como Parabolóide Hiperbólico. (Veja
a Figura 1.5.)G = V ( g) é simplesmente um dos planos coordenados. A curva C interseção das
duas superfı́cies é obtida fazendo Z = 0 na equação de F. Temos:
Z = 0 =⇒ XY = 0 =⇒ X = 0 ou Y = 0,
ou seja, C é a união das retas L1 = V ( Z, X ) e L2 = V ( Z, Y ). C também pode ser dada por
C = V ( Z, X.Y ).
O
Exemplo
acima
mostra
que,
mesmo
se
considerarmos
inicialmente dois polinômios irredutı́veis f , g, quando consideramos sua interseção
C = V ( f ) ∩ V ( g), podemos obter um conjunto que também pode ser dado por
1.3. VARIEDADES PROJETIVAS
9
polinômios que possuem uma fatoração não trivial. Geometricamente a interseção de
superfı́cies constituidas de ”um único pedaço”pode dar origem a uma curva constituida
de ”mais de um pedaço”. Gostarı́amos de evitar estas situações, não só por uma questão
de coerência com as demais definições (curvas algébricas e projetivas), como porque,
com esta condição , fica mais fácil enunciar alguns teoremas como , por exemplo , o
Teorema de Bézout. Para isto faremos as seguintes definições.
Definição 5 Um conjunto algébrico X ⊂ Pn (V ) é dito irredutı́vel se sempre que X = X1 ∪ X2 ,
com X1 , X2 algébricos tivermos X = X1 ou X = X2 .
Definição 6 Um conjunto algébrico X ⊂ Pn (V ) é dito uma Variedade Projetiva se X é
irredutı́vel.
Exemplo 14 Seja
F = V ( f ), f ( X, Y, Z ) = a0 X 2 + a1 XY + a2 XZ + a3 Y 2 + a4 YZ + a5 Z2 ,
uma cônica projetiva .(Neste exemplo f não é necessariamnte irredutı́vel.) Como c f , c ∈ C \ {0}
define a mesma cônica que f , vemos que F pode ser pensado como um elemento bem definido
de P5 (V ), onde V é o espaço vetorial de dimensão 6 dos polinômios homogêneos de grau 2 nas
−
variáveis X, Y, Z. Mais precisamente, um elemento f ∈ P5 (V ) é uma classe de equivalência
de polinômios onde qualquer representante é da forma c f , c ∈ C \ {0} e portanto pode ser
−
identificado com a cônica C = V ( f ), f ∈ f . Por esta identificação a cônica F , acima, pode ser
notada assim: F = ( a0 : a1 : a2 : a3 : a4 : a5 ).
Cada ponto de P5 (V ) corresponde , portanto, a uma única cônica. Dizemos que P5 (V )
parametriza as cônicas do plano projetivo. Os espaços projetivos Pn possuem uma importância
fundamental como espaços de parâmetros. Para ilustrar esta afirmativa, considere o conjunto das
cônicas que passam por um ponto ( x0 : x1 : x2 ) ∈ IP2 . Esta cônicas satisfazem a equação:
A0 x02 + A1 x0 x1 + A2 x0 x2 + A3 x12 + A4 x1 x2 + A5 x22 = 0.
Esta equação pensada no P5 (V ) das cônicas é a equação de um hiperplano. (Os Ai0 s são as
variáveis. )Se considerarmos cinco destes planos vemos que, em geral, eles se interceptam em
um ponto. Isto mostra que dados cinco pontos em IP2 ,entre os quais quaisquer três não estão
alinhados,existe única cônica passando por eles.(Veja os exercı́cios 1.8 e 1.9.) No próximo capı́tulo
estudaremos outros espaços de parâmetros de objetos geométricos.
Vamos agora tentar generalizar o Teorema de Bézout que enunciamos anteriormente
pra curvas projetivas para o contexto de Variedades Projetivas de Pn . Uma primeira
dificuldade é que se n > 2 não existe nenhuma garantia que duas variedades quaisquer
de Pn se interceptem. Considere o seguintes exemplos:
Exemplo 15 Considere o plano P = V ( aX + bY + cZ + dW ) ⊂ P3 e a reta de P3 dada por
L = V ( a1 X + a2 Y + a3 Z + a4 W, a10 X + a20 Y + a30 Z + a40 W ). Analisando o sistema formado
por estas três equações vemos que para quaisquer valor dos coeficientes o plano intercepta a reta
em um ponto, exceto quando a reta está contida no plano.
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
10
Exemplo 16 Considere agora a interseção de duas retas em P3 :
L1 = V ( a1 X + a2 Y + a3 Z + a4 W, a10 X + a20 Y + a30 Z + a40 W ),
L2 = V (b1 X + b2 Y + b3 Z + b4 W, b10 X + b20 Y + b3 Z + b40 W ).
Analisando o sistema formado pelas quatro equações acima vemos que dependendo do valor dos
coeficientes existem as seguintes possibilidades:
• a única solução do sistema é a origem caso em que as retas não se interceptam.
• o sistema possui infinitas soluções e neste caso as retas se interceptam em um ponto ou são
coincidentes.
Os resultados vistos nos dois últimos exemplos sobre interseção de retas e planos
em P3 se generalizam facilmente para interseções de sub-espaços lineares de Pn :
Para que duas variedades lineares V1 , (de dimensão n1 ), V2 , (de dimensão n2 ) ⊂ Pn se
interceptem obrigatoriamente é preciso que n1 + n2 ≥ n.Se n1 + n2 > n ,dim(V1 ∩ V2 ) >
0.Quando consideramos duas variedades V1 , V2 quaisquer a questão é muito mais
complicada.A própria noção de dimensão de uma variedade V é delicada e não será
tratada formalmente aqui.Admitiremos como noção intuitiva o que seja dimensão de
um conjunto algébrico de Cn .Dada uma Variedade Projetiva X ⊂ Pn temos que:
n
X=
∑ Xi , Xi = Ui ∩ X,
i =o
onde os Ui0 s são essencialmente Cn .Definiremos a dimensão de X como sendo o máximo
das
dimensões
dos
Xi .
Vale então um resultado analógo ao que enunciamos para sub-espaços lineares: Para
que duas variedades V1 , (de dimensão n1 ), V2 , (de dimensão n2 ) ⊂ Pn se interceptem
obrigatoriamente é preciso que n1 + n2 ≥ n.Se n1 + n2 > n ,dim(V1 ∩ V2 ) > 0.
Enunciaremos aqui uma versão fraca do Teorema de Bézout sem demonstração. A
demonstração de uma versão mais forte,bem como dos resultados aludidos acima sobre
dimensão pode ser encontrada em ([9],pg.47).
Teorema 1 Uma hipersuperfı́cie F ⊂ Pn de grau d intercepta uma reta genérica em d pontos.
Usaremos no texto frequentemente o termo genérico significando que a ”maioria”das
figuras de um certo tipo possuem uma determinada propriedade. Aqui queremos
dizer que a ”maioria”das retas de Pn intercepta F em d pontos. Este conceito pode
ser formalizado mas esta formalização escapa aos objetivos destas notas.
Consideremos um outro exemplo sobre a famı́lia de cônicas de IP2 e seu espaço de
parâmetros.
Exemplo 17 Seja dada uma cônica C ⊂ IP2 e considere o conjunto H ⊂ P5 de todas as cônicas
que são tangentes a C. Pode-se mostrar (Veja [?].) que H é uma hipersuperfı́cie de P5 de grau 6.
1.3. VARIEDADES PROJETIVAS
11
Para contar o número de cônicas que passam por 4 pontos dados e são tangentes a C podemos
considerar a interseção de H com os quatro hiperplanos H1 , H2 , H3 , H4 , que parametrizam as
cônicas que passam por cada um dos 4 pontos dados. Seja L = H1 ∩ H2 ∩ H3 ∩ H4 . Se os
quatro pontos são genéricos L é uma reta que pelo Teorema de Bézout intercepta H em 6 pontos.
Concluimos que, genericamente, existem 6 cônicas passando por 4 pontos dados e tangentes a
uma cônica C.
Os exemplos 13 e 16 ilustram um tipo de problema que dá origem a toda uma área da
Geometria Algébrica: A Geometria Enumerativa. Em Geometria Enumerativa é dada
uma famı́lia de objetos geométricos e impõe-se condições à famı́lia de tal forma que
apenas um número finito satisfaçam à estas condições. (No exemplo acima a famı́lia é a
das cônicas e as condições são ser tangente a uma cônica fixa e passar por 4 pontos. )A
Geometria Enumerativa preocupa-se com o cálculo deste número finito. Conforme ficou
evidente nos exemplos considerados a resolução de um problema enumerativo passa
pelo estudo de um espaço de parâmetros para a famı́lia em questão. No exemplo acima
o espaço P5 que parametriza as cônicas foi suficiente para o problema considerado.
Em geral, encontrar um espaço de parâmetros adequado para uma determinada famı́lia
e um determinado problema pode ser uma tarefa delicada . Nos próximos capı́tulos
estudaremos as Variedades Grassmannianas que aparecem como espaço de parâmetros
de muitas famı́lias importantes de objetos geométricos.
CAPÍTULO 1. O ESPAÇO PROJETIVO
12
1.4 Exercı́cios
1. Dado X ⊂ Pn , o conjunto dos polinômios f ∈ C[ X0 , X1 , X2 , ..., Xn ] que se anulam
em X é chamado o ideal de X e denotado por I ( X ).
I ( X ) = { f ∈ C[ X0 , X1 , X2 , ..., Xn ]/ f ( a1 , a2 , ..., an ) = 0 para todo ( a1 , a2 , ..., an ) ∈ X }.
Podemos estender a noção de conjunto de zeros de um polinômio a um conjunto
qualquer da seguinte maneira: Seja S ⊂ C[ X0 , X1 , X2 , ..., Xn ] um conjunto de
polinômios. Definimos:
V (S) = {( a1 , a2 , ..., an ) ∈ Cn / f ( a1 , a2 , ..., an ) = 0, para todo f ∈ S}.
Mostre que:
(a) X ⊂ Y então I ( X ) ⊃ I (Y ).
(b) I (V (S)) ⊃ S para todo subconjunto S de polinômios de C[ X0 , X1 , X2 , ..., Xn ].
(c) V ( I ( X )) ⊃ X para todo subconjunto X ⊂ Cn .
(d) X, Y ⊂ Pn I ( X ∪ Y ) = I ( X ) ∩ I (Y ).
√
2. Dado um ideal I ⊂ A definimos o radical de I, denotado por I como sendo o
conjunto :
√
I = { a ∈ A/an ∈ I para algum n > 0, n ∈ Z.}
√
Mostre que se I é um ideal de um anel A então I é um ideal de A.
3. Um ideal P ⊂ A é dito primo se sempre que ab ∈ P e a não pertence a P implica
que b ∈ P.
(a) Mostre que se f ∈ C[ X, Y ] irredutı́vel então o ideal (f) é primo.
√
(b) Mostre que se P é primo então P = P.
4. Um dos resultados centrais da Álgebra Comutativa é o Teorema dos zeros de
Hilbert:(A demonstração pode ser encontrada em [22].) Seja I ⊂ C[ X, Y ] um ideal
então temos I (V ( I ) = tI.Use o teorema dos zeros de Hilbert (também conhecido
como Nullstellensatz) para mostrar que a definição de grau de uma curva plana
afim (o caso projetivo é semelhante) é boa.
5. Seja f ∈ C[ X, Y ], f = ∑ f i ,onde cada f i é um monômio de grau i. Seja P ∈ IP2
e suponha que f ( x0 , x1 , x2 ) = 0,para toda escolha de coordenadas homogêneas
( x0 : x1 : x2 ) para P.Mostre que f i ( x0 , x1 , x2 ) = 0 , para qualque escolha de
coordenadas homogêneas para P.
6. Mostre que se f ∈ C[ X, Y ] é um polinômio homogêneo então f se escreve como
produto de polinômios de grau um.
1.4. EXERCÍCIOS
13
7. Um ideal I ⊂ C[ X0 , . . . , Xn ] é dito homogêneo se f ∈ I implica que todas as
componentes homogênes de f pertencem a I. Seja I = ( f ), f ∈ C[ X, Y, Z ] o ideal
de uma curva algébrica projetiva.Mostre que I é um ideal homogêneo.
8. Encontre a condição para que cinco hiperplanos em P5 se encontrem em umúnico
ponto.
9. Seja T : C3 −→ C3 um isomorfismo de espaços vetoriais. Como T preserva as
retas de C3 passando pela origem temos definida uma aplicação natural T : IP2 −→
IP2 ,chamada projetividade ou mudança de coordenadas em IP2 .Mostre que fixados
4 pares de pontos Pi , Ti , i = 1, 2, 3, 4 ∈ IP2 ,existe uma mudança de coordenadas T
tal que T ( Pi ) = Ti .
10. Em geral,um isomorfismo linear T : V −→ V,V espaço vetorial de dimensão n+1
induz uma mudança de coordenadas T : IPn (V ) −→ IPn (V ).Mostre que dados n+2
pares de pontos ( Pi , Ti ), Pi , Ti ∈ IPn (V ) existe uma mudança de coordenadas T tal
que T ( Pi ) = Ti .
CAPÍTULO 2
A Grassmanniana de Retas de P3
2.1 Coordenadas de Plücker
A grassmanniana de retas de P3 é o espaço que parametriza as retas de P3 da mesma
maneira que o P5 das cônicas parametriza as cônicas do plano projetivo. Ela surge
naturalmente sempre que desejamos resolver um problema enumerativo envolvendo
retas no espaço. Como exemplo considere o seguinte problema enumerativo: Sejam
dadas 4 retas em P3 em posição geral. Quantas retas de P3 interceptam as 4 retas
dadas? Este problema foi abordado por Schubert no século XIX e resolvido da seguinte
maneira. Especialize as quatro retas dadas L1 , L2 , L3 , L4 de tal maneira que o primeiro
par se encontre em um ponto P1 e o segundo par em um ponto P2 . Temos então duas
soluçoẽs: a reta M determinada por P1 , P2 e a reta N interseção do plano α determinado
por L1 , L2 e o plano β determinado por L3 , L4 .
No século XIX aplicava-se então o princı́pio da continuidade, devido a Poncelet,
que dizia que quando as retas Li fossem quaisquer o número de soluçoẽs para o
problema seria o mesmo. Ainda no século XIX este tipo de solução sofreu objeçoẽs dos
matemáticos da época. Daremos uma solução mais formal a este problema introduzindo
o espaço de parâmetros adequado: a Grassmanniana de retas.
A Grassmanianna de retas de P3 é uma generalização do espaço projetivo P3 .
Lembre-se que P3 foi construı́do da seguinte maneira: Consideramos C4 e um ponto
de P3 é uma reta de C4 passando pela origem. No caso da grassmanniana de retas os
pontos serão sub-espaços de dimensão dois.
Definição 7 A Grassmanniana de retas de P3 é o conjunto dos subespaços lineares de C4 de
dimensão dois que passam pela origem, que será notado por G(2, 4). Chamaremos os sub-espaços
lineares de C4 de dimensão dois de planos.
Segue da definição que a Grassmanniana parametriza as retas de P3 , já que uma reta
de P3 é um plano de C4 passando pela origem. Vejamos agora como trabalhar com este
conjunto.
Uma boa estratégia para estudar um conjunto é cobri-lo por subconjuntos menores
cuja estrutura conhecemos. No caso de Pn fomos capazes de escrever Pn = ∪in=0 Ui onde
cada Ui é essencialmente Cn . Faremos algo parecido com G(2, 4).
14
2.1. COORDENADAS DE PLÜCKER
15
Dado um plano Λ ⊂ C4 podemos representá-lo por dois vetores linearmente
independentes
a1 = ( a11 , a12 , a13 , a14 ), a2 = ( a21 , a22 , a23 , a24 ) que geram este plano. Ou seja, Λ pode der
representado pela seguinte matriz:
µ
¶
a11 a12 a13 a14
.
a21 a22 a23 a24
Seja
U12 = {Λ ∈ G(2, 4) tal que a11 a22 − a21 a12 6= 0}
onde Λ está representado por dois geradores como acima. Observe que dada uma
representação de um plano Λ ⊂ C4 por dois vetores a1 , a2 ∈ C4 podemos considerar
qualquer outro conjunto gerador b1 , b2 ∈ Λ e escrevê-lo numa matriz como acima e a
pertinência de Λ à U12 não depende da base escolhida. Segue que podemos escolher
geradores b1 , b2 de forma que cada elemento de U12 possui uma única representação da
seguinte forma:
µ
¶
1 0 b13 b14
0 1 b23 b24
e reciprocamente cada matriz como acima corresponde a um único plano Λ ∈ U12 .
Assim ,existe uma correspondência biunı́voca entre U12 e C4 .
Seja
Uij = {Λ ∈ G(2, 4) tal que a1i a2j − a2i a1j 6= 0},
onde i < j. Existem ao todo 6 tais Uij . Vemos então que
G(2, 4) = ∪i< j Uij ,onde cada Uij corresponde biunivocamente a C4 . Uma das vantagens
desta representação é que faz sentido falar na dimensão de G(2, 4).Como cobrimos
G(2, 4) por um número finito de Uij todos de dimensão 4 podemos dizer que sua
dimensão é 4. Melhor ainda, seremos capazes de identificar G(2, 4) com uma superfı́cie
de P5 . Para isto considere Λ ⊂ C4 dado por dois geradores:
µ
¶
a11 a12 a13 a14
a21 a22 a23 a24
Seja pij , i < j o determinante 2x2 obtido considerando as colunas i e j. Temos então o
seguinte teorema:
Teorema 2 Existe uma correspondencia biunı́voca entre os pontos de G(2, 4) e os pontos
( p12 : p13 : p14 : p23 : p24 : p34 ) ∈ P5 ,
cujas coordenadas satisfazem a equação:
P12 P34 − P13 P24 + P14 P23 = 0
Demonstração:Dado Λ ∈ G(2, 4) seja
¶
µ
a11 a12 a13 a14
,
A=
a21 a22 a23 a24
CAPÍTULO 2. A GRASSMANNIANA DE RETAS DE P3
16
uma matriz que o representa.
Considere a aplicação
Φ : G(2, 4) −→ P5
Λ 7−→ ( p12 : p13 : p14 : p23 : p24 : p34 )
dada por
onde os pij0 s são os determinantes 2x2 acima. Φ está bem definida pois como a1 =
( a11 , a12 , a13 , a14 ) e a2 = ( a21 , a22 , a23 , a24 ) são linearmente independentes algum dos
pij 6= 0. Além disto se
µ
0
A =
0
0
0
0
a12
a13
a14
a11
0
0
0
0
a22
a23
a24
a21
¶
é uma outra representação para Λ temos A0 = gA onde g é uma matriz 2x2 inversı́vel.
Denotando por Aij (resp. Aij0 ) a matriz formada pelas colunas i e j de A (resp. A’) temos:
Aij = gAij0 donde, pij = det( g) pij0 ,
onde pij = det( Aij ), pij0 = det( Aij0 ) . Como det( g) 6= 0 segue que
0
0
0
0
0
0
: p24
: p34
)
( p12 : p13 : p14 : p23 : p24 : p34 ) = ( p12
: p13
: p14
: p23
e portanto,Φ está bem definida. As coordenadas ( pij ) de Λ são chamadas de
coordenadas de Plücker.
A verificacão de que um ponto Φ(Λ) satisfaz a equação acima é fácil:
( a11 a22 − a21 a12 )
( a13 a24 − a23 a14 ) − ( a11 a23 − a21 a13 ) ( a12 a24 − a22 a14 ) +
( a11 a24 − a21 a14 ) ( a12 a23 − a22 a13 ) = 0.
Reciprocamente suponha que um ponto
P = ( p12 : p13 : p14 : p23 : p24 : p34 ) ∈ P5 ,
satisfaça a equação acima e que p12 6= 0(a demonstração nos outros casos é idêntica).
Supondo que p12 = 1 temos que
p34 = p13 p24 − p14 p23 . Segue que o ponto Λ0 ∈ G(2, 4) dado por
µ
1 0 − p23 − p24
0 1 p13
p14
¶
é tal que Φ(Λ0 ) = (1 : p13 : p14 : p23 : p24 : p34 ) como querı́amos. Além disto se
Φ(Λ1 ) = P,temos que Λ1 é dado pela mesma base acima logo Λ0 = Λ1 ,terminando a
demonstração.
2.2. SUBESPAÇOS LINEARES DA GRASSMANNIANA DE RETAS
17
2.2 Subespaços Lineares da Grassmanniana de Retas
Vimos na seção anterior que G(2, 4) pode ser vista como uma hipersuperfı́cie
quádrica Q = V (P ) ⊂ P5 onde:
P ( P12 , P13 , P14 , P23 , P24, , P34 ) = P12 P34 − P13 P24 + P14 P23 = 0.
No restante deste capı́tulo e no próximo designaremos esta quádrica por Q e sua
equação por P . Um ponto pertencente a Q será denotado por uma letra maiúscula
( P, Q, R,etc.) e a reta que ele representa em P3 pela letra minúscula correspondente:
p, q, r,etc.. Como hipersuperfı́cie de P5 , Q pode conter subespaços lineares de dimensão
menor, retas e planos por exemplo. É o que investigaremos nesta seção. Começaremos
pelas retas contidas na grassmanniana. Temos a seguinte proposição.
Proposição 2 Sejam p, q ⊂ P3 retas. A reta λ1 P + λ2 Q ⊂ P5 está contida em Q se e somente
se p e q se interceptam.
Demonstração:Sem perda de generalidade podemos supor que o ponto de interseção
das retas p e q é (1 : 0 : 0 : 0). Sejam x = ( x0 : x1 : x2 : x3 ) e y = (y0 : y1 :
y2 : y3 ) respectivamente dois outros pontos das retas p e q. Podemos representar p e q
respectivamente pelas seguintes matrizes:
¶
¶ µ
µ
1 0 0 0
1 0 0 0
0 1 q1 q2
0 1 p1 p2
para alguma escolha p1 , p2 , q1 , q2 ,donde,
Φ ( p ) = P = (1 : p1 : p2 : 0 : 0 : 0)
Φ ( q ) = Q = (1 : q1 : q2 : 0 : 0 : 0)
¾
∈Q.
A reta λ1 P + λ2 Q satisfaz a equação da quádrica para qualquer λ1 , λ2 donde Φ(λ1 P +
λ2 Q ) ⊂ Q.
Reciprocamente suponha que a reta λ1 P + λ2 Q ⊂ Q. Temos
(λ1 p12 + λ2 q12 : λ1 p13 + λ2 q13 : λ1 p14 + λ2 q14 : λ1 p23 + λ2 q23 :
λ1 p24 + λ2 q24 : λ1 p34 + λ2 q34 ) ∈ Q
para qualquer valor dos parâmetros λ1 , λ2 ,onde P = ( p12 : p13 : p14 : p23 : p24 :
p34 ), Q = (q12 : q13 : q14 : q23 : q24 : q34 ). Substituindo na equação da quad́rica temos:
λ1 2 P ( P) + λ2 2 P ( Q) + 2λ1 λ2 ( p12 q34 − p13 q24 + p14 q23 + p34 q12 − p24 q13 + p23 q14 ) = 0.
Como P ( P) = P ( Q) = 0 e λ1 , λ2 6= 0 temos
p12 q34 − p13 q24 + p14 q23 + p34 q12 − p24 q13 + p23 q14 = 0
(2.1)
18
CAPÍTULO 2. A GRASSMANNIANA DE RETAS DE P3
Sejam
a1 = ( a11 : a12 : a13 : a14 ) , a2 = ( a21 : a22 : a23 : a24 ) ∈ p
b1 = (b11 : b12 : b13 : b14 ) , b2 = (b21 : b22 : b23 : b24 ) ∈ q
Então fazendo pij = a1i a2j − a2i a1j , qij = b1i b2j − b2i b1j a relação (2.1) significa que:
¯
¯
¯
¯
¯
¯
¯
¯
a11
a21
b11
b21
a12
a22
b12
b22
a13
a23
b13
b23
a14
a24
b14
b24
¯
¯
¯
¯
¯=0
¯
¯
¯
ou seja os quatro pontos a1 , a2 ∈ p e b1 , b2 ∈ q são linearmente dependentes e portanto
as retas p e q se interceptam.
O determinante que aparece na demonstração acima desempenhará um papel
fundamental no que se segue. Seu anulamento pode ser visto como uma função das
retas p e q acima.Para isto considere seu desenvolvimento em relação às duas primeiras
linhas:
Ω pq = p12 q34 − p13 q24 + p14 q23 + p34 q12 − p24 q13 + p23 q14 = 0
(2.2)
É claro que as retas p e q se interceptam se e somente se Ω pq = 0. Ω pq é classicamente
conhecida como a derivada de P pelo proceso de polarização ou como a forma
polarizada da relação quadrática P = 0. Esta denominação vem da teoria clássica
dos invariantes.Voltaremos a tratar do assunto no capı́tulo 3.Recomendamos ao leitor
interessado ([16]).
Observe que de (2.2) vem que se o ponto (qi j) ∈ Q, Ω pq é a equação do do hiperplano
tangente à quádrica Q no ponto (qij ).
Já sabemos que se duas retas p, q ∈ P3 se interceptam então a reta λ1 φ( p) + λ2 φ(q) ⊂
Q.Será que esta reta parametriza alguma configuração de P3 ? A resposta é dada pelo
seguinte corolário:
Corolário 1 Dada uma reta L ⊂ Q, L parametriza o conjunto das retas de P3 contidas em um
plano e passando por um ponto.Esta configuração é conhecida como feixe (plano) de retas de P3 .
Demonstração:Seja λ1 P + λ2 Q a reta de Q com P = Φ( p), Q = Φ(q).Da proposição
sabemos que p e q se interceptam em um ponto p0 ∈ P3 . Sejam p1 , p2 ∈ P3 tais
que p =< p0 , p1 > e q =< p0 , p2 >.Temos então que as retas determinadas por
< p0 , p1 + λp2 > são todas as retas contidas no plano gerado por < p0 , p1 , p2 > que
passam por p0 .Por outro lado tomando p0 = (1 : 0 : 0 : 0), p1 = ( p11 : p12 : p13 : p14)
e p2 = ( p21 : p22 : p23 : p24 ), vemos facilmente qua as retas < p0 , p1 + λp2 >
correspondem aos pontos P + λQ ⊂ Q.
Passaremos agora a considerar sub-espaços lineares de Q de dimensão dois. Em
primeiro lugar faremos duas definições:
Definição 8 O conjunto de todas as retas contidas em um plano de P3 é chamado de plano
regrado.
2.2. SUBESPAÇOS LINEARES DA GRASSMANNIANA DE RETAS
19
Definição 9 O conjunto de todas as retas de P3 que passam por um mesmo ponto é chamado de
estrela.
Diremos que um subconjunto S ⊂ G(2, 4) é um espaço linear de retas se Φ(S) for um
sub-espaço linear de P5 .Já vimos que os únicos sub-espaços lineares de P3 de dimensão
1 são os feixes planos .Em dimensão dois temos:
Proposição 3 Os únicos sub-espaços lineares de P3 de dimensão dois são os planos regrados e
as estrelas.Não existem sub-espaços lineares de P3 de dimensão maior que dois.
Demonstração:Sejam P1 , P2 , ..., Pn ∈ Qpontos linearmente independentes de P5 tais que
qualquer combinação linear ∑in=1 λi Pi também representa uma reta de P3 ou seja tal que
∑in=1 λi Pi ∈ Q.Isto significa que qualquer par de retas pi , p j do conjunto p1 , p2 , ..., pn se
interceptam.Então p1 , p2 se interceptam em um ponto P ∈ P3 e estão contidas em um
plano comum α.Temos duas possibilidades para p3 :
• p3 intercepta p1 , p2 em pontos Q, R ∈ P3 distintos de P,donde p3 está contida em
α.
• p3 não está contida em α mas então intercepta p1 , p2 no ponto P.
No primeiro caso temos que :
3
Φ−1 ( ∑ λi Pi )
i =1
é o plano regrado,no segundo a estrela.Em qualquer caso não pode existir uma reta p4
linearmente independente com p1 , p2 , p3 e interceptando p1 , p2 , p3 .Segue que n=3 e a
proposição está demonstrada.
Já estamos em condições de resolver o problema enumerativo que enunciamos no
inı́cio do capı́tulo.Seja A ∈ Q, A = Φ( a) = ( a12 : a13 : a14 : a23 : a24 : a34 ) e IP( A) o
hiperplano tangente a QemA.A equação de IP( A) é dada por:
Ω a ( X12 : X13 : X14 : X23 : X24 : X34 ) =
a12 X34 − a13 X24 + a14 X23 + a34 X12 − a24 X13 + a23 X14 .
Vemos que Ω a ( X12 : X13 : X14 : X23 : X24 : X34 ) = 0 para xij ∈ Q se e somente se a reta
correspondente intercepta a.Concluimos que
IP( A) ∩ Q ←→ {retas de P3 que interceptam a tal que a = Φ( A)}.
Portanto dadas quatro retas a,b,c,d de P3 o problema enumerativo que queremos
resolver corresponde a encontrar o número de pontos do conjunto:
Q ∩ IP( A) ∩ IP( B) ∩ IP( C ) ∩ IP( D ),
20
CAPÍTULO 2. A GRASSMANNIANA DE RETAS DE P3
onde B = Φ(b), C = Φ(c), D = Φ(d).Seja M = IP( A) ∩ IP( B) ∩ IP( C ) ∩ IP( D ).Temos
duas possibilidades:Se os planos IP( A), IP( B), IP( C ), IP( D ) são linearmente dependentes
então dimM ≥ 2.Como dim(Q) = 4,segue-se dos comentários que fizemos no capı́tulo
1(antes do Teorema de Bézout) que M ∩ Q é um conjunto infinito.Se por outro lado
os hiperplanos são linearmente independentes então dim.M = 1 e temos duas outras
possibilidades:
1. M não está contido em Q e M ∩ Q é constituido por dois pontos coincidentes ou
não.
2. M ⊂ Q e temos uma infinidade de soluçẽs para o problema.
Nos exercı́cios você fará a análise das várias possibilidades para este caso.
Temos assim a solução final para o problema proposto:O número de retas de P3 que
interceptam 4 retas dadas pode ser uma reta,duas retas ou infinitas retas.
CAPÍTULO 3
Cônicas da Grassmanniana de Retas
3.1
Quádricas em P3
Antes de abordarmos o estudo das cônicas da Grassmanniana de Retas de P3 ,vamos
estudar as superfı́cies quad́ricas de P3 que serão úteis no estudo que faremos das
cônicas da Grassmanniana de retas.
No capı́tulo 1,seção 3,definimos uma Superfı́cie Quad́rica de P3 (C ),como sendo o
conjunto dos zeros de um polinômio irredutı́vel,não constante
f ∈ C[ X0 , X1 , X2 , X3 ],de grau dois.Assim uma quádrica de P3 é dada por F = V ( f ),onde
f pode ser escrita:
f ( X0 , X1 , X2 , X3 ) = a00 X02 + a01 X0 X1 + a02 X0 X2 + a03 X0 X3 +
a11 X12 + a12 X1 X2 + a13 X1 X3 + a22 X22 + a23 X2 X3 + a33 X32 ,
ou então:


a00 a01 /2 a02 /2 a03 /2
 a01 /2 a11 a12 /2 a13 /2 

f ( X ) = X T AX onde A = 
 a02 /2 a12 /2 a22 a23 /2  e
a03 /2 a13 /2 a23 /2 a33
X = ( X0 , X 1 , X 2 , X 3 ) .
Assim como uma cônica pode ser representada por um ponto de P5 vemos que,
como a equação acima possui dez coeficientes , as quádricas de P3 podem ser
parametrizadas por P9 (V ),onde V denota o espaço vetorial das das formas de grau
2 em 4 variáveis.Raciocinando de maneira semelhante ao que fizemos no capı́tulo 1
vemos então que uma quádrica de P3 fica determinada pela escolha de 9 pontos de
P3 ,em posição geral.
Considerando a forma quadrática f ( X ) = X T AX temos o seguinte resultado:
Teorema 3 Se f ( X ) = X T AX é uma forma quadrática em X0 , X1 , X2 , X3 e A é de posto
r podemos encontrar uma transformação linear não singular P e constamtes não nulas
a0 , a1 , ..., ar−1 tais que :
F ( P−1 ( X )) = a0 Y02 + a1 Y12 + ... + ar−1 Y 2 ,
21
CAPÍTULO 3. CÔNICAS DA GRASSMANNIANA DE RETAS
22
onde (Y0 , Y1 , Y2 , Y3 ) = P( X0 , X1 , X2 , X3 ).
Demonstração:(ver [14],pg. 274.) Como estamos trabalhando sobre C podemos supor
que ai = 1, i = 0, 1.., r − 1. Vejamos quais são as possibilidades possı́veis para F = V ( f ):
1. f = X02 + X12 + X22 + X32
Neste caso, a superfı́cie quádrica F = V ( f ) é conhecida como quádrica não
singular.(Veja exemplo 1.13 e figura 1.5)
2. f = X02 + X12 + X22
Neste caso, o ponto P = (0 : 0 : 0 : 1) ∈ F = V ( f ),possui a seguinte
propriedade:Dado P1 ∈ F,qualquer ponto da reta PP1 pertence a F.Uma superfı́cie
com esta propriedade é chamada um cone de vértice P.
3. f = X02 + X12
Neste caso ,f pode se fatorar como produto de duas formas lineares e F = V ( f ) é
união de dois planos distintos.
4. f = X02 e
Neste caso,F = V ( f ) pode ser pensada como um plano duplo.
Nos casos 3 e 4, F = V ( f ) não constituem uma superfı́cie conforme nossa definição.
3.2 Produto de Espaços Projetivos
Se Pn e Pm são espaços projetivos o produto cartesiano Pn × Pm não é um espaço
projetivo como seria desejável pois dados x = ( x0 : x1 : ... : xn ) ∈ Pn e y = (y0 : y1 : ... :
ym ) ∈ Pm temos (kx, y) 6= k ( x, y), k ∈ C \ {0}.Para contornar este problema definimos
o produto de espaços projetivos via a imersão de Segre, Ψ, da seguinte maneira: Seja
Ψ : Pn × Pm −→ P N ,
dada por
(( x0 : x1 : ... : xn ) , (y0 : y1 : ... : ym )) 7−→
( x0 y0 : x0 y1 : ... : x0 ym : x1 y0 : ... : xn ym )
onde N=(n+1)(m+1)-1. Ψ aplica o produto Pn xPm ,biunivocamente,sobre a superfı́cie de
P N dada pelos zeros comuns dos seguintes polinômios:
Vij Vkl − Vkj Vil , i, k = 0, 1, ..., n; j, l = 0, 1, ..., m
onde Vij , i = 0, 1, ..., n; j = 0, 1, ..., m são as coordenadas de Pn .Verificaremos as
afirmações acima no caso particular que vai nos interessar na sequência que é quando
m=n=1.A demonstração dos demais casos é semelhante.
3.2. PRODUTO DE ESPAÇOS PROJETIVOS
23
Seja então:
Ψ : P1 xP1 −→ P3
(( x0 : x1 ), (y0 : y1 )) 7−→ ( x0 y0 : x0 y1 : x1 y0 : x1 y1 )
Em primeiro lugar observe que Ψ está bem definida pois dado (kx0 : kx1 ) ∈ P1 , k 6=
0,temos:
Ψ((kx0 : kx1 ), (y0 : y1 )) = (kx0 y0 : kx0 y1 : kx1 y0 : kx1 y1 )
= k ( x0 y0 : x0 y1 : x1 y0 : x1 y1 ).
A verificação é análoga para (ky0 : ky1 ) ∈ P1 , k 6= 0.
Ψ aplica P1 xP1 biunivocamente sobre a superfı́cie de P3 (cujas coordenadas estamos
denotando por (V00 : V01 : V10 : V11 )) dada por:
V = V (V00 V11 − V01 V10 )
Com efeito,Ψ(P1 xP1 ) ⊂ V .Reciprocamnte dado v ∈ V , v = (v00 : v01 : v10 : v11 ) e
suponha v00 6= 0,por exemplo. Então se x = (v00 : v01 ) e y = (v00 : v10 ),temos:
Ψ( x, y) = (v00 v00 : v01 v00 : v00 v10 : v11 v00 ) = v00 v,
onde usamos o fato que v11 = v10 v01 .Por outro lado vemos que v ∈ V determina x ∈ P1
e y ∈ P1 tais que Ψ( x, y) = v de maneira única ou seja Ψ é injetiva e a demonstração
está concluida.
Geometricamente V ⊂ P3 é a quádrica não singular. Fixado x ∈ P1 , x = ( a0 : a1 ),o
conjunto
Ψ( xxP1 ) = ( a0 y0 : a0 y1 : a1 y0 : a1 y1 ).
Este conjunto é dado em P3 pelas equações:
a0 V00 = a1 V10 e a1 V01 = a0 V11
que é a equação de uma reta.
Por outro lado dadas duas retas retas Ψ( xxP1 ), x = ( a0 : a1 ) e Ψ( x 0 xP1 ), x 0 = ( a00 : a10 )
,suponha que elas tenham um ponto em comum:
( a0 y0 : a0 y1 : a1 y0 : a1 y1 ) = ( a00 y0 : a00 y1 : a10 y0 : a10 y1 )
.Temos então que (se a00 , a10 6= 0) :
a0 /a10 = a1 /a10 ou seja ( a0 : a1 ) = ( a00 : a10 ).
Se a00 = 0, a10 6= 0 temos a10 = ca1 , c 6= 0,o caso a10 = 0 sendo semelhante. Em qualquer
caso vemos que duas retas Ψ( xxP1 ) e Ψ( x 0 xP1 ) distintas não possuem interseção em
P3 . Analogamente,podemos considerar as retas Ψ(P1 xy), y ∈ P1 ,obtendo uma segunda
famı́lia de retas com propriedades anaálogas às da primeira.
São de fácil verificação os seguintes fatos a cerca destas duas famı́lias:
24
CAPÍTULO 3. CÔNICAS DA GRASSMANNIANA DE RETAS
1. dadas duas retas uma de cada famı́lia elas possuem um único ponto de interseção.
2. Dado um ponto v da quádrica existem duas retas contidas na quad́rica uma em
cada famı́lia tais que elas se interceptam em v.
Temos a seguinte caracterização da quádrica não singular:
Proposição 4 Sejam p0 , p1 , p2 ,três retas de P3 tais que quaisquer duas não se interceptam.
Então o lugar das retas que interceptam p0 , p1 , p2 ,simultaneamente é uma quádrica não singular.
Demonstração:Usaremos aqui,bem como no resto deste capı́tulo a notação do capı́tulo
2. Seja P0 = Φ( p0 ), P1 = Φ( p1 ), P2 = Φ( p2 ),os pontos correspondentes em Q =
Φ( G (2, 4)) e considere M = Q ∩ IP( P0 ) ∩ IP( P1 ) ∩ IP( P2 ).O conjunto S procurado é
o conjunto dos pontos P ∈ P3 tal que P ∈ Φ−1 ( M ).Sabemos que S é infinito.Sejam
l0 , l1 ∈ S e Aij = pi ∩ l j .Sem perda de generalidade podemos supor:
A00 = (1 : 0 : 0 : 0), A01 = (0 : 1 : 0 : 0), A10 = (0 : 0 : 1 : 0), A11 = (0 : 0 : 0 : 1),
escolhendo coordenadas convenientemente.(Veja exercı́cio 11,Cap.1.) Com esta escolha
de coordenadas temos:
p0 =< A00 , A01 >= ( x : y : 0 : 0) = Ψ((1 : 0)xP1 )
p1 =< A10 , A11 >= (0 : 0 : x : y) = Ψ((0 : 1)xP1 )
Ainda sem perda de generalidade podemos supor que p2 passa pelo ponto (1 : 1 : 1 : 1).
Além disto a interseção de p2 com l0 , l1 é da forma ( a0 : 0 : a1 : 0) e (0 : a00 : 0 : a10 )
respectivamente.Segue que p2 pode ser tomada como a reta ( x : y : x : y).
Seja l uma reta qualquer interceptando p0 , p1 , p2 simultaneamente.Sejam Li = l ∩
pi .Então L0 = (λ0 : µ0 : 0 : 0), L1 = (0 : 0 : λ1 : µ1 ).A condição para que a reta
l determinada por L0 , L1 intercepte a reta p2 corresponde ao anulamento do seguinte
determinante:
¯
¯
¯ λ0 µ0 0
¯
0
¯
¯
¯ 0 0 λ1 µ1 ¯
¯
¯ = λ0 λ2 µ1 µ2 − µ0 µ2 λ1 λ2 .
¯ λ2 0 λ2
0 ¯¯
¯
¯ 0 µ2 0 mu2 ¯
Concluimos que λ0 /µ0 = λ1 /µ1 . (se µ0 , µ1 6= 0.)Assim ,se l 6= li , temos que
L = xL0 + yL1 = ( xλ0 : xµ0 : yλ1 : yµ1 ) é dada por
Ψ(P1 × (λ0 : µ0 )) = ( xλ0 : xµ0 : yλ0 : yµ0 ).
Isto mostra que l ⊂ Ψ(P1 × P1 ).
Reciprocamente,dado x ∈ Ψ(P1 × P1 ) temos que ele é imagem por Ψ de (( x0 :
y) , ( x1 : y1 )).Portanto ele pertence a imagem de (P1 × ( x1 : y1 )) por Ψ que
sabemos ser uma reta que intercepta p0 , p1 , p2 ,(pelo que foi demonstrado antes da
proposição),concluindo assim a demonstração.
3.3. O RÉGULO DE P3
25
3.3 O Régulo de P3
Vimos no capı́tulo II,seção 2,que os únicos sub-espaços lineares de Q são o feixe em
dimensão 1 e o plano regrado e a estrela em dimensão dois.Dadas retas p1 , p2 , ..., pm ⊂
P3 e P1 = Φ( p1 ), P2 = Φ( p2 ), ..., Pm = Φ( pm ) ∈ Q,vimos que as configurações acima
correspondem a pontos P ∈ Q tais que P = λ1 P1 + λ2 P2 + λ3 P3 , onde quaisquer
pares de retas pi , p j se intercepta.Se considerarmos retas p1 , p2 , ..., pm ⊂ P3 que não
se interceptam sabemos que o sub-espaço linear de P5 gerado por :
P=
∑ λi Pi , não está contido emQ.
Vamos no entanto considerá-los agora e nos fazer a seguinte pergunta:Para quais
valores dos parâmetros λi , P ∈ Q?
Se m = 2 e considerarmos P = λ1 P1 + λ2 P2 ,com p1 , p2 ,retas reversas contidas em P3
temos:
Ω pp = λ21 Ω p1 p1 + 2λ1 λ2 Ω p1 p2 + λ22 Ω p2 p2 = 0
Como P1 , P2 ∈ Q,temos que Ω p1 p1 = 0, Ω p2 p2 = 0,donde λ1 λ2 = 0,pois estamos
supondo Ω p1 p2 6= 0.Segue que λ1 = 0 ou λ2 = 0.
Consideremos o caso m = 3,que é mais interessante.Seja
P = λ1 P1 + λ2 P2 + λ3 P3 ,
(3.1)
onde vamos supor que qualquer par de retas pi , p j possui interseção vazia.Temos então:
Ω pp = λ21 Ω p1 p1 + 2λ1 λ2 Ω p1 p2 + λ22 Ω p2 p2 + 2λ1 λ3 Ω p1 p3 + 2λ2 λ3 Ω p2 p3 λ23 Ω p3 p3 =
= 2(λ1 λ2 Ω p1 p2 + λ1 λ3 Ω p1 p3 + λ2 λ3 Ω p2 p3 ) = 0.
Como Ω pi p j 6= 0,temos que o lugar dos pontos P ∈ Q tais que Ω pp = 0 é a cônica
contida na interseção do plano de P5 dado por P = λ1 P1 + λ2 P2 + λ3 P3 com Q e cuja
equação é :
= λ1 λ2 Ω p1 p2 + λ1 λ3 Ω p1 p3 + λ2 λ3 Ω p2 p3 = 0.
Em geral,sejam p1 , p2 , ..., pm ⊂ P3 retas distintas tais que pelo menos duas não se
interceptam.Sejam Pi = Φ( pi ) e considere P = ∑ λi Pi .
Definição 10 Nas condições acima o conjunto Φ−1 ( P) ⊂ P3 dos pontos P ∈ Q é denominado
o régulo associado às retas p1 , p2 , ..., pm
O régulo é dado pela imagem inversa dos pontos pontos p que satisfazem a equação
(3.1) tais que Ω pp = 0.No caso m=3 vimos que o régulo corresponde a pontos p ∈ Q que
estão sobre uma cônica contida em Q. Ainda neste caso podemos nos fazer a seguinte
pergunta:O régulo é alguma superfı́cie conhecida de P3 ? A resposta é afirmativa e é
dada pela seguinte proposição:
CAPÍTULO 3. CÔNICAS DA GRASSMANNIANA DE RETAS
26
Proposição 5 Sejam p1 , p2 , p3 ⊂ P3 retas duas a duas reversas e P = ∑3i=1 λi Pi tal que
R = Φ−1 ( P) é o regulo determinado por p1 , p2 , p3 .Seja C a quádrica não singular lugar das
retas l que se apoiam em p1 , p2 , p3 simultâneamente.Então r ∈ R e somente se r ∩ l 6= ∅ para
toda l que intercepta p1 , p2 , p3 simultâneamente.
Demonstração: Seja l ⊂ P3 uma reta que intercepta p1 , p2 , p3 simultâneamente. Sejam
L = Φ(l ) e r ∈ Φ−1 ( P),ou seja tal que R = Φ(r ) = ∑3i=1 λi Pi .Temos que:
3
Ωlr = Ω( L, ∑ λi Pi ) =
i =1
3
∑ λi Ω( L, Pi ) = 0,
i =1
pois l intercepta pi para todo i.Segue que r ∩ l 6= ∅,para toda reta l nestas condições.
Reciprocamente,seja r ⊂ P3 ,reta tal que r ∩ l 6= ∅para toda l que intercepta
p1 , p2 , p3 simultâneamente.Vamos mostrar que existem λ1 , λ2 , λ3 tais que Φ(r ) = R =
∑3i=1 λi Pi .Como na proposição 4 da seção 2 ,podemos supor sem perda de generalidade
que que:
P1 = Ψ((1 : 0) × P1 ) = ( x : y : 0 : 0),
P2 = Ψ((0 : 1) × P1 ) = (0 : 0 : x : y),
P3 = Ψ((1 : 1) × P1 ) = ( x : y : x : y).
Calculando Pi = Φ( pi ) obtemos:
P1 = (1 : 0 : 0 : 0 : 0 : 0), P2 = (0 : 0 : 0 : 0 : 0 : 1), P3 = (1 : 0 : 1 : −1 : 0 : 1).
Foi demonstrado na Proposição 4,seção 2,que as retas l que interceptam p1 , p2 , p3
simultâneamente são da forma Ψ(P1 × (λ0 : µ0 )) para alguma escolha de (λ0 : µ0 ) ∈
P1 .Portanto uma reta que intercepta todas as retas l é da forma Ψ(( a : b) × P1 ).Seja
r = Ψ(( a : b) × P1 ) = ( ax : ay : bx : by) e R = Φ(r ) = ( a2 : 0 : ab : − ab : 0 : b2 ).Para
encontrar λ1 , λ2 , λ3 tais que ∑3i=1 λi Pi = ( a2 : 0 : ab : − ab : 0 : b2 ).,temos que resolver as
equações:
λ3 = ab, λ1 + λ3 = a2 , λ2 + λ3 = b2 .
Concluimos que :
λ1 = a( a − b), λ2 = b( a − b), λ3 = a.b,
encontrando portanto um elemento bem definido sempre que ab 6= 0,concluindo a
demonstração.
Corolário 2 A quádrica não singular possui dois sistemas de retas que podem ser caracterizados
da seguinte maneira: Fixadas três retas p1 , p2 , p3 ,duas a duas reversas contidas na quádrica,um
sistema de retas é formado pelas retas que interceptam p1 , p2 , p3 simultâneamente e o outro pelo
régulo associado a p1 , p2 , p3 .
CAPÍTULO 4
Métodos degenerativos em geometria
enumerativa
4.1
A evolução da geometria enumerativa na década dos
anos 90 do século XX
Uma verdadeira revolução tomou conta da geometria enumerativa a partir do
trabalho [13] do matemático russo Kontsevich de 1994. Talvez a maior contribuição
deste trabalho seja o uso sistemático dos espaços moduli de mapas estáveis na
geometria enumerativa. A partir daı́ Harris e Caporaso em 3 trabalhos seminais
[4], [5], [6] introduziram algumas idéias novas e poderosas. Eles trabalharam com a
geometria enumerativa de curvas em superfı́cies e não utilizaram os mapas estáveis
como Kontsevich e sim o esquema de Hilbert, mas tiraram lições importantes do
seu trabalho. Talvez a mais importante técnica introduzida por eles e largamente
utilizada foi a idéia de que famı́lias a 1-parâmetro podem ser utilizadas para entender
geometria enumerativa de tal forma que apenas degenerações em ”codimensão 1”
precisam ser estudadas. No final da década de 90 do século XX o matemático
Vakil, aluno de Harris, utiliza estas técnicas para estudar a geometria enumerativa de
curvas no espaço([19],[18]). A sofisticação destes métodos é grande e os pré-requisitos
necessários para entendê-los em profundidade é considerável. Mas, na verdade, as
idéias geométricas são surpreendentemente simples e podem ser entendidas por alunos
que estão apenas se iniciando no assunto. É este o objetivo deste capı́tulo. Introduzir o
aluno à esta bela e interessante geometria a partir de exemplos simples mas que já dão
uma boa idéia da força do método.
Considere inicialmente, o problema, que consideramos no inı́cio do capı́tulo II, de
encontrar o número retas que interceptam 4 retas em posição geral, um problema muito
simples. Vamos resolvê-lo agora segundo a técnica da teoria de deformação. Para isto
fixe um plano H ⊂ IP3 e considere as 4 retas L1 , L2 , L3 , L4 . Especialize cada uma das retas
ao plano H. Ao especializar L1 , nada acontece. Ao especializar L2 , vemos uma solução
do problema: As retas L3 e L4 que não especializamos encontram o plano H em dois
pontos P1 e P2 , que determinam uma reta `1 interceptando as 4 retas dadas. Há ainda as
soluções passando pelo ponto P de interseção das retas dadas. Especializando a reta L3
27
28 CAPÍTULO 4. MÉTODOS DEGENERATIVOS EM GEOMETRIA ENUMERATIVA
ao plano H, vemos a solução `2 . É a reta determinada por P e por P2 .
Esta maneira de resolver o problema deve ser pensada dinamicamente. Imagine as
4 retas dadas no espaço e o número finito de soluções no caso `1 , `2 . Ao especializarmos
as retas ao plano H, as soluções se movem, muitas vezes para o plano H e aı́ é mais
fácil contá-las. Em problemas mais complicados em que estamos considerando curvas
de grau maior que 1, ao especializarmos os dados ao plano as soluções se degeneram
o que pode parecer uma desvantagem, mas é uma vantagem, pois é precisamente este
fato que nos permite contar as soluções. É o que veremos na próxima seção.
4.2 Cônicas interceptando 8 retas no espaço
Considere a famı́lia de cônicas no espaço. Queremos calcular o número de cônicas
que interceptam 8 retas L1 , L2 , . . . , L8 em posição geral. Observe que é fácil ver que o
número é finito. Toda cônica está em um plano e os planos de IP3 são parametrizados
ˇ 3 . Além disto, já vimos no Capı́tulo I que as cônicas do plano são
pelo espaço IP
parametrizadas pelo IP5 das cônicas. Portanto as cônicas no espaço são parametrizadas
ˇ 3 . A condição de interceptar uma reta impõe uma condição e
pelo produto IP5 × IP
portanto se exigirmos que as cônicas interceptem 8 retas, a dimensão do espaço de
parâmetros, temos um número finito de soluções.
Passemos ao cálculo deste número finito. Fixamos primeiramente um plano H ⊂ IP3 ,
como anteriormente e especializamos as 8 retas Li uma a uma ao plano H. Quando
especializamos a reta L1 nada acontece, ao especializarmos L2 temos dois tipos possı́veis
de solução:
1. as soluções que passam pelo ponto P = L1 ∩ L2 .
2. as soluções que interceptam L1 e L2 em pontos distintos.
Vamos contar os dois tipos de solução. Em ambos os casos especializamos a reta L3
ao plano H e observamos o que acontece.
1)Queremos contar as cônicas no espaço que passam por P e por L3 . Para isto,
especializamos L4 ao plano H e temos 3 possibilidades.
1a) Cônicas que se quebram na união de duas retas. Ao especializarmos 4 das 8 retas
ao plano, 4 permanecem em posição geral no espaço. Sabemos que existem 2 retas `1 , `2
interceptando as retas L5 , L6 , L7 , L8 . Sejam P1 = `1 ∩ H e P2 = `2 ∩ H. Temos 2 soluções
a cônica C1 = `1 ∪ PP1 e a cônica C2 = `2 ∪ PP2 .
Além disto, considere uma das retas L5 , por exemplo, que intercepta H no ponto P5 .
Considere a reta L50 = PP5 . Temos aı́ mais 2 soluções: as cônicas formadas pela união
da reta L50 com uma das duas retas que interceptam L50 , L6 , L7 , L8 . Mas como escolhemos
a reta L5 poderı́amos ter escolhido qualquer uma das retas L5 , L6 , L7 , L8 totalizando 8
soluções. Adicionadas as duas iniciais temos um total de 10 soluções para o caso 1a).
4.3. MULTIPLICIDADE DAS SOLUÇÕES
29
1b) Cônicas irredutı́veis no plano. As 4 retas ainda não especializadas interceptam
o plano H em 4 pontos P5 , P6 , P7 , P8 . Temos, como única solução neste caso, a cônica
determinada por P, P5 , P6 , P7 , P8 .
1c) Cônicas irredutı́veis no espaço passando por 2 dos pontos de interseção das 4 retas
tomadas aos pares, P1 = Li ∩ L j , i, j =, 1, . . . , 4 e P2 = Lk ∩ Ll , k, l = 1, . . . , 4, {i, j} ∩
{k, l } = ∅. Para contar as soluções especializamos a reta L5 ao plano. Novamente
temos as soluções irredutı́veis e as soluções que são união de duas retas. Claramente a
solução irredutı́vel é a única cônica determinda pelos pontos P1 , P2 e P6 = L6 ∩ H, P7 =
L7 ∩ H, P8 = L8 ∩ H. No caso redutı́vel temos 2 soluções dadas pelas cônicas formadas
pela união da reta P1 P2 com uma das duas retas que intercepta L6 , L7 , L8 , P1 P2 .
2)Para contar as cônicas que interceptam L1 , L2 em pontos distintos especialize L3 ao
plano e conte como no caso 1) as soluções redutı́veis e irredutı́veis.
2a) cônicas irredutı́veis. Claramente existe uma única solução determinada pelos cinco
pontos Pi = Li ∩ H, i = 4, . . . , 8.
2b) Cônicas que se cindem na união de duas retas. Tome 4 das retas genéricas por
exemplo L5 , L6 , L7 , L8 . Existem duas retas `1 , `2 que interceptam as 4 retas. Seja P =
L4 ∩ H e Pi = `i ∩ H, i = 1, 2. Temos as soluções C1 = `1 ∪ PP1 e C2 = `2 ∪ PP2
Considerando todas as escolhas possı́veis neste tipo de solução temos (54) × 2 = 10
soluções.
Poderemos também considerar os pontos P1 = L4 ∩ H e P2 = L5 ∩ H e as retas `1 , `2
que interceptam P1 P2 , L6 , L7 , L8 simultâneamente. As soluções serão C1 = `1 ∪ P1 P2 e
C2 = `2 ∪ P1 P2 . Considerando todas as escolhas possı́veis temos (53) × 2 = 20 Total para
o caso 2b): 10+20=30.
4.3
Multiplicidade das soluções
Na seção anterior, onde fomos capazes de calcular todos os casos que apareceram,
pode ficar parecendo que resolvemos o problema de encontrar o número de cônicas no
espaço que interceptam 8 retas dadas. Mas falta considerar uma questão importante, a
questão das multiplicidades das soluções. Para entender do que se trata consideremos
novamente o problema de calcular o número de retas que interceptam 4 retas no
espaço. No inı́cio do capı́tulo resolvemos o problema especializando as quatro retas
paulatinamente a um plano fixo H. Como dissemos naquela oportunidade devemos
pensar dinamicamente: as soluções que contamos provêm de soluções do problema
original e o seu número portanto é o mesmo. Para que isto seja válido no entanto
é preciso que saibamos que não há colapsamento de soluções. Com efeito, podemos
imaginar, que duas das soluções originais colapsaram a uma das soluções que contamos
no plano H, ou seja, esta solução seria múltipla. Neste caso o número que contamos não
seria o número desejado.É isto que se entende como problema da multiplicidade das
soluções.
30 CAPÍTULO 4. MÉTODOS DEGENERATIVOS EM GEOMETRIA ENUMERATIVA
Considere, por exemplo, o caso 2a) da seção anterior. Temos inicialmente cônicas
passando pelas retas L1 , L2 do plano. Baixamos a reta L3 ao plano e vimos que há uma
única cônica C ⊂ H interceptando as retas restantes. Vejamos que esta cônica deve ser
contada com multipliciade 8. Consideremos a interseção de C com as retas L1 , L2 , L3 :
C ∩ Li = Pi , Pi0 , i = 1, 2, 3. Se considerarmos apenas os pontos P1 , P10 vemos que há duas
configurações no espaço com este limite. Para ver isto considere a cônica no espaço com
os dois pontos P1 , P10 marcados e a reta L1 interceptando a cônica em P1 . Imagine agora
a configuração baixando ao plano, de tal forma que quando a reta e cônica estiverem no
plano a outra interseção da reta com a cônica seja P10 . Claramente, se L1 interceptasse a
cônica no espaço em P10 o limite seria o mesmo daı́ a multiplicidade de 2. Como são 3
retas temos uma multiplicidade total de oito para este caso.
Da mesmo forma, no caso 1b) temos uma multiplicidade de 4, pois ao baixar a
reta L4 ao plano H as interseções com as retas L3 , L4 em número de 4 determinam
esta multiplicidade. Finalmente no caso 1c) ao especializarmos a reta L5 , a solução
irredutı́vel aparece com multiplicidade 2.
Assim, começando na linha inferior da figura abaixo podemos contar todas as
soluções e obtemos o total 92.
4.4 Cúbicas racionais de IP3 interceptando 12 retas
Considere a famı́lia de cúbicas no espaço. Queremos calcular o número de elementos
da famı́lia que intercepta 12 retas L1 , L2 , . . . , L12 em posição geral. Vejamos inicialmente
que este número é finito. Para isto observe que uma cúbica racional de IP3 é um mapa
da forma Φ : IP1 −→ P3 , onde Φ(u, v) = ( f 0 (u, v) : f 1 (u, v) : f 2 (u, v) : f 3 (u, v)),
onde cada f i (u, v) é um polinômio homogêneo de grau 3, que depende portanto de 4
parâmetros. O mapa depende portanto de 4 × 4 = 16 parâmetros. Mas se aplicarmos
um automorfismo de IP1 temos a mesma curva. Daı́ a dimensão projetiva do espaço de
parâmetros das cúbicas reversas 16-3-1=12.
Passemos ao cálculo deste número finito. Como anteriormente, fixamos um plano
H ⊂ IP3 e especializamos, uma a uma, as 12 retas Li ao plano H. Os primeiros passos
são idênticos ao caso das cônicas. Ao especializarmos a reta L1 nada acontece. Quando
especializamos a reta L2 temos as cúbicas passando pelo ponto P de interseção das duas
retas e as cúbicas que interceptam as duas retas em dois pontos distintos.Vamos tratar
estes dois casos separadamente.
1. Cúbicas que interceptam as retas L1 , L2 em dois pontos distintos. Para contá-las
baixamos a reta L3 ao plano H e temos duas possibilidades:1a) as cúbicas que
se quebram na união de uma cônica e uma reta e 1b) as cúbicas irredutı́veis que
interceptam L1 , L2 , L3 em 3 pontos distintos.
caso 1a): Temos 9 retas arbitrárias L4 , . . . , L12 . Duas delas L4 , L5 , por exemplo,
interceptam o plano H em 2 pontos e determinam uma reta `. Temos portanto
8 retas `, L6 , L7 , . . . , L12 e, pelas seções anteriores, sabemos que existem 92 cônicas
por elas. Temos portanto (92) × 92 soluções redutı́veis. Além disto, temos também
4.4. CÚBICAS RACIONAIS DE IP3 INTERCEPTANDO 12 RETAS
31
as soluções determinadas pelas cônicas passando por 8 retas, por exemplo,
L5 , . . . , L12 , em número de 92. Fixe uma destas cônicas e suponha que ela corte o
plano H em dois pontos P1 , P2 . Seja P4 o ponto determinado pela reta L4 no plano
H. Temos assim uma outra configuração redutı́vel determinada pela cônica fixada
e a reta P4 P1 ou P4 P2 . O número destas possibiliades é: 9 × 92 × 2 = 1656. Total
para o caso 1a): 1656+3312=4968.
caso 1b):Para contar as cúbicas irredutı́veis que interceptam as retas L1 , L2 , L3 em
3 pontos distintos baixamos a reta L4 ao plano H e examinamos as possibilidades.
São elas:
i)a cúbica se quebra em uma cônica irredutı́vel no plano e uma reta. Temos 8
retas arbitrárias. Por quatro delas passam 2 retas.Uma delas mais as outras 4
retas determinam 5 pontos no plano e portanto uma cônica. Número de tais
possibilidades:(84) × 2 = 140. Por outro lado, temos também a possibilidade que
cinco retas das oito, por exemplo L5 , . . . , L9 determinam 5 pontos em H e portanto
uma cônica C1 . O lugar das retas que se apoiam nas outras 3 retas é uma quádrica
Q de IP3 conforme vimos na Proposição [?] do capı́tulo III. Seja C2 = Q ∩ H a
cônica de interseção que intercepta C1 em 4 pontos e temos portanto 4 retas por
L10 , L11 , L12 e cada um dos 4 pontos. Temos um total de soluções (83) × 4 = 224.
Total para o caso 1bi)140+224=364. Observe que estas soluções aparecem com uma
multiplicidade de 16 = 24 .
ii)a cúbica se quebra como união de 3 retas. As oito retas arbitrárias se dividem
em dois grupos de 4. Cada um dos dois grupos de retas possui 2 retas que os
intercepta. Estas retas, por sua vez, interceptam o plano em pares de pontos que
determinam uma reta no plano H, determinando configurações de 3 retas:duas
se apoiando nos 2 grupos de 4 retas e uma contida no plano H. Temos (84) × 4 =
280/2 = 140. Temos também a possibilidade de duas das retas interceptando o
plano determinarem uma reta t em H. As outras 6 se dividem em dois grupos
de 3 retas que juntamente com a reta t fornecem uma solução para o problema.
Número de soluções: (8 × 7 × (63) × 4)/2 = 2240. Total:2240+140=2380. A divisão
por dois é devida a simetria da configuração.
iii)a cúbica se quebra na união de uma reta no plano H e uma cônica fora do plano.
Deixamos como exercı́cio o cálculo das 2808 possibilidades para este caso.
Há ainda duas outras possibilidades que não podem ser tratadas com o método
elementar que estamos utilizando.Vamos abordá-las na próxima seção.
2. cúbicas que interceptam L1 , L2 no ponto P de interseção das 2 retas. Para contá-las
baixamos as retas L3 , L4 para o plano H e temos 3 possibilidades. As 7632 cúbicas
irredutv́eis que que passam pelo ponto P e interceptam as outras duas retas em
pontos distintos; as 1312 cúbicas irredutı́veis que interceptam as duas primeiras
retas no ponto P e as duas outras no ponto Q de interseção delas; e as 920 cúbicas
32 CAPÍTULO 4. MÉTODOS DEGENERATIVOS EM GEOMETRIA ENUMERATIVA
que se quebram na união de uma reta contida em H passando pelo ponto P e uma
cônica fora do plano H. Deixamos a cargo do leitor a verificação dos números
acima.
4.5 Algumas questões pendentes; perspectivas
No caso 1b) da seção anterior, dissemos que deixamos de tratar dois casos,
que precisam ser abordados, caso desejemos completar o cálculo proposto. Estes
dois casos, no entanto, não podem ser abordados com os métodos elementares que
empregamos nos demais cálculos. Vamos tratar brevemente deles dando uma idéia
da sua dificuldade como uma motivação para estudos posteriores mais sofisticados.
Ambos surgem quando estamos calculando o número de cúbicas que interceptam
3 retas L1 , L2 , L3 ⊂ H em pontos distintos. Para calcular este número baixamos a reta
L4 e estudamos as várias possibilidades. Uma delas, que não abordamos ainda, é a
possibilidade de termos cúbicas planas singulares pelos 8 pontos de interseção das 8
retas arbitrárias com o plano H. Este número é conhecido classicamente e foi recalculado
utilizando vários métodos mais recentes. Recomendamos ao leitor interessado o
interessante artigo [3] aonde o assunto é exaustivamente discutido. Aqui diremos
apenas que existem 12 tais cúbicas que aparecem com multiplicidade 81, por razões
que já abordamos.
O segundo caso é a possibilidade de termos a cúbica se decompondo como uma
cônica fora do plano H e uma reta em H com a reta tangente a cônica. Temos 2552
soluções neste caso que aparecem com multipliciade 2. Isto completa o nosso cálculo e
temos o total de 80160 cúbicas por 12 retas no espaço em posição geral (veja a figura).
As referências para entender as afirmações feitas no último parágrafo são [19], [18],
onde todas as contas feitas de maneira eurı́stica neste capı́tulo recebem um tratamento
formal via o chamado moduli stack de mapas estáveis para IPn de grau d. Embora o
formalismo necessário contenha um grau de sofisticação considerável, o método passa
pela geometria que desenvolvemos aqui. Um hiperplano H ⊂ IPn é fixado e subespaços
lineares de IPn degeneram para este hiperplano H fixado e o que é feito é acompanhar a
degeneração correspondente dos mapas para IPn .
Estas 3 referências podem ser tomadas como uma introdução às técnicas da
geometria enumerativa atual.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[2] Ehresmann,C. : Sur la Topologie de Certains espaces Homogènes,Ann. Math..35,(1934).
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Proceedings of the second European congress of mathematicians, Budapest, 1996.
[4] Caporaso, L.; Harris, J. : Counting Plane Curves of any genus, Invent. Math. 131, no.
2,(1998) 345-392.
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Compositio Math. 113, no. 2,(1998) 209-236.
[6] Caporaso, L.; Harris, J. : Parameter spaces for curves on surfaces and enumeration of
rational curves, Compositio Math. 113, no. 2,(1998)155-208.
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[8] Griffiths, P. e Harris, J. : Principles of Algebraic Geometry, John Wiley & Sons , New
York, (1978).
[9] Hartshorne, R.: Algebraic Geometry, Springer-Verlag, New York, (1977).
[10] Kleiman, S. L. :Problem 15.Rigorous Foundation of Schubert Enumerative Calculus,
Mathematical Developments arising from Hilbert Problems, Proc. Sympos. in Pure
Math. 28, AMS, (1976), 445-482
[11] Kleiman, S. L. : Chasles’s Enumerative Theory of Conics : A Historical Introduction, M.
A. A. Studies in Mathematics 20, 117, (1980).
[12] Kleiman , S.L. e Laksov, D.: Schubert Calculus, Am. Math. Monthly 79, 1972,
pg.1061-1082.
[13] Kontsevich, M. e Manin, Y. : Gromov-Witten classes, quantum cohomolgy and
enumerative geometry, Comm. Math. Phys., 164, 1994, pg.525-562.
[14] Lang, S. : Linear Algebra, Addison-Wesley, Reading-Mass.,(1971).
[15] Semple, J.G. e Roth, L. : Algebraic Geometry, Clarendon Press, Oxford, (1949).
33
34
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[16] Semple, J.G., e Kneebone, G.T.: Algebraic Projective Geometry, Clarendon Press,
Oxford, 1952.
[17] Spindola, P., Quezada R., Tapia-Recillas, H.: Cônicas Proyectivas, Notas para 3o
Colóquio do Dep. de Matemáticas do I.P.N., México, (1983).
[18] Vakil, R. : The enumerative geometry of curves via degeneration methods, Tese de
doutoramento, Harvard University, Cambridge, 1997.
[19] Vakil, R. : The enumerative geometry of rational and elliptic curves in projective space J.
Reine angew. Math. 529(2000), 101-153.
[20] Vainsencher, I. : Cônicas Projetivas, Notas para a 5a Escola de Álgebra , IMPA, (1978).
[21] Vainsencher, I. : Introdução às Curvas Algébricas Planas, Notas para o 12o Colóquio
Brasileiro de Matemática, Poços de Caldas , (1979) .
[22] Zariski,O. e Samuel,P. : Commutative Algebra,Vol.II, Springer-Verlag,(1960).
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