Cláudia Araujo dos Santos A AUTONOMIA DA ESCOLA: A VISÃO DOS GOVERNOS E DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito final para a obtenção do Grau de Mestre em Educação. Orientador: Prof. Dr. Nicholas Davies Niterói 2005 {PAGE } A AUTONOMIA DA ESCOLA: A VISÃO DOS GOVERNOS E DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO Cláudia Araujo dos Santos Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense - UFF, como requisito final para a obtenção do grau de Mestre em Educação. Campo de Confluência: Movimentos Sociais e Políticas Públicas Aprovada em _________ de 2005 BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________ Professor Doutor Nicholas Davies (Orientador) Universidade Federal Fluminense ______________________________________________________ Professora Doutora Márcia Soares de Alvarenga FFP - Universidade do Estado do Rio de Janeiro ______________________________________________________ Professora Doutora Estela Scheinvar FFP - Universidade do Estado do Rio de Janeiro ______________________________________________________ Professora Doutora Eveline Bertino Algebaile FFP - Universidade do Estado do Rio de Janeiro Niterói 2005 {PAGE } Aos meus pais José Julio e Deborah e ao meu marido Robson. {PAGE } Agradecimentos Ao Professor e orientador Nicholas Davies, pela atenção, presença e incentivo. Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF. Aos profissionais entrevistados, pela disponibilidade em participar do estudo. Aos meus pais, que tanto se sacrificaram para tornar este momento possível. Ao meu marido, Robson, pelo apoio, incentivo, paciência, atenção e carinho dedicados durante a elaboração deste e de tantos outros estudos. A FAPERJ pelo financiamento da pesquisa através do Programa Bolsa nota 10. {PAGE } Resumo O objetivo inicial da dissertação consistiu em identificar a(s) concepção(ões) de autonomia presente nas políticas públicas que interferem direta ou indiretamente na gestão das unidades escolares, bem como apreender a(s) concepção(ões) de autonomia da escola para os profissionais que atuam no seu dia-a-dia. Nesse sentido, a pesquisa foi realizada em duas etapas. A primeira se deu através da análise de legislação, de documentos oficiais e de bibliografia pertinente com destaque para a realidade do Município e do Estado do Rio de Janeiro. Argumentamos que embora a maioria das políticas estudadas, ainda que de forma superficial, declarem almejar a autonomia, poucas são as que expõem a concepção de autonomia das unidades escolares de forma clara e, principalmente, a forma pela qual as escolas alcançariam essa autonomia. Na segunda etapa do estudo, realizamos entrevistas com professores, dirigentes escolares e uma funcionária tecnico-administrativa pertencentes a diferentes escolas do Município e/ou do Estado do Rio de Janeiro. Nos relatos, alguns professores afirmaram desconhecer as políticas educacionais o que pode indicar que a gestão democrática não tem sido uma realidade. Argumentamos, nas considerações finais, que a autonomia das unidades escolares está diretamente relacionada ao grau de aprofundamento da experiência democrática em cada escola e que, portanto, uma escola efetivamente autônoma seria aquela em que sua gestão baseia-se na ativa participação de seus membros que, enquanto grupo organizado, interagem conscientemente com as questões locais, conjunturais e estruturais da sociedade. Nessa perspectiva, seus membros devem ter consciência do papel que a escola representa e/ou deve representar tanto para seu público alvo, quanto para a transformação ou perpetuação das estruturas sociais e ter consciência desse papel implica, dentre outros fatores, ter ciência das políticas que regulam o funcionamento das escolas. {PAGE } Summary The first objective of the dissertation consisted of identifying the concept of autonomy in the public politics that attain direct or indirectly in the administration of the school units, as well as to apprehend the concept of school’s autonomy for the professionals that act in your day by day. In this sense, the research was accomplished in two stages. The first felt through the legislation analysis, of official documents and of pertinent bibliography with prominence for the reality of the Municipal district and of the State of Rio de Janeiro. We argued that although most of the studied politics, although in a superficial way, announce to long for the autonomy, little are the ones that expose the conception of autonomy of the school units in a clear way and, mainly, the form for which the schools would reach that autonomy. In the second stage of the study, we accomplished interviews with teachers, school leaders and a technician-administrative employee belonging to different schools of the Municipal district and the State of Rio de Janeiro. In the reports, some teachers affirmed to ignore the educational politics what it can indicate that the democratic administration has not been a reality. We argued, in the final considerations, that the autonomy of the school units is directly related to the degree of deep of the democratic experience in each school and that, therefore, a school indeed autonomous it would be that in that your administration bases on the active participation of your members that, while a organized group, they interact consciously with the subjects local, of the situation and the society structure. In this perspective, your members should be aware of the paper that the school represents and it should represent so much for your destined public, as for the transformation or perpetuity of the social structures and to have conscience of that paper implicates, among other factors, to have science of the politics that regulate the schools operation. {PAGE } Lista de siglas AAE ABESC ADIn AEC AELAC ANC ANDE ANDES-SN ANFOPE ANPAE ANPEd ARENA BIRD BMG CA CBCE CEC CEDES CEFAM CEPEC CES CF CGT CIEP CNAS CNBB CNTE CNTEE CONAM CONARCFE CONED CONSED CONTAG CONTEE CPB CRE CRUB CUT DNTE-CUT DOU EC ECA EDURURAL EEx EM Associação de Apoio a Escola Associação Brasileira de Escolas Ação Direta de Inconstitucionalidade Associação de Educação Católica Associação de Educadores da América Latina e do Caribe Assembléia Nacional Constituinte Associação Nacional de Educação Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação Associação Nacional de Política e Administração da Educação Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação Aliança Renovadora Nacional Bando Inter-Americano de Desenvolvimento Banco Mercantil do Brasil Classe de Alfabetização Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Conselho Escola Comunidade Centro de Estudos de Educação e Sociedade Centro de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério Centro Polivalente de Educação e Cultura Centro de Estudos Sociais Constituição Federal Central Geral dos Trabalhadores Centro Integrado de Educação Pública Conselho Nacional de Assistência Social Conselho Nacional dos Bispos do Brasil Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino Confederação Nacional das Associações de Moradores Comissão Nacional pela Formação dos Educadores Congresso Nacional de Educação Conselho Nacional de Secretários de Educação Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino Confederação de Professores do Brasil Coordenadoria Regional de Educação Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras Central Única dos Trabalhadores Departamento Nacional dos Trabalhadores da Educação da Central Única dos Trabalhadores; Diário Oficial da União Emenda Constitucional Estatuto da Criança e do Adolescente Programa de Expansão e Melhoria da Educação no Meio Rural do Nordeste Entidade Executora Exposição de Motivos / Entidade Mantenedora {PAGE } FASUBRA FBAPEF FENAJ FENASE FENOE FMI FNDE FUNDEF Federação dos Sindicatos de Trabalhadores das Universidades Brasileiras Federação Brasileira de Associações de Professores de Educação Física Federação Nacional dos Jornalistas Fundação Evangélica de Assistência Social El-Shadai Federação Nacional dos Orientadores de Ensino Fundo Monetário Internacional Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério FUNDEPAR Instituto de Desenvolvimento Educacional do Paraná INEP Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos LDB Lei de Diretrizes e Bases MDB Movimento Democrático Brasileiro MEC Ministério da Educação OAB Organização dos Advogados do Brasil ONG Organização Não-Governamental PDDE Programa Dinheiro Direto na Escola PDT Partido Democrático Trabalhista PEC Projeto de Emenda Constitucional PEJE Programa de Educação Juvenil PL Projeto de Lei PLC Projeto de Lei da Câmara PLS Projeto de Lei do Senado PMDE Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro PNE Plano Nacional de Educação PNTE Programa Nacional de Transporte Escolar PPP Projeto Político Pedagógico PRODASEC Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais para as Populações Carentes Urbanas. PROFIC Programa de Formação Integral da Criança Promunicípio Projeto de Coordenação e Assistência Técnica ao Ensino Municipal PRONASEC Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais para o Meio Rural PSC Partido Social Cristão PSDB Partido da Social Democracia Brasileira SBF Sociedade Brasileira de Física SBPC Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SDP Sistema Descentralizado de Pagamentos SEAF Sociedade de Estudos e atividades Filosóficas SEPE Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro SINASEFE Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Federal de 1°, 2º e 3º graus da Educação Tecnológica STF Supremo Tribunal Federal UBES União Brasileira dos Estudantes Secundaristas UEx Unidade Executora UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNE União Nacional dos Estudantes {PAGE } Sumário Lista de Anexos .......................................................................... xi Introdução ................................................................................... 12 A autonomia e as políticas educacionais ......... 17 Capítulo 1 1.1 – A autonomia e suas releituras ............................. 17 1.2 – O neoliberalismo e a busca da autonomia nas políticas educacionais ............................................. 21 1.3 A autonomia nas políticas educacionais brasileiras ............................................................... 26 Capítulo 2 A autonomia das unidades de ensino segundo as políticas educacionais brasileiras ................ 50 2.1- As propostas federais ............................................ 2.1.1 – A Constituição Federal ..................................... 2.1.2 - A LDB ................................................................ 2.1.3 – O PNE .............................................................. 2.1.4 – O PDDE ............................................................ 50 50 53 58 65 2.2- As propostas do Estado do Rio de Janeiro ........... 68 2.2.1 – A Constituição Estadual ................................... 68 2.2.2 – A Lei da Autonomia .......................................... 70 2.3- As propostas do Município do Rio de Janeiro ....... 73 2.3.1 – Lei Orgânica do Município ................................ 73 2.3.2 – O SDP – Sistema Descentralizado de Pagamentos ................................................................. 74 Capítulo 3 Os olhares de profissionais da educação sobre a autonomia da escola - uma “avaliação” das políticas governamentais? ...... 78 Considerações finais – Qual autonomia? ................................... 110 Referências Bibliográficas .......................................................... 114 {PAGE } Lista de anexos Anexo Página 01 Lei Estadual 2.518 de 16/01/1996 121 02 Lei Estadual 3.067 de 25/09/1998 124 03 Transcrição das entrevistas 126 {PAGE } Introdução As preocupações que norteiam esse estudo resultam de uma inquietação presente em pesquisa realizada sobre o uso dos recursos do PDDE1. Por entendermos que o Programa prometia viabilizar a autonomia das unidades escolares através da descentralização da gestão de recursos financeiros, buscamos investigar, através de um estudo de caso, até que ponto uma unidade escolar teria autonomia na gestão dos recursos oriundos do PDDE para investir no âmbito pedagógico e constatamos que a autonomia da escola era restringida em parte, pela omissão de professores e da coordenação pedagógica em reivindicar recursos para o seu espaço de atuação e, em parte, pela insuficiência de recursos para o atendimento das “urgências” da escola. O que seria, portanto, a autonomia da escola? A “liberdade” consentida de administrar recursos repassados diretamente à escola é condição suficiente para qualificar uma unidade escolar como autônoma? Essas e outras questões referentes à autonomia da escola ganharam destaque no contexto da década de 1990, principalmente na 2º metade, quando as orientações das reformas educativas brasileiras sofreram mudanças no sentido de valorizar a “desregulamentação de serviços e [a] descentralização dos recursos, posicionando a escola como núcleo do sistema” Oliveira (1997, p. 91). Com relação às ações de incremento da política de descentralização em que a autonomia da escola passa a ser evocada como urgente e necessária para a “democratização da escola”, Draibe (2001) destaca os programas da merenda escolar (Programa Nacional de Alimentação Escolar), o dinheiro na escola (Programa Dinheiro Direto na Escola) e a TV-Escola (programa de capacitação docente à distância). O Planejamento Político Estratégico de 1995 a 1998 do Ministério da Educação e do Desporto enfatiza os seguintes aspectos: 1 O “Dinheiro na Escola”: a autonomia e os seus reflexos no processo pedagógico. Monografia apresentada ao Departamento de Administração Escolar da Faculdade de Educação da UFRJ (2001) como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Administração Escolar. {PAGE } “- a valorização da escola e de sua autonomia, bem como da sua responsabilidade para com o aluno, a comunidade e a sociedade; - a promoção da modernização gerencial em todos os níveis e modalidades de ensino, assim como nos órgãos de gestão; - a progressiva transformação do MEC num organismo eficaz de formulação, coordenação e acompanhamento de políticas públicas na área educacional, e a conseqüente redução de seu papel executivo”. (BRASIL, MEC, 1995, p. 4) Nesse sentido, buscamos discutir no presente estudo as concepções de autonomia da escola presentes nas políticas educacionais e a concepção de autonomia da escola evocada por professores, diretores e outros profissionais atuantes no dia-a-dia das unidades escolares. O referencial teórico da pesquisa focalizou o conceito de autonomia e abordou, consequentemente, questões relativas à descentralização e à gestão escolar. Apoiamo-nos em autores como Bastos, Spósito, Coraggio, Davies, Martins e outros, que têm presente a ambigüidade com que tais conceitos vêm sendo apropriados no discurso das políticas públicas e, mais especificamente, nas políticas públicas voltadas para educação. Segundo Bastos (1999), a promulgação da LBD (Lei 9394/96) não alterou a situação da educação brasileira no que tange à gestão escolar. Afirma ainda que as questões que eram antes discutidas não só continuaram as mesmas, como também agravaram-se os problemas em função das “políticas neoliberais de educação”. Para ele, “ ... a autonomia da escola está transformando a gestão pedagógica da escola em uma gerência de recursos financeiros; a participação cidadã dos pais e da comunidade está se transformando numa participação de colaboração com a direção da escola, e a formação dos profissionais da escola mais aligeirada e mais despolitizada”. (Bastos, 1999, p. 15) Bastos alerta ainda para a importância de se considerar as relações de poder que perpassam as práticas gestionárias, pois estas ultrapassam o âmbito administrativo, fazendo-se presentes nos aspectos pedagógicos através de sua materialização “nas relações profissionais do professor com os alunos e a comunidade ...” (p. 25). {PAGE } Um dos argumentos mais utilizados em prol da “urgência” de um projeto descentralizador, não só para a esfera educacional mas para o próprio Estado brasileiro, é a percepção da descentralização enquanto processo de modernização e reestruturação, como único caminho possível para “... vencer a crise fiscal, retomar o desenvolvimento e adquirir credibilidade para o enfrentamento da dívida externa com soberania” (Mello, 1990. p. 6). Buscamos, portanto, identificar a(s) concepção(ões) de autonomia presente nas políticas públicas que interferem direta ou indiretamente na gestão das unidades escolares, bem como a(s) concepção(ões) de autonomia da escola para os profissionais que atuam no dia a dia das escolas. Os questionamentos sobre a(s) forma(s) pela(s) qual(is) as escolas vivenciam a suposta autonomia promovida pelas recentes políticas educacionais são alvo de nosso estudo, que buscou responder às seguintes questões: • Qual o significado de autonomia nas políticas educacionais propostas ou implementadas recentemente? • Quais as concepções de autonomia da escola para professores atuantes nas salas de aula e executores de funções adminstrativopedagógicas e em que medida há o desejo desses profissionais por essa autonomia? • Quais as condições necessárias para que as escolas obtenham efetivamente a autonomia pretendida pelos profissionais entrevistados? O estudo constitui, portanto, uma pesquisa qualitativa em que realizamos entrevistas semi-estruturadas cuja análise buscamos privilegiar a perspectiva dialética por entendermos tal como Chizzotti (2003, p. 80) que essa vertente de análise “Valoriza a contradição dinâmica do fato observado e a atividade criadora do sujeito que observa, as oposições contraditórias entre o todo e a parte e os vínculos do saber e do agir com a vida social dos homens”. Segundo Chizzotti (2003, p. 78), os pesquisadores adeptos da pesquisa qualitativa se dedicam: [...] à análise dos significados que os indivíduos dão às suas ações, ..., à compreensão do sentido dos atos e das decisões {PAGE } dos atores sociais ou, então, dos vínculos indissociáveis das ações particulares com o contexto social em que estas se dão. Nesse sentido, a pesquisa foi realizada através das seguintes etapas: 1. análise de legislação, documentos oficiais e bibliografia com o objetivo de explicitar a(s) perspectiva(s) de autonomia traduzida(s) nas principais políticas públicas vigentes, voltadas direta ou indiretamente para as unidades escolares, com destaque para a realidade do Município e do Estado do Rio de Janeiro2. Para tanto, tratamos das propostas presentes na Constituição Federal, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no Plano Nacional de Educação e no Programa Dinheiro Direto na Escola. No âmbito estadual, estudamos a Constituição do Estado do Rio de Janeiro e a chamada Lei da Autonomia e, no Município do Rio de Janeiro, nos debruçamos em sua Lei Orgânica e na proposta do chamado Sistema Descentralizado de Pagamentos, que estabelece critérios para a utilização de recursos destinados às escolas municipais. 2. entrevista com professores, dirigentes escolares e uma funcionária tecnico-administrativa pertencentes a diferentes escolas do Município e/ou do Estado do Rio de Janeiro, buscando identificar a concepção de autonomia desses profissionais, e sua visão quanto a forma pela qual a(s) escola(s) vem vivenciando a autonomia proposta pelas políticas educacionais. A dissertação ficou dividida nos seguintes capítulos: Capítulo 1 - A autonomia e as políticas educacionais – em que buscamos identificar a origem (epistemológica e política) e a trajetória do conceito de autonomia, compreender como o conceito figura nas chamadas políticas educacionais neoliberais e quais as concepções que a autonomia assume nas políticas educacionais brasileiras. Capítulo 2 - A autonomia das unidades de ensino segundo as políticas educacionais brasileiras – em que procuramos identificar na legislação 2 O Município e o Estado do Rio de Janeiro constituíram o espaço de investigação da forma pela qual as políticas proponentes da autonomia escolar são compreendidas e vivenciadas por professores atuantes em salas de aula e por profissionais envolvidos com a administração escolar propriamente dita. {PAGE } pertinente, as propostas e/ou políticas educacionais que tratam especificamente da autonomia das unidades escolares. Como enfocamos os casos do Município e do Estado do Rio de Janeiro, estudamos as políticas dessas esferas, além da legislação federal pertinente ao assunto. Capítulo 3 - Os olhares de profissionais da educação sobre a autonomia da escola - uma “avaliação” das políticas educacionais? – em que buscamos explicitar a(s) percepção(ões) dos profissionais que estão mais diretamente relacionados com as unidades escolares, sobre as políticas proponentes da autonomia escolar e sobre suas proposições para o que seria a autonomia escolar ideal. Considerações finais – Qual autonomia? – em que apresentamos uma síntese do conjunto de resultados dos capítulos anteriores e argumentamos sobre as concepções de autonomia da escola tratadas ao longo do estudo e, sobre a perspectiva por nós defendida. {PAGE } Capítulo 1 – A autonomia e as políticas educacionais 1.1 – A autonomia e suas releituras O conceito de autonomia aparece na literatura científica de forma difusa e com diversos significados vinculados ao campo específico de cada especialista. Nosso objetivo consiste, porém, em entender as concepções atribuídas ao conceito no que se refere às relações sociais e, mais especificamente, a essas relações no campo educacional. Martins (2002) identifica o conceito de autonomia como uma construção histórica baseada nas diferentes características culturais, econômicas e políticas que retratam as sociedades em sua trajetória. Figura na literatura especializada – no que diz respeito a questões de descentralização e desconcentração de poder - ligado à idéia de participação social ou de ampliação da participação política. O desenvolvimento e o exercício da autonomia no campo político surge ligado à própria construção da noção de democracia em Rousseau (17121778), que, em sua obra O Contrato Social, de 1762, define liberdade ou autonomia como o princípio inspirador do pensamento democrático. Segundo Duriguetto (2003, p. 33): O constructo do sistema político rousseauniano parte da necessidade da participação ativa individual no processo político de tomada de decisões. São os indivíduos que devem criar as leis que regulam suas vidas, e é na legitimidade do exercício participativo do poder que reside sua concepção de liberdade, que não é, como para os liberais, a capacidade do exercício e da satisfação dos interesses individuais. Ao contrário, liberdade é aqui entendida como um processo sóciohistórico de exercício da autonomia política e da faculdade de aperfeiçoamento das relações humanas. No campo da Filosofia, os estudos consultados remetem para a obra do filósofo Immanuel Kant3, mais especificamente para o livro Fundamentos da 3 Immanuel Kant nasceu em Königsberg, atual Kaliningrado - Rússia, em 1724, falecendo em 1804 aos 80 anos. {PAGE } Metafísica dos Costumes, de 1785, como a origem epistemológica do conceito de autonomia. Para Kant, a autonomia ou a “vontade” - que é necessariamente boa enquanto racional - estava ligada à capacidade de escolha orientada por uma regra universal. Para o filósofo, o indivíduo fazia parte de um todo de sujeitos conviventes e que necessitavam, portanto, de regras racionais e universais que garantissem a harmonia dessa convivência. O conceito de liberdade constitui a chave explicativa da autonomia da vontade. Ter liberdade corresponderia a ter a capacidade racional e/ou vontade de adequar as escolhas individuais a uma regra ou lei universal que, enquanto tal, cumpre a função de “proteger” os interesses individuais, pois, se a mesma é cumprida em igualdade de condições por todos os indivíduos, ela impede que haja distinção ou privilégios quanto aos direitos de uns em detrimento dos de outros. O indivíduo, enquanto ser racional, é naturalmente dotado de autonomia ou vontade, autonomia esta que só é praticada na medida em que é concebida como uma lei ou regra universal ou seja, na medida em que todos os outros indivíduos possam praticá-la. Com a idéia de liberdade se acha, contudo, inseparavelmente unido o conceito de autonomia, e com este o princípio universal da moralidade, que serve de fundamento à idéia de todas as ações de seres racionais, do mesmo modo que a lei natural serve de fundamento a todos os fenômenos. (KANT, p. 109) Tanto Kant quanto Rousseau defendem a necessidade de princípios normativos para o convívio social. Para Kant, estes princípios garantiriam os direitos individuais de forma a promover uma relativa igualdade no convívio social. Rousseau, por sua vez, propõe o “Contrato Social” a fim de possibilitar a igualdade tanto na garantia dos direitos individuais, quanto na garantia da participação política. Nas palavras de Rousseau (1996, p. 35): Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associação de qualquer força comum, e pela qual, cada um, unindo-se a todos, não obedeça, portanto, senão a si mesmo, ficando assim tão livre como dantes”. Tal é o problema fundamental que o Contrato Social soluciona. {PAGE } Cabe destacar a distinção fundamental entre as concepções de autonomia na perspectiva rousseauniana e a concepção evocada como sinônimo de descentralização tal como prevista no projeto liberal. Para Rousseau, a autonomia do indivíduo é essencial e deve se manifestar através de sua participação política, pois é através da participação de cada indivíduo que se busca a expressão da vontade coletiva. Já para o projeto liberal, a liberdade de escolha do indivíduo é a expressão última de sua vontade; dessa forma, a autonomia seria a garantia da representação dos interesses individuais; não para a construção da vontade coletiva ou de um “Contrato Social”, mas para a garantia da auto-afirmação de direitos pessoais em meio a uma sociedade individualista. Essa distinção é fundamental para que possamos entender as concepções que o conceito de autonomia assume nas políticas/propostas/projetos implementados nos anos 90, principalmente no que se refere à(s) reforma(s) de Estado. Conforme destacado, a autonomia evocada por Kant e Rousseau está relacionada ao estabelecimento de regras para garantir a harmonia no convívio de indivíduos. Será somente na segunda metade do século XIX que a idéia de autonomia passará a ser vinculada a grupos e associações, ou seja, passará a ser entendida como uma possibilidade em projetos coletivos. Nesse sentido, Martins anuncia que a autonomia, na perspectiva da autogestão, aparece na literatura especializada como oriunda da segunda metade do século XIX, mais especificamente com a Comuna de Paris, em 1871, transformando-se, no início do século XX, em uma das principais bandeiras dos movimentos operários4. 4 Cabe destacar que, para a autora, a autogestão constitui um processo de auto-administração coletiva e é nessa perspectiva que classifica a Comuna como uma experiência de autogestão. O termo propriamente dito foi utilizado inicialmente “para designar a experiência de gestão de empresa desenvolvida na Iugoslávia a partir de 1951. A partir de 1968, o termo passa a ser utilizado no espaço acadêmico e sindical para designar uma nova forma de organização política, econômica e social” (MARTINS, 2002, p. 18). {PAGE } Segundo Bottomore (2001, p. 70): A Comuna de Paris, que durou dois meses, não resultou de qualquer ação planejada e, em momento algum, beneficiou-se da liderança de qualquer indivíduo ou organização que dispusesse de um programa coerente. É significativo, porém, que um terço dos membros eleitos da Comuna fossem trabalhadores manuais e em sua maioria estivessem entre a terça parte dos membros da Comuna que era constituída por ativistas do ramo francês da Primeira Internacional. A Comuna de Paris teria, portanto, inaugurado a “nova” perspectiva de autonomia que traz como fundamento questões referentes à participação e à representação popular. Martins enumera alguns dos movimentos de trabalhadores do século XX, considerados exemplares em sua reivindicação por mudanças valorativas na representação política e que assumiram, como forma de participação institucional, a dinâmica autogestionária. São eles: a formação dos comitês de fábrica no período da Revolução Russa (1917); as experiências de coletivização de empresas agrícolas e industriais na Revolução Espanhola (1936-1939); as comunidades de trabalho na França em 1945; a experiência iugoslava implementada a partir de 1951, por iniciativa do próprio Estado; o movimento autônomo de trabalhadores na Polônia dos anos 1970; as experiências de coletivização da economia na Argélia nos anos 1960; os conselhos de fábrica da Itália nos anos 1920, quando, após uma onda de greve, os trabalhadores assumiram o controle das fábricas e constituíram em cada uma delas um conselho que assumiu a direção técnica e administrativa. (MARTINS, 2002, p. 19). No campo educacional, a re-significação do termo autonomia se deu, principalmente, a partir da década de 80 quando, segundo Martins (2002): A análise da literatura da área e de documentos que informam as orientações de organismos internacionais indica que o conceito de autonomia – (re)significado pelas políticas educacionais vigentes a partir dos anos de 1980 – passou a ser utilizado, de um lado, como sinônimo de descentralização e desconcentração e, de outro, como a etapa subseqüente de processos descentralizadores, a partir dos quais a unidade escolar estaria finalmente livre para elaborar seu próprio plano de vôo (MARTINS 2001 apud MARTINS, 2002 p. 48). {PAGE } Ainda segundo Martins (id.): O termo autogestão, significativamente, desapareceu nesse horizonte colocado pelas diretrizes oficiais em vigor. Também desapareceu o eixo central conferido, histórica e filosoficamente, ao conceito de autonomia: a defesa de conselhos gestores nas instituições de ensino com mandato revogável e a instauração da auto-avaliação institucional. No debate da área educacional, o conceito de autonomia vem sofrendo um processo de sacralização e, ao que tudo indica, encontra-se reduzido à redefinição de procedimentos administrativos e financeiros da rede de escolas, com significativa ampliação de encargos e responsabilidades para elas. Nos anos 90 é unânime o discurso em torno da influência do neoliberalismo nas políticas educacionais, sendo, portanto, fundamental compreender o objetivo de tais projetos a fim de avaliarmos sua real interferência nas políticas “proponentes” da autonomia escolar. 1.2 - O neoliberalismo e a busca da autonomia nas políticas educacionais. Segundo Anderson (1995), o nascimento do neoliberalismo se dá em 1945, na Europa, como uma reação teórica e política contra o Estado intervencionista do bem estar social. Mas é somente a partir de 1973, com a crise do modelo capitalista de bem estar, que as idéias neoliberais ganham terreno através do ataque ao poder dos sindicatos e movimentos operários. Dentre os principais representantes dessa ideologia Anderson (1995) cita Friedrich Hayek, Milton Friedman, Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwig Von Mises, Walter Eupken, Walter Lipman, Michael Polanyi e Salvador de Madariaga. Milton Friedman, importante economista e um dos principais representantes do neoliberalismo, em seu livro Capitalismo e Liberdade de 1962, afirma que o movimento intelectual iniciado entre o final do século XVIII e início do século XIX defendia a liberdade individual como princípio e valor último e em nome da liberdade apoiava a redução do papel do Estado na economia em prol da ampliação do espaço do indivíduo. {PAGE } Segundo Bianchetti (1996), o poder, sua concentração e distribuição consistem no foco central da preocupação neoliberal, para quem “o poder do Estado, que amplia sua esfera de ação, se transforma em coerção – direta, intencionada e ilegítima – que obstaculiza a liberdade” (VERGARA, 1984 apud BIANCHETTI, 1996, p. 79). O neoliberalismo propõe, dessa forma, a ampliação da ação do mercado e a redução da intervenção estatal ou a viabilização do chamado Estado Mínimo que se daria, principalmente, através do corte nos gastos públicos e da privatização de empresas e funções estatais. Segundo Draibe (1993), as reformas estruturais preconizadas pelo neoliberalismo são acompanhadas de reformas sociais que têm tido como caraterísticas a descentralização, a privatização e a focalização dos programas sociais em grupos específicos. A descentralização seria responsável por gerar aumento da eficiência e eficácia dos gastos públicos, interação, no nível local, dos recursos públicos e privados, para financiamento das atividades sociais, e a ampliação do uso de formas alternativas de produção e operação dos serviços, mais facilmente organizados nas esferas municipais. (DRAIBE, 1993, p. 97). No campo educacional, o neoliberalismo diagnostica a existência de uma crise de eficiência, eficácia e produtividade resultante da expansão desordenada e anárquica dos sistemas educacionais (GENTILI, 1996), que se materializaria na baixa qualidade do ensino oferecido. Nesse sentido, Casassus (1990, p. 12) destaca que: [...] durante a década de 80, as autoridades educacionais nos países da América Latina estabeleceram um diagnóstico crítico do estado da oferta educacional em seus países; tais diagnósticos parecem coincidir num ponto, qual seja, que a solução para muitas das dificuldades identificadas [...] aponta para a concepção e implementação de processos de desconcentração e/ou descentralização desses sistemas. Sobre os objetivos do processo descentralizador, Hanson (1997) destaca 8 como as principais metas motivadoras das políticas de descentralização educacional: 1) a aceleração do desenvolvimento econômico via modernização das instituições; 2) o progresso da eficiência gerencial; 3) a {PAGE } redistribuição da responsabilidade financeira; 4) a promoção da democratização; 5) o aumento do controle local; 6) a iniciação da educação baseada no mercado5; 7) a neutralização dos centros de poder concorrentes – sindicatos de professores e partidos políticos; e 8) a melhoria da qualidade da educação. Percebe-se, contudo, em estudos sobre as experiências de políticas de descentralização na América Latina, que grande parte desses objetivos não foram alcançados. O próprio Hanson, referindo-se à melhoria da qualidade da educação, afirma que: Infelizmente, os esforços de descentralização não garantem tais resultados. O que ficou evidente é que algum tipo de mudança é posta em marcha através da descentralização. O que acontece em seguida depende do tipo de liderança, da boa vontade e da colaboração que surgirem em resposta ao desafio. (HANSON, 1997, p. 23). A(s) política(s) descentralizadoras avançaram os anos 90, culminando com os esforços internacionais, implementados via organismos financeiros, de desresponsabilizar o governo central dos países da América Latina (devedores) para com os gastos sociais, inclusive e/ou especialmente com a educação. Lima (2002, p. 45), referindo-se à similaridade de projetos da UNESCO e do Banco Mundial, destaca que há nos dois projetos: [...] o estímulo à diversificação das fontes de financiamento expressa na defesa da necessidade de gerar o impulso do setor privado e dos organismos não-governamentais (ONGs) como agentes ativos no terreno educativo tanto nas decisões como na implementação. Para Coraggio (1992), existem, contudo, duas correntes antagônicas que defendem a descentralização na América Latina: a neoliberal, que tem como representantes o FMI, o Banco Mundial, o BIRD e diversas instâncias da 5 A educação baseada no mercado se daria tal como nos países que utilizam o sistema dos vales-educação financiados pelo governo. Segundo Hanson, “... os pais podem matricular seus filhos em escolas públicas ou privadas de sua escolha. (...) A idéia básica é que, tendo as escolas de competir pelos alunos para sobreviver e prosperar financeiramente, a qualidade da educação irá melhorar”. (Hanson, 1997, p. 7). {PAGE } administração e agências de ajuda dos Estado Unidos6, e a democrática, que dependeria de profundas mudanças sócio-políticas para se materializar. Para ambas o processo de descentralização se daria baseado em três eixos: o econômico, o administrativo e o político. A diferença estaria no eixo norteador da descentralização. Para o projeto neoliberal, o eixo administrativo direciona o processo de descentralização, funcionando como justificador tanto do eixo econômico quanto da concentração do poder político e repressivo no Estado reformista. Privilegia-se o nível local do Poder Público enquanto administrador e gestor de serviços, através de fórmulas e projetos que buscam principalmente a redução dos investimentos públicos e não a transferência de recursos de um nível para outro. Já para o projeto democratizante, a descentralização se basearia no eixo político, partindo de uma reforma sócio-política que redefinisse o Estado e suas funções, bem como os valores que regem a sociedade7. Quanto aos eixos administrativo e econômico, defender-se-ia a descentralização territorial do Poder Público como estratégia de conscientização local. A idéia seria a de que, através das experiências de gestão local, seria possível a luta cultural a favor da participação. Porém, Coraggio alerta para que não se idealize o nível local como fórmula mágica para a democratização. Segundo o autor: Porque en um mundo que se centraliza cada vez más, en que las vidas cotidianas de los habitantes periféricos están cada vez más determinadas por el impacto sorpresivo de fuerzas que se ocultan tras el supuesto naturalismo de la crisis, proponer que nuestras sociedades se retiren a lo local como ámbito de gestión popular, de democracia, de experimentación 6 Para CORAGGIO, 1992, p. 53: “Este proyecto impone su ritmo y condiciona las políticas nacionales, porque cuenta con la fuerza que da el poder condicionar créditos o ayudas internacionales en una época de crisis y erosión de las escasas bases de autonomia y de estabilidad social de nuestros países y, más recientemente, porque opera en el espacio de chantaje abierto por la deuda externa y sus recetas: las políticas de “ajuste” y la reforma del Estado”. 7 Segundo CORAGGIO, 1992, p. 56, a reforma sócio-política implicaria em: “[...] poner al clientelismo en la mira, luchando en el proprio campo popular contra el imperativo de la necesidad inmediata y la mercantilización de la politica. El efectivo ejercicio de la soberania popular, la defensa de los derechos humanos privilegiando el derecho del Estado combinando las instituciones de la democracia representativa con formas más directas de participación y gestión, la pluralidad de canales de representación social que superen el reivindicacionismo, [...]”. {PAGE } y reflexión, es poco menos que una trampa. (CORAGGIO, 1992, p.56). Para o autor, a descentralização pensada como transferência da gestão dos serviços estatais aos usuários locais é o ideário proposto pelos organismos internacionais, que legitimam a desestatização e a privatização nos países periféricos. Coraggio defende, portanto, que a corrente democratizadora deve se apropriar do processo de descentralização e usá-lo a seu favor através da incorporação da “... dimensión de autogestión a escalas que permitan mantener una adecuada visión y práctica respecto al todo”. (p. 57) Para Arretche (1997), porém, nenhum dos argumentos normalmente evocados como justificadores das políticas de descentralização são sustentáveis. Segundo a autora: “É a concretização de princípios democráticos nas instituições políticas de cada nível de governo que define seu caráter, e não a escala ou âmbito das decisões”. (ARRETCHE, 1997, p. 132). Nesse sentido, entendemos que, apesar de ter se tornado quase um consenso e de ser defendida por diversas correntes político-ideológicas, a descentralização, da forma como vem sendo pensada e implementada nas políticas educacionais, ou seja, entendida como sinônimo de autonomia, está muito longe de promover a democratização e a melhoria da qualidade da educação. Tal como Arretche (1997), Davies (1992) e outros autores, entendemos que não é o nível ou a hierarquia da tomada de decisões que define seu caráter – democrático ou antidemocrático - mas sim a intencionalidade das resoluções. Acreditamos que a descentralização pode ou não contribuir para viabilizar a autonomia das instituições, constituindo-se, tão somente, como um instrumental para a implementação de projetos. Nesse sentido, o questionamento sobre a possibilidade da promoção da autonomia deve recair sobre os objetivos próprios dos projetos (se efetivamente democratizador ou proponente da participação superficial apenas na execução de funções previamente determinadas) e não sobre um simples instrumental como a descentralização. {PAGE } O histórico da implementação de reformas descentralizadoras no campo da educação brasileira é exemplificador desse equívoco – ou estratégia – de considerar a descentralização como sinônimo de promoção da autonomia. Veremos que as experiências descentralizadoras durante o período da ditadura militar em momento algum se aproximam da idéia de promoção da autonomia. Será somente a partir dos anos 80 que esses conceitos serão aproximados e até mesmo confundidos, tanto nas políticas educacionais, como nas reivindicações da sociedade civil. Nos anos 90, quando esses conceitos passam a ser praticamente sacralizados, veremos como a promessa da autonomia, via descentralização, torna-se utensílio indispensável para a empreitada reformista. 1.3 – A autonomia nas políticas educacionais brasileiras Embora Duarte e Teixeira (1999) destaquem preceitos sobre a autonomia dos estados subnacionais já no Ato Adicional de 1834 e na Constituição Republicana de 1891, acreditamos que o período ditatorial (1964 – 1985) represente o melhor marco histórico-político para iniciar a discussão sobre a autonomia nas políticas educacionais brasileiras. Partimos desse pressuposto entendendo que, pensar a(s) concepção(ões) de autonomia presente(s) nessas políticas, pressupõe, necessariamente, uma reflexão sobre a própria relação/disputa entre Estado e sociedade civil tendo em vista que a repressão político-ideológica do período ditatorial veio a contribuir para uma visão restrita de Estado8, levando os movimentos sociais, na sua busca pela democracia, a uma oposição radical ao Estado e à sua intervenção, inclusive no campo educacional. Nesse sentido, concordamos com Cunha (1999, p. 377) quando destaca que: Não se pode deixar de reconhecer que a ditadura militar foi vitoriosa na própria ideologia que nasceu para combatê-la: o anti-estatismo prevalecente em certos setores da sociedade e até mesmo nas oposições, inclusive das esquerdas que acaba 8 Em que Estado – Poder Público, governo ou classe governante são confundidos ou tidos como sinônimos. {PAGE } por reforçar a ideologia neoliberal, em sua tentativa de fazer do mercado o regulador legítimo de todas as instâncias da vida social. (CUNHA, 1999, p. 377) Com relação às primeiras experiências de políticas descentralizadoras, implementadas durante o regime militar, Santos Filho (1992) destaca o Decreto-Lei 200, de 25/02/67, que, embora não se refira diretamente ao campo educacional, vai nele interferir, e o Promunicípio. Através do Decreto-Lei 200, de 25/02/679, o então Presidente da República, General Humberto de Alencar Castelo Branco, baseando-se no AI410, anuncia no Art. 6º os princípios do funcionamento da administração federal, dentre os quais, no inciso III, a descentralização. O Cap. III, Art. 10, trata da descentralização da execução de atividades na administração federal, que deveria se dar: a) dentro da administração federal, através da distinção dos níveis de direção e de execução; b) da administração federal para as unidades federadas e c) da administração federal para a órbita privada, via contratos e concessões. De acordo com o § 5° do Art. 10: § 5º Ressalvados os casos de manifesta impraticabilidade ou inconveniência, a execução de programas federais de caráter nitidamente local deverá ser delegada, no todo ou em parte, mediante convênio, aos órgãos estaduais ou municipais incumbidos de serviços correspondentes. Vale ainda destacar o capítulo seguinte, que trata da delegação de competência. De acordo com o Art. 11: Art. 11. A delegação de competência será utilizada como instrumento de descentralização administrativa, com o objetivo de assegurar maior rapidez e objetividade às decisões, situando-as na proximidade dos fatos, pessoas ou problemas a atender. 9 Publicado no D.O.U. de 27.2.1967 e retificado no D.O.U. de 17.7.1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. 10 O Ato Institucional N. 4, publicado no Diário Oficial de 7.12.66 e retificado no D.O. de 12.12.66, convoca o Congresso Nacional para discussão, votação e promulgação do Projeto de Constituição apresentado pelo Presidente da República, no período compreendido entre 12 de dezembro de 1966 a 24 de janeiro de 1967. De acordo com o Art. 9º, § 2º o Presidente da República poderia expedir decretos com força de lei sobre questões administrativas e financeiras no período pós convocação extraordinária até a reunião ordinária do Congresso Nacional. {PAGE } Está claramente explicitado nesse Decreto-lei a descentralização de funções meramente executivas da esfera federal, que, no entanto, passa a concentrar funções de planejamento e de controle. É interessante perceber como, nesse período, a descentralização pode ser considerada adversa à idéia de autonomia, caracterizando-se por uma imposição de “novas atribuições” para as unidades federadas e como uma forma de perpetuação da dependência destas unidades para com o governo federal. Nas palavras de Santos Filho (1992, p. 220-1): [...] essa descentralização assumiu um caráter autoritário e tecnocrático, onde o que podia ou devia ser descentralizado foi decidido na cúpula, cabendo aos órgãos descentralizados apenas o poder de execução das decisões das instâncias superiores. Cabe lembrar que a Constituição Federal de 1967 suprimiu a vinculação de percentual da receita de impostos para a educação nas três esferas do Poder Público e a EC N. 1, de 1969, restabeleceu a vinculação somente para os municípios que deveriam aplicar a partir de então, pelo menos 20% de receita tributária municipal no ensino de 1º grau11. Conforme Cunha (2002, p. 51): [...] a centralização promovida pelo regime autoritário fazia com que uma parcela ínfima da receita de impostos ficasse nos municípios e nos Estados. Era o governo federal – justamente a instância político-administrativa isenta de gastos pré-fixados com o ensino – que recebia a maior parte do bolo tributário. Também a Lei 5692/7112 determina a descentralização de funções especificamente executivas para os municípios, cabendo aos Estados o duplo 11 Segundo DAVIES, 2001, p. 1-2 “... a ditadura militar instalada em 1964 iria suprimir [...] essa obrigatoriedade com a Constituição elaborada em 1967 por um Congresso dócil à ditadura. Embora a Emenda Constitucional N. 1, de 1969, restabelecesse a vinculação de 20% da receita tributária no caso dos municípios, as demais esferas de governo (federal e estadual) deixaram de ser obrigadas de aplicar um percentual mínimo em educação, desvinculação essa apontada como um das razões para a deterioração da educação pública no período e o conseqüente favorecimento da iniciativa privada. [...] O restabelecimento da vinculação só foi acontecer em 1983, com a Emenda Constitucional do Senador João Calmon, que fixou o percentual mínimo de 13% no caso da União e 25% no caso dos Estados, Distrito Federal e Municípios”. 12 Lei 5692 de 11 de agosto de 1971. Fixa as diretrizes e bases para o Ensino de 1º e 2º graus. {PAGE } papel de planejador e executor de funções que contribuam para o desenvolvimento do ensino de 1º e 2º graus. De acordo com o Art. 5813: A legislação estadual supletiva, [...], estabelecerá as responsabilidades do próprio Estado e dos seus Municípios no desenvolvimento dos diferentes graus de ensino e disporá sobre medidas que visem a tornar mais eficiente a aplicação dos recursos públicos destinados à educação. Parágrafo único – As providências de que trata este artigo visarão à progressiva passagem para a responsabilidade municipal de encargo e serviços de educação, especialmente de 1º grau, que pela sua natureza possam ser realizados mais satisfatoriamente pelas administrações locais. Quanto ao Promunicípio - Projeto de Coordenação e Assistência Técnica ao Ensino Municipal - constituiu, segundo Rosar (1997), o projeto de maior destaque desenvolvido pelo MEC a partir de 1974, declarando como objetivo principal solucionar os problemas do ensino municipal, através da articulação das administrações de Estados e Municípios14. Ao município caberia a responsabilidade pelo ensino de 1º grau, enquanto o estado definiria as diretrizes gerais, prestaria assistência técnica e cooperação financeira. Também no Promunicípio a descentralização não estava relacionada à promoção da autonomia; instituía-se, na verdade uma nova forma de controle sobre estados e municípios, principalmente no que diz respeito ao financiamento da educação. Segundo Rosar (2002, p. 115): Como se constata, a nível da burocracia do setor da educação, foram definidos os parâmetros para uma descentralização centralizada, que pretendia concretizar uma política de distribuição de recursos com a garantia de manter o controle sobre os estados e municípios. ROSAR (2002) destaca outras experiências de projetos descentralizadores iniciados a partir de meados da década de 70 e início da década de 80. Além do Promunicípio, o EDURURAL, o POLONORDESTE, o 13 In.: BREJON, Moysés (Org.) Estrutura e Funcionamento do ensino de 1º e 2º graus. 5ª ed. São Paulo, Pioneira, 1974. 14 Segundo Rosar (2002, p. 114) os problemas do ensino municipal consistiam em: “inexistência ou inadequação de serviços municipais de educação, insuficiência de recursos humanos e financeiros, carência de rede física; predominância de professores não titulados; altas taxas de repetência escolar; elevadas taxas de evasão; acentuada distorção idade-série, grande número de escolas unidocentes, com classes multisseriadas; currículos e programas inadequados”. {PAGE } PRONASEC, o PRODASEC15 e o Projeto Nordeste, que contaram com financiamento do Banco Mundial, trouxeram em seu bojo diretrizes educacionais definidas pelo próprio Banco. Para a autora, a implantação desses programas consistiu em uma “estratégia de omissão em relação à definição de uma política de estado para o ensino rural”. (ROSAR, 2002, p. 118) Segundo BARRETO E ARELARO (1986) os dados do Censo Demográfico de 1980 levam a crer que os auxílios financeiros da União que se deram através de projetos especiais de fomento, não foram suficientes para alcançar os objetivos propostos. Para as autoras, esses dados ... dão prova da derrocada dessa política educacional ao indicarem uma taxa de 67,4% de escolarização na faixa de escolaridade obrigatória, apontando em torno de 7 milhões de crianças de 7 a 14 anos ainda fora da escola e 32% de analfabetos nessa idade. Mostram o produto de um ensino básico que não conseguiu superar gritantes diferenças de atendimento entre as diversas regiões do país, entre a cidade e o campo, entre as redes estaduais e municipais de ensino. BARRETO E ARELARO (1986, p. 11). Há, contudo, nesse período uma mobilização contrária ao Estado interventor. Segundo Cunha (1999), as forças oposicionistas aos governos militares teriam se organizado em duas correntes principais: a primeira, que via na luta armada instrumento de superação do governo militar; e a segunda, que acreditava na organização social das massas em defesa das liberdades democráticas como o caminho para “o restabelecimento do Estado de direito e da democracia” (CUNHA, 1999, p. 23). A primeira corrente era composta por alguns partidos de esquerda e a segunda por “um amplo leque que ia de partidos liberais-democráticos até socialistas e comunistas, incluindo as forças lideradas pelo Presidente da República deposto pelos militares - João Goulart - e outros dirigentes políticos que tiveram seus direitos políticos cassados (Miguel Arraes, Leonel Brizola, Carlos Lacerda e Juscelino Kubistchek)” (Ibid) 15 EDURURAL - Programa de Expansão e Melhoria da Educação no Meio Rural do Nordeste, PRONASEC – Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais para o Meio Rural, PRODASEC - Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais para as Populações Carentes Urbanas. {PAGE } As forças oposicionistas materializadas no MDB – Movimento Democrático Brasileiro, partido criado com remanescentes dos partidos políticos desfeitos em 1965, foram aos poucos influenciando a opinião pública e conquistando espaço político em favor de suas propostas16. Nas eleições municipais de 1976 o MDB e candidatos progressistas da ARENA conquistaram prefeituras, entre as quais Boa Esperança (ES), Lages (SC) e Piracicaba (SP), que tiveram seus trabalhos reconhecidos como modelos de administração democrática. Nos três municípios a educação ganhou destaque com propostas inovadoras no que diz respeito à participação popular nas decisões governamentais. Amoroso Covre, filiado à ARENA, eleito para a prefeitura de Boa Esperança em 1976, deu início ao planejamento participativo, através da criação das chamadas comunidades17. Composto pelos líderes comunitários, representantes dos órgãos públicos e entidades municipais, o Conselho Municipal de Desenvolvimento tinha a função de: [...] estudar a realidade sócio-econômica do município, selecionar os problemas maiores, assim como elaborar e avaliar os programas de desenvolvimento para serem implementados pela prefeitura. (CUNHA, 1999, p. 110) Dessa forma, foram identificados os principais problemas da educação municipal: a inadequação do currículo da escola da zona rural e o desinteresse da população pelas escolas. Para solucioná-los, procedeu-se à reforma curricular da escola rural, enfatizando a realidade do campo sem distorcer o quadro geral de ensino, e a transferência de todos os estabelecimentos de ensino do estado, juntamente com os recursos de manutenção, para a prefeitura de Boa Esperança. Foram acrescentadas 38 escolas às 10 existentes. Segundo Cunha (1999, p. 112): 16 O Ato Institucional N. 2, de 27 de outubro de 1965 extinguiu os partidos políticos até então existentes e criou dois partidos que, segundo Horta, (2001, p. 205) consistiam: “um da situação, a Aliança Renovadora Nacional – ARENA -, e outro de oposição consentida, o Movimento Democrático Brasileiro – MDB”. 17 Constituíam grupos formados por cerca de 10 ou 12 famílias vizinhas, que elegiam seus representantes. Os representantes - ou líderes comunitários - formavam três centros irradiadores, que eram responsáveis pela elaboração do planejamento setorial. {PAGE } [...] a iniciativa da administração municipal e a participação popular convergiram na ampliação e na reforma do ensino público, desenvolvendo formas inéditas de gestão. No caso do Município de Boa Esperança, a municipalização das escolas estaduais contribuiu para a aproximação da população à administração das mesmas, que caberia a partir de então à Secretaria de Educação municipal. Já em Lajes, Dirceu Carneiro, do MDB, foi eleito, também em 1976, para a prefeitura do município e, juntamente com sua equipe, realizaram uma campanha de mobilização a partir dos núcleos e sub-núcleos do MDB nos bairros e nos distritos. O objetivo era convencer a população de que, somente através de organização, era possível alcançar as reivindicações. Segundo Cunha (1999, p. 112): Sob o lema “Lages, a força do povo, a população foi levada a crer que só os setores que se organizassem receberiam apoio. Assim, o calçamento de ruas, por exemplo, [...], só se faria depois de formada uma associação de moradores que, pelo voto dos associados, decidisse quais as ruas a serem calçadas e as que tinham prioridade no atendimento. Com relação ao campo educacional, o principal problema do município consistia na elevada taxa de repetência e de evasão escolar. Buscaram-se, dessa forma, mudanças tanto no conteúdo quanto na forma de ensinar. O município de Piracicaba consiste em outra experiência de inovação no que diz respeito à participação popular. João Herrmann Neto venceu as eleições para a prefeitura de Piracicaba, em 1976, também pelo MDB. Após concentrar inicialmente suas prioridades no saneamento básico, direciona as políticas municipais para habitação popular, saúde e educação. Sua equipe pedagógica, composta por pedagogos e cientistas sociais, contribuiu para a formulação do Plano Municipal de Educação, que culminou na construção dos Centros Polivalentes de Educação e Cultura – CEPECs, onde eram desenvolvidas atividades demandadas pela população, tais como berçário, creche, ensino pré-escolar e educação complementar de 1º grau. {PAGE } A seleção de pessoal para os Centros era feita de forma a priorizar os moradores da localidade e a valorizar sua participação em comissões de bairro e a seleção de crianças era realizada por comissões de pais. Em 1982, quando das eleições municipais, havia 11 CEPECs em funcionamento mas a descontinuidade dos projetos educacionais se mostrava já naquele período. Além dos CEPECs, todas as propostas educacionais dos prefeitos de Piracicaba (SP) e de Lages (SC) foram perdidas com a derrota de seus proponentes nas eleições de 1982. O curto período de desenvolvimento dessas experiências, além da oposição partidária dos governadores dos respectivos Estados em que as experiências municipais ocorreram, teria contribuído para o impedimento da consolidação das forças políticas que inovaram em suas propostas para o campo educacional. Para tratar das experiências estaduais em que se buscou propiciar a participação popular, cabe esclarecimentos sobre os bastidores políticopartidários do país naquele período. Após a anistia, houve o retorno de importantes lideranças políticas até então exiladas e a reforma da lei orgânica dos partidos políticos. Em 1979, o MDB e a ARENA foram extintos, dando lugar a novos partidos que se distinguiam, dentre outras características, pela convergência ou divergência do regime militar. Em 1982 as oposições conquistaram cargos nas eleições para governador, para Câmara dos Deputados e para o Senado. Cunha (1999) estuda os casos dos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, que elegeram governadores de partidos opositores ao regime militar e que tiveram experiências de políticas educacionais inovadoras no mandato 1983-1987. No Estado do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, eleito governador pelo PDT, cria, no início de seu mandato, a Comissão Coordenadora de Educação e Cultura, que tinha o objetivo de “formular a política do setor e de orientar a sua execução”. (CUNHA, 1999, p. 129) {PAGE } Os principais problemas educacionais do Estado correspondiam às elevadas taxas de repetência e de evasão escolar que eram atribuídas à inadequação curricular; assim como a baixa oferta de classes pré-escolares, pela rede pública. Nesse sentido, as principais metas educacionais previam: a eliminação do 3º turno diurno nas escolas públicas; a construção de 3.000 salas de aula; capacitação docente e a ampliação da rede via implantação de uma nova concepção de escola de tempo integral – os Centros Integrados de Educação Pública – CIEPs e de Casas da criança, que prestaria assistência às crianças de 5 e 6 anos através da educação, saúde e nutrição. (CUNHA, 1999, p. 133). Uma das grandes contradições no governo Brizola teria sido a relação da Comissão Coordenadora de Educação e Cultura com o professorado. Embora o Plano Quadrienal de Educação embutido no Plano Estadual de Desenvolvimento Econômico e Social já estivesse pronto e aguardando aprovação do governador, todos os professores do 1º grau das redes estadual e municipal de educação foram convocados para participar do I Encontro de Professores de 1º grau, supostamente para a elaboração do Plano Quadrienal. O Encontro teria como objetivo discutir 45 teses referentes à análise da situação e dos problemas da escola pública, às metas da programação educacional do governo, e ao papel e participação dos professores na nova programação educacional. Segundo Cunha (1999, p. 138): [...], as Teses convergiam com os diagnósticos que se vinha fazendo a respeito do caráter discriminatório da escola [...] e não pouparam os professores como instrumentos dessa discriminação, qualificando-os (sem usar esses termos) de incompetentes, cúmplices e até mesmo de beneficiários do descaso para com a educação das crianças pobres. Nesse sentido, contra-argumentaram os professores: A crítica que fazemos às teses é que nelas não está incluída a análise sobre a escola no contexto político-social e econômico. [...] Esquece-se em que tipo de sistema estamos vivendo e que a questão da evasão escolar não é só rejeição do aluno à escola, e sim a necessidade premente de trabalho, desde muito jovem. A escola reflete o sistema e consideramos utópico construir uma escola-modelo, encarada como a salvação para {PAGE } os agudos problemas econômico-sociais que o País está vivendo [...]. “. (Pólo Tijuca, Escola viva, viva a escola, n° 2, p. 45 apud CUNHA, 1999, p. 139). As discordâncias entre professores e a administração educacional perduraram até o final do mandato do governo Brizola, resultando em 4 principais mudanças na política de relacionamento com os professores: a) renunciou-se à busca de participação de professores, atribuindo à categoria a qualificação de “elitismo docente”, razão de sua resistência à mudança; b) o projeto de reforma das escolas foi abandonado e a rede existente julgada “irrecuperável” em termos físicos e humanos; c) produziu-se uma grande campanha de divulgação na imprensa norte-americana, européia, e hispanoamericana, sobre à “revolução educacional do terceiro mundo”, que estaria se processando no Rio de Janeiro como resposta à desaprovação do magistério estadual, e d) os CIEPs passaram a ser prioridade um. Com o desentendimento entre os professores e a Administração Educacional, a comunidade não teve acesso às decisões políticas, resultando na protelação das eleições para diretores. Além do que, segundo Cunha (1999, p. 150): [...] o caráter meramente consultivo do “conselho escolacomunidade”, previsto no regimento dos CIEPs, desestimulou a institucionalização da participação dos pais de alunos na gestão das escolas de tempo integral. No Município do Rio de Janeiro, porém, buscou-se implementar uma proposta pedagógica para o ensino de 1º grau unificando CIEPs e Escolas convencionais com a participação dos professores da rede municipal. Houve ainda concurso unificado de professores para toda a rede e a regulamentação, em 1984, da eleição de diretores, embora a 1ª eleição só viesse a ocorrer em 1987. Embora as propostas para a educação fossem inovadoras e a participação popular figurasse desde o início do Governo Brizola, a desconsideração das críticas docentes ao projeto acarretou o afastamento entre a categoria e a administração educacional do Estado, impossibilitando o avanço no sentido da democratização do espaço escolar através, inclusive, da eleição para diretores. {PAGE } A experiência do Município do Rio de Janeiro mostrou a importância da efetiva participação dos professores que se deu através da elaboração da nova proposta pedagógica para o ensino de 1° grau, o que veio a viabilizar a participação da comunidade na eleição para diretores, pelo menos na regulamentação da mesma. Já no Estado de Minas Gerais, o governador eleito pelo PMDB, em 1982, - Tancredo Neves - nomeou, como secretário de educação, um professor da Universidade Federal de Minas Gerais – Octávio Elísio - que montou sua equipe com renomados professores da Faculdade de Educação da UFMG. Vista com desconfiança por diversos setores do estado, dentre os quais órgãos de segurança do governo militar, esferas do PMDB e grupos conservadores do estado, principalmente os privatistas, a Secretaria Estadual de Educação é levada a buscar uma base de sustentação política e o fez da seguinte forma: Idealizaram uma ampla consulta a professores, funcionários, estudantes e seus pais, de modo que os julgamentos e demandas daí oriundos fundamentassem as políticas educacionais. (CUNHA, 1999, p. 166) Com esse intuito, realizou-se o Congresso Mineiro de Educação, que teria a intenção de mobilizar todas as escolas - municipais e estaduais para a definição de metas educacionais. Seus objetivos consistiam em diagnosticar a situação educacional do Estado de Minas Gerais, conhecer as propostas pedagógicas desenvolvidas nas escolas, e sistematizar as propostas das várias categorias de pessoal para o estabelecimento de uma política de educação. Inúmeras propostas foram postas em prática a partir do Congresso, dentre elas: a delegação de competência às delegacias regionais para que, juntamente com as comissões municipais e demais órgãos educacionais, pudessem dinamizar as propostas das unidades escolares e comissões municipais, e a criação de uma comissão de diretores de cada Delegacia Regional de Ensino, eleitos democraticamente, para acompanhar o encaminhamento e a execução das propostas do I Congresso Mineiro de Educação. {PAGE } A experiência do Congresso incentivou a organização de colegiados nas unidades escolares, que deveriam ser formados pelo diretor da escola – como presidente, e por representantes dos trabalhadores das unidades escolares, alunos, responsáveis pelos alunos e “grupos comunitários”. Outro resultado foi a revitalização das escolas normais previsto no Plano Mineiro de Educação pelo qual 31 Escolas Normais da rede estadual foram transformadas em Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério – CEFAM, que, dentre outros projetos, realizou, em convênio com universidades, a habilitação de professores leigos em exercício no segundo segmento do ensino de 1º grau. Embora a experiência implementada pela Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais no Governo Tancredo Neves (1982-85) e Hélio Garcia (1985-86) tenha sido de incontestável importância, Cunha (1999, p. 187) destaca como muitas das conquistas desse período se perderam: Nas eleições de novembro de 1986 para o governo do estado, o candidato do PMDB, Newton Cardoso, venceu as eleições, beneficiando-se de práticas populistas sem precedentes em Minas Gerias e não assumiu compromisso algum com as políticas educacionais formuladas e implementadas pela equipe de Tancredo Neves. (...) A política educacional do governador Newton Cardoso (se se pode chamar assim às medidas que foram sendo tomadas na área) resultaram uma completa demolição do que havia sido erigido na gestão anterior. Não há elementos suficientes para que possamos avaliar a concepção de autonomia buscada naquele período; contudo, talvez a experiência de Minas Gerais, ao estimular a participação ativa da “comunidade escolar”18 na elaboração das políticas educacionais do Estado, tenha sido a que mais perto chegou da democratização da participação no espaço escolar. No caso do Estado de São Paulo, André Franco Motoro, eleito governador, também pelo PMDB, em 1982, trazia em sua proposta de governo 18 Entendemos por comunidade escolar o conjunto dos membros que interagem direta ou indiretamente com o cotidiano das unidades escolares, nesse sentido são integrantes da comunidade escolar todos os professores, funcionários, alunos e seus responsáveis além de representes da localidade. {PAGE } a promessa sobre três princípios básicos que iriam reger sua atuação: “participação, descentralização e criação de empregos”. A secretaria de educação foi ocupada inicialmente por Paulo de Tarso Santos, que, além da realização de um Fórum Estadual de Educação e a incorporação do ciclo básico no ensino de 1° grau, iniciou a discussão sobre o novo estatuto do magistério. Nos primeiros dias de sua atuação, Paulo de Tarso divulgou um “Documento Preliminar” para discussão na rede estadual de ensino, propondo: rumos e possíveis soluções para o debate pelos integrantes do magistério, compreendendo os seguintes tópicos: qualidade de ensino, plano de melhoria do ensino, situação do magistério, ensino de 1º grau, ensino de 2º grau, autonomia da escola”. (CUNHA, 1999, p. 197) Partindo da constatação da histórica escassez e má qualidade da escola pública de 1° grau, o então secretário de educação defendia que: [...] cada escola, [...], procedesse à identificação dos problemas que impediam a melhoria do ensino e à reformulação das possíveis soluções. [...] Neste sentido, a ação da Secretaria de educação consistiria na criação de condições de sustentação e apoio ao plano de cada escola. (Id., p. 198) A intenção de propiciar o debate e o surgimento de propostas a partir do Documento Preliminar fracassou pois, Como não havia uma direção, no sentido político e pedagógico do termo, a Secretaria viu-se afogada numa avalancha de propostas e reivindicações, que chegavam aos milhares, desde pedidos de cães de guarda para as escolas até complicados mecanismos de classificação de cargos”. (Ibid). O segundo secretário de educação, Paulo Renato Costa Souza, empossado em 1984, deu continuidade a implantação do ciclo básico e liderou a implementação do novo estatuto do magistério, que promoveu, dentre outras modificações, a criação dos conselhos de escola. Os conselhos eram compostos pelo diretor da escola como presidente, professores, especialistas e funcionários representando metade dos membros e, ainda, pais e alunos compondo a outra metade do conselho. Eram de caráter deliberativo e deveriam ser renovados anualmente. {PAGE } Dentre as principais atribuições do conselho, constava: a) a deliberação sobre diretrizes e metas das escolas, soluções para problemas administrativos e pedagógicos, integração escola-família-comunidade, definição de prioridades para aplicação de recursos da escola e sobre a disciplina de funcionários, servidores e alunos; b) elaborar o calendário escolar; e c) analisar o desempenho da escola através da apreciação dos relatórios anuais. Embora a proposta tenha sido inovadora, os conselhos funcionaram em poucas escolas devido principalmente: [...] não só a tradição de impermeabilidade da escola diante dos pais, até mesmo para as mais simples informações, como também a prioridade que a população dava a outros serviços públicos (como saúde) e à solução de problemas mais imediatos (como salário e moradia) quando a participação tornava-se uma possibilidade objetiva e subjetivamente reconhecida. (id.) Em maio de 1986, o terceiro secretário de educação do mandato Montoro, José Aristodemo Pinotti, assumiu a Secretaria e, a partir de então, empreendeu o Programa de Formação Integral da Criança – PROFIC, na qual destacava-se a implantação do regime de 8 horas diárias para o pré-escolar e para o 1º grau. A rejeição ao PROFIC se deu inicialmente a partir da própria Secretaria Estadual de Educação. Segundo Cunha (1999, p. 206), a Professora Mirian Jorge Warde, titular da Coordenadoria de Ensino da Região Metropolitana de São Paulo, foi demitida pelas críticas atribuídas ao Programa. Dizia ela que, como o PROFIC não era um programa de construção, como o dos CIEPs do Rio de Janeiro, ele não poderia beneficiar as crianças que pretendia, já que 40% das escolas estaduais de 1° grau da Grande São Paulo funcionavam em regime de quatro turnos diários, superlotadas, sem espaço disponível que pudesse ser ocupado pelos alunos em regime de tempo integral. Na gestão do Governador seguinte, Orestes Quércia, apesar de o PROFIC ter sido desativado, manteve-se “a orientação geral do ciclo básico e até se corrigiram os equívocos do PROFIC e do Estatuto do Magistério, ...” (CUNHA, 1999, p. 222). {PAGE } Também no Estado de São Paulo, houve importantes iniciativas direcionadas a ampliar a participação no espaço escolar. Faltou, contudo o combate às causas que impediam a participação da comunidade na gestão escolar. No caso do Estado do Paraná, José Richa, eleito também pelo PMDB, tomou posse em março de 1983, permanecendo como governador até 1986, quando assume seu vice, João Elisio Ferraz de Campos. No campo educacional, suas propostas constituíram: [...] uma mistura bastante heterogênea de formulações gerais e propostas específicas. Defendia uma especial “tarefa da escola numa educação libertária”, para o que se previa a atribuição “aos grupos sociais organizados a responsabilidade de forjar seus próprios destinos” e a criação de mecanismos para que a “comunidade escolar” (pais, mestres, estudantes e servidores) passassem a ter “participação decisiva na escolha da direção dos estabelecimentos oficiais de ensino, mediante o sistema de eleições diretas, nas escolas de todos os níveis de ensino”. (CUNHA, 1999, p. 233). Em maio de 1983, Gilda Poli assume a Secretaria Estadual de Educação e divulga, em seguida, o texto Políticas SEED/PR – fundamentos e explicitação contendo as propostas de políticas a serem implementadas em seu mandato. O objetivo principal consistia em assegurar o acesso e a permanência dos alunos à escola e, principalmente, garantir a qualidade do ensino. Dessa forma, [...] o desafio aos professores [era] oferecer às camadas populares [...] o saber que é oferecido às classes com maior poder aquisitivo”. A finalidade era a “reconstrução social”, isto é, a escola deixar de contribuir, pela educação, para que a maioria da população continuasse a ser alijada dos processos decisórios, administrativos, políticos, científicos ou tecnológicos, em nome de sua “ignorância” ou “incompetência. (Id., p. 234) A Secretaria de Educação via a participação popular - ou das comunidades - como forma de promover a democratização do poder e, portanto, [...] insistia para que os professores se propusessem a aprender junto com os pais, os alunos, os elementos da “comunidade”, das associações e dos sindicatos, e a ensinar através de atos objetivados na prática quotidiana o verdadeiro {PAGE } significado de governo (ou direção) participativo dos processos educacionais. (Ibid, p. 235) Nesse sentido, buscou-se realizar a descentralização da Secretaria de Educação e a valorização docente. A descentralização administrativa da Secretaria se deu principalmente, via “... transferência dos núcleos regionais que tinham sede em Curitiba para vinte microrregiões. [...] Os núcleos receberam atribuições novas, como a distribuição de aulas extraordinárias e de recursos financeiros com verbas de pronto pagamento”. (Ibid, p. 236) E a valorização do professorado foi realizada através da: [...] melhoria do salário, a melhoria das condições físicas no local de trabalho, tempo pago para a preparação das aulas, possibilidade de realização de cursos de aperfeiçoamento, quadro de carreira, concursos públicos, e outras. (Ibid, p. 235) Em 1993, havia cerca de um milhão e meio de estudantes no ensino de 1º grau no Estado do Paraná. As escolas estaduais atendiam a 56% dos alunos mas somente 7% da rede estava localizada na zona rural. Eram as escolas municipais as maiores responsáveis pelos alunos dessa região. Tais escolas eram, em sua maioria, feitas de madeira e com “uma só sala e um só professor, situação de cerca de onze mil dos quatorze mil prédios escolares nos quais se ministrava o ensino de 1º grau no Paraná”. (Cunha, 1999, p. 236) Diante desse quadro O governo estadual optou por uma política de expansão do ensino de 1° grau que priorizava a transferência de recursos para as prefeituras por intermédio da FUNDEPAR, com a justificativa de que a compra de material de construção no local, a contratação e a fiscalização das obras pelo município, assim como o emprego da mão-de-obra local eram providências que poderiam reduzir o custo de uma escola em 50% do que se gastaria se a mesma fosse feita pelo governo do estado. Em conseqüência, parte das novas escolas construídas ficou com a rede estadual e parte com as redes municipais. (Id.) A descentralização continuou a ser incentivada juntamente com a priorização da expansão do ensino de 1º grau. Nesse sentido, celebrou-se um convênio entre o governo estadual e 306 municípios que previa: [...] a transferência de recursos para pagar treze mil professores e pessoal de apoio contratados pelas prefeituras, mas que trabalhavam em escolas da rede estadual, [...] {PAGE } A FUNDEPAR, encarregada de gerenciar os recursos federais para a merenda, modificou os critérios de distribuição de modo a substituir os procedimentos clientelísticos até então praticados, por um mecanismo de remessa automática dos alimentos, conforme o número de alunos, [...]. (Ibid. p. 237) O êxodo rural no Paraná interferiu, contudo, no processo de expansão do ensino de 1° grau. Segundo Cunha (1999, p. 238-9), [...] o estado passava por um processo intenso de concentração da propriedade fundiária, de capitalização acelerada do campo, que resultava em intensas correntes migratórias da população expulsa da zona rural para as cidades ou mesmo para fora de suas fronteiras. [...] Como resultado, a população rural diminuía e as escolas ficavam vazias, enquanto as das cidades eram superlotadas. A experiência do Estado do Paraná no campo educacional ficou ainda conhecida pelas iniciativas de modificar os regimentos escolares, de forma a buscar eliminar traços de autoritarismo presentes e pela proposição de eleições diretas para diretores das unidades escolares. Apesar de ter tido como objetivo a remoção do caráter autoritário do texto legal, as mudanças nos regimentos geraram críticas e discordâncias em parte do professorado e nos diretores, o que levou a Secretaria de Educação a propor que “no segundo semestre de 1986, se iniciasse a elaboração de novos regimentos, pretendendo que cada escola elaborasse o seu, reunindo professores, funcionários, pais e alunos”. (Id. p. 245) Embora as primeiras eleições para diretores tenham ocorrido em 17 de junho de 1983, com a participação de aproximadamente 70% dos pais de alunos, a Associação dos Professores do Paraná contrapôs-se ao processo eleitoral alegando que a escolha dos diretores não se daria diretamente, mas por intermédio de uma lista tríplice da qual a Secretaria de Educação escolheria o nome que lhe conviesse. Outra problemática levantada pela Associação, dizia respeito à eleição para diretores com voto igualitário entre professores, alunos do 2º grau e pais de alunos do 1º grau. Reivindicava-se que o voto de professores deveria valer pelo menos a metade do total de votos. Diante das reivindicações docentes e da pressão político-partidária para a nomeação de determinados candidatos das listas tríplices, a Secretaria de Educação passou a apoiar a eleição direta para diretor de escola, incentivando {PAGE } a apresentação de projeto de lei nesse sentido. Finalmente, a Lei (PR) 7.691, de 21 de novembro de 1984, garantiu a eleição direta para diretor. As experiências anunciadas mostraram que nem sempre os conceitos de autonomia e descentralização figuraram como sinônimos nas políticas educacionais. Embora a Lei 5692/71 em Parágrafo único determinasse a “progressiva passagem para a responsabilidade municipal de encargo e serviços de educação, especialmente de 1º grau, que pela sua natureza possam ser realizados mais satisfatoriamente pelas administrações locais....” (Brejon, 1974, p. 241) houve, no período ditatorial, a descentralização de funções executivas para Estados e Municípios e em contrapartida, uma centralização cada vez maior de funções decisórias no nível federal. No período da chamada redemocratização brasileira, iniciado com o mandato do primeiro Presidente civil após o término da ditadura militar (196485), o acesso ao ensino obrigatório permaneceu como um dos maiores desafios a serem enfrentados pelas novas propostas políticas19. No I Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República 1986/1989 previu-se o desenvolvimento do Programa Descentralização e Participação, que tinha como justificativa combater a excessiva centralização dos recursos públicos; a morosidade no que dizia respeito à destinação de recursos para atividades educacionais e, propiciar a “participação de todos os cidadãos na formulação e implementação das políticas educacionais” (Id., p. 271). Segundo Rosar, (2002, p. 128): A mesma direção das ações desenvolvidas durante os governos militares manteve-se no período pós-ditadura, no que diz respeito ao “fortalecimento do processo de municipalização do ensino [...]. Nesse sentido Cunha (1999, p. 267) afirma que: 19 Segundo BARRETO e ARELARO (1986, p. 14) “O ensino municipal, ao atender sobretudo os segmentos mais marginalizados da sociedade, em particular os residentes nas áreas rurais, constitui a mais pobre e precária das redes de ensino no país. A maioria de suas escolas é de professor único, com classe multisseriada funcionando na casa do professor ou em dependência cedida pela comunidade. De tão pobres que são, essas redes de ensino costumam não ter sequer rede física. Assim, das 139.415 unidades escolares de uma sala só, existentes no Brasil, em 1979, 107.649 (77%) pertenciam às redes municipais. {PAGE } No que dizia respeito à transferência de recursos federais para os níveis inferiores da administração, o MEC levou ainda mais longe as práticas do último governo militar, de só efetivá-las para os municípios “fiéis” às orientações político-partidárias dos ministros, diretamente, sem a intermediação dos governos estaduais”. Com relação à elaboração da nova Constituição Federal, ainda em 1985 o Presidente José Sarney criou uma Comissão de Estudos Constitucionais para elaborar um anteprojeto de Constituição. O anteprojeto foi amplamente criticado, levando o Presidente da República a não encaminhá-lo para a Assembléia Nacional Constituinte, que, por sua vez, determinou que a elaboração da Lei Maior não partiria de qualquer anteprojeto. As propostas educacionais para a nova Constituição Federal representavam diversas correntes de pensamento que se aproximavam, de acordo principalmente, com a defesa ou o ataque à destinação de recursos públicos exclusivamente para as instituições públicas de ensino. Várias propostas foram apresentadas à Assembléia Constituinte, dentre elas a que resultou dos trabalhos do Fórum Nacional da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito20. A disputa em torno das propostas levadas à Assembléia Constituinte resultaram, nas palavras de Cunha, (1999, p. 441) na garantia da: [...] transferência de recursos públicos para as instituições privadas de ensino sem fins lucrativos, como queria a emenda CNBB/AEC/ABESC, sem que os beneficiados tivessem, entretanto, as obrigações de reaplicação dos excedentes do rendimento (dos lucros, sem eufemismo) na qualidade do ensino, nem de prestação de contas à “comunidade” [...]. Com relação ao processo de municipalização em andamento antes mesmo do início dos trabalhos da ANC, a Constituição Federal de 1988 é freqüentemente apontada como sua incentivadora nos artigos 30 e 21121. 20 Integravam o Fórum Nacional da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito as seguintes entidades: ANDES, ANPEd, ANDE, CEDES, CONSED, ANPAE, CPB, CGT, CUT, FASUBRA, OAB, SBPC, SEAF, UBES e UNE. 21 “Art. 30, inciso VI - Compete aos municípios: - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental; e Art. 211, § 2º - Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil”. {PAGE } Contudo, concordamos com Davies (1992) quando afirma que essa interpretação está equivocada pois a própria Constituição Federal, no Art. 208, prevê como dever do Estado a garantia do ensino fundamental e pré-escolar, agora educação infantil; a CF não estipula a desobrigação dos Estados para com o ensino fundamental e tampouco a transferência de sua responsabilidade para as prefeituras; a determinação da CF sobre a atuação dos municípios prioritariamente no ensino fundamental e educação infantil não visa impedir a atuação de Estados e da União nestes níveis, mas evitar a atuação das prefeituras no ensino médio e superior sem que tenham dado conta do ensino fundamental e da educação infantil. O autor argumenta ainda que a CF não prevê que o ensino fundamental e a educação infantil sejam responsabilidade prioritária dos Municípios, mas sim que estes atuarão prioritariamente nesses segmentos. Nesse sentido, após a CF de 88, Estados e Municípios atuavam no ensino fundamental de acordo com seus acertos até que o debate em torno da municipalização foi retomado com bastante vigor, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9394/96) e do Fundef (9424/96)22. A municipalização passa, a partir de então, a ser defendida como uma das principais formas de descentralizar o poder de decisão sobre a gestão das unidades escolares através da transferência de sua gerência didático/financeira para os municípios. Oliveira (2002) enfatiza que, no contexto da década de 1990 no Brasil, ocorreram educativas. mudanças Essas mais reformas peculiares são nas orientações caracterizadas, das reformas principalmente, por “orientações administrativas cujo referencial é a realidade desenvolvida nas empresas privadas” (Oliveira,1997, p. 91). Tais orientações vêm a se traduzir, segundo a autora, no que diz respeito à gestão da educação pública, na “desregulamentação de serviços e na descentralização dos recursos, posicionando a escola como núcleo do sistema”.(Id.) 22 Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério. {PAGE } Verifica-se, a partir dessa perspectiva, que algumas ações dos órgãos centrais do nosso sistema educacional – Ministério da Educação e Secretarias Estaduais e Municipais – são deslocadas diretamente para as escolas, que na nova ordem passam a se constituir em núcleos de execução, tornando-se um dos determinantes da descentralização. No Planejamento Político Estratégico de 1995 a 1998 do Ministério da Educação e do Desporto destaca-se, dentre outras, a seguinte meta: - a progressiva transformação do MEC num organismo eficaz de formulação, coordenação e acompanhamento de políticas públicas na área educacional, e a conseqüente redução de seu papel executivo. (BRASIL/MEC, 1995, p. 4) De acordo com o referido documento, a política do MEC se baseava no princípio de que: A heterogeneidade e as dimensões continentais do país, agravadas pela escassez de recursos, reafirmam a descentralização da execução como o caminho mais correto para alcançar os objetivos em cada área. Nesse sentido, o grande desafio é articular, através de uma política clara de financiamento/estímulo/orientação/avaliação, as redes de atendimento federal, estaduais, municipais e privadas. (MEC, 1995, p. 05). As medidas implementadas nesse período (2ª metade da década de 90) pelo governo federal - via Ministério da Educação - objetivando fortalecer o processo de descentralização já em curso concentraram-se em quatro planos norteadores: 1 - no plano pedagógico, 2 - na dimensão dos recursos e gastos, 3 - no plano da regulação e supervisão do ensino, e 4 - no plano do incremento da política de descentralização, principalmente dos programas federais de apoio ao ensino fundamental. Com relação ao 4º plano norteador, referente às ações de incremento da política de descentralização, Draibe (2001) destaca como seus integrantes: • os programas da merenda escolar - Programa Nacional de Alimentação Escolar, • 23 dinheiro na escola - Programa Dinheiro Direto na Escola23 O PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola destaca-se dos demais por prometer a viabilização da autonomia das unidades escolares no decorrer de sua implementação e execução. Sua peculiaridade o torna alvo de nosso estudo no capitulo 2. {PAGE } • e a TV-Escola - programa de capacitação docente à distância. Tal como alegado por diversos autores, entendemos que as políticas implementadas no final do século XX têm sido fortemente influenciadas por prescrições de organismos internacionais. Lima (2002, p. 43) alerta, porém, para o fato de que: A história destas organizações [Banco Mundial e FMI] está ligada ao aspecto financeiro, ao fornecimento de empréstimos aos países periféricos, mas, sobretudo, ao controle econômico, cultural e político que exercem com os países credores a partir da exigência de cumprimento de condicionalidades, travestidas pela imagem de assessorias técnicas. O fator de maior gravidade consiste no fato de que a exigência da redução de gastos públicos recai nas políticas sociais e no campo educacional, inviabilizando a expansão e a melhoria da qualidade da educação pública. A chegada do século XXI traz algumas novidades no que concerne a propostas do novo governo24, que, porém, não inovam em seus objetivos e perpetuam a intencionalidade das reformas postas em prática anteriormente. No que diz respeito à continuidade e até mesmo ao aprofundamento da descentralização nos programas/projetos educacionais no governo Lula, há indícios de que o Ministério da Educação vem incentivando de forma extensiva, parcerias com Organizações Não-Governamentais - ONGs. Segundo dados do Manual de orientações para assistência financeira a programas e projetos educacionais – 2004, desde o ano 2000 o MEC através do FNDE vem repassando, de forma ininterrupta25, recursos para ONGs, como o que está previsto para o Programa Nacional de Transporte Escolar26. Enfatizar a participação social ou a ação voluntária parece ser o lema e a diretriz para os projetos educacionais voltados para o financiamento e gestão 24 Mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006). No ano de 2003 foram repassados R$ 4.536.947,65 no âmbito do FNDE para 182 ONGs. (Sítio do FNDE consultado em 13/06/05) 26 “O Programa Nacional de Transporte Escolar – PNTE consiste na assistência financeira para aquisição de veículos automotores de transporte coletivo, zero quilômetro, destinados, exclusivamente, ao transporte diário dos alunos com necessidades educacionais especiais, mantidos por Organizações Não-Governamentais – ONG, filantrópicas e sem fins lucrativos, mantenedoras de escolas especializadas do ensino fundamental, de modo a garantir o seu acesso à escola”. (MEC/FNDE, 2004, p. 29) 25 {PAGE } das unidades escolares. Segundo o texto de apresentação do referido Manual de 2005: [...] este Manual estabelece as orientações e diretrizes para a elaboração e a apresentação de projetos educacionais que tenham por finalidade pleitear recursos financeiros oriundos das transferências voluntárias, realizadas pelo MEC/FNDE, promovendo ações supletivas e redistributivas a estados, municípios e organizações não-governamentais para o exercício de 2005. (MEC/FNDE, 2005, p. 10). Nesse sentido, tem-se apostado na descentralização até mesmo de funções antes consideradas estratégicas para órgãos governamentais. É o que ocorreu em caso divulgado pela mídia em julho de 2004, em que uma Organização Não-Governamental assumiu a Secretaria de Educação de uma cidade mineira27. Não nos propusemos aqui a uma avaliação dos projetos/ações do novo governo, mas consideramos fundamental destacar que, em nome da descentralização de funções do MEC e do discurso de incentivo à participação social, estimula-se cada vez mais a interferência de ONGs no funcionamento das Instituições escolares. O próprio Manual de Orientações para assistência financeira a programas e projetos educacionais de 2004, bem como o de 2005, incluem as ONGs, juntamente com estados, Distrito Federal e municípios, na ordem de possíveis elaboradores de projetos a serem financiados pelo MEC. Nesse sentido, destacamos que um dos argumentos mais utilizados em prol da “urgência” de um projeto descentralizador, não só para a esfera educacional, mas para o próprio Estado brasileiro, é a percepção da descentralização enquanto processo de modernização e reestruturação, como único caminho possível para “... vencer a crise fiscal, retomar o desenvolvimento e adquirir credibilidade para o enfrentamento da dívida externa com soberania”. (Mello, 1990. p. 6). Os autores estudados destacam a ambigüidade conceitual com que a questão da autonomia e portanto da descentralização vem sendo tratada e contra-argumentam as principais teses levantadas por defensores das políticas 27 Revista Isto É, Edição 1816 de 28/07/2004. Para sair da UTI - ONG assume Secretaria de Educação de cidade mineira e cria projeto para superar dificuldades de aprendizagem. Rita Moraes. {PAGE } descentralizadoras, quais sejam, a descentralização como promotora da democratização, como propiciadora de maior eficiência das políticas públicas e como indutora da valorização da dimensão local. Tais argumentos não podem continuar sendo anunciados como resultados de reformas descentralizadoras, pois são contestados tanto no âmbito conceitual da formulação das políticas, como nas experiências realizadas. Argumentamos, portanto, que o conceito de autonomia sofre profundas transformações no que concerne a seu entendimento, tanto na comparação a que nos propusemos – na primeira parte desse capítulo - entre sua origem epistomológica e a interpretação utilizada nas políticas do final do século XX, como entre as próprias propostas dos anos 90, que apresentam profundas distorções quanto à interpretação do conceito. Chamamos atenção para o fato de que os conceitos de descentralização e municipalização aparecem nas atuais propostas de reforma da política educacional brasileira interligadas à concepção “utilitária” de autonomia, sendo classificados como o caminho, quase que exclusivo, para atingir o ideal autônomo. Concluímos, portanto, com a perspectiva de que, tal como defende Coraggio (1992), a descentralização pode constituir um importante instrumento de implementação de políticas públicas voltadas para a democratização, para o aperfeiçoamento das instituições e até mesmo para a valorização do âmbito local. Argumentamos, contudo, que enquanto instrumental, a descentralização não poderia ou deveria constituir-se como foco das políticas. A questão está no objetivo das reformas - reformar para descentralizar ou reformar para democratizar, para melhorar a qualidade da educação e para propiciar a efetiva autonomia das unidades escolares? {PAGE } Capítulo 2 - A autonomia das unidades de ensino segundo as atuais políticas educacionais brasileiras “É a concretização de princípios democráticos nas instituições políticas de cada nível de governo que define seu caráter, e não a escala ou âmbito das decisões” (ARRETCHE, 1997: p. 132). O presente capítulo tem como objetivo explicitar a(s) perspectiva(s) de autonomia traduzida(s) nas principais políticas públicas em vigor voltadas direta ou indiretamente para as unidades escolares, com destaque para a realidade do Município e do Estado do Rio de Janeiro28. Para tanto, tratamos das propostas presentes na Constituição Federal, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no Plano Nacional de Educação e no Programa Dinheiro Direto na Escola. No âmbito estadual, estudamos a Constituição do Estado do Rio de Janeiro e a chamada Lei da Autonomia e, no Município do Rio de Janeiro, nos debruçamos em sua Lei Orgânica e na proposta do chamado Sistema Descentralizado de Pagamentos, que estabelece critérios para a utilização de recursos destinados às escolas municipais. 2.1- As propostas federais 2.1.1 – A Constituição Federal29 Na CF de 5 de outubro de 1988, a questão da autonomia propriamente dita não figura como uma das mais recorrentes. O termo autonomia é destaque apenas no Art. 207, referindo-se exclusivamente à autonomia didáticocientífica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades. 28 O Município e o Estado do Rio de Janeiro constituíram o espaço de investigação da forma pela qual as políticas proponentes da autonomia escolar são compreendidas e vivenciadas por professores atuantes em salas de aula e por profissionais envolvidos com a administração escolar propriamente dita. 29 A composição da CF, no que concerne ao campo educacional, foi apresentado no capítulo anterior. Focalizaremos aqui a autonomia escolar na CF. {PAGE } Contudo, no Art. 206, onde são definidos os princípios em que se baseiam o ensino nacional, o inciso VI prevê a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”. Para Pinheiro (2001), o fato do princípio da gestão democrática referir-se somente ao ensino público no texto constitucional, representa um retrocesso em relação ao debate estabelecido no processo constituinte. Segundo a autora: Outras duas modificações, atendendo aos interesses do grupo privado [...], foram as referências apenas ao ensino público quando se tratasse do “plano de carreira” e da “gestão democrática do ensino”. Com isso, a escola privada ficou excluída desses princípios gerais, configurando-se assim a concepção de dois sistemas de ensino distintos, onde princípios fundamentais vigoraram apenas para o setor público. Contraditoriamente, quando se tratou do uso de recursos públicos, o grupo privado procurou tornar-se semelhante ao público. (id., p. 283) Para Oliveira (1996), a incorporação do princípio da gestão democrática do ensino público ao texto constitucional se deu principalmente através de reivindicações do movimento docente, que tinha como bandeira a eleição direta para diretores das escolas. Nesse sentido, Tavares (1990, p. 49 apud OLIVEIRA, p. 23) considera que: [...] o princípio da gestão democrática do ensino público é inédito na história da educação brasileira. [...] De certa forma, ninguém, naquele momento, teve a ousadia de negar a gestão democrática enquanto princípio, talvez porque o próprio processo de elaboração da nova Constituição representava o resgate da democracia no país. Embora Pinheiro (2001) entenda que, ao excluir o ensino privado, o Art. 206 representa um ganho para este setor, muito mais do que para as escolas públicas propriamente ditas, entendemos que a CF de 1988 cria precedentes para que seja levada adiante a efetivação da autonomia das unidades escolares. Partimos desse pressuposto entendendo que a gestão democrática, embora não seja garantia, é condição fundamental para o alcance da autonomia da escola e que, uma vez garantido na CF, caberia à LDB, o aprofundamento do princípio da gestão democrática e o estabelecimento das formas pelas quais esse princípio se efetivaria ao menos nas escolas públicas. Contudo, como veremos a seguir, nem a LDB promulgada, tampouco o PNELei tratam do princípio da gestão democrática de forma aprofundada. {PAGE } Outras questões tratadas na CF que entendemos como diretamente relacionadas ao debate sobre a autonomia escolar dizem respeito ao estabelecimento de uma base curricular comum para o ensino fundamental e a oferta do ensino religioso em escolas públicas. O Art. 210 da CF determina que: “Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais”. Segundo Cunha (1999), essa determinação converge com as reivindicações de educadores progressistas que, à época da constituição do texto legal, defenderam uma base comum nacional para o ensino, em contraposição à tese do regionalismo e do localismo como determinantes curriculares30. Referindo-se ao § 1° do mesmo Art., em que o ensino religioso, embora com matrícula facultativa, passa a constituir disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, Cunha (1999, p. 451) afirma que: O texto constitucional se confronta com as reivindicações dos educadores progressistas de que o ensino público seja totalmente laico. [...] Com isso, incorporou a demanda dos grupos clericalistas e dos conservadores em geral. Entendemos que a imposição legal da presença do ensino religioso na escola pública cerceia a autonomia da escola pois, ainda que abandonemos o referencial progressista31 e pensarmos a autonomia da escola com base no referencial de valorização da localidade, a imposição do ensino religioso em escolas públicas, pode discriminar estudantes de localidades em que não há a prevalência de indivíduos religiosos. Como veremos a seguir, houve a tentativa de estruturação de uma LDB pautada no processo democrático em sua constituição e na perspectiva da democratização do espaço escolar (principalmente da escola pública). Contudo, um atropelamento dessas ações e intenções possibilitou o 30 A questão é bastante polêmica pois, como veremos no capítulo 3, alguns professores entrevistados, defendem que a escola deveria definir o conteúdo programático a ser trabalhado, exclusivamente de acordo com aspectos relacionados à localidade da escola e à realidade dos alunos. 31 A defesa do ensino público, gratuito e laico conforme o Fórum Nacional da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito. {PAGE } prevalecimento de uma LDB omissa ou superficial em questões importantes, como a eleição de diretores das unidades escolares. 3.1.2 – A LDB - Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996 e suas versões antecessoras. O clima de re(democratização) do país e o processo constituinte impulsionaram anseios por novas diretrizes para o ensino nacional. As experiências de “gestão” democratizadora nas prefeituras e nos estados que elegeram seus governantes32 mostraram a necessidade da construção/elaboração de novos parâmetros legais, que considerassem as novas perspectivas e necessidades da educação brasileira. Já em 1987, em meio ao processo de elaboração das propostas educacionais a serem incorporadas no texto constitucional, deu-se início ao movimento em prol da elaboração do que seriam as novas diretrizes e bases da educação nacional. Tendo sido promulgada a CF em 5 de outubro de 1988, o Deputado Octávio Elíseo, do PSDB de MG, apresentou à Câmara Federal, em dezembro do mesmo ano, o primeiro projeto de lei de LDB que recebeu o nº 1.258-A/88. Embora o texto do projeto tenha resultado, em parte, da mobilização de um setor progressista da comunidade educacional, não há nele menção sobre a autonomia das unidades escolares. Tendo em vista tal omissão, poderíamos interpretar que essa e outras questões seriam definidas em um Plano Nacional e nos Planos Estaduais e Municipais de Educação. Art. 15 – As linhas mestras da administração da educação serão definidas no Plano Nacional de Educação e nos Planos Estaduais aprovados de 4 em 4 anos pelos respectivos Conselhos de Educação. Ao projeto de lei 1258-A/88 foram anexadas 3 emendas do próprio autor, 7 projetos completos de LDB, 17 projetos sobre aspectos específicos da 32 Conforme estudado no capítulo anterior. {PAGE } educação nacional e 978 emendas de diversos deputados. Saviani (2000, p. 57) destaca que [...] além dessas propostas formalmente registradas na Câmara dos Deputados, é preciso mencionar que um número incontável de sugestões dos mais distintos locais também foi levado à consideração do relator. A “comunidade” educacional organizou-se através do Fórum em Defesa da Escola Pública na LDB, que reunia cerca de 30 entidades de âmbito nacional33. A Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, em 28 de junho de 1990, aprovou o texto substitutivo que ficou conhecido como “substitutivo Jorge Hage”. O substitutivo Jorge Hage defende o princípio da gestão democrática em vários momentos do texto34. O Art. 7º, inciso VI, prevê a gestão democrática como princípio da educação escolar, abrangendo, portanto, o ensino particular e não somente o ensino público. Na perspectiva do Substitutivo, as instituições privadas são incorporadas ao Sistema Nacional de Educação, o que pode ser considerado um avanço em relação à CF. O Art. 9° trata dos objetivos e normas do Sistema Nacional de Educação, dentre os quais: a administração democrática da política educacional; a participação da comunidade educacional e o fortalecimento das unidades escolares através da descentralização dos processos de decisão e execução. No Art. 15, propõe-se que os sistemas de ensino de Estados e Municípios se pautem, em sua organização e composição, pelos mesmos princípios democráticos que o Sistema Nacional de Educação e que todo o processo se dê através da forma colegiada e representativa, com a participação das comunidades interna e externa. 33 Eram elas: “ANDE, ANDES-SN, ANPAE, ANPEd, CBCE, CEDES, CGT, CNTE, CNTEEC, CONAM, CONARCFE (depois ANFOPE), CONSED, CONTAG, CRUB, CUT, FASUBRA, FBAPEF, FENAJ, FENASE, FENOE (as duas últimas, depois, se integraram à CNTE), OAB, SBF, SBPC, UBES, UNDIME E UNE, além das seguintes entidades convidadas: CNBB, INEP e AEC”. Saviani (2000, p. 57). 34 Texto do “Substitutivo Jorge Hage” in Saviani (2000, p. 71). {PAGE } O Art. 21 retoma a discussão da elaboração do texto constitucional e ousa impor, às instituições privadas de ensino que recebem recursos públicos, as mesmas diretrizes viabilizadoras da democratização da gestão escolar propostas às escolas públicas. Nesse sentido, conselhos compostos por representantes das comunidades interna e externa à escola participariam ativamente da administração escolar em todas as suas dimensões, incluindo-se o aspecto pedagógico35 e a escolha dos dirigentes36. No Art. 22, há referência direta à autonomia das unidades escolares através da previsão de garantia, pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino, da autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira. A autonomia de gestão financeira37 das escolas é entendida como: a competência para o ordenamento e a execução de gastos rotineiros de manutenção e custeio, excetuados os relativos a pessoal. O Substitutivo Jorge Hage – PL 1.158-B de 1988, foi aprovado pela Comissão de Educação em 28 de junho de 1990 passando ainda por diversas comissões na Câmara dos Deputados e obtendo aprovação final em 13 de maio de 1993. Durante a tramitação do Substitutivo na Câmara, o senador Darcy Ribeiro - PDT/RJ deu entrada a um Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação, o PL 67/92, em 20 de maio de 1992, na Comissão de Educação do Senado Federal38. 35 Estamos nos referindo à gestão do ensino conforme o texto legal, que inclui a discussão ampla dos objetivos e prioridades anuais. 36 No caso das escolas públicas, haveria a opção pelo sistema de mérito através de concurso. 37 Não há menção sobre as concepções de autonomia pedagógica e administrativa da Lei. 38 “Numa sistemática de funcionamento bicameral como é o caso do Parlamento Brasileiro, um projeto de lei pode ser apresentado e iniciar sua tramitação, (...), em qualquer uma das duas casas do Congresso. Assim, se um projeto começa a sua tramitação na Câmara dos Deputados, ao ser aprovado deverá seguir para o Senado que funcionará como casa revisora. Uma vez aprovado no Senado, havendo alterações, o projeto deve retornar à Câmara para deliberação final após a qual é encaminhado para sanção ao Presidente da República, que, por sua vez, detém o direito de veto. Se houver vetos, o projeto deve retornar à Câmara, que pode manter ou derrubar os vetos. Só então a lei é promulgada. Caso o projeto comece a tramitar no Senado segue-se o mesmo processo, invertendo-se as posições; nessa hipótese é a Câmara dos Deputados que desempenha o papel de casa revisora. Formalmente é possível também que, estando um projeto tramitando em uma das duas casas, surja outro projeto sobre a mesma matéria na outra casa. Nesse caso prevalece o projeto que for aprovado antes, transformando a outra casa em câmara revisora”. (SAVIANI, 2000, p. 127). {PAGE } Conforme Saviani (2000, p. 129): [...] o projeto do Senador tem por base uma concepção de democracia representativa na qual a participação da sociedade se limita ao momento do voto através do qual se dá a escolha dos governantes. Uma vez escolhidos, estão eles legitimados para tomar as decisões em nome de toda a sociedade, não necessitando mais sequer consultá-la. No PL 67/92 – Darcy Ribeiro, não há menção à questão da autonomia escolar e, a gestão democrática aparece de forma limitada no Art. 3º inciso VII tal como na Constituição Federal: Art. 3º - O ensino é ministrado com base nos seguintes princípios: VII – gestão democrática do ensino público, na forma da lei; O substitutivo Jorge Hage foi identificado no Senado como PLC – Projeto de Lei da Câmara nº 101, de 1993, sendo seu novo relator na Comissão de Educação, o senador Cid Saboia – PMDB/CE. Dessa forma, apresentou-se um novo substitutivo, que “preservava a estrutura do projeto aprovado na Câmara, tendo incorporado aspectos aceitáveis do PLS 67, de 1992, de autoria do senador Darcy Ribeiro” (SAVIANI, 2000, p. 56), sendo encaminhado ao Plenário do Senado em 12 de dezembro de 1994. A troca ministerial do governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, e a entrada de Paulo Renato Costa de Souza no Ministério da Educação, causou um retrocesso na tramitação do então substitutivo Cid Sabóia. [...] Tal posição se manifesta quando, apenas iniciada a nova Legislatura, o senador Beni Veras (PSDB-CE) apresenta requerimento solicitando o retorno do projeto de LDB à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. [...] A relatoria do projeto na Comissão de Constituição e Justiça foi assumida pelo senador Darcy Ribeiro. Consumada a manobra regimental, o senador dá a conhecer seu parecer em 21 de março de 1995 (SAVIANI, 2000, p. 159). O relator Darcy Ribeiro alegou inconstitucionalidades no PLC 101/93 e no substitutivo Cid Sabóia. Diante de uma certa comoção que se seguiu à inteira mudança de rumo a que fora conduzido o projeto de LDB, o senador Ribeiro foi apresentando sucessivas versões de seu {PAGE } substitutivo incorporando emendas que atenuassem de algum modo as resistências e o mal-estar provocados pela estratégia acionada que ficou conhecida como “manobra regimental”. (SAVIANI, p. 160) A última versão foi aprovada pelo Senado em 8 de fevereiro de 1996 e retornou à Câmara dos Deputados como substitutivo Darcy Ribeiro, sendo aprovado, em 17 de dezembro de 1996, na íntegra, pela Câmara, sancionado e promulgado como a nova LDB – Lei 9.394, em 20 de dezembro de 1996, pelo Presidente FHC. No que diz respeito à autonomia das unidades escolares, a Lei é superficial e não traz em seu texto uma definição clara sobre como se efetivaria a autonomia das escolas. O Art. 3°, que define os princípios do ensino nacional, em seu inciso VIII prevê a “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino”. Esse Artigo é extremamente importante pois menciona a gestão democrática do ensino público sem referir-se à eleição direta para diretores indicando, portanto, que não há no Brasil, salvo quando previsto nas leis estaduais e/ou municipais, a obrigatoriedade da eleição de diretores tanto em escolas públicas como privadas. O art. 12, que trata das incumbências dos estabelecimentos de ensino, encarrega as unidades escolares, dentre outras funções, da elaboração e execução de sua proposta pedagógica e da administração de pessoal e dos recursos materiais e financeiros, sem mencionar a participação coletiva nesse processo. O Art. 14 joga a responsabilidade pela definição de normas de gestão democrática para os “sistemas de ensino”39 mas dita os princípios que deve seguir a gestão democrática, a ser definida e implementada por estados e municípios. Nesse sentido, são reivindicadas a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. 39 Entenda-se estados e municípios. {PAGE } Embora o Artigo destaque a participação dos profissionais da educação e das comunidades escolar e local, a referida participação é pré-definida, não havendo indicação, por exemplo, sobre a participação dos conselhos, constituídos com representantes das comunidades escolares, na elaboração ou no acompanhamento da execução do projeto pedagógico das escolas. Por último, segundo o Art. 15, os sistemas de ensino assegurarão progressivos graus de autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira às escolas públicas de educação básica. Apesar de tratar especificamente da autonomia das unidades de ensino, o Art. 15 mantém o tom superficial da Lei e não determina as formas pelas quais os sistemas de ensino podem assegurar a autonomia das escolas. 3.1.3 - O Plano Nacional de Educação40 Da mesma forma que a LDB, a elaboração e a aprovação do PNE se deu em meio a intensas disputas entre propostas de diversos matizes políticoideológicos. Também o PNE aprovado em 2001 mantém a superficialidade com relação à democratização das unidades escolares e se detém numa visão limitada do que convencionou-se chamar de gestão democrática. A movimentação em torno da elaboração do Plano Nacional de Educação tem início no primeiro semestre de 1997, com a divulgação pelo MEC do documento – Plano Nacional de Educação/proposta inicial dos procedimentos a serem seguidos, contendo: estratégias para a elaboração do PNE, sistemática de trabalho “[com indicação dos] principais interlocutores, a forma das reuniões previstas e o modo de incorporação das contribuições para cada um dos itens que integrarão o PNE, [...]” (SAVIANI, 1998, p. 81) e um cronograma determinando o período entre junho e dezembro de 1997 como prazo para elaboração do Plano. 40 Aprovado em 9 de janeiro de 2001 pela Lei 10.172. {PAGE } Além da “Proposta Inicial”, o MEC divulgou em agosto de 1997 o texto “Proposta para o Documento: roteiro e metas para orientar o debate sobre o Plano Nacional de Educação”. Para Saviani (1998, p. 84), a proposta do MEC se limitava a reiterar a política educacional que vinha sendo conduzida pelo Ministério e que implicava a compressão dos gastos públicos, a transferência de responsabilidades, especialmente de investimento e manutenção do ensino para Estados, Municípios, iniciativa privada e associações filantrópicas, ficando a União com as atribuições de controle, avaliação, direção e, eventualmente, apoio técnico e financeiro de caráter complementar. Em dezembro do mesmo ano, vem a público, sob o título “versão preliminar para discussão interna”, uma segunda proposta do MEC para o PNE. Cabe destacar que o Art. 87, § 2º da LDB, determina o prazo de 1 ano, a contar da data de publicação da própria LDB, para o encaminhamento ao Congresso Nacional do PNE. Nesse caso, o MEC estava ainda divulgando sua proposta de PNE no mês limite estabelecido por lei para o envio do Plano ao Congresso Nacional. Segundo Neves (2000, p. 163) a realização do I CONED – Congresso Nacional de Educação41, em Belo Horizonte, em agosto de 1996, é resultado da insatisfação de organizações de trabalhadores da educação com relação a explicitação das diretrizes políticas neoliberais através de “instrumentos governamentais de reforço à exclusão social e educacional”. Do I CONED resultou a Carta de Belo Horizonte42 e a decisão de “intervir nas políticas educacionais como a única forma de satisfazer as reais necessidades da maioria da população” (Id.). Apesar dos resultados do Congresso, ainda em 1996 o Congresso Nacional aprovou a EC 14 (PEC 30/96) e a Lei 9394 - LDB. 41 Segundo Neves (2000, p. 163) participaram da organização do I CONED: A AELAC, ANDE, ANDES-SN, CNTE, CONTEE, DNTE-CUT, FASUBRA, SINASEFE, UBES, UNE e UNDIME. 42 “ ... a Carta de Belo Horizonte [...] repudiou as leis já promulgadas no ano de 1995 e os vários dispositivos legais em tramitação no Congresso Nacional: o parecer n° 72/96, o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Darcy Ribeiro/MEC; o PL n° 1.603/96 – Projeto de Lei sobre Educação Profissional e organização da Rede Federal de Educação Profissional; a PEC nº 370/96 – Proposta de Emenda Constitucional desmembrada da PEC 233 a/95, sobre autonomia universitária; a PEC 30/96 – Proposta de Emenda Constitucional no Senado, aprovada na Câmara (PEC 233 a/95) sobre o financiamento da Educação Básica”. Neves (2000, p. 164). {PAGE } Dando continuidade às propostas aprovadas no I Congresso, realizou-se entre 6 e 9 de novembro de 1997 o II CONED, quando as entidades reunidas aprovaram sua proposta de PNE, elaborada a partir de intenso debate e com a participação de inúmeras entidades cientítico-político-educacionais. O Plano Nacional de Educação: Proposta da Sociedade Brasileira foi protocolado como PL nº 4.155/98 no dia 10 de fevereiro de 1998. Dois dias depois, 12 de fevereiro de 1998, foi encaminhado ao Congresso Nacional a proposta do MEC para o PNE identificada como o PL n° 4.173/98 No PNE-Coned, a gestão democrática está entre as diretrizes da proposta juntamente com o ideário da constituição de um Sistema Nacional de Educação. Parte-se do pressuposto de que todas as instituições de ensino (públicas e privadas) deveriam fazer parte de um Sistema Nacional de Educação e que a gestão democrática deveria nortear as relações inter e intra institucionais. Na defesa dessas diretrizes, propõe-se: Revogar imediatamente toda a legislação que impede ou fere a organização e o funcionamento democrático da educação brasileira (Lei 9.192/95; Lei 9.131/95; Lei 9.394/96; Emenda Constitucional 14/96; Lei 9424/96, Decreto 2208/97; entre outras)43. No PNE-Coned estão previstas diretrizes específicas para a gestão democrática da educação, dentre as quais: a descentralização do Estado de forma a possibilitar a autonomia didático-pedagógica, administrativa e financeira das instituições educacionais; a revogação das leis contrárias à gestão democrática dos sistemas de ensino e unidades escolares; a articulação das diferentes esferas de poder (federal, estadual e municipal), com vistas à 43 A Lei 9.192/95 altera dispositivos da Lei. n° 5.540, de 28 de novembro de 1968, que regulamentam o processo de escolha dos dirigentes universitários; a Lei 9.131/95 altera os artigos 6°, 7°, 8° e 9° da Lei n° 4024, de 20 de dezembro de 1961 que tratam do Conselho Nacional de Educação; a Lei 9.394/96 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional; a Emenda Constitucional 14/96 que modifica os arts. 34, 208, 211 e 212 da Constituição Federal, e dá nova redação ao art. 60 do ato das Disposições Transitórias criando o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério e o Decreto 2208/97 que regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, tratando da educação profissional. {PAGE } integração de seus planos de educação; a articulação de cada sistema educacional considerando as especificidades das unidades e as demandas educacionais da população; o estímulo da discussão em torno do direito à participação na tomada de decisão pelos usuários e profissionais da educação garantindo condições adequadas (informações, locais, horários, materiais etc.) para o exercício da gestão democrática da educação em nível local e mais amplo; a utilização dos veículos de comunicação de massa de forma a incentivar a participação da sociedade na definição das prioridades educacionais, em âmbito local, regional e nacional, divulgando as experiências de participação e decisão; a garantia da autonomia político-pedagógica às instituições educacionais, assegurando-lhes condições materiais e financeiras; a avaliação das instituições educacionais interna e externamente, via processo coordenado pelos Conselhos Superiores e Conselhos Sociais (nas instituições de educação superior) e pelos Conselhos Escolares (nas unidades escolares de educação básica); e a criação de estratégias para o acompanhamento da implementação do Plano Nacional de Educação pela sociedade civil pressionando as diferentes esferas de poder (federal, estadual e municipal) para que ocorra a necessária integração entre seus Planos de Educação. Para o cumprimento dessas diretrizes, destacam-se as seguintes metas: - a realização de eleições diretas e paritárias de dirigentes das unidades escolares e universitárias; Estaduais a criação do Fórum Nacional de Educação, Fóruns e Municipais acompanhamento, com avaliação e atribuições reorientação deliberativas das de políticas educacionais e de implementação do PNE, com a participação democrática de representantes da sociedade civil organizada e da sociedade política, com garantia de autonomia, orçamento e infraestrutura. - a criação dos Conselhos Escolares deliberativos, como instrumentos de construção coletiva e democrática das propostas político-pedagógicas das unidades escolares; e {PAGE } - a democratização da composição dos Conselhos Escolares pelo critério de paridade entre profissionais das escolas e usuários, garantindo-se a representação de todos os segmentos no seu interior. No que diz respeito especificamente ao Ensino Fundamental, propõe-se dentre outras, a seguinte diretriz: Reforçar o projeto político-pedagógico da escola, como a própria expressão da organização educativa da unidade escolar. Essa organização deve orientar-se pelos princípios democráticos e participativos, materializados na formação dos Conselhos Escolares e na escolha de dirigentes pela comunidade escolar44. Destacamos ainda as metas com relação ao Ensino Fundamental: a garantia dos recursos financeiros e materiais necessários à execução do projeto político-pedagógico das escolas públicas; e a organização de um sistema de informações estatísticas e de divulgação das avaliações da política e dos resultados das ações político-pedagógicas no ensino fundamental. A gestão democrática é valorizada em toda a extensão da Proposta de PNE e, com relação ao Ensino Fundamental, o Projeto Pedagógico e a efetiva participação em sua elaboração são tidos como fundamentais. Já a proposta do MEC, na Exposição de Motivos do PL 4.173/98, – E. M. Nº 221, de 16 de dezembro de 199745, o Sr. Ministro da Educação, Paulo Renato Souza, destaca 19 inovações de sua proposta de PNE. A 19ª “inovação” prevê: “A participação da comunidade na gestão, melhoria da qualidade e manutenção da escola, sem que se exima o Poder Público de suas responsabilidades”. A meta de n° 5, referente ao Ensino Fundamental, prescreve: Estabelecer medidas para assegurar que, em três anos, todos os Estados e Municípios tenham estabelecido suas diretrizes curriculares e que todas as escolas tenham formulado seus projetos pedagógicos, observando as sugestões dos parâmetros curriculares nacionais e as diretrizes emanadas do 44 SAVIANI, (1998, p, 145). Anexo XI – Diretrizes e metas do Plano Nacional de Educação proposto pela oposição. 45 Embora o PL 1.473/98 tenha sido encaminhado ao Congresso Nacional juntamente com a EM 221 em 12 de fevereiro de 1998. {PAGE } Conselho Nacional de Educação, dos Conselhos Estaduais de Educação e, quando for o caso, dos Conselhos Municipais de educação. Nesse Projeto de Lei, as metas 17, 18 e 19 para o Ensino Fundamental tratam da participação da comunidade na gestão escolar, sem mencionar a democratização desta gestão. Propõe-se, na verdade, a participação passiva da comunidade, através do trabalho voluntário e, conforme as metas 5 e 18, uma pseudo-autonomia na elaboração do projeto pedagógico e da gestão dos recursos financeiros. 17. Universalizar, em três anos, a instituição de Conselhos Escolares ou órgãos equivalentes nas escolas, a fim de assegurar a participação da comunidade na gestão escolar. 18. Assegurar a autonomia das escolas tanto no que diz respeito ao projeto pedagógico como em termos de recursos financeiros públicos suficientes para a manutenção do cotidiano escolar. 19. Valorizar a participação da comunidade na gestão, manutenção física e melhoria do funcionamento das escolas, incentivando o trabalho voluntário, sem eximir o Poder Público das suas obrigações constitucionais. As duas propostas tramitaram juntas na Câmara dos Deputados, sendo indicado como relator da Comissão de Educação o deputado Nelson Marchezan (PSDB/RS) que, “coincidentemente”, fazia parte do partido da base governista. O relator procedeu à elaboração de relatório que configurou-se em um substitutivo ao PNE-Coned, vindo a tornar-se o texto-base da lei. Dessa forma, o substitutivo Nelson Marchezan, como ficou conhecido, tornou-se a Lei n° 10.172/01 que aprova o Plano Nacional de Educação “acrescidos“ dos vetos presidenciais. Os inúmeros vetos atacaram todas as possibilidades de aumento de recursos para a educação. Nas palavras de Valente, (2002, p. 131): [...] o governo vetou o que atenua no PNE o seu traço de uma grande listagem contendo intenções, mais ou menos, genéricas sobre política educacional. Isto é, vetou tudo o que aproximava de um plano, dotando-o do principal meio – verbas – para viabilizar as diretrizes e metas propostas. Ainda segundo Valente, (2002, p. 109) Este PNE [aprovado pelo Congresso Nacional] é tributário da rejeição à construção de um verdadeiro Sistema Nacional de Educação, postura que, aliás, historicamente tem marcado as políticas educacionais das classes dominantes. Como {PAGE } alternativa ao sistema educacional, reafirmou-se, conferindolhe o estatuto de lei ao Sistema Nacional de Avaliação – instrumento nuclear da política de ultracentralização da gestão da educação na União. Com o discurso de promoção da descentralização, presente no PNE-Lei aprovado, outorga-se uma autonomia cerceada pelo Sistema Nacional de Avaliação, o que, na prática, centraliza o planejamento na esfera federal, que é a instância definidora (de forma isolada) dos objetivos e metas educacionais. Ainda segundo Valente, (Id.) O PNE [...] além de reduzir democracia à “participação da comunidade escolar e da sociedade” na implementação prática de deliberações definidas na cúpula do Estado, esta é entendida como algo de interesse exclusivo do ensino público. Nesse sentido, vejamos o que o PNE, em vigor desde 9 de janeiro de 2001, traz sobre as questões relacionadas à autonomia da escola. No item 2 – sobre os objetivos e prioridades do PNE destacamos: - democratização da gestão do ensino público, nos estabelecimentos oficiais, obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. Tal como o PL 4.173/98, o Plano não apresenta compromisso com uma efetiva democratização do espaço escolar e limita sua concepção de gestão democrática à participação da comunidade escolar na execução de planos previamente decididos. Com relação ao Ensino Fundamental, o PNE aprovado traz como uma de suas diretrizes a participação dos conselhos escolares como “fiscalizadores” do cumprimento de metas dos Projetos Pedagógicos e não em sua elaboração. Nesse sentido destacamos a seguinte diretriz do Ensino Fundamental: Reforçando o projeto político-pedagógico da escola, como a própria expressão da organização educativa da unidade escolar, surgem os conselhos escolares, que deverão orientarse pelo princípio democrático da participação. A gestão da educação e a cobrança de resultados, tanto das metas como dos objetivos propostos neste plano, envolverão comunidade, alunos, pais, professores e demais trabalhadores da educação. Nesse sentido, destacamos as seguintes metas para o ensino fundamental: assegurar, no prazo de três anos, que todas as escolas tenham {PAGE } formulado seus projetos pedagógicos de acordo com as Diretrizes Curriculares para o ensino fundamental e com os Parâmetros Curriculares Nacionais; promover, no prazo de dois anos, a participação da comunidade na gestão das escolas através da instituição de conselhos escolares; e assegurar a elevação do desempenho dos alunos via implantação de um programa de monitoramento que utilize os indicadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica e dos sistemas de avaliação dos Estados e Municípios. A respeito da questão do financiamento e da gestão, destacamos as seguintes diretrizes: a promoção da efetiva desburocratização e descentralização da gestão nas dimensões pedagógica, administrativa e financeira através do repasse de recursos diretamente às escolas para o desenvolvimento do essencial da proposta pedagógica, e para despesas cotidianas; e a implantação da gestão democrática no nível da gestão de sistemas e das unidades escolares através da formação de conselhos. No primeiro caso na forma de Conselhos de Educação que reúnam competência técnica e representatividade dos diversos setores educacionais e, no caso das escolas, por meio da formação de conselhos escolares de que participe a comunidade educacional e formas de escolha da direção escolar que associem a garantia da competência ao compromisso com a proposta pedagógica emanada dos conselhos escolares e a representatividade e liderança dos gestores escolares. Conforme destacado, o PNE aprovado deixa brechas ou omissões em sua composição e não tem a efetiva democratização do espaço escolar como meta. Sintomaticamente, também o PNE não torna obrigatória a eleição para diretores das unidades de ensino, delegando a Estados e Municípios o ônus ou bônus dessa decisão46. 46 Veremos adiante como essa decisão foi tomada no Estado e no Município do Rio de Janeiro. {PAGE } 3.1.4 – O PDDE O Programa Dinheiro Direto na Escola, implantado pelo Ministério da Educação em 1995, com a denominação de PMDE – Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental, passa a utilizar a atual denominação por força da Medida Provisória nº. 1.784, de 14/12/98, e suas reedições. No contexto das mudanças estruturais da década de noventa, o PDDE foi concebido a partir da perspectiva da descentralização dos recursos federais com o objetivo de propiciar: [...] a melhoria da qualidade do ensino fundamental e da eqüidade da sua oferta, reforçando a autonomia gerencial e a participação social das unidades escolares, assegurando-lhes as condições mínimas indispensáveis ao seu bom funcionamento”. (MEC/FNDE, 2001, p. 7). Atende às escolas do ensino fundamental do sistema público de ensino e às escolas de educação especial mantidas por entidades sem fins lucrativos ou similar que preste atendimento direto e gratuito ao público, inscritas no Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS. De acordo com o Art. 2° da Resolução FNDE/CD N° 17, de 9 de maio de 2005, os recursos do PDDE devem ser destinados para: [...] cobertura de despesas de custeio, manutenção e de pequenos investimentos, de forma a contribuir, supletivamente, para a melhoria física e pedagógica dos estabelecimentos de ensino beneficiários, devendo ser empregados: I – na aquisição de material permanente, quando receberem recursos de capital;47 II – na manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade escolar; III – na aquisição de material de consumo necessário ao funcionamento da escola; IV – na capacitação e aperfeiçoamento de profissionais da educação; V – na avaliação da aprendizagem; VI – na implementação de projeto pedagógico; e 47 De acordo com o § 4° do Art. 5° da Resolução, as escolas com até 50 alunos matriculados que não possuírem UExs – Unidades Executoras próprias, só receberão recursos destinados à cobertura de despesas de custeio, o que representa 80% do valor total dos recursos a que teriam direito. {PAGE } VII – no desenvolvimento de atividades educacionais. Os recursos repassados são calculados com base em uma tabela elaborada pelo MEC, levando em consideração o número de matrículas no Censo escolar do ano anterior e a localização geográfica da escola48. A forma de distribuição dos recursos do Programa se dá através de depósitos nas contas das chamadas Unidades Executoras (UEx)49, que têm o poder de utilizá-los de acordo com as decisões da comunidade escolar. As escolas com menos de 50 alunos que não possuem UEx50 própria, podem receber os recursos via EEx – Entidade Executora e as que têm mais de 50 e menos de 99 alunos do ensino fundamental matriculados, só poderão receber os recursos por intermédio de sua UEx própria ou por meio de consórcios de escolas formando uma única UEx51. Embora Draibe (2001, p. 72) proclame que o PDDE contemple “objetivos de reforço da autonomia da escola e estímulo ao envolvimento e à maior participação da comunidade escolar”, a legislação pertinente ao Programa, no geral, faz apenas uma descrição operacional da sistemática do uso e da prestação de contas dos recursos que chegam às escolas. De acordo com o Manual de Procedimentos Operacionais relativos às transferências de recursos às escolas das redes estadual e municipal de ensino fundamental, aprovado pela Resolução Nº 12 do FNDE, de 10 de maio de 1995: 48 São três as tabelas referenciais. A primeira corresponde ao “Referencial de cálculo dos valores a serem repassados às Escolas Públicas situadas nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste”, com exceção do Distrito Federal; a segunda ao “Referencial de cálculo dos valores a serem repassados às escolas Públicas situadas nas Regiões Sul, Sudeste e no Distrito Federal”, e a terceira tabela corresponde ao “Referencial de cálculo dos valores a serem repassados às escolas privadas que ministram educação especial”. (RES FNDE/CD N° 17, de 09/05/05). 49 De acordo com o Parágrafo único do Art. 3° (Id.) Unidade Executora – Uex – constitui “o órgão, entidade ou instituição responsável pelo recebimento, execução e prestação de contas dos recursos transferidos, pelo FNDE, para o atendimento das escolas beneficiárias do PDDE” 50 As Unidades Executoras – UEXs podem ser: UEx própria – que representa a comunidade das escolas públicas beneficiárias do PDDE; Entidade executora – EEx – prefeitura municipal e secretarias de educação estadual e do Distrito Federal, quando recebem e executam os recursos do PDDE destinados às escolas públicas que não instituíram UEx própria e Entidade Mantenedora – EM – entidade sem fins lucrativos e inscrita no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), responsável pela representação de escolas privadas de educação especial beneficiárias do PDDE. 51 Até 2003 era permitida a formação de consórcios de até 20 escolas. De 2004 em diante, só é permitida a congregação de no máximo 5 escolas por UEx. {PAGE } Não pode nem deve o Governo Federal criar escolas, mantêlas e remunerar professores. Incumbe-lhe, entretanto, prestar assistência financeira supletiva aos sistemas estaduais e municipais de ensino, para que os referidos objetivos sejam atingidos. (MEC/FNDE, 1995, apresentação) Diferentemente da perspectiva de autonomia por nós defendida, em que a democratização da escola é condição fundamental, o PDDE, em articulação com a trajetória das principais diretrizes das atuais políticas educacionais brasileiras, refere-se ao termo autonomia como sinônimo de autonomia da gestão financeira. Parte do pressuposto de que a gestão dos recursos repassados diretamente às escolas é condição suficiente para que as mesmas adquiram sua autonomia. {PAGE } 2.2- As propostas do Estado do Rio de Janeiro 2.2.1 – A Constituição Estadual Elaborada em 1989 a Constituição do Estado do Rio de Janeiro52 dedica 15 artigos específicos para a educação dos quais destacamos o 307, que prevê os princípios do ensino, e o 308, que trata da forma pela qual deve ser efetivado o dever do Estado e dos Municípios com a educação. Segundo o Art. 307, inciso VI da Constituição Estadual, a gestão democrática constitui um dos princípios norteadores do ensino público, devendo ser desempenhada através da participação da sociedade (pais, professores, estudantes e funcionários), na formulação, acompanhamento e execução da política educacional, e o Art. 308, inciso XII prevê eleições diretas para a direção das instituições de ensino mantidas pelo Poder Público53. No Art. 1° da Lei 2.518 está prevista a eleição direta para os cargos de Diretor e Diretor Adjunto das instituições de ensino mantidas pelo Poder Público. Se retomarmos o debate presente na elaboração do Plano Nacional de Educação54, sobre o Sistema Nacional de Educação, podemos considerar que, tanto a Constituição quanto a Lei estadual estariam avançando na direção da formação do que poderia vir a ser um Sistema Estadual de Educação, tendo em vista que a determinação da eleição direta para a direção das instituições 52 Os artigos que tratam especificamente da educação na Constituição do Estado do Rio de Janeiro vão do 306 ao 321. 53 As Leis que regulamentam o inciso XII do Art. 308 são: a {HYPERLINK "/CONTLEI.NSF/c8aa0900025feef6032564ec0060dfff/141b0b4be49c034e032564f8006957b5? OpenDocument"} e a {HYPERLINK "/CONTLEI.NSF/c8aa0900025feef6032564ec0060dfff/61b83c32953abb860325668e00664fe0? OpenDocument"}, que dispõe sobre a autonomia das unidades escolares da rede pública do Estado do Rio de Janeiro. O Art. 308, inciso XII, a lei 2.518 e o Art. 5º, incisos I e II, da Lei 3067 foram suspensos pela liminar deferida pelo STF à Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIn Nº 2997, ajuizada no Supremo Tribunal Federal pelo Partido Social Cristão – PSC em 18 de setembro de 2003. 54 Estamos nos referindo à proposta de PNE do II CONEd que constituiu o PL nº 4.155/98. {PAGE } de ensino55 não se restringiria às escolas públicas, abrangendo, inclusive as escolas particulares que eventualmente recebessem recursos públicos. A Lei, porém, descreve os procedimentos a serem adotados nas eleições para diretores e diretores adjunto apenas nas instituições públicas. Do Art. 3º ao 1656 são ditadas as regras mais específicas do processo eleitoral propriamente dito, tais como as exigências para a candidatura57, as atribuições da comissão eleitoral, a constituição do eleitorado, a forma de apuração dos votos, além dos casos específicos como as escolas recém-inauguradas e diretores pertencentes a outra rede pública na segunda matrícula. O Art. 17 prevê a regulamentação da lei pelo executivo no prazo de 90 dias e o Art. 18 revoga as disposições contrárias. Contudo, a ADIn 2997 ataca o Art. 308, inciso XII da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a Lei n° 2.518/96 e a Lei n° 3.067/9858, além de outras resoluções da Secretaria Estadual de Educação do ano de 1998, com a argumentação de que tais normas são incompatíveis com a Constituição Federal, principalmente, com o Art. 37, inciso II. - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; Dessa forma, em 29 de outubro de 2003, o Supremo Tribunal Federal suspendeu, com eficácia ex nunc (que não retroage), o inciso XII do artigo 308 da Constituição Estadual, a lei 2.518/96 e os incisos I e II do artigo 5º da Lei 3.067/9859 alegando que o cargo de diretor de unidade escolar classifica-se 55 Cabe esclarecer que não entendemos a eleição de diretores como garantia da efetivação da autonomia escolar mas como condição primeira para que a mesma possa ser viabilizada; ou seja, acreditamos que sem eleição não há autonomia das/nas unidades escolares. 56 Os Arts. 2º, 7° e 13 foram vetados pelo Governador Marcelo Alencar. 57 Para candidatar-se, o professor deve, de acordo com o Art. 3°, inciso III, “ser membro do magistério público estadual;” 58 A Lei 3.067/98 dispõe sobre a autonomia das unidades escolares da rede pública do Estado do Rio de Janeiro. Tendo em vista sua importância para nosso estudo, ela será tratada separadamente a seguir. 59 “Ao votar pela concessão da liminar, o ministro Cezar Peluso, relator da ADIn, lembrou da urgência da decisão pois o mandato dos atuais diretores de unidades escolares do Rio de Janeiro expirou em setembro, com prorrogação até 31 de outubro, próxima sexta-feira. A decisão foi unânime”. Notícia da sessão de informação do site do Supremo Tribunal Federal datada de 29/10/03. www.stf.gov.br. {PAGE } como cargo em comissão, cujo provimento é de competência exclusiva do chefe do Executivo. {PAGE } 2.2.2 – A Lei da Autonomia Em 25 de setembro de 1998 foi sancionada, pelo Governador Marcelo Alencar, a Lei 3.067, de autoria do Poder Executivo, que dispõe sobre a autonomia das unidades escolares da rede pública do Estado do Rio de Janeiro. No Art. 1º é anunciada a finalidade da Lei de estabelecer as diretrizes da autonomia nas escolas públicas estaduais objetivando a gestão democrática, o melhor aproveitamento dos recursos e a qualidade da educação. De acordo com o Art. 2º, a autonomia das unidades escolares se dará através de práticas integradas nas esferas administrativa, financeira e pedagógica com a participação da comunidade escolar nas chamadas Associações de Apoio às Escolas – AAEs Os Arts. 3º e 4º tratam mais especificamente da composição das AAEs, que devem constituir-se como instituições sem fins lucrativos e acordar com o Estatuto-Padrão da Secretaria Estadual de Educação – SEE. Embora a legislação não detalhe a composição dessas Associações, podemos comparar sua lógica de funcionamento à das Unidades Executoras – UEXs dos recursos do PDDE60. O Art. 5º61 trata da autonomia administrativa das escolas públicas do Estado, que deve basear-se na escolha dos dirigentes pelo voto direto da comunidade escolar62 e na participação democrática dos alunos e de seus responsáveis no processo de avaliação do ensino-aprendizagem. O Art. 5º poderia tornar-se um importante instrumento viabilizador da efetiva autonomia das unidades escolares. Se entendemos que a avaliação constitui uma etapa do processo de planejamento e execução do Projeto Pedagógico, esta não teria razão de ser, caso não houvesse objetivos claros a serem alcançados com a mesma. Ao especificar a participação de pais e 60 Conforme tratada no sub-ítem 2.1.4 Revogado pela ADIn 2997, juntamente com seus incisos I e II. 62 Conforme a Lei 2518/96, também revogada pela ADIn 2997. 61 {PAGE } alunos na avaliação do processo ensino-aprendizagem, a legislação vai mais longe e compele, de forma implícita, as escolas a porem em prática o Projeto Político Pedagógico. O Art. 6º trata da autonomia financeira das escolas públicas estaduais, que se daria mediante o repasse de recursos às AAEs através de Convênio, Termo de Compromisso e outros ajustes. E o Art. 7º identifica os recursos que devem ser repassados às escolas via AAEs. São eles: repasses obrigatórios de recursos do Tesouro Estadual; repasse do Tesouro Nacional destinados às unidades escolares (recursos do PDDE para o Ensino Fundamental e demais programas federais); doações, patrocínios e legados, nos termos da legislação vigente; subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais; incentivos fiscais previstos em lei; rendas decorrentes das atividades exclusivas das AAEs e outras fontes. O parágrafo único anuncia que será previsto no orçamento estadual recursos específicos para a autonomia das escolas e o Art. 8º descreve as possibilidades de uso dos recursos repassados às AAEs (dentro das atividades específicas do ensino médio e fundamental) que são: aquisição de merenda, material permanente e de consumo para os alunos; pequenos reparos e obras emergenciais; conservação e manutenção das condições de higiene e limpeza do prédio; programas de capacitação de professores e de agentes comunitários e programas e projetos vinculados às atividades de ensino-aprendizagem dos discentes. Embora os Arts. 6º e 7º, o parágrafo único e o Art. 8º estejam voltados para o que seria a autonomia financeira das unidades escolares, eles apenas anunciam a função das AAEs de gestora dos recursos e enumeram as fontes da verba destinada às escolas. Além de não tratar da questão da autonomia financeira propriamente dita, os artigos não especificam como as AAEs devem proceder para gerir os recursos e a quem e como devem prestar contas. Se analisarmos mais detalhadamente a questão, iremos perceber que: a) a lei não especifica a composição das AAEs, apenas anunciando que devem ser compostas por membros da comunidade escolar, b) as AAEs recebem {PAGE } todos os recursos das escolas e não há no texto legal um controle mais criterioso para o acompanhamento dos gastos. A impressão que se tem da leitura desses Artigos é a de que a concepção de autonomia financeira utilizada aproxima-se da falta de controle do uso do dinheiro público, tendo em vista a indeterminação sobre o acompanhamento do uso desses recursos e de sua prestação de contas. No Art. 8°, por exemplo, não há definição sobre o uso dos recursos que chegam às AAEs para a contratação de prestadores de serviços. Se os recursos podem ser utilizados para conservação e manutenção das condições de higiene e limpeza do prédio, pode-se supor que haveria essa possibilidade. Além disso, prevê-se a capacitação de professores e agentes comunitários. A capacitação de agentes comunitários pode ser considerada uma atividade fora do âmbito escolar, devendo, dessa forma, estar a cargo de outras fontes de financiamento que não as destinadas à educação. O Art. 9º versa sobre a autonomia pedagógica e a relaciona à adequação e desenvolvimento local da proposta educativa, com o estabelecimento de formas próprias de organização do ensino-aprendizagem, e de acordo com as diretrizes legais unificadoras do sistema de ensino e as da Secretaria Estadual de Educação. Acreditamos que a prática participativa proposta pelos incisos revogados poderia de fato viabilizar a melhoria/promoção da qualidade de ensino, primeiramente porque a eleição para diretor pode propiciar um maior envolvimento da comunidade e a cobrança pela execução das propostas para melhoria da escola e, porque os principais interessados no sucesso escolar – alunos e responsáveis - ao participarem da avaliação do processo ensinoaprendizagem teriam a oportunidade de interagir com o Projeto Político Pedagógico da escola e pressionarem para seu constante aperfeiçoamento. Tendo em vista que tanto no que diz respeito à autonomia financeira quanto à autonomia pedagógica a Lei não traz novidades, a conclusão a que chegamos é a de que a revogação do Art. 5º, que versa sobre a autonomia administrativa das unidades escolares, tornou a chamada Lei da autonomia incapaz de atingir os seus objetivos principais. {PAGE } Como poderia se dar a autonomia financeira e pedagógica sem a autonomia administrativa? A pergunta se torna ainda mais pertinente se levarmos em consideração que a perspectiva de autonomia administrativa da Lei 3067/98 era fundamentada na eleição direta para diretores das escolas e na participação efetiva de alunos e responsáveis na avaliação do processo de ensino-aprendizagem. 3.3- As propostas do Município do Rio de Janeiro 3.3.1 – A Lei Orgânica do Município A Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, promulgada em 5 de abril de 1990, traz 16 artigos63 específicos sobre educação. Os artigos 321 e 322 tratam exclusivamente da gestão das unidades escolares. O Art. 321 dita os princípios da educação no Município do Rio de Janeiro, dentre eles a gestão democrática do ensino público, e o art. 322 descreve os deveres do Município com a educação, sendo um deles a garantia da eleição direta para diretores64 das unidades escolares da rede pública com a participação da comunidade escolar. Nesse sentido, no Município do Rio de Janeiro65 só há eleições para diretores de escolas públicas por prescrição de sua própria Lei Orgânica. Como já destacado, não há essa obrigatoriedade na Constituição Federal, na LDB, no Plano Nacional de Educação ou na Constituição Estadual, cujo artigo referente à eleição de diretores foi revogado pela ADIn 2997 de 2003. 63 Os artigos que tratam especificamente da educação vão do 320 ao 336. É exigido para o exercício do cargo de diretor de unidade da rede municipal de ensino público, a formação pedagógica específica em administração escolar. 65 Tal como outros Municípios em que a Lei Orgânica obrigue a realização de eleições para diretores das escolas públicas. 64 {PAGE } 3.3.2 – O SDP – Sistema Descentralizado de Pagamentos O Decreto Municipal 20633, de 18 de outubro de 2001, institui o Sistema Descentralizado de Pagamento, substituindo o Fundo Rotativo, ou Sistema Descentralizado de Suprimento de Fundos, regido de acordo com o Decreto 13.891, de 12 de maio de 1995. O Sistema Descentralizado de Pagamento, tal como o Sistema Descentralizado de Suprimento de Fundos, não é um programa de financiamento específico para as escolas. Destina-se à descentralização de recursos financeiros para órgãos da administração do Município do Rio de Janeiro com o objetivo de agilizar a realização de pequenas despesas, tais como aquisição de material de consumo e prestação de pequenos serviços, despesas emergenciais. Da mesmo forma como o PDDE, há a exigência da abertura de conta bancária em nome do Órgão/Unidade Municipal para que os recursos sejam ali depositados. Sua gestão, porém, não é desempenhada por um conselho mas sim pelo Titular do Órgão/Unidade Municipal e por outro servidor por ele indicado. Os recursos são requisitados pelo Titular da conta, portanto do Órgão a que os recursos serão destinados, ao Ordenador de Despesas ou autoridade delegada. Embora o SDP não tenha objetivos educacionais específicos, tal como o PDDE, destacamos sua relevância para a administração das escolas municipais. Como veremos no capítulo 3, o Sistema ou, no caso, a descentralização da gestão dos recursos da escola é apontado tanto como um fator propiciador quanto um limitador da autonomia administrativa. Conforme anunciado, procuramos nesse capítulo explicitar a(s) perspectiva(s) de autonomia das principais políticas públicas que fazem alusão direta ou indiretamente às unidades escolares, especialmente às escolas do Município e do Estado do Rio de Janeiro. Nesse sentido, o estudo da Constituição Federal, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, do Plano Nacional de Educação, do Programa Dinheiro Direto na Escola, da {PAGE } Constituição do Estado do Rio de Janeiro, da Lei da Autonomia, da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro e do Sistema Descentralizado de Pagamentos nos permite argumentar que, embora a maioria dessas políticas66, ainda que de forma superficial, declarem almejar a autonomia das escolas, poucas são as que expõem a concepção de autonomia das unidades escolares de forma clara, e, principalmente, a forma pela qual as escolas alcançariam essa autonomia. No nível federal, somente o PNE-Coned – que não chegou a ser promulgado, ousou tratar minuciosamente da autonomia da escola, assegurando, inclusive, condições materiais e financeiras para tal fim. A Lei Estadual Nº 3067/98, a chamada Lei da autonomia, se aprofundou em instaurar de fato um processo de implementação da autonomia das unidades de ensino. Contudo, o art. 5°, que inovava ao propor, aliada à eleição direta para diretores, a participação de pais e alunos no processo de avaliação do ensinoaprendizagem das escolas públicas estaduais, foi revogado pela ADIn 2997. Ao questionar a constitucionalidade da eleição de diretores, o Partido Social Cristão acabou com o que a Lei da Autonomia possuía de mais inovador e essencial. Apesar da redefinição do conceito de autonomia da escola presente nas políticas educacionais a partir da década de 80, tender para uma redução ao aspecto administrativo-financeiro, conforme alerta Martins (2002); Costa et alii (1997, p. 22, apud Moreira 1998, p. 166) definem autonomia da escola como: [...] o reconhecimento ou a construção de sua identidade institucional; em outras palavras, é a capacidade de elaborar e executar um projeto educacional único, referido a uma clientela específica, pautado na participação de todos os atores e direcionado para objetivos que têm significado para a comunidade. Pressupõe, também, a ampliação da liberdade de gestão de recursos materiais, humanos e financeiros, bem como o aumento de controle sobre a aplicação destes últimos. À definição de Costa et alii (1997) acrescentamos o necessário esclarecimento sobre a função do projeto pedagógico. Tendo em vista o caráter 66 Principalmente as que são especificamente voltadas para a Educação – LDB, PDDE, PNE e a Lei da Autonomia. {PAGE } eminentemente político67 do projeto pedagógico, sua elaboração e execução devem partir de uma concepção de sociedade e, portanto, de uma definição sobre o papel que alunos e demais membros da comunidade escolar68 representam nessa sociedade e na escola propriamente dita. Partimos do pressuposto de que a autonomia das unidades escolares está diretamente relacionada com o grau de aprofundamento da experiência democrática em cada escola e, dessa forma, concordamos com Coutinho (2002, p. 17) quando defende que se entendemos a democracia como um processo e não como um estado, “a democratização só se realiza plenamente na medida em que combina a socialização da participação política com a socialização do poder”. Nesse sentido, compreendemos como autônoma ou possuidora de autonomia a escola politicamente participada e participativa, ou seja, sua administração se dá através da ativa participação de seus membros que, enquanto grupo organizado, interagem conscientemente com as questões locais, conjunturais e estruturais da sociedade. Portanto, a efetiva autonomia da escola só se daria em uma gestão genuinamente democrática que extrapole os limites da gerência de recursos, atingindo todas as dimensões da escola, inclusive e principalmente a sala de aula69. Como pudemos perceber, algumas propostas de políticas educacionais defenderam a democratização do espaço escolar através da eleição de diretores, como ponto de partida, e da participação coletiva como garantia de uma gestão democrática aproximando-se, dessa forma, da perspectiva de autonomia escolar por nós 67 defendida. Contudo, “manobras políticas” Na perspectiva da grande política ou alta política, conforme Gramsci. Ver Cadernos do Cárcere, vol. 3, p. 21-22. 68 Entendemos por comunidade escolar todos aqueles que estão ligados direta ou indiretamente à unidade escolar; dessa forma professores e demais funcionários, alunos, responsáveis, moradores da localidade e demais interessados fariam parte da comunidade escolar. 69 Nesse sentido, Bastos (1999, p. 25), parafraseando Marília Spósito, defende que: “assim como a administração atinge a totalidade da escola, a gestão democrática não pode ser uma proposta de democratizar apenas a esfera da administração da escola. [...] Enquanto a democracia não chegar ao trabalho de sala de aula, a escola não pode ser considerada democrática. A sala de aula não é só lugar do conteúdo, é também o lugar da disputa pelo saber, é o lugar da construção da subjetividade, é o lugar da educação política”. {PAGE } conseguiram neutralizar o que havia de mais ousado e inovador nessas propostas70. Tendo já um panorama das políticas educacionais no que concerne à autonomia das escolas, tentaremos vislumbrar como se dá a efetivação dessas políticas no âmbito escolar. Nesse sentido, no capítulo seguinte, buscaremos entender as concepções de autonomia da escola explicitadas por professores atuantes em salas de aula e por profissionais envolvidos diretamente com a administração de unidades escolares. 70 Estamos nos referindo especialmente à proposta da chamada Lei da Autonomia do Estado do Rio de Janeiro, do Projeto de LDB – Jorge Hage e do PNE CONEd. {PAGE } Capítulo 3 – Os olhares de profissionais da educação sobre a autonomia da escola – uma “avaliação” das políticas educacionais? Pretendemos identificar, nesse capítulo, a(s) concepção(ões) de autonomia presente(s) nos discursos de professores, dirigentes e demais profissionais de unidades escolares e sua avaliação sobre o grau/tipo de autonomia gozada pelas escolas. Entendemos que por vivenciar o cotidiano escolar, esses profissionais constituem uma importante fonte para o entendimento sobre a forma pela qual as políticas educacionais influenciam a gestão das unidades escolares. A análise das questões trazidas pelos depoentes constitui um dos pontos mais importantes de nosso estudo tendo em vista que nos capítulos anteriores abordamos a questão da autonomia e da autonomia escolar pelos aspectos histórico, epistemológico e legal, faltando, contudo, compreender o que profissionais que vivenciam o dia a dia das escolas pensam sobre a autonomia escolar. Com esse intuito, entrevistamos 12 profissionais: duas diretoras de escola, uma coordenadora pedagógica, uma secretária escolar, uma professora atuante em sala de leituras e sete professores atuantes no ensino fundamental e no ensino médio. O critério de escolha dos entrevistados se deu primeiramente pela facilidade de acesso a essas pessoas por conta da localidade de suas residências ou de seu local de trabalho71 e, pela busca em diversificar o perfil dos mesmos tentando ouvir profissionais envolvidos com diversas realidades em diferentes níveis e modalidades de ensino. As entrevistas foram realizadas entre os meses de maio e junho de 2005. A maior parte delas foi gravada individualmente, sendo que em um caso específico as entrevistadas preferiram falar em grupo e suas respostas foram 71 A maioria dos entrevistados reside ou trabalha em escolas de bairros vizinhos na zona oeste do Município do Rio de Janeiro. {PAGE } gravadas e transcritas dessa forma. Apenas uma professora preferiu responder por escrito às questões propostas. Durante nossa análise descreveremos com mais detalhes cada uma das situações. As questões propostas foram semi-estruturadas e foram solicitadas inicialmente algumas informações que nos permitiram traçar os perfis dos depoentes72. Com relação às perguntas propriamente ditas, formulamos 3 questões mais diretamente relacionadas à autonomia da escola em que indagamos sobre a percepção de autonomia; sobre as condições para que a escola se tornasse autônoma e, sobre o conhecimento do entrevistado a respeito das políticas/programas proponentes da autonomia da escola. Dessa forma, todos os entrevistados tiveram contato com o seguinte formulário: { EMBED Word.Picture.8 }UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CES – FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Mestranda: Cláudia Araujo dos Santos Professor orientador: Nicholas Davies Título da dissertação: A autonomia da escola: as visões dos governos e dos profissionais da educação Roteiro de entrevista 1. Perfil do(a) entrevistado(a) a) Tempo de matrícula na rede pública:__________________________________ b) Função na escola: ________________________________________________ c) Idade: ______________ Sexo: __________________ Professores d) Disciplina(s) que leciona: ___________________________________________ e) Em qual(is) segmento(s): ___________________________________________ 2. Questões a) O que seria a autonomia da escola, no seu entender? b) O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? c) Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? d) Comentários: 72 Entrevistamos somente aqueles que possuíam no mínimo 2 anos de incorporação à rede pública de educação do Estado ou Município do Rio de Janeiro, entendendo que os entrevistados deveriam ter tido um tempo mínimo na rede para conhecer um pouco melhor as especificidades das escolas bem como as políticas que as regem. {PAGE } A partir da identificação dos depoentes, criamos o seguinte quadro: Perfis dos depoentes Identificação Idade Sexo Função / disciplina lecionada Rede de atuação Professora 1 33 anos Feminino Professora Professora 2 38 anos Professor 3 42 anos Professor 4 33 anos Masculino Professor de Matemática Município e Estado do RJ Professora 5 31 anos Feminino Professora de Língua Portuguesa Município e Estado do RJ Professora 6 33 anos Feminino Professora de História Município e Estado do RJ 7 anos no Estado Professora 7 57 anos Feminino Município do RJ 39 anos Diretora 1 não informado Feminino Professora de Geografia Diretora Município do RJ 31 anos Coordenadora Pedagógica não informado Feminino Coord. Pedagógica Município do RJ 18 anos Professora da Sala de Leituras não informado Feminino 6 anos Diretora 2 38 anos Feminino Atendimento Município na SL / do RJ Professora de Língua Portuguesa Diretora Estado do RJ Secretária Escolar 48 anos Feminino Estado do RJ Feminino Professora Município do RJ Masculino Professor de Município Matemática e Estado do RJ Secretária Escolar Estado do RJ T. de Matrícula Níveis e segmentos de atuação. 12 anos 1º segmento do EF 1º segmento do EF 2º segmento do EF – PEJE no Mun. e EM no Estado 2º segmento do EF no Mun. e EM no Estado 1º segmento do EF no Mun. e 2º segmento do EF – supletivo no Estado 2º segmento do EF no Mun. e EM no Estado. 2º segmento do EF. 6 anos 3 anos no Mun. e 2 no Est. 7 anos no Mun. e 3 no Est. 2 anos no Mun. e 3 no Est. 20 anos 22 anos Educação Infantil e 1º segmento do EF. Educação Infantil e 1º segmento do EF. Educação Infantil e 1º segmento do EF. 2º segmento do EF até 2004 e EM atualmente 2º segmento do EF até 2004 e EM atualmente {PAGE } Cada entrevistado desenvolveu as respostas da forma como melhor lhe pareceu. Contudo, em função dos argumentos apresentados pelos depoentes, novas indagações foram apresentadas com o intuito de elucidar os discursos e/ou apreender mais informações73. A fim de facilitar a comparação entre as diversas experiências, trataremos primeiramente dos relatos dos professores atuantes em salas de aula e em seguida dos demais profissionais. A Professora 1 atuou até 2002 no 1º segmento do ensino fundamental, tem 33 anos de idade e 12 anos de matrícula na rede estadual. Encontra-se atualmente licenciada por motivos médicos. Para a Professora 1 a autonomia da escola ou a sua ausência estaria relacionada à impossibilidade de disciplinar os alunos por conta da atuação do Conselho Tutelar e do Estatuto da Criança e do Adolescente. Aliada à questão disciplinar, a violência constituiria outro fator contribuinte para a falta de autonomia da escola. Segundo a Professora 1: Os maiores problemas que eu percebo, em relação à questão da autonomia, fica na questão da disciplina. Muitas vezes a criança se apresenta como problemática onde fica muito difícil você ter controle sobre a criança e aí tem àquelas coisas que a escola não pode fazer isso, que você não pode suspender, não pode transferir para outra escola e etc. E aí se fala logo nos direitos das crianças, no Conselho Tutelar, no ECA. ... Hoje em dia, uma coisa que também vejo como grande problema, que dificulta a autonomia da escola, é a violência. Antecipando-se à questão seguinte, sobre as condições necessárias para a autonomia da escola, a Professora 1 sugere que a escola deveria criar novas formas de avaliação independentemente das regras estabelecidas pela Coordenadoria e destaca a importância do Projeto Político-pedagógico na definição de regras da própria escola. Outra coisa que eu penso com relação à autonomia, é que, independentemente do que a Coordenadoria esteja mandando como norma, eu acho que a escola tem que definir outras 73 Cabe destacar que nem todos os entrevistados tiveram um acréscimo de questões. Novas indagações foram apresentadas aos entrevistados, quando entendíamos no decorrer das entrevistas que as respostas iniciais sinalizavam com a possibilidade da apresentação de novas informações. Foi o caso, por exemplo, da Diretora 2 que forneceu informações sobre a indicação de diretores na rede estadual. {PAGE } maneiras de avaliar. Nesse sentido é muito importante a questão do Projeto Político-pedagógico quando a escola senta e junto define as normas internas que devem ser seguidas e respeitadas. Às vezes você percebe que os diretores ficam com muito medo de autorizar atividades fora da sala de aula. Quando perguntada sobre as condições para que a escola alcançasse a autonomia, a Professora 1 defendeu que as leis e as normas deveriam estar voltadas para a realidade da escola. Nas suas palavras: Eu não sei bem. Eu acho que às vezes, falta realmente que as leis, as normas estejam realmente observando a realidade da escola. As vezes parece que as leis são criadas para crianças que não existem. ... Eu acho que é dentro da escola, só quando você está ali no dia a dia é que você percebe que tem normas que não funcionam. Então eu acho que, na verdade, todo código - Penal, Civil, ... hoje em dia no Brasil, se nós formos observar, ele muitas vezes está muito distante da realidade brasileira e na educação não está diferente. (...) Acho, que a questão principal seria essa de algo mais envolvido com a realidade em que a escola está inserida. Acho que essas leis têm que estar realmente envolvidas no dia a dia, na realidade escolar. Sobre as políticas voltadas para a autonomia da escola, a Professora 1 alega estar um pouco desinformada por conta de seu afastamento da escola mas cita o FUNDEF e critica a metodologia utilizada na avaliação feita pelo Programa Nova Escola. Então hoje, com relação às políticas, a gente fala do FUNDEF, do Nova Escola que eu acho uma furada, um absurdo. A gente acaba se empolgando muito com o nova escola porque você fica sonhando com a possibilidade de você ganhar um dinheirinho a mais. Só que a coisa é muito absurda porque você percebe que eles lançam o Nova Escola, afirmam que é em cima do trabalho da escola. Só que a coisa não funciona assim. Por que na escola em que eu trabalho, é um ambiente até legal, há muito cuidado com a questão da limpeza, da organização e eu acho que essas são coisas que poderiam ser valorizadas. Ainda sobre o Programa Nova Escola, a Professora 1 destaca a atuação dos professores e argumenta que as dificuldades por eles enfrentadas ultrapassam os limites das salas de aula. Com todas as dificuldades que todas as escolas têm, eu sinto que lá [na escola em que trabalhou] o pessoal tenta se envolver muito no que as crianças vivem. Têm professoras que quando vêem que a coisa está muito complicada, vão até a casa da criança e descobrem realidades absurdas. Nós {PAGE } tínhamos um problema com três crianças que eram irmãs e tinham uma dificuldade imensa com relação à higiene. Aí nós decidimos que a gente ia começar a se aproximar para descobrir como essas crianças viviam e no dia em que nós fomos até a casa das crianças, nós percebemos o seguinte: primeiro que quando eles não estão na escola, eles estão trancados em casa. (...) Quando nós conseguimos destrancar a porta, no mesmo ambiente em que as crianças ficavam, ficava uma montoeira de lixo. Como eles queriam ter certeza que no outro dia teriam dinheiro, então eles iam juntando garrafas, latas e tudo o que você possa imaginar que eles poderiam vender no ferro velho tinha ali. Então aquele mal cheiro era horrível e aí o que é que você faz? Procura o Conselho Tutelar? Denuncia a situação? Tira a criança dali e a criança vai ser jogada em um abrigo? Naquele momento a gente acabou não tendo essa postura mas há poucos meses isso acabou acontecendo. Eu me lembro que as minhas colegas estavam meio que tentando fazer campanha para quem adotaria, quem teria coragem de adotar todos juntos. Então eu vejo que é muito difícil. Essa bola de neve social, esses problemas. A desigualdade social bate muito forte na escola. Outra questão lembrada pela Professora 1 diz respeito à merenda escolar cujos recursos, segundo sua opinião, são mal utilizados. Uma outra coisa que eu acho que deveria ser mais observada é a questão da merenda escolar que é de péssima qualidade na maior parte das escolas. Você vê que se eles recebem uma verba X eu acho que essa verba às vezes é muito mal direcionada. Ainda sobre os recursos, a Professora 1 faz sugestões para o uso do dinheiro da escola: Uma outra coisa que eu também já vivenciei muito na escola é a questão da higiene, como eu já coloquei. Quantas vezes é necessário fazer campanha na escola, por exemplo, por causa do piolho. Ou você faz uma campanha, você convoca os pais a comprarem [remédio para combater] e um compra e os outros não têm condições ou não se interessam. Também são coisas que o dinheiro da escola deveria ter né? ... acho que os professores teriam que sentar junto com os pais e direcionar quais são os maiores problemas que a gente sente hoje, o uniforme, as vezes a criança não tem mesmo. Como a Professora 1 mencionou o mau uso de recursos, indaguei sobre a atuação do CEC na escola, se ele não fazia o acompanhamento dos gastos e ela respondeu que havia o Conselho mas sua atuação era limitada pelo desinteresse do próprio grupo. Nas palavras da Professora: {PAGE } Existe o Conselho, ele participa mas acaba sendo assim ... o brasileiro não é acostumado muito a isso entendeu? É aquela coisa do pessoal ir para a reunião dizendo “Ai, que saco, hoje tem aquela reunião!” e o que falar está falado e perguntam: “onde é que eu tenho que assinar? vamos logo que eu tenho que ir para casa”. Você vê que na maior parte das vezes não tem aquele envolvimento, eles não questionam muito. Eu acho muito ruim e vejo que a coisa poderia ter uma qualidade melhor. Conforme seu relato os representantes do CEC não davam importância para a função do Conselho. As palavras da Professora 1, demonstram que apesar da participação da comunidade ser defendida com unanimidade pelas políticas educacionais, não há a preocupação com a conscientização popular sobre a importância dessa participação. Nesse sentido, perguntei sobre a atuação do SEPE, se o Sindicato de alguma forma buscava interferir na situação dessa escola no que diz respeito à participação ou ao acompanhamento da gestão. Sobre essa questão a Professora 1 respondeu: ... do SEPE lá na escola, nós não tivemos grandes respostas. Em alguns momentos nós percebíamos que já aconteceu deles direcionarem uma greve, de todo mundo se envolver mas que não tinha muito sentido. Em uma das greves que nós fizemos, a coisa foi exatamente assim, por uma questão deles mesmos. Acho que eles iriam entrar em momento de eleição e então eles precisavam chamar o pessoal a conhecer, a falar em chapa e a gente viu que a coisa era muito política mesmo, infelizmente. Não que eu desacredite da política, seria uma ignorância se eu dissesse isso mas eu compreendo que às vezes, a coisa tem mesmo que ser com quem está ali, independente de você pensar sobre quem está direcionando, quem é o coordenador, quem é o Ministro da Educação. Você que está ali diretamente com a criança, com os pais, você tem que botar a coisa para andar. Conforme a Professora 1, o SEPE parece não ter como meta a intervenção no que diz respeito à gestão da escola, o que reforçaria a idéia de que a sua atuação profissional pode ser realizada de forma individualizada/independente da conjuntura político-educacional. Da mesma forma que a Professora 1, a Professora 2 trabalha com turma do 1º segmento do ensino fundamental mas na rede municipal. Ela tem 38 anos de idade e 6 anos de matrícula no Município do Rio de Janeiro. {PAGE } Como a Professora 2 preferiu responder às perguntas, por escrito, não tivemos a chance de incluir novas questões em seu depoimento. Para ela, a autonomia da escola se expressaria na realização de projetos desvinculados das instâncias superiores. Nas suas palavras: Seria a escola poder realizar suas atividades e projetos desvinculados de órgãos superiores (como a Secretaria de Educação). Se diz que a “escola é autônoma”; mas se é, por que há a necessidade de se comunicar com outros órgãos e não realizar imediatamente o projeto com a comunidade? Para que a escola alcançasse a autonomia, a Professora 2 defende o que parece ser a elaboração do Projeto Político-pedagógico. O grupo de professores da unidade escolar deveria sentar-se, reunir-se e discutir as propostas da escola e o que se quer buscar. A direção também deveria dar liberdade para que isto acontecesse. Quanto às políticas proponentes da autonomia escolar, a Professora 2 afirma desconhecê-las. Para as duas Professoras, atuantes no 1º segmento do ensino fundamental, a autonomia da escola se daria em duas perspectivas: para a Professora 1 seria no nível intra-escolar, no âmbito da relação entre professores, alunos e a função disciplinadora que a escola não estaria conseguindo exercer. Já a Professora 2, embora atente para a relação interinstitucional entre a escola e órgãos superiores, o faz na perspectiva de reivindicar como autonomia a possibilidade da escola realizar projetos de forma independente ou desvinculada de órgãos superiores. Sobre as condições necessárias para que a escola alcançasse a sua autonomia, ambas as Professoras insinuam a importância do Projeto Políticopedagógico como forma de definição de objetivos e metas próprios da escola e a Professora 2 reivindica ainda a focalização da “realidade da escola” por leis e normas. Com relação às políticas ou programas proponentes da autonomia escolar, a Professora 1 menciona o FUNDEF e o Programa Nova Escola, criticando esse último pela metodologia utilizada para a avaliação da escola, e a Professora 2 alegou desconhecer as políticas. {PAGE } A Professora 1 tratou ainda do mau uso da verba da merenda e o mau gerenciamento dos recursos da escola, da falta de interesse dos membros do CEC e da omissão do SEPE com relação aos problemas de participação na gestão escolar. Ambas as entrevistadas parecem desconhecer as políticas federais que tratam do funcionamento das unidades escolares. A própria LDB foi ignorada pelas Professoras. A Professora 1 mencionou o Fundef, que não se refere ao funcionamento de unidades escolares ou à questões ligadas à autonomia da escola, e o Programa Nova Escola, que, enquanto programa de avaliação em larga escala, trabalha com os mesmos parâmetros para avaliar todas as escolas da rede estadual, o que poderia, de certa maneira, cercear a margem de autonomia dessas escolas na definição e na execução de seus Projetos Político-pedagógicos. O Professor 3 leciona Matemática, tem 42 anos de idade, 3 anos de matrícula na rede municipal e 2 na rede estadual. Trabalha com turmas de 5ª a 8ª séries do PEJE – Programa de Educação Juvenil do Município do Rio de Janeiro e com turmas do Ensino Médio na rede estadual. Para o Professor 3, a autonomia parece estar vinculada à idéia de liberdade tanto na relação professor/aluno quanto na relação Direção/professor. O entrevistado não estabelece uma diferenciação entre a autonomia da escola e a autonomia nas relações intra-escolares. Nas suas palavras: Eu acho que hoje nós poderíamos entender a autonomia, em primeiro lugar, como a relação do professor com os alunos. [...] E tem uma autonomia também da Direção com o professor, ... [que] te dá autonomia para trabalhar o conteúdo das disciplinas, conversar com eles. Quando indagado sobre sua concepção de autonomia da escola, ele afirma não haver tal autonomia por conta da interferência de instâncias superiores no âmbito escolar, principalmente na escola estadual, através do controle da freqüência docente e da falta de “autonomia” dos professores para opinarem sobre a realização de Conselhos de Classe aos sábados. {PAGE } Segundo o Professor 3: ... esse Secretário – o Mendonça – ele está sendo bastante rigoroso na questão da freqüência do professor. Então a escola não tem muita autonomia para trabalhar independente. Eu ia falar um negócio sobre a questão do conselho de classe. Marcaram os conselhos todos no sábado. Então, qual a autonomia que os professores têm para dizer - nós não queremos os conselhos no sábado? Se você falta eles cortam teu ponto. E no meu caso, em que a gente ainda está no estágio probatório? Como é que eu vou faltar? Então eu acho que a escola tem muito pouca autonomia para fazer alguma coisa diferente. ... Sobre as condições para a autonomia da escola, o Professor 3 é enfático na defesa de que o programa ou os conteúdos programáticos deveriam ser definidos pelo professor em função da “realidade da comunidade”. À primeira vista, a concepção de comunidade evocada seria sinônimo de localidade mas, na sua exemplificação, o Professor 3 levanta a questão do aproveitamento dos alunos nos períodos anteriores como condição para a definição dos conteúdos. Nas palavras do Professor 3: Eu acho que uma das autonomias seria os professores, dentro da realidade da comunidade, dizer o que é que tem que ser dado e o que não tem que ser dado. Porque, com certeza uma escola, mesmo sendo do Estado, lá na zona sul ela é uma escola diferente da de Nilópolis. ... ... eu que cheguei agora [para dar aulas para uma turma de 3º ano do Ensino Médio] to pegando tudo aquilo que não foi dado e montei um programa. E aí o que é que acontece? Se você for pegar os três anos, não bate com o programa da Secretaria porque cada um fez uma coisa diferente. E aí eu pergunto: esse programa que foi dado é o mesmo de uma escola em Anchieta? São realidades diferentes. Então, eu acho que a autonomia passa por aí, os próprios professores no início do ano letivo, definir o que é que vai ser dado para as turmas. Diante dos argumentos apresentados pelo Professor, mencionei o Projeto Político-pedagógico com o intuito de verificar se ele sustentaria sua defesa da definição de conteúdos pelos professores. Nesse sentido, ele respondeu que o PPP deveria nortear a seleção de conteúdos mas que não haveria a necessária participação dos professores na construção do Projeto. Nas suas palavras: {PAGE } Então é por isso que, quando, a gente define a questão do que é que deve ser dado, deve-se trabalhar em cima do PPP. E geralmente, o que eu sinto é que os professores, não se interessam pelo PPP. ... Mas na verdade, se você tem 20 ou 25 professores em uma reunião, dois ou três dão uma sugestão. ... Eu acho que, com certeza, a autonomia, o PPP passa por essa discussão dos professores. Mas muitas vezes se diz o PPP é isso daqui. Vamos trabalhar isso e só o fulano deu a sugestão e não foi discutido. Às vezes o professor até tem uma boa idéia, mas aquilo não é discutido. Sobre as políticas ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola, o Professor 3 afirma desconhecê-las. Segundo ele “... eu não sei como é que a escola, trata dessas questões. Não nos é passado nada, nem no Município, nem no Estado”. Diante da negação do Professor 3, perguntei-lhe sobre a gestão dos recursos com o objetivo de tentar lembrá-lo das leis que regem o financiamento das escolas mas novamente o Professor afirmou desconhecê-las e, diante da questão dos recursos ele se remeteu ao FUNDEF, relacionando-o à questão salarial. Não, o que a gente comenta mais no Município é sobre o FUNDEF por que segundo a informação [de um outro professor], o FUNDEF é um fundo para complementar a renda do professor. Então se o seu salário é R$ 1.000,00, o FUNDEF complementaria para R$ 1.200,00 e não está sendo feito isso. Estão usando o FUNDEF para pagar o salário do professor. Para voltar à questão da autonomia ou de sua falta na escola, perguntei ao Professor 3 se havia eleição para diretores no Município do Rio e ele respondeu que havia tanto no Município quanto no Estado mas seria uma eleição “direcionada”. No seu entender: Existe tanto no município quanto no Estado. A comunidade vota mas o que acontece é que é também uma eleição direcionada pois geralmente há somente uma chapa onde se faz um rodízio do mesmo grupo a cada eleição. Da mesma forma que o Professor 3, o Professor 4 leciona Matemática na rede municipal, onde trabalha com turmas do 2º segmento do ensino fundamental, e com turmas do ensino médio na rede estadual. Ele tem 33 anos de idade e 7 anos de matrícula. Para o Professor 4, a autonomia da escola se daria na efetivação de linhas de ação determinadas por professores, alunos, direção, funcionários e {PAGE } comunidade em conjunto. Ao que parece, o Professor defende a construção e a execução do Projeto Político-Pedagógico da escola. Nas suas palavras: ... A autonomia da escola é fazer o que professores, alunos, diretores, funcionários e comunidade desejam para a comunidade. Fazer com que a escola sirva a comunidade. Isso é a autonomia da escola. A escola tem que ter autonomia para isso. Agora, hoje ela não tem muita autonomia para isso, para traçar suas próprias linhas de ação muito pela questão política, né? É a Coordenadoria que quer interferir no trabalho da escola, ..., que coloca funcionário readaptado lá para a escola, funcionário que nem a escola quer. Enfim tem inúmeros problemas políticos que fazem com que a autonomia da escola não se concretize. Então, a autonomia para mim é isso é a escola ter a liberdade de se pensar e concretizar aquilo que ela traçou como linha. Sobre as condições, para a autonomia da escola o Professor 4 argumenta que a escola deve conhecer sua identidade para poder traçar o seu Projeto Político-Pedagógico; no entanto, ele reconhece que esse processo depende de infra-estrutura material, financeira e humana. Para o Professor: Eu acho que para ter autonomia ... a escola tem que ter uma identidade. Não sei se eu estou falando disso agora para você por que a escola está passando por um processo, a escola do Município em que eu dou aulas para a 8ª série, de falta de identidade. (...) Então, qualquer PPP que a gente fique traçando não dá muito certo. É aluno de uma comunidade aqui, aluno de uma comunidade ali, alunos de várias comunidades diferentes. ... Agora, as condições são muitas. Depende de condições financeiras também, a escola às vezes tem poucos profissionais para lidar com os problemas que ela tem. A escola hoje tem problema de falta de segurança, de falta de inspetor nos andares, a escola hoje tem problema de falta de professor de falta de tudo, de falta de equipamento necessário para os profissionais da cozinha trabalharem ... . Enfim há de se ter investimento também. Investimento nas escolas não só na parte salarial mas também na parte estrutural. Sobre as políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola, o Professor 4 afirma desconhecê-las. Nas suas palavras: Não conheço as políticas ou programas que prometem viabilizar a autonomia. Não conheço. A gente que está em sala de aula, a gente que vive na sala de aula o dia todo, vai de {PAGE } uma escola para outra a gente, de vez em quando, no recreio quando a gente costuma se encontrar ... Às vezes o que um professor sabe, passa para o outro. Então, por exemplo, essas políticas eu não conheço. Não sei se existem ou não. Diante da negação do Professor 4 sobre o conhecimento das políticas educacionais, perguntei-lhe sobre a LDB e ele reafirmou não conhecê-la. Nas suas palavras: Não peguei essa lei no curso [na licenciatura]. Enfim eu não sei dessas novas políticas e programas. Isso também não se comenta na Coordenação Pedagógica. Não se discute as políticas educacionais nacionais na escola. Não se debate. Além das questões propostas, o Professor 4 faz críticas à interferência da Coordenadoria e de políticas que se baseiam em estatísticas para avaliar a escola. Embora não tenha citado o Programa Nova Escola, os seus argumentos descrevem os critérios utilizados pelo Programa para avaliar as escolas do Estado. Com relação à autonomia da escola, eu acho que hoje dificilmente você encontra escolas públicas que tenham 100% de autonomia. É difícil de você encontrar. Sempre tem influência de Coordenadoria, sempre tem influência de políticas que só vêem estatísticas e quando isso sai do padrão, sempre tem auditoria. Na minha escola teve uma. Foi uma equipe da CRE na escola para verificar como é que estava a questão de material se estava sendo utilizado, como é que estavam os conceitos e o aproveitamento dos alunos. Tudo isso porque os conceitos dos alunos não foram muito bem vistos na CRE da nossa escola. Como o Professor afirmou desconhecer as políticas para o funcionamento da escola, indaguei-lhe sobre a gestão de recursos e, segundo o Professor, a direção da escola apenas comunica o recebimento dos recursos, mas não fala em valores ou solicita sugestões para o uso da verba. Nesse sentido, busquei saber da atuação do professor representante no CEC dessa escola. Segundo o Professor 4, há um professor representante mas as reuniões do CEC são realizadas em conjunto com professores representantes de outras escolas e com um representante da CRE – Coordenadoria Regional de Educação, em que se discute sobre: .. questão do dinheiro que entra nas escolas e fala-se um pouco também sobre os problemas das escolas, os problemas de violência, que geralmente hoje é a tônica. Mas, pelo que ele [o professor representante no CEC] me passa, as reuniões do {PAGE } CEC é mais para eles ficarem dizendo amém ao que é colocado para eles. Como não há reuniões do CEC da Escola, perguntei-lhe se os Conselhos de Classe seriam, portanto, o único momento em que os professores e a direção se encontravam, mas o Professor afirmou que seria nos conselhos e nas reuniões do centro de estudos em que são discutidas questões pedagógicas. Nas suas palavras: É discutido o pedagógico, por exemplo, a coordenadora tirou xerox de um livro que falava sobre a relação entre o professor e o aluno, só, só isso e a gente ia lendo e discutindo o livro e só. Mas sempre nas discussões recaíamos nos problemas da escola. Nós desviávamos completamente da leitura do livro. Era um texto teórico e a gente via alguma coisa lá que tinha alguma coisa a ver com a gente e aí a gente atropelava. O Professor 4 fez ainda algumas considerações no término da entrevista: Então é isso. Eu me preocupo com a autonomia da escola hoje porque eu vejo que a escola não tem autonomia nenhuma, por exemplo, ..., eu, em sala de aula não me sinto com autonomia de aprovar e reprovar um aluno. Não que isso seja muito importante, mas isso é uma forma de constatar tanto o seu trabalho como o aproveitamento do aluno. ... Enfim, eu fico com pena porque o aluno fica olhando para você, ele fica desestimulado. ... Esse é o tipo de trabalho que o Município dá, trabalho em grupo, trabalho em dupla e um copia do outro, enfim e eu temo muito por isso porque isso é exclusão do aluno, o aluno está sendo excluído. ... . Ele já é um excluído da sociedade. ... Então, a escola hoje não tem autonomia, por exemplo para consertar isso. A escola hoje passa por cima disso tudo. Aliás passa por cima da escola as políticas educacionais não oficiais, creio eu. O que são as políticas educacionais não oficiais? São essas políticas de estatística ... Ambos os Professores de Matemática afirmam desconhecer as políticas educacionais que tratariam da autonomia da escola. Apenas o FUNDEF é citado com referência à sua melhoria salarial74. Para os dois Professores, a autonomia da escola se daria também no nível intra-escolar, ou seja, na relação entre professor e alunos e entre a 74 De fato, segundo o Art. 7º da Lei 4.024, de 24 de dezembro de 1996, pelo menos 60 % dos recursos do FUNDEF devem ser utilizados por Estados, Distrito Federal e Municípios para a remuneração dos profissionais do magistério atuantes no ensino fundamental público. {PAGE } diretoria e os professores, na opinião do Professor 3, e na execução de linhas de ação traçadas pela comunidade escolar, na avaliação do Professor 4. Para que a escola alcançasse a sua autonomia, o Professor 3 propõe que os conteúdos programáticos deveriam ser definidos pelo professor em função dos conteúdos vistos previamente pelos alunos. Para o Professor 4, a escola deveria conhecer sua identidade como ponto de partida para traçar suas metas, o que dependeria, segundo ele, de maior investimento na escola de forma a proporcionar melhoria salarial e de infra-estrutura (material e humana). Já a Professora 5, que tem 31 anos de idade, 2 anos de matrícula no Município do Rio de Janeiro, onde trabalha com turmas do 1° segmento do Ensino Fundamental, e 3 anos na rede estadual, onde leciona Língua Portuguesa para turmas do 2º segmento do Ensino Fundamental (Ensino Supletivo), cogita a autonomia da escola enquanto instituição e propõe uma forma de independência ou desvinculação da instituição escolar da interferência do Poder Público. Para ela seria: ... ter a possibilidade de desenvolver projetos, até para lidar com professores e alunos com a comunidade escolar de forma geral, independente de políticas ditadas pela Secretaria ou por algum tipo de governo. Para que a escola alcançasse a autonomia, a Professora 5 defende que a “política” não deveria estar “influenciando da maneira como vem influenciando”. Para ela, a preocupação da Secretaria de Educação e das políticas educacionais são voltadas para uma rede de escolas, não sendo capazes portanto, de atender as especificidades das unidades escolares. Nesse sentido, além de não dar conta das necessidades específicas das escolas, as “políticas e o governo” seriam responsáveis pela inviabilização de projetos ao impor exigências padronizadas para escolas que, em tese, possuem realidades diferentes. Nas palavras da Professora: A “política” não deveria estar influenciando da maneira como vem influenciando. Então, às vezes o diretor, professores e os próprios alunos querem alcançar alguma coisa e dependem do aval da Secretaria ... A preocupação, às vezes, é muito mais ampla, no nível de abarcar uma grande quantidade de escolas, ... então a preocupação é mostrar um serviço independente daquela realidade, daquela escola específica. Então, às vezes, o que a Secretaria entende, o que a política ou o governo {PAGE } entende como bom, muitas vezes não é, porque não se adequa àquela escola específica. E eu acho que deveria haver uma coisa assim voltada para a realidade de cada escola. Porque certamente, uma escola que está situada em uma comunidade financeiramente melhor estruturada, não é a mesma realidade de uma escola que está dentro da favela e a comunidade que pertence, os alunos e a comunidade do entorno, em geral, não vive da mesma forma e nem tem os mesmos objetivos. Então, às vezes, é o que eu disse a princípio, o que se enquadra a um grupo não é o mesmo ao que vai se enquadrar a outro grupo. E aí, os projetos vão por água abaixo. Diante da defesa de projetos independentes da interferência das políticas governamentais que tenderiam a um tratamento igual para escolas diferentes, perguntei à Professora 5 se na escola em que trabalha havia um Projeto Político-Pedagógico, com o intuito de verificar como a Professora percebia a interferência dessas políticas no desenvolvimento do PPP da escola. Segundo ela, a escola não tem um Projeto Político-Pedagógico e, por isso, perde pontos no programa estadual de avaliação escolar - o Nova Escola. Para a Professora, a direção tenta fazer um bom trabalho mas a escola sofre com a insuficiência de recursos. Com o objetivo de verificar se a Professora 5 conhecia as regras de distribuição dos recursos que chegam à escola, indaguei-lhe se a insuficiência de recursos se daria em função da escola não atender ao ensino fundamental regular75. Nas suas palavras: Por não ter o ensino fundamental regular e porque o Estado tem uma coisa em relação ao número de turmas. Então, o prédio é pequeno, atende de C. A. à 8ª série no sistema supletivo, e ..., as escolas da rede estadual, de um modo geral, elas são assistidas financeiramente, de acordo com o número de turmas que elas possuem. Então, você tem vários níveis. Eu não sei em que nível a minha escola está mas é uma escola de pequeno porte e por conseguinte, recebe uma verba menor e por isso muitas coisas que poderiam ser feitas não são. Segundo a Professora, além de fazer a distribuição de recursos financeiros de acordo com o número de turmas, o Estado também controla a quantidade 75 de funcionários das escolas em função desse número. Tendo em vista que os recursos do PDDE, por exemplo, são destinados apenas para escolas com matrículas do ensino fundamental regular. {PAGE } No caso da escola em que trabalha, considerada de pequeno porte, esse critério é utilizado como justificativa para a recusa de solicitações da escola, inclusive da necessidade de um orientador pedagógico. A falta desse profissional, aliada à cobrança da Secretaria Estadual de Educação pelo Projeto Político-Pedagógico da escola, teria levado a diretora a contratar um profissional para elaborar o Projeto, que ficou inconcluso por falta de verba. Diante da afirmação sobre a contratação de um profissional para desenvolver o Projeto Político-Pedagógico, questionei sobre a origem dos recursos e a Professora confirmou a utilização de recursos da escola. Segundo a Professora 5: A direção faz de tudo. Ela tentou chamar uma menina para desenvolver [o Projeto Político-pedagógico] ... porque ela quis botar um orientador ou coordenador pedagógico e não pôde. (...) Então para o Projeto Político-Pedagógico, a gente fez duas ou três reuniões, ... . Nós achamos que a coisa ia para frente, mas aí, por falta de verba, porque a menina estava sendo paga para desenvolver o projeto, ... com verba que a escola recebia do governo do Estado. A professora destaca ainda os empecilhos para a participação docente em qualquer atividade da escola fora as aulas. Segundo ela, mesmo quando as aulas são suspensas para a realização de reuniões, não há a possibilidade de reunir todos os professores. Então fica difícil. Porque quem é que vai desenvolver? são os próprios professores? Até sim. Mas tem que ter alguém mediando ali que tenha uma responsabilidade direta com aquilo para botar no papel o que está sendo discutido. Que se dedique àquilo. E a gente também não pode porque o Estado não deixa você fazer isso. Tirar um dia da semana para tentar resolver isso. Você tem que dar aulas. Para poder fazer reunião a gente adianta os tempos dos alunos ... e mesmo assim não é possível reunir todos os professores pois têm os que não vão naquele dia da semana. E se não é o seu dia você vai lá? Se o governo já te paga mal? A conversa que você escuta é que o salário é muito pouco, o que é verdade. Então, o cara diz que não está podendo se responsabilizar com isso não. Às vezes o cara trabalha o dia inteiro e chaga lá à noite, então quer dizer que às vezes não tem mesmo como se envolver. ... Então é isso e o Projeto Político-pedagógico até hoje não saiu do papel. {PAGE } Perguntada sobre as políticas educacionais que prometem viabilizar a autonomia da escola, a Professora 5 alega que não chegaram informações a esse respeito e que na escola só chegam circulares tratando de mudanças promovidas pelo Secretário Estadual de Educação – Cláudio Mendonça com relação à freqüência dos professores e questionários do Programa Nova Escola, que, segundo a Professora 5, não contribui para a melhoria da escola. Nesse sentido, ela propõe que: Deveria haver uma real avaliação, onde se buscasse saber qual a real deficiência dessa escola. Então vamos avaliar. Já que ela está assim então porque que está assim? Mas não, simplesmente vamos dar uma nota para ela, como se isso fosse resolver o problema. Partindo da proposição de que não chegam informações sobre as políticas educacionais na escola, indaguei-lhe sobre a influência do SEPE junto aos professores a fim de verificar se através do Sindicato essas informações poderiam chegar aos professores. Mais uma vez o SEPE é relatado como indiferente à gestão escolar. Segundo a Professora: O que vai na escola é representante de banco, do BMG, para você pegar dinheiro emprestado. Agora o SEPE nem aparece lá. Ele manda sim. Pelo que fiquei sabendo, pelo menos uma vez ele mandou um panfleto dizendo que haveria greve. Já a professora 6, que leciona História, tem 33 anos de idade, 7 de matrícula na rede estadual, onde trabalha com turmas do ensino médio, e com o 2º segmento do ensino fundamental no Município do Rio de Janeiro. Define a autonomia da escola como a capacidade de gerir os recursos para o atendimento de suas necessidades específicas. Para ela: A autonomia da escola é a capacidade dessa escola gerir os seus próprios recursos, ou seja, através do dinheiro que o Estado manda, a escola ter a consciência de como e quais são as suas áreas de fraqueza e as suas áreas de força e o que que ela pode investir. Como é que ela pode pegar esse dinheiro e saber, por exemplo se ela tem que investir mais em pessoal de apoio, se ela tem que investir mais em merenda ou se ela tem que investir mais em livros para a biblioteca. Administrar as suas forças e fraquezas com esse dinheiro vindo do Estado. Quanto às condições para que a escola atingisse a sua autonomia, a Professora 6 foge um pouco da questão da escola propriamente dita e extrapola na defesa da transparência nos gastos públicos. Nas suas palavras: {PAGE } Eu acho que transparência nos gastos públicos porque hoje em dia falar do que é público vira uma coisa que não é de ninguém, então por isso as pessoas não têm uma questão da responsabilidade, da transparência, seja pelo dinheiro público, pelo bem público. Eu acho que cada vez mais a gente precisa trabalhar a questão da ética, dos valores a preocupação com o que é de todos e isso é fundamental para trabalhar qualquer projeto ligado à educação e ligado à autonomia do ensino público. Como a professora destacou em sua fala a questão da defesa do bem público, indaguei-lhe sobre a “consulta popular” que teria havido nas escolas estaduais, em lugar da eleição direta para diretores. Para a ela, o fato de não haver eleições, impede que a comunidade escolar se sinta responsável ou coresponsável pela gestão da escola. Nas suas palavras: Um grande retrocesso. Voltamos à ditadura. De novo é uma coisa imposta de cima para baixo ...: e aí você impõe uma medida “goela” abaixo das pessoas e esquece que as pessoas, pra participar e para se sentir parte de um processo elas têm que escolher também. Se não, elas não se sentem responsáveis. Você tem co-responsáveis por esse processo de estar na escola e aí a escola não faz o seu processo que é tornar a vida do outro melhor no sentido de que o aluno tem que entrar aqui e sair um ser humano melhor. Mas se ninguém tomar parte ou responsabilidade desse processo acaba virando um depósito de gente. Sobre o conhecimento das Políticas proponentes da autonomia da escola, a Professora 6 faz críticas generalizadas, demonstrando não conhecer as políticas voltadas para a autonomia da escola. Eu conheço muito o discurso, a teoria que normalmente são maravilhosos agora não esquecem de como tem que trabalhar na prática. Então todo o enunciado, todas as propostas maravilhosas isso é sempre falado agora eu queria me aprofundar em algo mais do que só o discurso. Eu queria ver realmente a prática disso. Aproveitando sua crítica enfática às “propostas”, que imaginamos tratar-se das propostas de política educacional, indaguei-lhe sobre a exigência do Projeto Político-Pedagógico com a condição da indicação de diretores e da falta de funcionários da área pedagógica. Nas suas palavras: ... uma grande contradição ... Que toda escola precisa de seu PPP é obvio, mas que ele tem que realmente fazer parte da prática dessa escola então, aí está a grande contradição. Você segue a receita de bolo pedindo que a escola desenvolva o seu projeto, tenha as suas idéias e em compensação você empurra {PAGE } de cima para baixo todo o projeto de autonomia ou administração dessa unidade escolar. Então, por isso, essa coisa não funciona. ... Então, como é que a escola pode ter autonomia se, na verdade, continua o retrocesso, continua a ditadura, continua o impasse ou de novo a recusa em querer ouvir o outro. A Professora 7, que leciona Geografia, tem 57 anos de idade e 39 de matrícula na rede municipal, onde trabalha com turmas do 2° segmento do Ensino Fundamental. Também pensa a autonomia da escola relacionada à sua capacidade gestora tanto no nível administrativo quanto no nível pedagógico. Para ela: É justamente a escola poder se autogerenciar. De uns tempos para cá já está havendo um pouco mais de autonomia, inclusive na questão do currículo. A escola já pode, tendo como base os Parâmetros Nacionais, estabelecer o seu currículo com base nas necessidades da escola e todas as características da comunidade escolar. ... Com relação às verbas, ... de alguns anos para cá ela [a escola] recebe verbas para uso próprio, do governo federal e também do governo municipal. Isso ajudou e muito na questão de pequenos reparos, pequenas necessidades, necessidades imediatas da escola que às vezes precisava esperar decisão da Secretaria de Educação, decisão do Prefeito e agora não. Sobre as condições para que a escola alcance a autonomia, a Professora 7 argumenta que deveria haver mais liberdade para que a escola pudesse fazer parcerias, independentemente de decisões superiores. Seria isso mesmo, a escola não ficar tão presa a determinações do órgão central. Tudo bem que o Sistema é único, o Sistema de Educação do Município é único mas para isso tem-se o acompanhamento com supervisores da própria CRE da Coordenadoria de Educação mas é necessário que realmente a escola pudesse ela mesma fazer as suas parcerias com a comunidade, com entidades oficiais, sem depender de autorização de decisões superiores. Sobre as políticas educacionais, a professora 7 citou o FUNDEF, confundindo-o aparentemente com o PDDE76, os Parâmetros Curriculares Nacionais e, no nível municipal, citou Grupos de Trabalho criados pela Prefeitura para avaliação do Currículo escolar. 76 Os recursos do PDDE são depositados em Contas Corrente das Escolas Públicas que atendem ao ensino fundamental regular o que não ocorre com os recurso do Fundef em que, de acordo com o Art. 2º § 1º da Lei 4024/96, a distribuição dos recursos é feita entre o Governo Estadual e os Governos Municipais. {PAGE } A atual política, que eu conheço mais é do Município e que também está atrelada ao Governo Federal, por exemplo, a criação do FUNDEF, que é o Fundo de Ensino Fundamental que é transformado assim ... a ajuda é transformada em dinheiro, é justamente a verba federal que a escola recebe para ter um pouco mais de autonomia no gerenciamento das suas necessidades. No caso, a Prefeitura também ela cria grupos de trabalho. Agora mesmo, há umas duas semanas eu fui indicada pela escola para fazer parte do grupo do município que vai justamente discutir o currículo Multieducação, porque o currículo usado nas escolas municipais é o Multieducação, que é adaptado em cada escola através do seu PPP. ... No nível federal, a autonomia é dada mais nesse sentido operacional, prático de gerenciar a verba federal. Isso, cada escola, junto com o seu Conselho Escola-Comunidade, decide ... o uso da verba ... e também os Parâmetros Curriculares Nacionais, com isso o MEC também quer dar autonomia para a escola para ela própria criar o seu currículo. A Professora 7 finaliza a entrevista com os seguintes comentários: Eu acho que a escola pública ... a gente pode fazer uma escola pública de qualidade mas, ... às vezes a escola luta por fazer um bom trabalho mas esbarra numa série de problemas, ..., até mesmo da comunidade em volta, o despreparo dos professores de enfrentar problemas que surgem na escola que fogem da alçada de ser professor. A gente encontra muito e nós somos despreparados para isso. A gente vai mais na intuição, no bom senso mas é muito complicado. Mas tenta-se de qualquer maneira, ainda, fazer uma escola pública de qualidade e democrática que dê oportunidade a todo mundo. Sobre as concepções de autonomia da escola evocadas pelos professores, a maioria deles, - 5 entrevistados trataram como algo que se daria intra-muros escolares, ou seja, não estabelecem em suas definições vínculos extra-intitucionais. Ao que parece, a autonomia da escola para esses professores se daria no interior da escola, independentemente das políticas e/ou propostas educacionais. Dois dos professores entrevistados, porém, mencionaram a relação da escola com as políticas e/ou propostas educacionais mas somente para reivindicar como autonomia da escola uma independência ou desvinculação da escola das instâncias superiores e/ou do Poder Público. Quando perguntados sobre as condições para que a autonomia por eles proposta chegasse à escola, quatro dos professores mencionaram a relação da escola com instâncias superiores ou com o Poder Público. Dois dos {PAGE } professores reivindicaram leis/propostas que atendessem mais diretamente às realidades específicas da escola, e os outros dois professores reivindicaram a previsão de maior liberdade de ação nas determinações dos órgãos superiores destinadas às escolas. Dos demais professores – três - que não estabeleceram vinculações extra-escolares como condição para a autonomia da escola, um extrapolou a questão da autonomia da escola, fugindo da questão colocada, e dos outros dois, um professor exaltou a eleição de conteúdos a serem ministrados para as turmas, pelo professor e pela escola, e o segundo professor mencionou a construção e a execução do Projeto Político-pedagógico como condição para a autonomia da escola. Sobre as políticas educacionais propriamente ditas, três professores alegaram total desconhecimento de qualquer política educacional. Dos demais entrevistados, dois mencionaram o Fundef, mas apenas um deles fez comentário, ainda que superficial, do que seria, em seu entender, o objetivo do Fundo. O Programa Nova Escola também foi lembrado por dois entrevistados77, que fizeram críticas radicais aos seus objetivos e sua metodologia na avaliação das escolas estaduais. E somente uma entrevistada descreveu o PDDE, embora o tenha denominado de Fundef, e os Parâmetros Curriculares Nacionais como propostas voltadas para a autonomia da escola. Vejamos em seguida as questões trazidas pelos demais profissionais entrevistados. Foram entrevistadas em conjunto 3 profissionais atuantes em uma mesma escola da rede municipal que atende ao 1° segmento do ensino fundamental, a turmas de educação infantil e a uma classe de portadores de deficiência auditiva. Entrevistamos a diretora da escola78, que tem 31 anos de matrícula na rede municipal, a Coordenadora Pedagógica, com 18 anos de matrícula, e a Professora atuante na Sala de Leituras, que tem 6 anos de matrícula e é formada em Letras. 77 Um dos entrevistados em destaque, mencionou o Fundef e discorreu críticas ao Programa Nova Escola concomitantemente. 78 Diretora 1 {PAGE } Para a Diretora 1 e a Coordenadora Pedagógica, a autonomia da escola corresponderia principalmente, à liberdade de gerenciar os recursos da escola em função de suas necessidades específicas, enquanto que, para a Professora da Sala de Leituras, a autonomia se daria no âmbito de sua atuação em sintonia com os projetos da escola. Nas palavras das entrevistadas: Coordenadora Pedagógica - ... seria uma liberdade de você estar gerenciando os recursos disponíveis, de maneira responsável, ... Diretora - Eu concordo porque isso até a gente tem, os recursos, a gente procura gerenciar mas ainda tem coisas que a escola tem que submeter a uma avaliação sobre o que pode e o que não pode, ficando ainda muito dependente. Professora da Sala de leituras - No meu caso, que estou com turma, é uma liberdade responsável para atuar de acordo com a sua informação, com a sua experiência mas de acordo com os projetos da escola. A partir da reivindicação pela liberdade na gestão dos recursos da escola, procurei direcionar as perguntas no sentido de entender de que maneira a escola poderia ser menos dependente conforme a colocação da Diretora 1. Nesse sentido perguntei sobre a proveniência dos recursos da escola e obtive as seguintes respostas: Diretora 1 - Do PDDE e do SDP [Sistema Descentralizado de Pagamento] que a Prefeitura do Rio dá para as escolas de acordo com a necessidade da escola e com o número de matrículas, uma verba com a natureza de despesa 34, que é para consumo - material para professor, para alunos, para secretaria, material de informática, material para a sala de leitura, e para pequenos consertos. E a natureza 63, que é para pequenas reformas no prédio, mobiliário ... Sobre a gestão desses recursos, a Diretora 1 descreve: [O SDP] substitui o Fundo Rotativo. (...). A gente agora está recebendo um e na semana que vem a gente vai se reunir com o CEC para a gente planejar o que vai fazer. Nós terminamos o planejamento essa semana do PDDE de 2005 e vamos fazer agora do SDP. Sobre as condições para que a escola tivesse autonomia, a Diretora 1 e a Coordenadora reivindicaram maior liberdade para a gestão dos recursos. Para elas, através de uma margem maior de decisão no âmbito da escola, haveria a possibilidade de atender às necessidades específicas da escola. {PAGE } Diretora 1 - A gente, em parte tem autonomia só que ela é uma autonomia vigiada, ... Coordenadora - E eu acho que é muito restrita, por exemplo o 6379 tem que ser só para aquilo. Diretora 1 - Tinha que ser uma coisa mais aberta, mais ampla em que você pudesse gerenciar de acordo com as necessidades totais da escola. (...) , por exemplo, o PDDE ..., a escola está com dificuldades de fazer passeios porque é difícil conseguir um ônibus, está muito caro e a nossa escola gosta muito de passear até porque os professores aproveitam para engajar isso no projeto (...). Mas, para a gente fazer um passeio com o PDDE, a gente não pode levar duas ou três turmas porque todos os alunos da escola têm que ser contemplados. (...) A gente não pode fazer só passeio, porque para passear com a escola inteira, a verba ia toda embora. Coordenadora - Eu acho que ... teria que atender mais às necessidades específicas da escola. Qual é a necessidade do momento? Investir mais em aulas-passeio? Que se pudesse ter essa liberdade porque aqui, já está tudo mais ou menos de acordo, não temos mais necessidade de tanta obra. Mas se aquele dinheiro for reservado para obra, tem que ser obra, tem que ser reparo. Deveria haver mais autonomia na prática, no dia-a-dia mesmo. Diretora - Então, é uma liberdade, é um dinheiro que você tem, que você tem liberdade para gerenciar aquela verba mas não é uma liberdade total. Acho que o diretor deveria ter uma liberdade mais ampla para gerenciar da forma como ele achasse melhor. Como a liberdade no uso dos recursos foi bastante exaltada, questioneilhe sobre a prestação de contas. A esse respeito a Diretora 1 argumenta ser um processo trabalhoso e que toma um tempo que o diretor não tem para gastar. Diretora 1 - A prestação de contas é bem complicada. Uma coisa também, muito difícil, no gerenciamento das verbas é a questão da cobrança de tomada de preços. Nós tivemos uma experiência no ano passado do PDDE, que geralmente em junho a gente manda o planejamento e em julho, o dinheiro está na conta e aí você tem de julho a 31 de outubro para prestar contas e no ano passado, o PDDE só saiu após 15 de outubro e a gente só teve aquele espaço de 15 dias para você refazer o trabalho, gerenciar e prestar contas e aí ficou complicado porque a gente fez uma tomada de preços em julho e tudo aumentou muito, e quando chegou em outubro, já não dava para fazer as mesmas coisas. E o SDP também, na questão da tomada de preços. Se você vai fazer um serviço de obras, você tem que pesquisar dois, 79 Referindo-se a uma especificidade do uso dos recursos oriundos do SDP. {PAGE } três profissionais, se você vai comprar material você tem que ter três pesquisas e isso toma muito tempo e o diretor não tem tempo para isso. Eu acho que aí é que está a questão pior do gerenciamento dessas verbas. (...) Sobre as políticas voltadas para a autonomia da escola, a Coordenadora e a Diretora 1 mencionaram o PDDE e o SDP e disseram ter tomado conhecimento dessas políticas em reuniões, seminários e circulares da Secretaria Municipal de Educação. Coordenadora – Até cursos eles estabeleceram. Até que as informações chegam. Diretora – Até porque, a gente não é formado em contabilidade e tem que gerenciar isso como se fosse um contador e tem as questões dos tributos que é bem complicado e a gente tem que ter aquilo tudo na cabeça, prazos para o pagamento dos tributos, percentual do que é que vai descontar na nota fiscal, nos recibos e é bem complicado. A partir da declaração do conhecimento sobre o funcionamento das políticas de financiamento das unidades escolares, questionei as entrevistadas sobre a participação dos responsáveis na gestão dos recursos80. Segundo a Diretora 1 e a Coordenadora, a participação da comunidade parece ser uma rotina na administração da escola. Diretora 1 – A escola tem o CEC ... Por exemplo, nas reuniões de pais, a mãe representante dos responsáveis participa juntamente com a direção, para prestar contas aos pais. ... Temos uma reunião marcada com o CEC para planejar o SDP e ver o planejamento do PDDE se vai continuar o mesmo ou se a gente vai dar uma mexida. Coordenadora – Agora, durante esses anos todos, a gente têm zelado muito pela transparência e por ouvir a comunidade. O que o professor precisa, o que é que vai facilitar o processo ensino-aprendizagem, o que é que vai ser bom para o aluno? Porque a gente acha que a escola tem que ser prazerosa, você tem que chegar e se sentir bem e aí é o que a gente têm feito com esses recursos, investindo mesmo na questão de que tanto aluno, responsáveis, professores e funcionários em geral, terem prazer em estar na escola. Conforme destacado anteriormente, a Diretora 1, a Coordenadora Pedagógica e a Professora da Sala de leituras foram entrevistadas em grupo e trabalham juntas em uma mesma escola da rede municipal. Cabe destacar que 80 Tendo em vista que para receber os recursos do PDDE, as escolas públicas de ensino fundamental regular são obrigadas a ter uma unidade executora composta por representantes da comunidade escolar. {PAGE } as relações estabelecidas nesse tipo de escola são muito específicas. A presença diária dos professores, a carga horária da equipe de direção de 40 horas semanais e o interesse dos pais/responsáveis dos alunos pela escola são fatores que contribuem para que haja uma gestão participativa. As entrevistadas a seguir, embora tenham feito suas declarações em separado, atuam também em uma mesma escola da rede estadual que até 2004 atendia ao 2º segmento do ensino fundamental e ao ensino médio, passando a trabalhar somente com o ensino médio a partir de então. Foram entrevistadas: a Diretora81, que tem 38 anos de idade e 20 de matrícula, e a Secretária Escolar, que tem 48 anos de idade e 22 de matrícula. Também para a Diretora 2, a autonomia da escola estaria relacionada à maior liberdade no gerenciamento dos recursos da escola. No entanto, a Diretora 2 reivindica maior participação no sentido da escola propor para a Secretaria de Educação o valor necessário para se manter. Para mim a autonomia teria que ser ampla, geral e irrestrita. Quando você fala em autonomia, é você poder fazer o que é necessário com as verbas que são recebidas, prestando contas, é lógico, ... A autonomia para mim, seria a autonomia não só no sentido de verbas, que é a autonomia de você poder comprar o que é necessário e não ser restrito ... porque é restrito em algumas coisas, você pode comprar 40% de material didático, 30 % de material permanente. Então você tem uma certa restrição para comprar e, às vezes, não é isso o que você vê na escola. Você vê que é necessário comprar um determinado material, um determinado objeto que custa, às vezes, 50% da verba mas é necessário e você não vai comprar, não pode comprar porque você não tem autonomia para comprar? Porque existe uma restrição de valores para você comprar? Então isso não é autonomia. Como a insuficiência de recursos e a falta de liberdade no gerenciamento dos mesmos foram destacadas pela Diretora 2, questionei-lhe sobre a origem e o período em que o dinheiro chega até a escola; obtendo a seguinte resposta: A verba de manutenção é do Estado e a verba de Merenda é federal. Agora existe um calendário. O Secretário de Educação, esse ano, publicou um calendário das verbas. Então, mais ou 81 Diretora 2 {PAGE } menos de dois em dois meses, é depositada a verba tanto de merenda quanto a de manutenção mas mesmo assim, o dinheiro não é suficiente porque, por exemplo, eu lido com uma média de 500 alunos, são 11 turmas de 2° grau e a verba de merenda é de R$ 4.000,00 que, hipoteticamente, para o Estado tem que dar para manter esses alunos por um mês e meio a quase dois meses comendo o que no cardápio seria não só a merenda do cardápio como teria que ter suco, uma fruta ... só que não dá. .... Na verdade eu tenho que fazer um cardápio alternativo, que pegue alguma coisa do cardápio do Estado mas ... que seja um cardápio um pouco mais barato para que todos consigam comer todos os dias. ... . Além disso eu é que tenho que fazer levantamento de preços e comprar. Para isso existe autonomia, de executar. Agora, deveria existir também autonomia no sentido de nós propormos para a Secretaria, qual o valor necessário da verba para manter esses alunos durante esse período. Nós é que deveríamos dizer – Olha, o valor necessário é tanto! e não eles acharem ... eles estipulam o valor per capita, a per capita do aluno é menos de R$ 1,00 por aluno. Eles acham que com menos de R$ 1,00 o aluno pode fazer uma refeição por dia, uma refeição completa. Agora a gente faz o que é possível para que as pessoas não fiquem sem a merenda. Nesse sentido, existe uma certa autonomia, porque eu posso fazer o que for necessário. Mas eu acho que a autonomia deveria ser de nós podermos chegar até as autoridades competentes e colocarmos para elas quanto é realmente necessário para cumprir aquele programa que a Secretaria coloca. Sobre as condições necessárias para que a escola tivesse autonomia, a Diretora 2 sugere maior participação dos diretores no processo de tomada de decisão da Secretaria de Educação. Eu acho que os diretores deveriam ser mais ouvidos pelos órgãos competentes, pela própria Secretaria, pelo próprio Governo do Rio porque nós que estamos dentro da escola, ..., nós sabemos o que é necessário e quando é necessário ou não é para cumprir as normas que a Secretaria exigir. Mas a gente não é perguntado sobre isso. A gente só é solicitado para realizar as coisas necessárias, a gente trabalha, faz relatórios, tem que mandar documento daqui documento dali, fichas. Só que você não é solicitada na hora de propor. Quando eles propõem uma determinada coisa você não é perguntada se aquilo vai ser realmente eficaz, se não vai ser. .... A gente participa de cumprir as decisões não participa da escolha das decisões. Seria importante ouvir os diretores porque a gente que está aqui na escola a gente sabe da realidade do que precisa e do que não precisa. {PAGE } E sobre as políticas educacionais, a Diretora 2 cita a criação das Associações de Apoio à Escola, conforme a chamada Lei da Autonomia - Lei 3.067/98. Os programas de trazer a autonomia para a escola, primeiro a Secretaria lançou a questão da escola fazer uma AAE, que é uma Associação de Apoio à Escola ... [em que] os membros dessa associação ... são professores, funcionários, alunos, as pessoas que participam da AAE, que assinam, que verificam, que fiscalizam são pessoas da comunidade de dentro da escola. ... Isso foi uma coisa boa que o Estado fez porque foi uma coisa que oficializou essa autonomia da escola, porque antigamente ... você recebia a verba, [que] era chamada de empenho e aí você recebia o empenho, gastava e prestava contas mas não tinha associação e você não tinha talão de cheques, não tinha conta em banco. Era o empenho que chegava e você tinha que gastar com os fornecedores que já eram determinados e acabou. Agora não, com a Associação você tem tudo legalizado, talão de cheques, conta em banco, cartão do banco, extrato no final do mês. Então você controla tudo, o banco manda para você e você controla. Além das questões inicialmente propostas, indagamos à Diretora 2 sobre a escolha de diretores nas escolas estaduais e ela descreve o processo: A última eleição foi feita em 2001. Era para ter sido feita em 2003 e foi adiada e aí em 2004 eles decidiram que seria por indicação. Desde 2001 que não tem eleição direta. O SEPE brigou, brigou mas não adiantou. No ano passado foi feita uma consulta aos alunos e professores ... . Só que essa consulta muitas vezes não foi respeitada. Teve escolas em que o diretor que venceu na consulta popular não foi o que ficou na direção da escola. O que ficou foi o que foi indicado pelo político ou pelo Secretário ou sei lá por quem. Na verdade houve vários casos desses. Aqui até que não houve isso porque só houve uma candidatura. ... Mas teve escolas em que havia mais de uma candidatura, e quem foi oficializado não foi quem ganhou a “eleição” da escola. ... E houve casos de diretores que foram tirados, por algum motivo, perseguição ou sei lá o quê e foi colocada uma outra pessoa no lugar dele também de fora, escolhida pela Coordenadoria. Isso aconteceu em escolas grandes, escolas com um número de alunos muito grande, escolas de três turnos, CIEPs e a gente até acha assim, não pode nem falar muito sobre isso mas é uma questão de poder econômico. Algumas escolas foram escolhidas porque têm uma verba alta. As escolas que gerem verbas altas e têm um número de alunos muito grande, as escolas com três turnos, muitos funcionários então essas escolas foram deixadas realmente para as {PAGE } pessoas que eles escolheram. Mas houve casos também de escolas pequenas em que a direção foi trocada porque havia diretores que não eram bem quistos. A Diretora 2 considera que a substituição da eleição de diretores pela “consulta popular” constituiu um passo contrário à autonomia da escola, pois o controle da Secretaria de Educação sobre as atividades das escolas e dos diretores foi aumentada. Para a Diretora 2: Aí, agora existe aquela cobrança em cima do diretor que ficou de que: - Você foi indicado. Você não pode fazer isso ou aquilo sem comunicar, sem passar por nós porque ... você não foi eleito. É como se nós fôssemos representantes da Secretaria. Eu não me considero representante da Secretaria eu sou representante de uma comunidade. A partir do momento que aquela comunidade não quiser mais, eu estou fora, mesmo que a Secretaria diga que eu tenho que ficar, eu não sou obrigada. ... E as escolas estão sendo muito cobradas. Esse ano tem uma cobrança da Secretaria muito grande sobre o diretor. Acho que eles estão cobrando demais e não estão dando condições para cumprir o que eles estão pedindo e isso se deve à mudança do Secretário. Para a Secretária Escolar, atuante na mesma escola que a Diretora 2, a autonomia da escola se daria no âmbito de uma gestão livre da intervenção de instâncias superiores. Para ela: Uma escola autônoma é ela poder resolver tudo. Eu acho que é isso, sem intervenção porque uma escola não pode ser igual a outra porque vai de acordo com a clientela. Não é mais aluno, é clientela. E aí eles impõem coisas que de uma escola para outra não dá para fazer o mesmo trabalho porque modifica muito. Sobre as condições para a autonomia, a Secretária Escolar propõe que a escola deveria trabalhar em função “da comunidade, da clientela sem comparação de bairros, de municípios”. Pelo seu discurso parece haver uma crítica ao padrão de avaliação do Programa Nova Escola, que, no entanto, não foi citado. E, quanto às políticas educacionais, a Secretária Escolar embora não declare desconhecê-las, faz considerações inexpressivas. As concepções de autonomia da escola para as Diretoras, para a Coordenadora, para a Professora da Sala de Leituras e para a Secretária Escolar, vão ao encontro de uma perspectiva interinstitucional de autonomia, {PAGE } ou seja, que leva em consideração as relações da unidade escolar com outras instituições. Para a maioria das entrevistadas, a autonomia da escola se expressaria em uma liberdade maior para gerenciar os recursos da escola. Somente a Professora da Sala de Leituras propôs a autonomia da escola como uma atuação em sintonia com o Projeto Político-Pedagógico. Sobre as condições para a autonomia, as entrevistadas diversificam suas respostas. A Diretora 1 e a Coordenadora Pedagógica mantiveram sua proposta no nível institucional e insistem na liberdade para gerir os recursos da escola. A Professora da Sala de Leituras, não opinou quando as questões passaram a exigir um conhecimento maior do funcionamento administrativo da escola. Já a Diretora 2 extrapola o limite institucional e reivindica maior participação dos diretores na formulação, no planejamento das Secretarias de Educação. Para a Secretária Escolar, contudo, a condição para a autonomia da escola estaria dentro da própria instituição, através de seu trabalho voltado para a comunidade mas sem uma suposta comparação de bairros, de municípios, que poderíamos entender como uma crítica aos critérios de avaliação do Programa Nova Escola. Sobre as políticas educacionais, a Diretora 1 e a Coordenadora Pedagógica citaram o PDDE e o SDP, enquanto a Diretora 2 mencionou as Associações de Apoio à Escola criadas pela Lei da Autonomia. A Secretária Escolar, embora não o tenha declarado, demonstrou desconhecer as políticas educacionais. Conforme anunciado, pretendemos nesse capítulo identificar as concepções de autonomia de professores, dirigentes e outros profissionais de unidades escolares; bem como sua avaliação sobre o grau/tipo de autonomia gozada pelas escolas. Para tanto nos lançamos a seguinte questão: “Os olhares de profissionais da educação sobre a autonomia da escola poderia ser uma “avaliação” das políticas educacionais?” A essa pergunta respondemos enfaticamente que não. Muitas questões importantes foram levantadas pelos depoentes, mas grande parte deles afirmou desconhecer as políticas educacionais. Até mesmo a LDB e o Plano {PAGE } Nacional de Educação não foram citados, dificultando a expectativa de uma avaliação das políticas em vigor. Os resultados das entrevistas serviram, contudo, como uma avaliação da forma pela qual as políticas e/ou propostas educacionais supostamente “viabilizadoras” da autonomia da escola têm influenciado o cotidiano escolar. A constatação do desconhecimento dos professores sobre essas políticas por si indicam que a gestão democrática não tem sido uma realidade. A maioria dos entrevistados apresentou uma concepção de autonomia da escola voltada para questões intra-escolares. Algumas propostas, contudo, consideraram as relações extra-escolares mas com o intuito de reivindicar uma desvinculação da escola de instâncias superiores como expressão de sua autonomia. Somente uma Diretora de escola da rede do Estado do Rio de Janeiro reivindicou maior participação dos diretores na formulação das regras/resoluções determinadas pela Secretaria de Educação. A reivindicação da suposta incapacidade das políticas, leis, propostas e similares em dar conta dos problemas específicos das unidades escolares foi praticamente unânime nas entrevistas e, baseando-se nesse pressuposto, alegou-se em alguns casos a necessária independência da instituição escolar das instâncias superiores. Entendemos, contudo, que os problemas específicos enfrentados por cada escola podem não ser tão específicos ou particulares. Nesse sentido, a violência, a indisciplina, a falta de expectativa dos jovens com relação a seu futuro, a situação de extrema pobreza econômica e cultural de muitos dos que conseguem chegar às salas de aula, o despreparo de professores e demais profissionais da educação, a falta de recursos financeiros, humanos e estruturais por que a escola tem passado, o desinteresse da sociedade pela instituição escolar, o desencanto e a falta de compromisso de alguns professores, são problemas que atingem muitas escolas públicas brasileiras. Embora muitos dos entrevistados tenham alegado o desconhecimento das políticas e/ou propostas educacionais, seus depoimentos tenderam a {PAGE } reforçar a perspectiva da escola como núcleo de execução. Não houve, principalmente nos discursos dos professores, um posicionamento contrário a essa perspectiva. Não houve, por exemplo, nenhum discurso que argumentasse a necessidade de mudanças estruturais na fundamentação das leis e políticas educacionais vigentes. A impressão que se tem a partir da leitura das entrevistas é a de que em primeiro plano, a perspectiva de focalização da localidade presente nas falas, produziu um isolamento ou uma falsa independência da instituição escolar das características sócio-econômicas e culturais do país e, portanto, do públicoalvo das escolas públicas. É como se o quadro de desigualdade social brasileira não interferisse diretamente no funcionamento das unidades escolares, no seu cotidiano e, dessa forma, a própria escola teria condições ou a obrigação, de dar conta desses problemas. Conforme declarado no capítulo anterior, entendemos como autônoma a escola politicamente participada e participativa cuja administração é baseada na ativa participação de seus membros que, enquanto grupo organizado, interagem conscientemente com as questões locais, conjunturais e estruturais da sociedade. Nessa perspectiva, para que a escola exerça sua autonomia, seus membros devem ter consciência do papel que ela representa e/ou deve representar tanto para àqueles que a procuram quanto para a transformação ou perpetuação das estruturas sociais. Ter consciência do papel da escola implica, dentre outros fatores, ter ciência das políticas que regulam o funcionamento das escolas e, dessa forma, ter condições pelo menos de avaliar essas políticas. {PAGE } Considerações finais - Qual autonomia? Definir o conceito de autonomia não constitui uma tarefa fácil. Conforme tratado no primeiro capítulo, no que se refere a questões de descentralização e desconcentração de poder, o conceito surge ligado à idéia de participação social ou ampliação da participação política confundindo-se com a construção da perspectiva rousseauneana de democracia. Cabe, portanto, enfatizar a distinção fundamental entre as concepções originárias de autonomia e, a concepção evocada como sinônimo de descentralização tal como prevista no projeto liberal em que a autonomia seria a garantia da representação dos interesses individuais, da auto-afirmação em meio a uma sociedade individualista. Somente a partir da segunda metade do século XIX, que a autonomia passa a ser entendida como uma possibilidade em projetos coletivos através da autogestão, envolvendo questões sobre a participação e a representação popular. No campo educacional, o ideal de autonomia da instituição escolar na perspectiva da autogestão sofre uma re-significação na década de 80 e passa a ser utilizado como sinônimo de descentralização e/ou desconcentração. A partir da perspectiva neoliberal das políticas educacionais dos anos 90, constata-se a existência de uma crise de eficiência, eficácia e produtividade materializada na baixa qualidade do ensino. A solução estaria na implementação de processos de desconcentração e/ou descentralização dos sistemas escolares embora estudos sobre as experiências de políticas de descentralização na América Latina, tenham revelado que seus objetivos não foram alcançados, principalmente no que concerne à melhoria da qualidade do ensino,. Nesse sentido, entendemos tal como Arretche (1997), Davies (1992) e outros autores, que não é o nível ou a hierarquia da tomada de decisões que define seu caráter – democrático ou antidemocrático - mas a intencionalidade {PAGE } das resoluções. A descentralização pode ou não contribuir para a autonomia das instituições, constituindo apenas, um instrumental para a implementação de projetos. Dessa forma, o questionamento deve recair sobre os objetivos próprios dos projetos (se efetivamente democratizador ou proponente da participação superficial, apenas na execução de funções previamente determinadas). O histórico da implementação de reformas descentralizadoras no campo da educação brasileira é exemplificador do equívoco – ou estratégia – de considerar a descentralização como sinônimo de promoção da autonomia. As experiências descentralizadoras durante o período da ditadura militar são avessas à idéia de promoção da autonomia. Somente a partir dos anos 80 que esses conceitos são aproximados e até mesmo confundidos, tanto nas políticas educacionais, como nas reivindicações da sociedade civil. Nos anos 90, esses conceitos passam a ser praticamente sacralizados e a promessa da autonomia, via descentralização, torna-se utensílio indispensável para a empreitada reformista que chega ao século XXI na forma de incentivo à participação social e à ação voluntária na gestão das unidades escolares. No Capítulo 2, vimos que houveram tentativas de estruturação de propostas de políticas educacionais pautadas no processo democrático tanto em sua constituição quanto na perspectiva da democratização do espaço escolar (principalmente da escola pública). Contudo, o atropelamento dessas ações e intenções possibilitou o prevalecimento de leis que, em alguns casos, primam pela omissão e/ou pela superficialidade em questões centrais para a definição de rumos da escola pública. Conforme destacado, tanto a LDB, quanto o PNE-Lei não têm a efetiva democratização do espaço escolar como meta pois, não asseguram a obrigatoriedade da eleição para diretores das unidades de ensino, delegando a Estados e Municípios o ônus ou bônus dessa decisão e não tratam objetivamente da questão da autonomia escolar. No Estado do Rio de Janeiro, a chamada Lei da Autonomia, também tornou-se incapaz de atingir os seus objetivos principais pois, a perspectiva de {PAGE } autonomia administrativa da Lei 3067/98 era fundamentada na eleição direta para diretores das escolas e na participação efetiva de alunos e responsáveis na avaliação do processo de ensino-aprendizagem previstos nos incisos revogados por uma ADIn. Somente no Município do Rio de Janeiro há a obrigatoriedade da eleição de diretores por conta da previsão em sua Lei Orgânica. Embora a maioria das políticas estudadas, ainda que de forma superficial, declarem almejar a autonomia das escolas, poucas são as que expõem a concepção de autonomia das unidades escolares de forma clara, e, principalmente, a forma pela qual as escolas alcançariam essa autonomia. No Capítulo 3 identificamos que há um grande desconhecimento das políticas educacionais, principalmente por parte dos professores. Grande parte deles afirmou desconhecer as políticas educacionais e até mesmo a LDB e o Plano Nacional de Educação deixaram de ser citados o que dificulta uma avaliação das políticas em vigor. As entrevistas serviram, contudo, como uma avaliação da forma pela qual as políticas e/ou propostas educacionais supostamente “viabilizadoras” da autonomia da escola têm influenciado o cotidiano escolar. A constatação do desconhecimento dos professores sobre essas políticas por si indicam que a gestão democrática não tem sido uma realidade. A maioria dos entrevistados apresentou uma concepção de autonomia da escola voltada para questões intra-escolares. Somente uma Diretora de escola reivindicou maior participação dos diretores na formulação das regras/resoluções determinadas pela Secretaria de Educação. A suposta incapacidade das políticas, leis, propostas e similares em dar conta dos problemas específicos das unidades escolares constituiu uma fala praticamente unânime nas entrevistas e, baseando-se nesse pressuposto, chegou-se a reivindicação de uma independência da instituição escolar das instâncias superiores. Entendemos, contudo, que os problemas supostamente específicos enfrentados por cada escola podem não ser tão específicos ou particulares. {PAGE } Nesse sentido, a violência, a indisciplina, a falta de expectativa dos jovens com relação a seu futuro, a situação de extrema pobreza econômica e cultural de muitos dos que conseguem chegar às salas de aula, o despreparo de professores e demais profissionais da educação, a falta de recursos financeiros, humanos e estruturais por que a escola tem passado, o desinteresse da sociedade pela instituição escolar, o desencanto e a falta de compromisso de alguns professores, são problemas que atingem muitas escolas públicas brasileiras. Embora muitos entrevistados tenham alegado o desconhecimento das políticas educacionais, seus depoimentos tenderam a reforçar a perspectiva da escola como núcleo de execução. A impressão que se tem a partir da leitura das entrevistas é a de que em primeiro plano, a perspectiva de focalização da localidade presente nas falas, produziu um isolamento ou uma suposta independência da instituição escolar dos graves problemas sociais decorrentes da má distribuição da renda nacional. Concluímos com a defesa de que a autonomia das unidades escolares está diretamente relacionada ao grau de aprofundamento da experiência democrática em cada escola. Nesse sentido, concordamos com Coutinho (2002, p. 17) quando argumenta que, se entendemos a democracia como um processo e não como um estado, “a democratização só se realiza plenamente na medida em que combina a socialização da participação política com a socialização do poder”. Nesse sentido, defendemos como ideal de escola autônoma, a escola que é politicamente participada e participativa, cuja administração baseia-se na ativa participação de seus membros que, enquanto grupo organizado, interagem conscientemente com as questões locais, conjunturais e estruturais da sociedade. Nessa perspectiva, para que a escola exerça sua autonomia, seus membros devem ter consciência do papel que ela representa e/ou deve representar tanto para seu público alvo, quanto para a transformação ou perpetuação das estruturas sociais. Ter consciência do papel da escola implica, dentre outros fatores, ter ciência das políticas que regulam o funcionamento {PAGE } das escolas e, dessa forma, ter condições pelo menos de avaliar essas políticas. {PAGE } Referências Bibliográficas ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In.: SADER, Emir e GENTILI, Pablo (orgs.). Pós-neoliberalismo – as políticas sociais e o Estado democrático. São Paulo: Paz e Terra, 1995. ARRETCHE, Marta. 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O Governador do Estado do Rio de Janeiro, Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º - Os cargos de Diretor e de Diretor Adjunto das instituições de ensino mantidas pelo Poder Público serão preenchidos mediante eleições diretas, livres e secretas, realizadas no âmbito de cada unidade. Art. 2º - V E T A D O. Art. 3º - Para candidatar-se, deverá o professor: I - contar, no mínimo, 2 (dois) anos de magistério público, com pelo menos 1 (um) ano de regência de turma; II - estar em exercício na unidade escolar ou dela não estar afastado por mais de 1 (um) ano; III - ser membro do magistério público estadual; IV - não estar respondendo a inquérito administrativo, nem ter tido participação comprovada em irregularidade administrativa. § 1º - Aos especialistas de educação não será exigido o tempo de regência de que trata o inciso I deste artigo. § 2º - Dos candidatos aos cargos de Diretor e Diretor Adjunto das unidades escolares especais será exigido exercício em Educação Especial. § 3º - Não se admitirá ao professor candidatar-se em mais de uma chapa na unidade escolar em que esteja concorrendo, ou em mais de uma unidade escolar. Art. 4º - A inscrição de chapas será feita até 15 (quinze) dias antes do início do pleito perante a comissão eleitoral. § 1º - No ato da inscrição, a chapa apresentará seu programa de gestão e os currículos profissionais dos seus componentes. § 2º - Será de 10 (dez) dias o período de inscrição de chapas. Art. 5º - A Comissão eleitoral a que se refere o artigo anterior será constituída, preferencialmente, de representantes de todos os segmentos da comunidade escolar e será eleita em assembléia geral convocada especificamente para este fim, até 30 (trinta) dias antes do início do pleito. Parágrafo único - O presidente da Comissão Eleitoral será eleito por seus membros. Art. 6º - São atribuições da Comissão Eleitoral: I - fixar as normas sobre a propaganda e o bom andamento do processo eleitoral, nestas Incluído, obrigatoriamente, em debate público entre a comunidade escolar e a(s) chapa (s) concorrente (s); II - comunicar por ofício ao respectivo órgão local da Secretaria de Estado de Educação a(s) chapas inscritas seu(s) programa(s) de gestão e os currículos profissionais dos candidatos; 82 Disponível em { HYPERLINK http://www.alerj.rj.gov.br/processo2htm }. Acessado em 10/09/2005 {PAGE } III - providenciar as listagens dos eleitores; IV - providenciar ampla divulgação do pleito, suas regras e datas; V - zelar pela legalidade e probidade do pleito; VI - acolher e julgar recursos interpostos pelas chapas concorrentes ou por eleitores; VII - proclamar o resultado do pleito e registrá-lo em ata, a qual será encaminhada em cópia ao órgão local da Secretaria Estadual de Educação. Art. 7º - VETADO Art. 8º - São eleitores para os fins desta Lei: I - os professores e os servidores públicos com funções administrativas lotados e em efetivo exercício na unidade escolar; II - os alunos matriculados na unidade escolar, a partir da 5º série ou que, Independentemente da série que estejam cursando, tenham, no mínimo, 12 (doze) anos de idade; III - um responsável por aluno matriculado nas escolas de pré-escolar e/ou de 1º grau, independentemente da série que esteja cursando. § 1º - Cada eleitor terá direito a apenas um voto na mesma unidade escolar. § 2º - Nas escolas supletivas, de ensino regular para jovens e adultos e nos colégios de 2º grau, os responsáveis por alunos não têm direito ao voto. § 3º - Os professores e servidores públicos cedidos ou amparados poderão optar pelo voto em sua unidade de origem ou naquela em que se encontrem em exercício. § 4º - São assegurados os votos dos analfabetos e dos portadores de deficiência visual. § 5º - Não será admitido o voto por procuração ou por correspondência. § 6º - Ao professor com duas matriculas e facultado o voto, em ambas as unidades, se estiver em exercício em unidades diversas. Art. 9º - Os votos serão ponderados na proporção de 50% (cinqüenta por cento) do total de votantes dos segmentos professor e servidor administrativo e 50% (cinqüenta por cento) do total de votantes dos demais segmentos. § 1º - O quorum mínimo; eleitoral para que seja referendado o pleito será de 30% (trinta por cento) do universo de eleitores da unidade escolar; § 2º - Se ao pleito concorrer apenas 1 (uma) chapa, exigir-se-á, além do quorum previsto, o voto favorável da maioria absoluta do total de votos em cada urna; § 3º - O cálculo para apuração do percentual de votos de cada chapa observará a seguinte fórmula, tantas vezes tantas forem as chapas concorrentes: - 50 X Nº de votos da chapa na Urna A + total de prof. e servidores votantes - 50 x Nº de votos da chapa na Urna B = total de alunos e responsáveis votantes - = Percentual de votos de uma chapa § 4º - Considerar-se-á eleita a chapa que obtiver maior percentual. Art. 10 - Caso não seja atingido o quorum legal, será realizado novo escrutínio no prazo de 30 (trinta) dias, facultando-se a inscrição de novas chapas até 15 (quinze) dias antes de sua realização. Parágrafo único - Não sendo atingido o quorum de acordo com o previsto no "caput” deste artigo, caberá à Secretaria de Estado de Educação a Indicação e nomeação da futura direção. {PAGE } Art. 11 - Cada chapa poderá credenciar até 3 (três) fiscais para acompanhar o processo eleitoral. Art. 12 - As cédulas a serem utilizadas no pleito serão confeccionadas conforme modelo publicado pela Secretaria de Estado de Educação. Art. 13 - . . . VETADO. . . Art. 14 - Nas unidades onde, por ausência de chapas concorrentes, não houver eleições, a Secretaria de Estado de Educação decidirá sobre o preenchimento dos cargos de direção para o próximo biênio. Art. 15 - Nas escolas recém-inauguradas será nomeada, pela Secretaria de Estado de Educação, uma direção provisória até a data das eleições gerais. Art. 16 - A segunda matrícula dos eleitos, se for o caso, será transferida para a unidade onde exercerão seus cargos de direção, durante todo o período do mandato. Parágrafo único - Caso o eleito seja servidor do quadro de outra rede pública de ensino na segunda matricula, o Governo do Estado providenciará sua requisição. Art. 17 - O Poder Executivo regulamentará, no prazo de 90 (noventa) dias a contar de sua publicação, o que for necessário a execução desta Lei. Art. 18 - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Rio de Janeiro, 16 de janeiro de 1996. MARCELLO ALENCAR Governador {PAGE } ANEXO 02 {PAGE } LEI Nº 3067, DE 25 DE SETEMBRO DE 199883. Dispõe sobre a autonomia das unidades escolares da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro e dá outras providências. O Governador do Estado do Rio de Janeiro, Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º - Esta Lei estabelece as diretrizes da autonomia das Unidades Escolares da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro, visando à gestão democrática, ao melhor aproveitamento dos recursos e à qualidade da educação. Art. 2º - A autonomia das Unidades Escolares far-se-á através de um conjunto de práticas integradas, nas esferas administrativas, financeira e pedagógica, com a participação dos diversos segmentos da comunidade escolar, através das Associações de Apoio às Escolas - AAEs. Art. 3º - Cada unidade Escolar da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro será assistida por uma única Associação de Apoio à Escola - AAE, respeitadas as seguintes exigências: I - Instituição sob a forma de sociedade civil, sem fins lucrativos; II - Compromisso de destinar os benefícios de suas atividades à Unidade Escolar a que estiver vinculada; III - Reconhecimento do Estatuto-Padrão, na forma como fixado pela Secretaria de Estado de Educação; IV - Obrigação de prestação de contas dos recursos e bens repassados, a qualquer título; V - Previsão estatutária de, no caso de sua extinção, reverter todo o seu patrimônio ao Estado, vinculada a sua utilização à respectiva Unidade Escolar. Art. 4º - As Associações de Apoio às Escolas - AAEs, organizadas segundo as diretrizes desta Lei, gozarão dos seguintes benefícios: I - Gratuidade de emolumentos e outras quaisquer despesas nos atos necessários à sua constituição e subseqüentes alterações, inclusive as publicações necessárias à validade de seus atos e existência legal, perante as Serventias Judiciais e Órgãos do Estado, da Administração Direta e Indireta; II - Assistência e orientação dos órgãos próprios da Administração Pública do Estado do Rio de Janeiro, no que for compatível com a legislação vigente; III - Reconhecimento da condição de entidades de utilidade pública, para todos os fins de direito. Art. 5º - A autonomia administrativa das Unidades Escolares da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro compreende: I - Escolha dos seus dirigentes pelo voto direto dos seus professores, demais profissionais de ensino, alunos e seus responsáveis, nos termos do disposto na Lei nº 2518, de 16 de janeiro de 1996, e sua regulamentação. 83 Disponível em { HYPERLINK http://www.alerj.rj.gov.br/processo2htm }. Acessado em 10/09/2005. {PAGE } II - Participação democrática dos responsáveis legais pelos alunos e dos discentes no processo de avaliação do ensino-aprendizagem; Art. 6º - A autonomia financeira das Unidades Escolares da Rede Pública farse-á através do repasse de recursos às Associações de Apoio às Escolas AAEs, mediante Convênio, Termo de Compromisso e outros Ajustes. Art. 7º - São considerados recursos destinados às Unidades Escolares da rede pública do Estado os repassados às Associações de Apoio às Escolas - AAEs, nas seguintes condições: I - Repasses obrigatórios de recursos do Tesouro Estadual; II - Repasse do Tesouro Nacional destinados às Unidades Escolares; III - Doações, patrocínios e legados, nos termos da legislação vigente; IV - Subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais; V - Incentivos fiscais previstos em lei; VI - Rendas de qualquer espécie decorrentes das atividades exclusivas das Associações de Apoio às Escolas - AAEs; VII - Outras fontes. Parágrafo único - O orçamento estadual consignará, anualmente, dotação específica destinada à autonomia das Unidades Escolares. Art. 8º - Os recursos financeiros e outros bens repassados a qualquer título para as Associações de Apoio às Escolas - AAEs, serão destinados às atividades próprias do ensino médio e fundamental, entre as quais: I - Aquisição de merenda e material permanente e de consumo para os alunos, inclusive uniforme escolar; II - Pequenos reparos e obras emergenciais do prédio; III - Conservação e manutenção das condições de higiene e limpeza do prédio; IV - Programas de capacitação de professores e de agentes comunitários; V - Programas e projetos vinculados às atividades de ensino-aprendizagem dos discentes. Art. 9º - A autonomia pedagógica das Unidades Escolares da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro compreende a adequação e o desenvolvimento local da proposta educativa, com o estabelecimento de formas próprias de organização do ensino-aprendizagem, observadas as diretrizes legais unificadoras do sistema de ensino e as da Secretaria de Estado de Educação. Art. 10 - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Rio de Janeiro, 25 de setembro de 1998. MARCELLO ALENCAR Governador {PAGE } ANEXO 03 {PAGE } Entrevistas Entrevistado 1 – (14/05/05) f) Tempo de matrícula na rede pública: 3 anos no Município do Rio de Janeiro e 2 anos na rede estadual. g) Função na escola: Professor h) Idade: 42 anos i) Disciplina(s) que leciona: Sexo: Masculino Matemática j) Em qual(is) segmento(s): _5ª a 8ª séries no PEJ – Projeto Educação Juvenil do Município e com Ensino Médio no Estado. Autonomia. Eu acho que hoje nós poderíamos entender a autonomia, em primeiro lugar, como a relação do professor com os alunos. Você tendo um diálogo maior, também não se fechar só nas disciplinas, procurar orientar o aluno. Por exemplo: com os alunos do terceiro ano eu dou uma matéria, mas eu procuro mostrar que aquilo vai servir para ele, não é simplesmente um número, contas, fórmulas. Que aquilo dali, por mais que o cara pense – Para quê que eu estou estudando isso? Então é mostrar para o aluno, principalmente porque em primeiro lugar é aquele aluno que não tem idéia do todo, não sabe o que vai fazer quando terminar o segundo grau. Então eu falo com eles, vocês têm que compreender bem o português porque, vocês têm que saber fazer bem uma redação, vocês têm que compreender bem o português para poder interpretar um problema matemático. Se um dia você for pensar em ser um jornalista você tem que escrever bem, não pode escrever uma frase errada. Têm que conhecer principalmente .... no texto matemático, você tem que saber interpretar para não escrever uma bobagem. Então, eu acho que a autonomia ela começa primeiro na relação do professor com o aluno. Procurar orientar esse aluno para frente. E tem uma autonomia também da Direção com o professor, é uma escada. Da Direção com o professor, te dá autonomia para trabalhar o conteúdo das disciplinas, conversar com eles. Acho então que seria isso. Mas nós estamos nos referindo aqui à questão da escola. Para você o que seria uma escola que têm autonomia? Eu acho que, por exemplo, hoje o Estado, com o pouco tempo que eu tenho, eu vejo que ele está muito atrelado à direção superior. Eu acho que a escola hoje quase não tem autonomia para fazer muita coisa não. Também no Município é assim? No Município, é um pouco mais flexível por causa do PEJ. Mas eu vejo também, que no curso normal – de 5ª a 8ª - ele também tem um peso de lá de cima, de quem está na Secretaria de Educação. Ela coloca algumas questões que têm que ser seguidas e poucas pessoas questionam e quem questiona, às vezes é visto como àquele que está complicando. Agora, por exemplo, o Estado, com esse Secretário – o Mendonça – ele está sendo bastante rigoroso na questão da freqüência do professor. Então a escola não tem muita autonomia não para trabalhar independente. Eu ia falar um negócio sobre a questão do conselho de classe. Marcaram os conselhos todos no sábado. Então, qual a autonomia que os professores têm para dizer nós não queremos os conselhos no sábado? Se você falta eles cortam teu ponto. E no meu caso em que a gente ainda está no estágio probatório? Como é que eu vou faltar? Então eu acho que a escola tem muito pouca autonomia para fazer alguma coisa diferente. Tem sempre alguém que está olhando e questionando o de cima. Porque que vai fazer isso? Mas isso leva a alguma coisa? {PAGE } Acaba interferindo também no pedagógico, dentro da sala de aula. É, você tem um programa para ser cumprido e se ficar falando muito em vestibular, o programa não anda, não é? Eu acho que tá fraco. A escola não tem muita autonomia não. O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? Eu acho que para ela chegar à escola, essa autonomia, eu acho que primeiro, por exemplo, vem a questão do programa. O programa que é dado para os alunos já é predeterminado. Eu acho que uma das autonomias seria os professores, dentro da realidade da comunidade, dizer o que é que tem que ser dado e o que não tem que ser dado. Porque, com certeza uma escola, mesmo sendo do Estado, lá na zona sul ela é uma escola diferente da de Nilópolis. è outra realidade, não é? Eu peguei essa turma de terceiro ano, e o que eles falaram para mim? A professora do 1º ano só deu função o ano todo, o professor do 2º ano procurou dar algumas coisas que eles deveriam ter visto no primeiro mas não deu o que tinha que ser dado no segundo. E eu que cheguei agora, to pegando tudo aquilo que não foi dado e montei um programa. E aí o que é que acontece? Se você for pegar os três anos, não bate com o programa da Secretaria porque cada um fez uma coisa diferente. E aí eu pergunto: Esse programa que foi dado é o mesmo de uma escola em Anchieta? São realidades diferentes. Então, eu acho que a autonomia passa por aí. Os próprios professores no início do ano letivo, definir o que é que vai ser dado para as turmas. Mas isso também passa por um projeto da escola não é? É o que eles chamam de projeto pedagógico. Então é por isso que, quando, a gente define a questão do que é que deve ser dado, deve-se trabalhar em cima do PPP. E geralmente, o que eu sinto é que os professores, não se interessam pelo PPP. Um ou outro professor diz que tem que fazer isso no dia das mães, dentro do que a gente planejou no início. Mas na verdade, se você tem 20 ou 25 professores em uma reunião, dois ou três dão uma sugestão. ... Então eu acho que 80 ou 90 % vão dizer. O que resolver está resolvido. Principalmente àqueles professores mais antigos. O cara já está de saco cheio. A gente que está entrando novo, ainda tem um pique, ainda dá uma sugestão, ainda fala alguma coisa. Eu acho que, com certeza, a autonomia, o PPP passa por essa discussão dos professores. Mas muitas vezes se diz o PPP é isso daqui. Vamos trabalhar isso e só o fulano deu a sugestão e não foi discutido. Ás vezes o professor até tem uma boa idéia, mas aquilo não é discutido. Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? Eu não sei, respondendo a letra c, eu não sei como é que a escola, trata dessa questões. Não nos é passado nada nem no Município, nem no Estado. Para você ter uma idéia, ontem, no Município, eu falei para os professores recém chegados, que sexta-feira que vem é o Conselho de Classe. Então a gente já vai adiantando durante a semana para quando chegar na sexta, já está tudo encaminhado e não deixar tudo para a última hora. E aí eles perguntaram, mas tem conselho? E eu disse, sim tem. O aluno para ser promovido de uma unidade para a outra, tem que haver um conselho. Isso não foi passado para vocês? Não. Então, quer dizer isso é uma falha de quem? da coordenação pedagógica escola. Quando o cara chegou, teria que ser explicado como funciona o PEJE. Pra gente foi explicado a metade e a outra metade a gente aprendeu com o caminhar da coisa. Agora, realmente eu não conheço a política dos governos. Eu consegui um estatuto do município. Um estatuto simplificado que tem a questão das faltas do horário, com o tipo de licença que se tem direito, mas é o básico e no Estado nem isso. Mas na escola não se fala na questão da gestão de recursos? Não, o que a gente comenta mais no Município sobre o FUNDEF. Por que, segundo a informação do Professor de História, o FUNDEF, é um fundo para complementar a renda do professor. Então se o seu salário é 1000, o FUNDEF complementaria para 1200 e não está {PAGE } sendo feito isso. Estão usando o FUNDEF para pagar o salário do professor. No ano passado, eu fiz um curso de extensão, pelo Município, lá na PUC. O dia da formatura foi um dia todo, várias turmas se formaram. Mas o que eu quero dizer é que qualquer professor da rede poderia ter dado esse curso. Poderia ter sido um professor mais experiente. ..... No Município há eleição para diretores? Existe tanto no município quanto no Estado. A comunidade vota mas o que acontece é que é também uma eleição direcionada pois geralmente há somente uma chapa onde se faz um rodízio do mesmo grupo a cada eleição. Entrevistado 2 – (14/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública:_2 anos no Município do Rio de Janeiro e 3 anos na rede estadual.. b) Função na escola: __Professor a) Idade: ____31 anos___ b) Disciplina(s) que leciona: _____Língua Portuguesa c) Em qual(is) segmento(s): _5ª a 8ª séries - ensino supletivo. Sexo: ___Feminino__________ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? É ter a possibilidade de desenvolver projetos, até para lidar com professores e alunos com a comunidade escolar de forma geral, independente de políticas ditadas pela Secretaria ou por algum tipo de governo. O que deveria ser feito para viabilizar a autonomia da escola, da forma como você a concebe? Em outras palavras, quais as condições necessárias para essa autonomia? A “política” não deveria estar influenciando da maneira como vem influenciando. Então, às vezes o diretor, professores e os próprios alunos querem alcançar alguma coisa e dependem do aval da Secretaria que muitas vezes também, não está interessada em responder àquelas questões. A preocupação, às vezes, é muito mais ampla, no nível de abarcar uma grande quantidade de escolas, de mostrar trabalho então a preocupação é mostrar um serviço independente daquela realidade, daquela escola específica. Então, às vezes, o que a Secretaria entende, o que a política ou o governo entende como bom, muitas vezes não é, porque não se adequa àquela escola específica. E eu acho que deveria haver uma coisa assim voltada para a realidade de cada escola. Porque certamente, uma escola que está situada em uma comunidade financeiramente melhor estruturada, não é a mesma realidade de uma escola que está dentro da favela e a comunidade que pertence, os alunos e a comunidade do entorno, em geral, não vive da mesma forma e nem tem os mesmos objetivos. Então, às vezes, é o que eu disse a princípio, o que se enquadra a um grupo não é o mesmo ao que vai se enquadrar a outro grupo. E aí, os projetos vão por água abaixo. Hoje você está trabalhando em uma escola só. Essa escola tem um Projeto Pedagógico? Pois é, essa escola chegou até a perder pontos, pelo o que eu fiquei sabendo na última avaliação do Nova Escola, por não ter um Projeto Político Pedagógico. Então a gente conversou com a direção, por ser também uma escola de pequeno porte, em comparação com colégios estaduais. Porque a escola não é uma escola estadual. Ela é uma escola municipal que tem o prédio cedido ao governo do Estado. Então a minha escola funciona no prédio da Prefeitura. O dia em que a prefeitura decidir que não vai ceder o prédio ao Estado, acaba a escola naquela localidade. O espaço físico da escola acaba e nesse caso ou se vai buscar um outro espaço físico ou, cada professor vai procurar uma outra escola. É o que aconteceu com o Manoel Maurício [escola estadual que funcionava em prédio cedido parla prefeitura no horário {PAGE } noturno e teve seu funcionamento interrompido no prédio municipal] que acabou se mudando para um lugar distante e muitos professores saíram por esse motivo. Então, a escola em que eu trabalho até que se tenta fazer alguma coisa. A gente observa boa vontade por parte da direção e até recursos financeiros que a escola recebe é muito pouco, mas o que ela pode fazer ela procura fazer de bem para os alunos. Porque não tem o Ensino Fundamental regular não é? Por não ter o Ensino Fundamental regular e porque o Estado tem uma coisa em relação ao número de turmas. Então, o prédio é pequeno, atende de CA à 8ª série no sistema supletivo, e pelo o que eu fiquei sabendo, as escolas da rede estadual, de um modo geral, elas são assistidas financeiramente, de acordo com o número de turmas que elas possuem. Então, você tem vários níveis. Eu não sei em que nível a minha escola está mas é uma escola de pequeno porte e por conseguinte, recebe uma verba menor e por isso muitas coisas que poderiam ser feitas não são. A direção faz de tudo. Ela tentou chamar um menina para desenvolver... porque ela quis botar um orientador ou coordenador pedagógico e não pôde. Porque tinha determinadas características e os professores não queriam aceitar, quem quis aceitar não podia. Então a política entrou novamente no setor e impediu que isso acontecesse para o bem da comunidade em geral. Então para o Projeto Político Pedagógico, a gente fez duas ou três reuniões, a menina fez as perguntas básicas para se desenvolver um projeto. Nós achamos que a coisa ia para frente, mas aí, por falta de verba, porque a menina estava sendo paga para desenvolver o projeto, Com verba da escola? ... com verba que a escola recebia do governo do Estado. A diretora não conseguiu que fosse para a escola um pedagogo? Não conseguiu. Ela não conseguiu e então teve que chamar uma pessoa de fora para poder desenvolver já que a nossa escola não tinha uma pessoa e parece também que, por exemplo, até a quantidade de diretores, de tipo de pessoal que vai trabalhar, depende da quantidade de turmas de que nível está enquadrada a escola e a nossa escola não tem direito nem ao Adjunto. Então fica difícil. Porque quem é que vai desenvolver? são os próprios professores? Até sim. Mas tem que ter alguém mediando ali que tenha uma responsabilidade direta com àquilo para botar no papel o que está sendo discutido. Que se dedique àquilo. E a gente também não pode porque o Estado não deixa você fazer isso. Tirar um dia da semana para tentar resolver isso. Você tem que dar aulas. Para poder fazer reunião a gente adianta os tempos dos alunos para poder depois fazer a reunião. E mesmo assim não é possível reunir todos os professores pois têm os que não vão naquele dia da semana. E se não é o seu dia você vai lá? Se o governo já te paga mal? ... Então a gente não consegue reunir todo mundo. No período da páscoa no ano retrasado, eu falei para uma das colegas – Puxa, não teremos nada aqui na escola? na semana do meio ambiente, não tem nada na escola ? Porque não tem uma pessoa, por exemplo, um coordenador pedagógico que possa desenvolver um projeto, fazer alguma coisa. Aí o que aconteceu. Eu dava aula no primeiro tempo, no segundo tempo ia ensaiar os alunos. Porque também existe muito disso – como você já está há muito tempo no magistério, muitas pessoas acham que não devem se envolver. A conversa que você escuta é que o salário é muito pouco o que é verdade. Então, o cara diz que não está podendo se responsabilizar com isso não. Ás vezes o cara trabalha o dia inteiro e chaga lá à noite, então quer dizer que ás vezes não tem mesmo como se envolver. E aí o que aconteceu. Eu e essa colega que somos de matrícula nova, fomos nós que acabamos fazendo e ficou tudo em cima da gente e ficou pesado para a gente também. E nesse dia (que a gente fez uma apresentação na Lona Cultural) não conseguimos levar todos os professores. Depois, na semana do meio ambiente, também não conseguimos que todos os professores participassem. O pessoal fala – é minha folga, não venho não! Sinto muito, não vai dar para vir não. Então o que se pode fazer? {PAGE } Então é isso. E o Projeto Político Pedagógico até hoje não saiu do papel. E aí a gente vai tentando fazer alguma coisa. Os meus alunos quando vão chegando essas datas perguntam, e aí professora, vamos fazer o quê? Eles queriam que eu levasse o Pedro (filho recém nascido da professora) botava no carrinho e um deles ficasse de babá para poder fazer alguma coisa para a Páscoa. E realmente não teve nada. Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? Sobre a autonomia da escola não chegou nada. O que chega para a gente são algumas circulares do que mudou ou do que o Cláudio Mendonça vai fazer ou vai deixar de fazer. Tipo faltas. que a partir de tantas faltas ..... é isso que chega. E chegou alguma coisa sobre o ensino supletivo propriamente dito com orientações sobre alguns tópicos que deveriam ser abordados porque iria mudar alguma coisa dentro do próprio ensino. Sobre o que você deveria privilegiar ou não dentro de cada disciplina. Além disso chegam questionários de avaliação pelo que parece faz parte do Nova Escola. É muita avaliação para pouca ação no meu entender. Por exemplo, o Nova Escola vai a cada escola, pelo o que entendi, pelo menos na minha escola foram umas duas ou três vezes. E pega questionário, e preenche questionário, e manda para o MEC e envia pelo correio, e no final das contas fica tudo como já relatei. Deveria haver uma real avaliação onde se buscasse saber qual a real deficiência dessa escola. Então vamos avaliar. Já que ela está assim então porque que está assim? Mas não, simplesmente vamos dar uma nota para ela, como se isso fosse resolver o problema. E ainda tem um acréscimo ao salário. ... que também é uma absurdo, e eu não concordo com isso. Eu fiquei sabendo que o Garotinho falou que já estávamos ganhando demais. E eu acredito que nós professores não somos uma classe. Se fôssemos uma classe, diante dessa afirmação do Garotinho a gente já teria se manifestado porque ele acha que está pagando muito. A noite, não vai nenhum representante do SEPE à escola? O que vai na escola é representante de banco, do BMG, para você pegar dinheiro emprestado, agora o SEPE nem aparece lá. Ele manda sim. Pelo que fiquei sabendo, pelo menos uma vez ele mandou um panfleto dizendo que haveria greve. Mas não vai. E outra coisa, eu tenho uma amiga lá na escola que faz greve. Ela vai e entra de cabeça. Mas olha só, vamos analisar. Por isso é que eu falo que não é claro. O que é que adianta fazer greve em uma escola em que só um professor faz? e o resto diz que não vai fazer porque depois tem que repor as aulas. E realmente tem que repor. O que já está errado, porque se é uma greve não tem que repor nada. Mas acontece que vai haver a cobrança para que você reponha. Eu sou favorável à greve eu não fiz da última vez porque eu estava em estágio probatório e não pode fazer. Mas agora eu não estou mais. Mas vamos avaliar do que adianta eu fazer a greve se os outros não vão fazer? adianta alguma coisa? Não adianta nada. E o que acontece, para os alunos você não quer trabalhar. Você é preguiçoso, você não quer nada. Quantas linhas você viu no jornal, o Dia, por exemplo, a respeito da greve dos professores? você ouviu? Não tem nada só saiu a respeito do professor que foi espancado. Só por isso. Entrevistadas 3, 4 e 5 – (17/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública: _31 anos, 18 anos e 6 anos b) Função na escola: Diretora, Coordenadora Pedagógica e Professora da Sala de leituras c) Idade: ___________ d) Disciplina(s) que leciona: ______________________________ Sexo: ___Feminino__________ {PAGE } e) Em qual(is) segmento(s) do Ensino Fundamental: _1° segmento do ensino fundamental, educação infantil e classe de deficiente auditivo O que seria a autonomia da escola, no seu entender? (Coordenadora Pedagógica) - Na minha opinião seria uma liberdade de você estar gerenciando os recursos disponíveis, de maneira responsável, mas seria uma liberdade. Que os órgãos superiores dessem liberdade para estar gerenciando esses recursos de uma forma responsável. (Diretora) - Eu concordo porque isso até a gente tem, os recursos, a gente procura gerenciar mas ainda tem coisas que a escola tem que submeter a uma avaliação sobre o que pode e o que não pode ficando ainda muito dependente. Os recursos que vocês recebem são provenientes do PDDE. (Diretora) - Do PDDE e do SDP [Sistema Descentralizado de Pagamento] que a Prefeitura do Rio dá para as escolas de acordo com a necessidade da escola e com o número de matrículas, uma verba com a natureza de despesa 34 que é para consumo - material para professor, para alunos, para secretaria, material de informática, material para a sala de leitura, e para pequenos consertos. E a natureza 63 que é para pequenas reformas no prédio, mobiliário ... O SDP substitui o Fundo Rotativo? (Diretora) - Substitui o Fundo Rotativo. Esse é o SDP. A gente agora está recebendo um e na semana que vem a gente vai se reunir com o CEC para a gente planejar o que vai fazer. Nós terminamos o planejamento essa semana do PDDE de 2005 e vamos fazer agora do SDP. Professora, e a sua perspectiva de autonomia? (Professora da Sala de leituras) - No meu caso, que estou com turma, é uma liberdade responsável para atuar de acordo com a sua informação, com a sua experiência mas, de acordo com os projetos da escola, no meu caso, o projeto da sala de leitura. O projeto da sala de leitura está intimamente ligado com o projeto político pedagógico da escola mas dentro desse projeto a gente tem uma liberdade pois cada um tem o seu toque pessoal, as suas experiências. O que deveria ser feito para que a escola alcançasse a autonomia? (Diretora) - A gente, em parte tem autonomia só que ela é uma autonomia vigiada, ... (Coordenadora) - E eu acho que é muito restrita, por exemplo, o 63 tem que ser só para aquilo. (Diretora) - Tinha eu ser uma coisa mais aberta, mais ampla em que você pudesse gerenciar de acordo com as necessidades totais da escola. E aquilo vem para determinadas coisas, por exemplo, o PDDE. A gente terminou o planejamento e a gente até pode modificar esse planejamento mas tem que ser mais ou menos àquilo que se planejou. Não pode fugir, por exemplo, a escola está com dificuldades de fazer passeios. Porque é difícil conseguir um ônibus, está muito caro e a nossa escola gosta muito de passear até porque os professores aproveitam para engajar isso no projeto para se trabalhar no dia a dia. Mas, para a gente fazer um passeio com o PDDE, a gente não pode levar duas ou três turmas porque todos os alunos da escola têm que ser contemplados e a verba, às vezes, a gente têm outras necessidades também com a verba e não podemos gastar em passeio. A gente não pode fazer só passeio, porque para passear com a escola inteira, a verba ia toda embora. (Coordenadora) - Eu acho que eles até tentam, mas teria que atender mais às necessidades específicas da escola. Qual é a necessidade do momento? investir mais em aulas-passeio? Que se pudesse ter essa liberdade. Porque aqui, já está tudo mais ou menos de acordo, não temos mais necessidade de tanta obra. Mas se àquele dinheiro for reservado para obra, tem que ser obra, tem que ser reparo. Deveria haver mais autonomia na prática, no dia a dia mesmo. {PAGE } (Diretora) - Então, é uma liberdade, é um dinheiro que você tem, que você tem liberdade para gerenciar àquela verba mas não é uma liberdade total. Acho que o diretor deveria ter uma liberdade mais ampla para gerenciar da forma como ele achasse melhor. (Coordenadora) - De acordo com as necessidades específicas da escola. E a prestação de contas? (Diretora) - A prestação de contas é bem complicada. Uma coisa também, muito difícil, no gerenciamento das verbas é a questão da cobrança de tomada de preços. Nós tivemos uma experiência no ano passado do PDDE, que geralmente em junho a gente manda o planejamento e em julho, o dinheiro está na conta e aí você tem de julho à 31 de outubro para prestar contas e no ano passado, o PDDE só saiu após 15 de outubro e a gente só teve àquele espaço de 15 dias para você desfazer o trabalho, gerenciar e prestar contas e aí ficou complicado porque a gente fez uma tomada de preços em julho e tudo aumentou muito, e quando chegou em outubro, já não dava para fazer as mesmas coisas. E o SDP também, na questão da tomada de preços. Se você vai fazer um serviço de obras, você tem que pesquisar dois, três profissionais, se você vai comprar material você tem que ter três pesquisas e isso toma muito tempo e o diretor não tem tempo para isso. Eu acho que aí é que está a questão pior do gerenciamento dessas verbas. (Coordenadora) - A questão do imediato, tem que ser para agora, para hoje ... (Diretora) - e a gente não tem tempo para ficar fazendo essas pesquisas de preço. A tomada de preço demora, por exemplo, na semana passada, eu pedi a um Senhor, para vir fazer um orçamento de manutenção que estou precisando fazer no parquinho e ele ficou de me dar o orçamento no início dessa semana, hoje é sexta-feira e ele ainda não veio trazer o orçamento e aí complica porque você vai esbarrar com o prazo que você tem lá na frente para entregar toda a prestação de contas. Vocês conhecem as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? (Coordenadora) - Sim, o PDDE, o SDP... E como vocês tomaram conhecimento dos mesmos? (Diretora) - Através de reuniões, seminários, circulares da Secretaria... (Coordenadora) - Até cursos eles estabeleceram. Até que as informações chegam. (Diretora) - Até porque, a gente não é formado em contabilidade e tem que gerenciar isso como se fosse um contador e tem as questões dos tributos que é bem complicado e a gente tem que ter aquilo tudo na cabeça, prazos para o pagamento dos tributos, percentual do que é que vai descontar na nota fiscal, nos recibos e é bem complicado. E a participação dos responsáveis? (Diretora) - A escola tem o CEC – Conselho Escola Comunidade, que é formado pelo segmento professor, pelo segmento aluno, responsáveis, funcionários e uma pessoa que responde pela associação de moradores. Por exemplo, nas reuniões de pais, a mãe representante dos responsáveis participa juntamente com a direção, para prestar contas aos pais. Na última reunião que foi em maio, nós prestamos contas do PDDE de 2004. Além disso, a gente se reúne, agora na terça-feira temos uma reunião marcada com o CEC para planejar o SDP, ver o planejamento do PDDE, se vai continuar o mesmo ou se a gente vai dar uma mexida. (Coordenadora) - Agora, durante esses anos todos, a gente têm zelado muito pela transparência e por ouvir a comunidade. O que o professor precisa, o que é que vai facilitar o processo ensino-aprendizagem, o que é que vai ser bom para o aluno? Porque a gente acha que a escola tem que ser prazerosa, você tem que chegar e se sentir bem e aí é o que a gente têm feito com esses recursos, investindo mesmo na questão de que tanto aluno, responsáveis, professores e funcionários em geral, terem prazer em estar na escola. {PAGE } Entrevistada 6 – (18/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública: _12 anos______________ b) Função na escola: Professora c) idade: _33 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ________todas__________________ Sexo: ___Feminino__________ e) Em qual(is) segmento(s) do Ensino Fundamental: 1° segmento do ensino fundamental O que seria a autonomia da escola, no seu entender? Os maiores problemas que eu percebo, em relação à questão da autonomia, fica na questão da disciplina. Muitas vezes a criança se apresenta como problemática onde fica muito difícil você ter controle sobre a criança e aí tem àquelas coisas que a escola não pode fazer isso, que você não pode suspender, não pode transferir para outra escola e etc. E aí se fala logo nos direitos das crianças, no Conselho Tutelar, no ECA. Eu concordo que a gente tenha realmente que seguir alguns parâmetros porque senão a coisa fica sem medidas. É claro que você tem que ter um limite e para disciplinar o aluno você tem que saber até onde você pode ir já que você não é pai nem mãe. Mas você tem que ter liberdade para disciplinar uma criança. Hoje em dia, uma coisa que também vejo como grande problema, que dificulta a autonomia da escola, é a violência. Um exemplo é o da minha irmã que trabalha há uns três anos no município do Rio de Janeiro. Nesses dias, ela puniu um aluno e ele fez um desenho para ela de uma criança apontando uma arma para outra pessoa. E ele disse: Eu vou te matar tia. Então chega um momento em que você pensa será que eu não posso mais punir? Outra coisa que eu penso com relação a autonomia, é que independentemente do que a Coordenadoria esteja mandando como norma, eu acho que a escola tem que definir outras maneiras de avaliar. Nesse sentido é muito importante a questão do Projeto Político Pedagógico quando a escola senta e junto define as normas internas que devem ser seguidas e respeitadas. Às vezes você percebe que os diretores ficam com muito medo de autorizar atividades fora da sala de aula. O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? Eu não sei bem. Eu acho que ás vezes, falta realmente que as leis, as normas estejam realmente observando a realidade da escola. As vezes parece que as leis são criadas para crianças que não existem. Quando a gente pára para perceber qual o público que a gente atende numa escola pública, por exemplo, que você chega e a criança, muitas vezes, não tem lápis, vai com um chinelo e esse chinelo arrebenta e passa a aula inteira falando que o chinelo está arrebentado. Então eu penso. Bem, primeiro eu tenho que resolver o problema do chinelo para poder continuar a aula. Por exemplo, quando você tem crianças que os pais estão presos, crianças que a mãe é prostituta e a criança convive com essa realidade. Eu acho que é dentro da escola, só quando você está ali no dia a dia é que você percebe que tem normas que não funcionam. Então eu acho que, na verdade, todo código, Penal, Civil, hoje em dia no Brasil, se nós formos observar, ele muitas vezes está muito distante da realidade brasileira e na educação não está diferente. Acho que tem coisas que são positivas, por exemplo, os temas transversais eu acho que são positivos. Agora, por exemplo, quando se começou a falar que o professor que não tivesse faculdade não poderia continuar dando aula. Muitos professores dão aulas de manhã, à tarde e à noite. Acho, que a questão principal seria essa de algo mais envolvido com a realidade em que a escola está inserida. Acho que essas leis têm que estar realmente envolvidas no dia a dia, na realidade escolar. {PAGE } Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? Hoje, eu posso dizer que eu não estou tão informada de como a coisa está acontecendo. A partir de meados de 2002 em diante, praticamente eu já não consegui render muito como professora pois eu já estava passando muito mal e logo depois entrei de licença médica. Depois de muitas ida e vindas de hospitais, foi detectado que eu tinha um cisto e fui operada para extrair esse cisto e depois de 40 dias decorridos da cirurgia, a biópsia confirmou que era um câncer. Então, desde 2003 que eu estou afastada. Mas eu percebo que, com as amigas que converso que, existem muitas coisas difíceis. Infelizmente, ainda está muito difícil sobreviver no ambiente escolar. As vezes você vai quase que empurrando com a barriga sem saber o que fazer. As vezes você vê professores desesperados. Hoje em dia, eu fico muito triste quando eu percebo que por um lado talvez eu não esteja voltando mais à sala de aula, mas por outro lado, eu percebo também que é muito difícil. Os médicos que me acompanham, acreditam muito na possibilidade da vida que eu tive, tenha sido o que fortaleceu à chegar ao problema que eu tive. Que quando eu fui operada eu já estava com um câncer de ovário de quase 12 cm. Então a vida que eu levei e pela minha personalidade acho que foi algo muito negativo porque eu quero muito abraçar o mundo. Aquela coisa de levar problema de criança para casa, e tentar resolver. Já aconteceu várias vezes de eu chegar a trazer criança para passar o final de semana na minha casa. Então hoje, com relação às políticas, a gente fala do FUNDEF, do nova escola que eu acho uma furada, uma absurdo. A gente acaba se empolgando muito com o nova escola porque você fica sonhando com a possibilidade de você ganhar um dinheirinho a mais. Só que a coisa é muito absurda porque, você percebe que eles lançam o Nova Escola, afirmam que é em cima do trabalho da escola. Só que a coisa não funciona assim. Por que na escola em que eu trabalho, é um ambiente até legal, há muito cuidado com a questão da limpeza, da organização e eu acho que essas são coisas que poderiam ser valorizadas. Com todas as dificuldades que todas as escolas têm, eu sinto que lá o pessoal tenta se envolver muito no que as crianças vivem. Têm professoras que quando vêem que a coisa está muito complicada, vão até a casa da criação e descobrem realidades absurdas. Nós tínhamos um problema com três crianças que eram irmãs e tinham uma dificuldade imensa com relação à higiene. Aí nós decidimos que a gente ia começar a se aproximar para descobrir como essas crianças viviam e no dia em que nós fomos até a casa das crianças, nós percebemos o seguinte: primeiro que quando eles não estão na escola, eles estão trancados em casa. A mãe, era totalmente desequilibrada, ela usava drogas pesadas, o pai era alcoólatra e vivia catando lixo para sobreviver. Quando nós conseguimos destrancar a porta, no mesmo ambiente em que as crianças ficavam, ficava uma montoeira de lixo. Como eles queriam ter certeza que no outro dia teriam dinheiro, então eles iam juntando garrafas, latas e tudo o que você possa imaginar que eles poderiam vender no ferro velho tinha ali. Então aquele mal cheiro era horrível e aí o que é que você faz? Procura o conselho tutelar? Denuncia a situação? Tira a criança dali e a criança vai ser jogada em um abrigo? Naquele momento a gente acabou não tendo essa postura mas há poucos meses isso acabou acontecendo. Eu me lembro que as minhas colegas estavam meio que tentando fazer campanha para quem adotaria, quem teria coragem de adotar todos juntos. Então eu vejo que é muito difícil. Essa bola de neve social, esses problemas. A desigualdade social bate muito forte na escola. ... Uma outra coisa que eu acho que deveria ser mais observada é a questão da merenda escolar que é de péssima qualidade na maior parte das escolas. Você vê que se eles recebem uma verba X eu acho que essa verba às vezes é muito mal direcionada. Havia o Conselho Escola Comunidade? Ele não participava da fiscalização do uso dos recursos? Existe o conselho, ele participa mas acaba sendo assim ... o brasileiro não é acostumado muito a isso entendeu? É aquela coisa do pessoal ir para a reunião dizendo “Ai, que saco, hoje tem aquela reunião!” e o que falar está falado e perguntam: “onde é que eu {PAGE } tenho que assinar? vamos logo que eu tenho que ir para casa”. Você vê que na maior parte das vezes não tem aquele envolvimento, eles não questionam muito. Eu acho muito ruim e vejo que a coisa poderia ter uma qualidade melhor. Uma outra coisa que eu também já vivenciei muito na escola é a questão da higiene, como eu já coloquei. Quantas vezes é necessário fazer campanha na escola, por exemplo, por causa do piolho. Ou você faz uma campanha, você convoca os pais a comprarem [remédio para combater] e um compra e os outros não têm condições ou não se interessam. Também são coisas que o dinheiro da escola deveria ter né ... acho que os professores teriam que sentar junto com os pais e direcionar quais são os maiores problemas que a gente sente hoje, o uniforme, as vezes a criança não tem mesmo. ... Agora, também do SEPE lá na escola, nós não tivemos grandes respostas. Em alguns momentos nós percebíamos que já aconteceu deles direcionarem uma greve, de todo mundo se envolver mas que não tinha muito sentido. Em uma das greves que nós fizemos, a coisa foi exatamente assim por uma questão deles mesmos. Acho que eles iriam entrar em momento de eleição e então eles precisavam chamar o pessoal a conhecer, a falar em chapa e a gente viu que a coisa era muito política mesmo infelizmente. Não que eu desacredite da política, seria uma ignorância se eu dissesse isso mas, eu compreendo que as vezes, a coisa tem mesmo que ser com quem está ali independente de você pensar sobre quem está direcionando, quem é o coordenador, quem é o ministro da educação. Você que está ali diretamente com a criança, com os pais, você tem que botar a coisa para andar. ... Eu compreendo que quando o diretor está fazendo um bom trabalho, um trabalho realmente envolvido com a escola, a coisa anda muito bem. Tem um CIEP aqui no Paiol [Bairro no Município de Nilópolis] em que eles dão um banho. Por tudo os pais estão na escola. Qualquer festinha que as crianças queiram fazer os pais vão, eles são convidados à assistir as aulas ... e eu acho que é por aí porque, quando os pais estão dentro da escola eles começam a ver o lado do professor. Entrevistada 7 – (18/06/05) – por escrito a) Tempo de matrícula na rede pública:________6 anos b) Função na escola: ____Professora c) Idade: ____38 anos_ k) Disciplina(s) que leciona: ________Todas l) Em qual(is) segmento(s) do Ensino Fundamental: ____1° segmento Sexo: __Feminino O que seria a autonomia da escola, no seu entender? Seria a escola poder realizar suas atividades e projetos desvinculados de órgãos superiores (como a Secretaria de Educação). Se diz que a “escola é autônoma”; mas se é, por que há a necessidade de se comunicar com outros órgãos e não realizar imediatamente o projeto com a comunidade? O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? O grupo de professores da unidade escolar deveria sentar-se, reunir-se e discutir as propostas da escola e o que se quer buscar. A direção também deveria dar liberdade para que isto acontecesse. Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? {PAGE } busca. Não, de política pública não tenho conhecimento, mas entendo e percebo que se Comentários: Uma coisa que muito me preocupa e que quase não percebo, é o interesse dos professores em permitir o desenvolvimento do senso e pensamento crítico dos alunos. Alguns professores (grande maioria) entra em sala, “entorna”/”despeja” seu conteúdo e não dá ao aluno a oportunidade de expressar-se ou até mesmo de concordar/discordar de algo. Para eles (os professores), só eles têm razão, têm voz e têm vez. Entrevistada 8 – (19/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública:__20 anos b) Função na escola: ____Diretora 7 anos c) Idade: ____38 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ______________________________________ Sexo: __Feminino___________ e) Em qual(is) segmento(s) do Ensino Fundamental: a escola trabalha somente com EM desde 2004_ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? Para mim a autonomia teria que ser ampla, geral e irrestrita. Quando você fala em autonomia, é você poder fazer o que é necessário com as verbas que são recebidas, prestando contas, é lógico, você tem que prestar contas de tudo que é comprado de tudo que é feito na escola; prestar contas não só para a comunidade como para o próprio governo do que você compra mas você ter autonomia de poder fazer as coisas necessárias e não é esse o tipo de autonomia que existe no Estado hoje em dia. A autonomia para mim, seria a autonomia não só no sentido de verbas, que é a autonomia de você poder comprar o que é necessário e não ser restrito ... porque é restrito em algumas coisas, você pode comprar 40% de material didático, 30 % de material permanente então você tem uma certa restrição para comprar e, às vezes, não é isso o que você vê na escola. Você vê que é necessário comprar um determinado material, um determinado objeto que custa, às vezes, 50% da verba mas é necessário e você não vai comprar, não pode comprar porque você não tem autonomia para comprar? Porque existe uma restrição de valores para você comprar? Então isso não é autonomia. Existe essa restrição de valores. Quando fala em verba de merenda, em verba de manutenção a verba de merenda você pode gastá-la toda com merenda e a manutenção também. Se você tiver que comprar merenda com a manutenção, você pode mas você não pode comprar as coisas de manutenção com a merenda o que já é também uma restrição. Se eu preciso de um objeto na escola, por exemplo, a gente está precisando agora de uma TV de 29 polegadas, que é cara, entendeu? e eu não posso tirar um dinheiro, se estiver sobrando da merenda para comprar essa televisão porque o dinheiro da merenda é só para a merenda. Quais as origens dos recursos e quando chegam à escola? A verba de manutenção é do Estado e a verba de Merenda é federal. Agora existe um calendário. O Secretário de Educação, esse ano, publicou um calendário das verbas. Então, mais ou menos de dois em dois meses, é depositada a verba tanto de merenda quanto a de manutenção mas mesmo assim, o dinheiro não é suficiente porque, por exemplo, eu lido com uma média de 500 alunos, são 11 turmas de 2° grau e a verba de merenda é de R$ 4.000,00 que, hipoteticamente, para o Estado tem que dar para manter esses alunos por um mês e meio a quase dois meses comendo o que no cardápio seria não só a merenda do cardápio como teria que ter suco, uma fruta ... só que não dá. Se você for fazer exatamente o que está no cardápio, não dá o dinheiro não dá. Imagina você gastar R$ 4.000,00 com 500 pessoas por quase dois meses. Na verdade, eu é que tenho que fazer o cardápio. Eu tenho que fazer uma cardápio alternativo, que pegue alguma coisa do cardápio do Estado mas que não seja, é claro, um cardápio sem nutrientes mas que seja um cardápio um pouco mais barato para que todos consigam comer todos os dias. Se eu fosse fazer o cardápio exatamente como o Estado quer, {PAGE } eles vão comer durante duas semanas e acabou e aí eles vão passar um mês sem comer. Além disso eu é que tenho que fazer levantamento de preços e comprar. Para isso existe autonomia, de executar. Agora, deveria existir também autonomia no sentido de nós propormos para a Secretaria, qual o valor necessário da verba para manter esses alunos durante esse período. Nós é que deveríamos dizer – Olha, o valor necessário é tanto! e não eles acharem ... eles estipulam o valor pela percapita, a percapita do aluno é menos de R$ 1,00 por aluno. Eles acham que com menos de R$ 1,00 o aluno pode fazer uma refeição por dia, uma refeição completa. Agora a gente faz o que é possível para que as pessoas não fiquem sem a merenda. Nesse sentido, existe uma certa autonomia, porque eu posso fazer o que for necessário. Mas eu acho que a autonomia deveria ser de nós podermos chegar até as autoridades competentes e colocarmos para elas quanto é realmente necessário para cumprir aquele programa que a Secretaria coloca. Então a escola não tem espaço para propor nada? Não, você não tem espaço para propor. Você simplesmente recebe uma listagem com os valores e acabou. O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? Eu acho que os diretores deveriam se mais ouvidos pelos órgãos competentes, pela própria Secretaria, pelo próprio Governo do Rio porque nós que estamos dentro da escola, no dia a dia da escola, nós sabemos o que é necessário e quando é necessário ou não é para cumprir as normas que a Secretaria exigir. Mas a gente não é perguntado sobre isso. A gente só é solicitado para realizar as coisas necessárias, a gente trabalha, faz relatórios, tem que mandar documento daqui documento dali, fichas. Só que você não é solicitada na hora de propor. Quando eles propõe uma determinada coisa você não perguntada se aquilo vai ser realmente eficaz, se não vai ser. Por exemplo, o próprio cardápio deveria ser feito em conjunto com as escolas para saber o que os alunos gostam, o que eles não gostam, o que possível, o que não é possível. Em determinadas áreas, por exemplo, com escolas da zona sul a alimentação é totalmente diferente de uma escola aqui na periferia. A alimentação que eles procuram aqui não é a alimentação que um aluno de uma escola pública lá de dia na zona sul quer. Lá eles querem simplesmente um lanchinho porque eles têm dinheiro para comprar merenda e normalmente a escola tem uma cantina e alguns alunos nem merendam então a alimentação é outra. Agora aqui não, à noite você tem que dar janta porque as pessoas vêm sem jantar, as pessoas vêm direto do trabalho sem se alimentar e as vezes a única refeição que eles fazem durante o dia é aqui. Então eu não concordo com esse negócio de dar lanchinho. E aí eu acho complicado essa coisa de não participar também das decisões da Secretaria. A gente participa de cumprir as decisões não participa da escolha das decisões. Seria importante ouvir os diretores porque a gente que está aqui na escola a gente sabe da realidade do que precisa e do que não precisa. Você conhece as atuais políticas e/ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Caso afirmativo, como tomou conhecimento dos mesmos e como os avalia? Os programas de trazer a autonomia para a escola, primeiro a Secretaria lançou a questão da escola fazer uma AAE que é uma Associação de Apoia à Escola que é uma associação registrada em cartório, documentada com ata, onde as pessoas, os membros dessa associação são escolhidas entre os membros da escola. São professores, funcionários, alunos, as pessoas eu participam da AAE, que assinam, que verificam, que fiscalizam são pessoas da comunidade de dentro da escola. Então, isso foi uma forma que o Governo criou de autonomia, uma forma de autonomia dentro da legislação que você teria que formar essa AAE e através dessa AAE é que você gere os recursos da escola que chegam através do Estado ou do Governo Federal. Você gere através da AAE porque no final de cada semestre, você tem que prestar contas e o pessoal da AAE tem que assinar essa prestação de contas, essa prestação de contas é colocada no quadro do lado de fora para saber no que é que foi gasto e a escola é informada sobre o que é que o diretor fez com aquele dinheiro. Não é o {PAGE } diretor que assina sozinho também, o diretor assina junto com outra pessoa da escola, no caso outro professor ou secretária alguma pessoa, outro co-responsável assina junto com o diretor. Nenhum diretor assina sozinho o cheque na hora de compra qualquer coisa. Então na hora de prestar contas ele não responde sozinho pelo o que ele fez. A AAE é responsável também pelo o que é feito porque, porque eles são informados das compras que estão sendo feitas e no final é prestado contas, é feita uma reunião com a AAE para que eles assinem a ata concordando com àquela prestação de contas. Isso foi uma coisa boa que o Estado fez porque foi uma coisa que oficializou essa autonomia da escola, porque antigamente as escolas não tinham essa autonomia assim legalizada. Você recebia a verba, não era dentro da Associação, era chamado de empenho e aí você recebia o empenho, gastava e prestava contas mas não tinha associação e você não tinha talão de cheques, não tinha conta em banco. Era o empenho que chegava e você tinha que gastar com os fornecedores que já eram determinados e acabou. Agora não, com a Associação você tem tudo legalizado talão de cheques, conta em banco, cartão do banco, extrato no final do mês então você controla tudo, o banco manda para você e você controla. Ficou melhor, ficou muito melhor porque é uma coisa que você consegue controlar legalmente e você consegue provar legalmente, na hora de prestar contas o que é que você fez com aquele dinheiro porque tem pessoas por detrás também que assinam àquela prestação de contas. Então isso foi bom. Nesse ponto foi bom. Agora, existe outros lados da autonomia que não são respeitados. Porque, essa AAE deveria ter toda autonomia, como eu te falei antes. A autonomia comprar, de fazer o que fosse necessário. Por exemplo, se você faz uma festa na escola ou arrecada dinheiro com algum bazar ou alguma coisa, você não pode depositar esse dinheiro nessa conta. Essa conta poderia ter sido feita para você também poder depositar e usar normalmente esse dinheiro, porque é um dinheiro que vem da escola mas esse dinheiro não pode ser misturado porque se faltar ou sobrar um centavo no final da prestação de contas, você é cobrado e tem que fazer tudo de novo. Na prestação de contas tem que dar certinho, você tem que zerar o extrato então, na verdade, essa é uma autonomia relativa porque a AAE tem autonomia mas só para gerir a verba do Estado porque na hora de gerir a verba da escola, você não pode misturar. Você não pode misturar esse dinheiro na conta. Deveria poder usar a conta normalmente para você fazer qualquer coisa qualquer movimentação. Aí, a escola é obrigada a abrir uma outra conta, de poupança ou alguma coisa assim para gerir os recursos que obtém de outros meios que são festas ou venda de alguma coisa, bazar. Existe também agora no Estado, uma coisa de ... você não tem mais autonomia para chegar e permitir que uma pessoa faça uma palestra na escola, ou fazer uma divulgação de um livro. Mesmo que não seja para cobrar do aluno, só o fato de divulgar o material, não pode mais. Isso tem que ser passado pela Coordenadoria e pela Secretaria de Educação para que eles dêem a autorização. Então, que autonomia que o diretor tem dentro da escola? E o Projeto Pedagógico, como fica? E o Projeto Pedagógico, que é cobrado pela própria Secretaria, que nós temos que fazer todo início de ano, entregar ... . Dentro do Projeto Pedagógico a gente coloca que a gente vai fazer ou trabalhar educação ambiental, doenças sexualmente transmissíveis logo você deveria poder ter o direito de estabelecer que você vai fazer uma palestra sobre isso, que você vai chamar pessoas para demonstrar material sobre aquilo. Você não está obrigando o aluno a comprar nada ou pedindo dinheiro, você só está demonstrando alguma coisa, falando sobre o assunto ou demonstrando material, só que você não tem mais autonomia para isso. Atualmente você não pode mais permitir esse tipo de coisa dentro da escola porque eles dizem que é comércio e não pode. E aí, compromete o Projeto Pedagógico da escola. Mesmo que um professor que você conheça venha falar sobre algum assunto do Projeto da escola? Não pode mais. Tem que pedir permissão à Coordenadoria. Eles vão querer ver o projeto da pessoa, vão querer ver todo o trabalho que a pessoa tem. Se está fazendo mestrado, se está fazendo algum coisa ligada àquela palestra, por que vai dar àquela palestra. Agora é assim. Pode ser uma forma de controle político? {PAGE } É, de repente também porque eles podem estar cerceando ou querendo verificar quem é que está trabalhando dentro da escola, está falando o quê, se é para fazer de repente campanha de algum candidato ou contra a ação do Governo, entendeu? Isso é uma forma de controle do que acontece dentro da escola, que não deveria existir. A escola não tem autonomia de fazer, de cumprir o seu projeto pedagógico que é exigido pela própria secretaria? E é mandado no começo do ano para a Secretaria eles sabem que o projeto está lá. Está todo escrito. Por exemplo, eu tenho no Projeto pedagógico essa questão do pré-vestibular. É feito todos os sábados aqui na escola, com professores voluntários da comunidade, e alguns professores da escola porque nem todos querem participar, eles não são obrigados, não estão ganhando nada com isso. A carga horária dos professores que participam do pré-vestibular não conta como carga horária da escola? Não, a carga horária não conta. Eles são voluntários porque a carga horária do sábado não conta como carga horária para o Estado. E as pessoas da comunidade que vêm ajudar, que vêm dar aulas é totalmente de graça. Não é cobrado nada nem do aluno. Só que o Estado, nesse sentido, não dá nenhum apoio por que você não pode pedir nada. Você deveria pedir um apoio para cumprir o projeto que é um projeto que atende não só ao aluno da escola como atende à comunidade. Eu tenho aqui mais de 20 alunos que são de fora, que são da comunidade, que estão assistindo o pré-vestibular para que tenham condições de fazer uma boa prova do ENEM ou o vestibular. E no ano passado a gente teve um bom resultado. Os alunos que fizeram o pré-vestibular, todos eles que fizeram ou passaram na prova do ENEM e estão fazendo faculdade pelo Pró-Uni ou passaram no próprio vestibular da UERJ, UFRJ. Praticamente, a gente faz isso às escondidas. Porque se o Estado souber que eu estou fazendo um trabalho sem autorização, eles são capazes até de punir. Mesmo estando previsto o pré-vestibular no projeto pedagógico? Mesmo assim ... teria que mandar um projeto específico para a Secretaria, informando sobre isso, entendeu? para que eles aprovassem ou não. E aí, até você esperar a aprovação chega o final do ano e você não tem aula nenhuma porque tudo é muito moroso, as coisas demoram muito para acontecer. Se eu mando um projeto pedindo autorização e espero eles aprovarem, não aprontava nunca. Porque até eles lerem e chegar nas mãos de quem realmente tem que aprovar, aí já era o final do ano. Aí vai pedir currículo [dos professores], vai pedir se tem habilitação disso, habilitação daquilo, vai pedir seguro porque esse professor não vai poder ... ele pode estar dentro da escola, pode estar dando aula e se acontecer alguma coisa ele pode processar o Estado. Para o Estado tem toda essa burocracia. Então, eu não vou fazer todo esse processo para mandar para eles porque não tem como, não ia nem ser aprovado. Então você também é voluntária ao trabalhar aos sábados para o prévestibular? É, porque eu venho para cá, trabalhar sábado sem receber nada e a gente ainda tira xerox para esses alunos sem cobrar, e faz lanche ainda, com o que sobra de merenda. Eu economizo e dou um lanche no sábado para eles não ficarem também com fome. Mas, vai falar isso para o Estado! Não pode. Isso não pode chegar no ouvido da governadora. Se as coisas fossem mais fáceis, mais simples não deveria haver esse tipo de burocracia para você informar alguma coisa dentro do projeto mas por causa da burocracia você acaba sendo obrigada a não informar. A Secretaria de Educação costumava mandar temas a serem desenvolvidos durante o ano letivo, ela continua mandando? Continua mandando só que atualmente, a própria Secretaria promove cursos que são pagos pela Secretaria em convênio com alguns órgãos ou com a UERJ e esses cursos são oferecidos aos professores só que existe uma restrição, só pode ser professor de matrícula e normalmente eles querem que esse professor seja obrigado a assistir o curso sem dar nenhuma ajuda de custo, sem oferecer nada para o professor assistir ao curso, nem alimentação e o professor não quer. Simplesmente ele não é obrigado. É fora do horário dele, fora do horário de aula e aí o professor não vai querer porque, ele poderia estar fazendo isso {PAGE } mas como que ele vai largar o emprego dele, que ele ganha em outro lugar para fazer o curso de graça pelo Estado? Mesmo sendo aperfeiçoamento as pessoas não querem. Porque o Município quando faz um curso de aperfeiçoamento, ela paga para o pessoal fazer o curso, paga a despesa do pessoal, paga para o profissional fazer o curso porque aí ele não está perdendo e abona também a falta dele num outro local. Mas o Estado não. Quer que o professor seja obrigado a fazer o curso de reciclagem fora de seu horário, sem ganhar nada, num lugar longe, as vezes distante e complicado para ele chegar e não pode ser todo professor. Ás vezes o professor que está interessado, eu já tive muitos professores interessados em cursos dados pelo Estado, que não puderam fazer. Por quê? Porque não são de matrícula. Eles só querem professor de matrícula. Aí o professor de contrato que está interessado, que quer se aperfeiçoar e quer se reciclar até para ajudar a escola não pode porque o curso não é para professor contratado. Mas se o professor está dentro dessa escola, deveria ser para qualquer curso. Se o professor é contratado? Quem contratou foi o Estado. Ele está dentro da escola, ele está fazendo um trabalho, ele participa do projeto? Ele está inserido no projeto da escola então, nada mais lógico do que ele fazer também o curso porque está interessado em trazer para a escola àquele trabalho. Só que não é permitido ao professor de contrato. E como atualmente, a maioria dos professores de algumas escolas do Estado são de contrato, pelo menos aqui eu tenho mais professores de contrato do que de matrícula. A maioria das escolas que são de difícil acesso, que são à noite e em locais de difícil acesso, só têm mais é contrato. Então, o que acontece, se eu tenho poucas matrículas e mais contratos, é lógico que estes professores estão compromissados com o projeto da escola e eles são muito mais compromissados, às vezes do que os próprios professores de matrícula. Alguns já estão no Estado há algum tempo já relaxaram e aí esse professor que quer melhorar, que quer fazer um trabalho bom pela escola, ele não pode porque não é permitido que ele faça reciclagem. Há dois meses atrás, tinha que enviar um professor para fazer um treinamento para um campeonato de xadrez que iria haver e aí eu queriam que eu mandasse um professor de matrícula de Matemática ou de Educação Física. Eu não tinha. Quem eu tenho de matrícula de Matemática, não quis. Só tem uma professora e ela não quis. Ela disse que não tinha tempo e que não ia fazer. Aí, eu mandei um professor de contrato de Educação Física, que é a área dele e ele até se interessou em fazer o treinamento e em trazer o xadrez para a escola participar do campeonato. Eles não permitiram. Mandei ofício, mandei o professor, ele esteve duas vezes no curso e eles disseram que ele não podia fazer e aí a escola ficou de fora. O campeonato que nós vamos fazer aqui é um campeonato interno porque não tem como participar de um campeonato do Estado, da Secretaria, porque é todo cheio de uma burocracia, todo cheio de complicações que a gente não consegue cumprir. Para concorrer com outras escolas não vai ser possível. Além disso, o horário que o Estado coloca, as vezes, para determinados trabalhos é inviável. Eles colocam campeonatos de dia, que o aluno da noite não pode assistir porque ele trabalha, eles colocam peça de teatro, palestras, chamam a escola para assistir durante o dia, na parte da tarde, no horário da manhã que o aluno da noite não pode participar porque ele trabalha. E aí depois ficam criticando que a escola não participa de nada, que as escolas não vão às palestras, não mandam os alunos para as peças de teatro, que o aluno do Estado não participa de nada mas é lógico, os horários são totalmente inviáveis. O Estado deveria viabilizar também, o transporte público como o Município viabiliza. No Município se torna muito mais fácil. A diretora do Município manda um ofício para a CRE, a CRE entra em contato com a empresa de ônibus e manda o ônibus para buscar os alunos e o Estado não tem isso. O Diretor é que tem que correr atrás de um ônibus, conseguir um ônibus de graça ou pagar para a empresa fazer o transporte dos alunos. E isso cabe na prestação de contas do uso dos recursos da escola? Eu faço. Se cabe ou não, se eles vão permitir ou não, eu coloco a nota fiscal do ônibus, para que que foi feito, para que que foi chamado àquele ônibus, a data dessa nota fiscal, o valor e mando na prestação de contas. Você já teve alguma prestação de contas devolvida? Não, graças a Deus. Nesse sentido, não. Não teve nenhuma devolvida por causa disso porque eu envio a nota fiscal e justifico que é uma atividade prevista no projeto. {PAGE } E a escolha de diretores, como tem sido feita? No ano passado foi feita uma consulta aos alunos e professores para ver se eles concordavam com àquela determinada direção ou não. Só que essa consulta, muitas vezes não foi respeitada. Teve escolas em que o diretor que venceu na consulta popular não foi o que ficou na direção da escola. O que ficou foi o que foi indicado pelo político ou pelo Secretário ou sei lá por quem. Na verdade houve vários casos desse. Aqui até que não houve isso porque só houve uma candidatura. Então, foi oficializada a candidatura que houve, que os alunos concordaram e a própria Secretaria concordou. Mas teve escolas que não, que havia mais de uma candidatura, e quem foi oficializado não foi quem ganhou na “eleição” da escola. Aconteceu indicações de diretores de fora das escolas? Aconteceu de serem mandados diretores para algumas escolas porque onde não houve indicação de ninguém, onde o diretor não quis continuar e nenhuma pessoa se candidatou houve a indicação de uma pessoa de fora. A Coordenadoria que indicou uma pessoa para assumir àquela escola. E houve casos de diretores que foram tirados, por algum motivo, perseguição ou sei lá o quê e foi colocada uma outra pessoa no lugar dele também de fora, escolhida pela Coordenadoria. Isso aconteceu em escolas grandes, escolas com um número de alunos muito grande, escolas de três turnos, CIEPs e a gente até acha assim, não pode nem falar muito sobre isso mas é uma questão de poder econômico. Algumas escolas foram escolhidas porque têm uma verba alta. As escolas que gerem verbas altas e têm um número de alunos muito grande, as escolas com três turnos, muitos funcionários então essas escolas foram deixadas realmente para as pessoas que eles escolheram. Mas houve casos também de escolas pequenas em que a direção foi trocada porque havia diretores que não eram bem quistos. Aí, agora existe aquela cobrança em cima do diretor que ficou de que: - Você foi indicado. Você não pode fazer isso ou aquilo sem comunicar, sem passar por nós porque você foi indicado por nós, você não foi eleito. Eles estão sempre falando isso. É como se nós fôssemos representantes da Secretaria. Eu não me considero representante da Secretaria eu sou representante de uma comunidade. A partir do momento que aquela comunidade não quiser mais, eu estou fora mesmo que a Secretaria diga que eu tenho que ficar, eu não sou obrigada. Eu fiquei por uma questão até ... me candidatei de novo, meu marido nem queria, porque ele acha que é muito trabalhoso, cansativo, desgasta pra caramba e a gente não descansa nada, não tem final de semana, não tem nada, é preocupação o tempo todo, cobrança. Apesar de todo o trabalho que a gente tem á cobrança é muito grande em cima da gente, não só da Secretaria como dos alunos. Ele queria que eu não me candidatasse mas acontece que foi toda uma comunidade que pediu para que eu continuasse. Eles disseram que se mudasse a direção muitos professores não ficariam e muitos funcionários não ficariam. As pessoas ficam com medo de que venha alguém de fora, alguém estranho e aí, com o fato de vir alguém de fora, as pessoas querem sair. E as escolas estão sendo muito cobradas. Esse ano tem uma cobrança da Secretaria muito grande sobre o diretor. Acho que eles estão cobrando demais e não dando condições para cumprir o que eles estão pedindo e isso se deve à mudança do Secretário. E a eleição para diretores não acontece desde 2003, não é? A última eleição foi feita em 2001. Era para ter sido feita em 2003 e aí foi adiada, não foi feita e aí em 2004 eles decidiram que seria por indicação. Desde 2001 que não tem eleição direta. O SEPE brigou, brigou mas não adiantou. Entrevistada 9 – (19/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública: __desde 83 – 22 anos b) Função na escola: ____Secretária escolar c) Idade: ____48 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ______________________________________ Sexo: __Feminino___________ {PAGE } e) Em qual(is) segmento(s): a escola trabalha somente com EM desde 2004_ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? Uma escola autônoma é ela poder resolver tudo. Eu acho que é isso, sem intervenção porque uma escola não pode ser igual a outra porque vai de acordo com a clientela. Não é mais aluno é clientela. E aí ele impõem coisas que de uma escola para outra não dá para fazer o mesmo trabalho porque modifica muito. O que você acha que deveria ser feito para a escola atingir essa autonomia? Se pudéssemos, o corpo docente pudesse trabalhar em função da comunidade, da clientela sem essa comparação de bairros, de municípios, de nada disso. Cada um pudesse gerir a sua autonomia, fazer o seu trabalho. Você conhece as políticas que prometem trazer a autonomia para a escola? É o que mais tem. Como é que você tomou conhecimento delas? Através do noticiário, dos discursos é o que mais a gente houve mas ninguém faz nada. Só prometem. Comentários coisa. Seria tão bom se dessem autonomia para a gente. A gente ia poder resolver tanta Entrevistada 10 – (19/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública:__7 anos b) Função na escola: ____Professora c) Idade: ____33 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ___________História___________________ e) Em qual(is) segmento(s): ensino fundamental e médio Sexo: __Feminino___________ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? A autonomia da escola é a capacidade dessa escola gerir os seus próprios recursos; ou seja, através do dinheiro que o Estado manda, a escola ter a consciência de como e quais são as suas áreas de fraqueza e as suas áreas de força e o que que ela pode investir. Como é que ela pode pegar esse dinheiro e saber, por exemplo se ela tem que investir mais em pessoal de apoio, se ela tem que investir mais em merenda ou se ela tem que investir mais em livros para a biblioteca. Administrar as suas foças e fraquezas com esse dinheiro vindo do Estado. O que deveria se feito para que a escola atingisse esse ideal de autonomia? Eu acho que transparência nos gastos públicos porque hoje em dia falar do que é público vira uma coisa que não é de ninguém, então por isso as pessoas não têm uma questão da responsabilidade, da transparência, seja pelo dinheiro público, pelo bem público. Eu acho que cada vez mais a gente precisa trabalhar a questão da ética, dos valores a preocupação com o que é de todos e isso é fundamental para trabalhar qualquer projeto ligado à educação e ligado à autonomia do ensino público. E como você vê essa questão de não haver mais a eleição para diretores? Um grande retrocesso. Voltamos à ditadura. De novo é uma coisa imposta de cima para baixo e aí o luxo é dizer assim: “Há que se cuidar do broto para que a vida nos dê flor e fruto” [fazendo referência a um cartaz da Secretaria de Educação] e aí você impõe uma medida “guela” à baixo das pessoas e esquece que as pessoas, pra participar e para se sentir parte de um processo elas têm que escolher também se não elas não se sentem responsáveis. Você {PAGE } tem co-responsáveis por esse processo de estar na escola e aí a escola não faz o seu processo que é tornar a vida do outro melhor no sentido de que o aluno tem que entrar aqui e sair um ser humano melhor. Mas se ninguém tomar parte ou responsabilidade desse processo acaba virando um depósito de gente. Você conhece as atuais políticas ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? Eu conheço muito o discurso, a teoria que normalmente são maravilhosos agora não esquecem de como tem que trabalhar na prática. Então todo o enunciado, todas as propostas maravilhosas isso é sempre falado agora eu queria me aprofundar em algo mais do que só o discurso. Eu queria ver realmente a prática disso. E como você tomou conhecimento desse discurso? Através da mídia. Principalmente em ano de eleição para justificar os gastos ou os desvios de verbas então, a todo momento a mídia é capaz de fazer um marketing e dizer que está fazendo isso e que está fazendo aquilo outro e acaba manipulando uma população mas na verdade, algo efetivo e prático a gente não percebe. Como é que você vê a exigência de que a escola monte seu PPP com toda essa condição que temos hoje; com o diretor que não é eleito, com a falta de funcionários da área pedagógica? De novo uma grande contradição e de novo um grande e gigante pé de barro. Que toda escola precisa de seu PPP é obvio, mas que ele tem que realmente fazer parte da prática dessa escola então, aí está a grande contradição. Você segue a receita de bolo pedindo que a escola desenvolva o seu projeto, tenha as suas idéias e em compensação você empurra de cima para baixo todo o projeto de autonomia ou administração dessa unidade escolar então, por isso, essa coisa não funciona. É como assim, eu estou obrigando alguém a ser espontâneo então cadê o ato dele ser espontâneo? Não existe. Então, como é que a escola pode ter autonomia se, na verdade, continua o retrocesso, continua a ditadura, continua o impasse ou de novo a recusa em querer ouvir o outro. E aí se pergunta porque é que esse negócio não dá certo. Entrevistada 11 – (19/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública:__39 anos b) Função na escola: ____Professora c) Idade: ____57 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ___________Geografia___________________ e) Em qual(is) segmento(s): 2º segmento do ensino fundamental Sexo: __Feminino___________ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? É justamente a escola poder se autogerenciar. De uns tempos para cá já está havendo um pouco mais de autonomia, inclusive na questão do currículo. A escola já pode, tendo como base os Parâmetros Nacionais, estabelecer o seu currículo com base nas necessidades da escola e todas as características da comunidade escolar. Mas ainda falta muito por que apesar de a Secretaria de Educação dizer que as escolas têm autonomia, elas ainda ficam muito presas a certas normas e documentos que não dão justamente ao diretor e aos professores a real autonomia de trabalharem somente em cima daquilo que é realmente necessário. Parece que depois que a informática chegou às escolas, mais papel se criou. A informática foi criada, foi institucionalizada nas escolas para diminuir o trabalho, para racionalizar o trabalho mas quanto mais informatizado, mais papel se tem que preencher; os diretores, pelo menos de duas a três vezes por semana são tirados da escola para reuniões ou no nível intermediário e as vezes até no nível central e isso dificulta muito o acompanhamento da escola, o próprio gerenciamento da escola. {PAGE } Com relação à verbas, até há alguns anos a escola era realmente muito presa . Não tinha direito de fazer nada. Dependia de determinações legais da prefeitura mas já de alguns anos para cá ela recebe verbas para uso próprio, do governo federal e também do governo municipal. Isso ajudou e muito na questão de pequenos reparos, pequenas necessidades, necessidades imediatas da escola que as vezes precisava esperar decisão da Secretaria de Educação, decisão do Prefeito e agora não. Dependendo do tamanho da escola, da quantidade de alunos as verbas são maiores e com isso se consegue realmente de pronto atingir algumas necessidades mais prementes da escola. O que deveria ser feito ou, quais seriam as condições, para que a autonomia (da forma como você a concebe) chegasse à escola? Seria isso mesmo, a escola não ficar tão presa à determinações do órgão central. Tudo bem que o Sistema é único, o Sistema de Educação do Município é único mas para isso tem-se o acompanhamento com supervisores da própria CRE da Coordenadoria de Educação mas é necessário que realmente a escola pudesse ela mesma fazer as suas parcerias com a comunidade, com entidades oficiais sem depender de autorização, de decisões superiores. Você conhece as atuais políticas ou programas que prometem viabilizar a autonomia da escola? A atual política, que eu conheço mais é do Município e que também está atrelada ao Governo Federal, por exemplo, a criação do FUNDEF que é o Fundo de Ensino Fundamental que é transformado assim ... a ajuda é transformada em dinheiro, é justamente a verba federal que a escola recebe para ter um pouco mais de autonomia no gerenciamento das suas necessidades. No caso, a Prefeitura também, ela cria grupos de trabalho. Agora mesmo, há umas duas semanas eu fui indicada pela escola para fazer parte do grupo do município que vai justamente discutir o currículo Multieducação, porque o currículo usado nas escolas municipais é o Multieducação que é adaptado em cada escola através do seu PPP. Então, eu não sei ainda o que vem de novidade que venha a aumentar essa autonomia porque ainda não houve nenhum encontro dos professores que foram indicados em suas escolas para discutir, para avaliar e até mesmo reformular esse currículo. A gente espera que, com base nisso, seja realmente dada um pouco mais de autonomia à escola. Isso no nível da Secretaria de Educação? No nível da Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro. No nível federal, a autonomia é dada mais nesse sentido operacional, prático de gerenciar a verba federal. Isso, cada escola, junto com o seu Conselho Escola Comunidade, decide ... O CEC é formado por pais, professores, alunos, funcionários e um elemento da comunidade escolar, da associação de moradores que está mais ali dentro da escola. Então, são eles, juntamente com a direção que decidem o uso da verba do dinheiro mesmo em si e também os Parâmetros Curriculares Nacionais, com isso o MEC também quer dar autonomia para a escola para ela própria criar o seu currículo. Mas é como eu disse a gente ainda depende muito do que a Secretaria de Educação estabelece. Certas normas, por exemplo, nem todos os professores concordam com o atual processo de avaliação, como ele é feito, também, o caso da educação por ciclos em que a criança de primeira à terceira série, se não me engano, não é reprovada. Nós recebemos na 5ª série alunos praticamente analfabetos, que mal sabem assinar o nome e a gente sabe que muito disso está nessas mudanças de progressão, ciclo e nós queríamos que isso mudasse, que a escola tivesse realmente autonomia para reverter isso. Comentários Eu acho que a escola pública ... a gente pode fazer uma escola pública de qualidade mas, a sociedade atual está muito complicada mesmo e as vezes a escola luta por fazer um bom trabalho mas esbarra numa série de problemas, as vezes, até mesmo da comunidade em volta, do despreparo dos professores de enfrentar problemas que surgem na escola que fogem da alçada de ser professor. A gente encontra muito e nós somos despreparados para isso. A gente vai mais na intuição, no bom senso mas é muito complicado. Mas tenta-se de qualquer maneira, ainda, fazer uma escola pública de qualidade e democrática que dê oportunidade a todo mundo. {PAGE } Entrevistado 12 – (19/06/05) a) Tempo de matrícula na rede pública:__7 anos b) Função na escola: ____Professor c) Idade: ____33 anos_ d) Disciplina(s) que leciona: ___________Matemática___________________ e) Em qual(is) segmento(s): 2º segmento do ensino fundamental Sexo: __Masculino_________ O que seria a autonomia da escola, no seu entender? No meu entender autonomia da escola. Bom, o que é a escola? A escola são os professores, alunos, funcionários, diretores e a comunidade. O que é a autonomia da escola? A autonomia da escola é fazer o que professores, alunos, diretores, funcionários e comunidade desejam para a comunidade. Fazer com que a escola sirva a comunidade. Isso é a autonomia da escola, a escola tem que ter autonomia para isso. Agora, hoje ela não tem muita autonomia para isso, para traçar suas próprias linhas de ação muito pela questão política, né? É a Coordenadoria que quer interferir no trabalho da escola, é a Coordenadoria que acha que não acha que o trabalho da escola está certo, que coloca funcionário readaptado lá para a escola, funcionário que nem a escola quer. Em fim tem inúmeros problemas políticos que fazem com que a autonomia da escola não se concretize. Então, a autonomia para mim é isso é a escola ter a liberdade de se pensar e concretizar aquilo que ela traçou como linha. O que deveria se feito para que a autonomia da escola fosse alcançada? As condições e o que deveria ser feito. Eu acho que para ter autonomia eu acho que a escola tem que ter uma identidade. Não sei se eu estou falando disso agora para você por que a escola está passando por um processo, a escola do Município em que eu dou aulas para a 8ª série, de falta de identidade. Está faltando identidade a ela. Então, qualquer PPP que a gente fique traçando não dá muito certo. É aluno de uma comunidade aqui, aluno de uma comunidade ali, alunos de várias comunidades diferentes. Eu acho que para chegar essa autonomia à escola, ele tem que ter primeiro uma identidade. Buscar essa identidade. Tendo uma identidade, ... isso aí também tem que partir dos professores esse entendimento, não é só de mim, ela começa a traçar planos, linhas de ação da própria escola. Isso o que eu falo acho que parte mais dos professores. Eu acho que são os profissionais da escola que têm que convidar a comunidade à entrar na escola para desenvolver esse projeto. Agora, as condições são muitas. Depende de condições financeiras também, a escola as vezes tem poucos profissionais para lhe dar com os problemas que ela tem. A escola hoje tem problema de falta de segurança, de falta de inspetor nos andares, a escola hoje tem problema de falta de professor de falta de tudo, de falta de equipamento necessário para os profissionais da cozinha trabalharem ... . Em fim há de se ter investimento também. Investimento nas escolas não só na parte salarial mas também na parte estrutural. Eu não sei se estou fugindo da pergunta mas eu volto para o valor da identidade da escola. Ela tem que buscar sua identidade para traçar um projeto junto com todos para que essa autonomia chegue à escola e, de uma certa forma, eu acho que quando a identidade chega a uma escola e ela chega a sua autonomia, eu acho que a Coordenadoria ou até mesmo as instâncias superiores não se metem muito no trabalho não. Quando ela vê que trabalho está dando certo, as coordenadorias não se metem muito no trabalho que está sendo feito na escola. Você conhece as atuais políticas de autonomia? Não conheço as políticas ou programas que prometem viabilizar a autonomia. Não conheço. A gente que está em sala de aula, a gente que vive na sala de aula o dia todo, vai de uma escola para outra a gente de vez em quando, no recreio quando a gente costuma se encontrar com alguns professores porque nem todos os professores se encontram. Lá o recreio é dividido, o recreio só vai para algumas séries por uma hora e para outras séries em outra {PAGE } hora e isso de uma certa forma, eu acho prejudicial porque isso evita da gente discutir questões. As vezes o que um professor sabe, passa para o outro. Então, por exemplo, essas políticas eu não conheço. Não sei se existem ou não. Você fez a licenciatura ... Na UERJ. Depois de 1996? Eu acabei em 1996. Então você não estudou a nova LDB? Não peguei essa lei no curso. Em fim eu não sei dessas novas políticas e programas. Isso também não se comenta na Coordenação Pedagógica. Não se discute as políticas educacionais nacionais na escola. Não se debate. Comentários Com relação à autonomia da escola, eu acho que hoje dificilmente você encontra escolas públicas que tenham 100% de autonomia. É difícil de você encontrar. Sempre tem influência de Coordenadoria, sempre tem influência de políticas que só vêem estatísticas e quando isso sai do padrão, sempre tem auditoria. Na minha escola teve uma. Foi uma equipe da CRE na escola para verificar como é que estava a questão de material se estava sendo utilizado, como é que estavam os conceitos e o aproveitamento dos alunos tudo isso porque os conceitos dos alunos não foram muito bem visto na CRE da nossa escola. Claro que lá de cima vem uma preocupação mas a preocupação deles a gente sabe que é com as estatísticas. Eles têm que mostrar serviço para alguém lá de cima poder mantê-los no cargo. Com relação aos recurso da escola vocês não têm acesso à forma como esses recursos são usados? Não, a gente não tem aceso a isso não. Vez em quando, a direção comunica pra a gente que vai chegar uma verba para a escola. Não fala em valores? Não, não fala em valores. Não pergunta se tem sugestões para o uso dos recursos? Não. Na escola municipal nunca teve isso. Existe professor representante no CEC? Existe. Mas o que acontece nas reuniões do CEC é o seguinte. Parece que , segundo esse professor representante, tem um representante da escola, que é ele, das outras escolas da região e um representante da Coordenadoria. Nas reuniões do CEC? Nas reuniões do CEC. Mas não há reunião interna do CEC? Não. Só reunião geral com outros representantes de CECs de outras escolas. E o que é discutido nessas reuniões? Pelo o que ele me fala, questão do dinheiro que entra nas escolas e fala-se um pouco também sobre os problemas das escolas, os problemas de violência, que geralmente hoje é a tônica. Mas, pelo o que ele me passa as reuniões do CEC é mas para eles ficarem dizendo amem ao que é colocado para eles. Então vocês só se reúnem com a dirão da escola na época do conselho de classe? {PAGE } Exatamente ou quando se tem o centro de estudos que é um a programação feita ... o centro de estudos pega-se um dia na semana para se fazer o estudo mas não é feito todas as semanas não. Agora, por exemplo, nesse ano, tiveram dois centros de estudo só. E o que é discutido? É discutido o pedagógico, por exemplo, a coordenadora tirou xerox de um livro que falava sobre a relação entre o professor e o aluno, só, só isso e a gente ia lendo e discutindo o livro e só. Mas sempre nas discussões recaíamos nos problemas da escola. Nós desviávamos completamente da leitura do livro. Era um texto teórico e a gente via alguma coisa lá que tinha alguma coisa haver com a gente e aí a gente atropelava. Então é isso. Eu me preocupo com a autonomia da escola hoje porque eu vejo que a escola não tem autonomia nenhuma, por exemplo, eu não tenho autonomia, eu, em sala de aula não me sinto com autonomia de aprovar e reprovar um aluno. Não que isso seja muito importante, mas isso é uma forma de constatar tanto o seu trabalho como o aproveitamento do aluno. Me dá pena ver, por exemplo, hoje eu estava comentando isso com a professora de ciências. Eu estava na escola do Estado dando aula para o 1° ano e já estava chegando perto da semana de provas e lá a maioria esmagadora dos alunos vêm do Município do Rio em que se aprova automaticamente e uma aluna não sabia fazer, por exemplo, conta de multiplicar nem de dividir estando no 1º ano do 2º grau. Aí eu estava resolvendo uma equação com ela, coisa que se aprende na 5ª série, e chegou em um momento em que chegamos lá em 20 dividido por cinco. Eu disse para ela: - Faça essa conta para mim. Ela demorou um pouco e me perguntou: - Professor, dá 1? Aí eu falei não e perguntei: - Você sabe a tabuada de cinco? Ela disse que achava que sim então eu pergunte a tabuada para ela e ela não soube responder. Em fim, eu fico com pena porque o aluno fica olhando para você, ele fica desestimulado. Eu pergunte para ela como é que ela conseguiu, mas eu perguntei não de forma ofensiva, como é que ela conseguiu estar lá. Se o professor não ensinava aquilo para ela. Ela respondeu que o professor ensinava mas ela fazia um trabalho e estava tudo bem. Esse é o tipo de trabalho que o Município dá, trabalho em grupo, trabalho em dupla e um copia do outro, em fim e eu temo muito por isso porque isso é exclusão do aluno, o aluno está sendo excluído. Eu sinto que ele é um aluno excluído, ele vai ser excluído. Ele já é um excluído da sociedade. Para mim, ele já é. Então, esses alunos são excluídos da sociedade. Então, a escola hoje não tem autonomia, por exemplo para consertar isso. A escola hoje passa por cima disso tudo. Aliás passa por cima da escola por políticas educacionais não oficiais, creio eu. O que são as políticas educacionais não oficiais? São essas políticas de estatística - eu quero estatística, eu quero número de aprovações e não interessa como. Isso, para mim é política não oficial. Porque se a gente fosse realmente ler a política oficial, eu acho que seria o correto, eu acho até que eu vou sugerir isso nas próximas reuniões, ler a lei mesmo, ler a lei e refletir sobre a lei. Eu acho que é mais importante a gente debater isso, e também jogar na nossa realidade, quer dizer, fazer um paralelo, a gente pode ir debatendo isso e realidade, debatendo isso e realidade e ver ... porque muitos professores não sabem o que é a LDB. É incrível isso. Eu, por exemplo, sou um que não sei o que é a LDB direito. Até mesmo para a gente não engolir mais sapo como a gente tem engolido muitas vezes. Você fala em autonomia da escola mas o profissional não tem autonomia e quando o profissional não tem autonomia na escola é porque, ... a autonomia que eu estou dizendo não é a liberdade de se fazer o que quer, é a liberdade dirigida. A liberdade responsável. Hoje, o profissional não tem direito em opinar. Você falou da questão do dinheiro, da verba; a gente não sabe de verba, muito pouco.