ALDICARBE efeitos à saúde e ao meio ambiente Biólogo Sérgio Greif O Chumbinho • Comercializado clandestinamente como veneno para ratos. • Nome deriva de seu aspecto granulado sólido de cor cinza escuro, lembrando pequenas esferas de chumbo. • Outros nomes: “chumbinho terrível”, “raticida Japan”, “mil gatos” e “três passitos”. • Composição varia, mas em geral seu ingrediente ativo é o aldicarbe. O Aldicarbe • O aldicarbe é um ester carbamato • Fórmula bruta: C7H14N2O2S • Pesticida sistêmico • Controle de insetos, ácaros e nematóides • Culturas: batata, algodão, beterraba açucareira, amendoim, soja, feijão, café, cebola, tomate, cana- deaçúcar, banana, fumo, batata-doce e plantas ornamentais (WHO, 1991; Andrei, 2005). Restrições de uso • Maioria dos países tem restrições para o uso, alguns já proibiram (WHO, 1991); • Proibida utilização dentro de cidades (residências e jardins); • No Brasil, comercialização para uso em campo só é permitida nos Estados da Bahia, Minas Gerais e São Paulo (ANVISA, 2007). • Produção no Brasil é proibida (ANVISA, 2007). Estrutura química do aldicarbe Sinonímias para o aldicarbe • Carbanolato; • ENT 27 093 ; • 2-metil-2-(metiltio)propanal O-[(metilamino)-carbonil]oxima (C.A.); • 2-metil-2-(metiltio)propionaldeido 0-metil-carbamoiloxima (IUPAC); • NCI-CO8640; • OMS-771; • Propanal, 2-metil-2-(metiltio)-, O-((metillamino)carbonil) oxima; • Temic; • Temik (Temik G; Temik M; Temik LD; Temik 5G; Temik 10G; Temik 15G; Temik 150G); • Sentry; • Union Carbide UC 21 149. Números de identificação internacionais CAS: 116-06-3 RTECS: UE2275000 ICSC: 0094 ONU nº 2757 CE: 006-017-00-X Aldicarbe é o praguicida mais tóxico disponível no mercado Classificação Toxicológica • A Environmental Protection Agency (EPA), dos EUA, classificou o aldicarbe como Tóxico Classe I – “Extremamente tóxico” Toxicidade em humanos • Testes com voluntários humanos ingestão de 0,1 mg/kg de p. c. produzem sinais tóxicos, • Há relatos de casos de intoxicações com doses de 0,02 mg/kg de p. c. Fonte: Burgess, Bernstein e Hurlbut, 1994. Toxicidade • Grande toxicidade aguda, alta letalidade; • Doses sub-letais: – sem evidências de toxicidade crônica; – efeitos sobre o sistema imunológico e possivelmente sobre o S.N.; – Quadro clinico por apenas poucas horas, eliminação rápida do agente. • Conforme Ficha Internacional de Segurança Química da IPCS/WHO “os efeitos do produto sobre o organismo podem aparecer de forma não imediata.”. Toxicodinâmica e toxicocinética • Absorção – Absorção quase completa pelas mucosas do organismo; – Absorção boa também pela pele • Distribuição – Distribui por todos os tecidos • Transformação – Metabolismo transforma aldicarbe em sulfóxido e sulfona, ambos tóxicos (sulfóxido é 23 vezes mais tóxico do que o próprio aldicarbe) • Eliminação – Principalmente pela urina. Circulação enterohepática Principal ação sobre o organismo Inibição da colinesterase • Como potente inibidor de colinesterase, impede recuperação da ACETILCOLINA, • Acetilcolina - responsável pela transmissão da sinapse. • Ao permitir o acumulo da acetilcolina nos receptores sinápticos, ocorre SUPERESTIMULAÇÃO COLINÉRGICA, • Danos ao sistema nervoso autônomo, sistema nervoso central e junção neuromuscular. Transmissão da sinapse Recuperação da acetilcolina Superestimulação colinérgica Principais manifestações clínicas • São derivadas da crise colinérgica aguda: • 1. Manifestações muscarínicas: – Broncoespasmo, – Dificuldade respiratória, – Aumento de secreção brônquica, – Cianose, – Edema pulmonar; – Falta de apetite , – – – – – – – – – – – – Náuseas e vômitos, Cólicas abdominais, Diarréia, Incontinência fecal, Dor ao defecar; Lacrimejamento, Salivação, Suor excessivo; Pupilas contraídas, Visão turva; Incontinência urinária; Bradicardia. Principais manifestações clínicas • 2. Manifestações nicotínicas: – Fasciculações musculares, – Cãimbas, – Fraquezas, – Ausência de reflexos, – Paralisia muscular; – Hipertensão, – Taquicardia, – Palidez, – Pupilas dilatadas. • 3. Manifestações no sistema nervoso central: – Inquietação, – Labilidade emocional, – Cefaléia, – Tremores, – Sonolência, – Confusão, – Marcha incoordenada, – Fraqueza generalizada, – Depressão do centro respiratório, – Coma. Intoxicações humanas • Acidentais • Suicídios • Homicídios • OMS – principais vitimas são os que fabricam, elaboram, manipulam e aplicam (WHO, 1991) • No Brasil – principais vitimas são crianças (intoxicação acidental), – Suicidas (SINITOX, 2003) Estatísticas de intoxicações: • Temik: Estatísticas de pesticidas; • Chumbinho: Estatísticas de raticidas. • Intoxicações por raticidas no DF entre 2004 e 2005 29,4% se deveram ao aldicarbe (Rebelo, 2006); • Intoxicação por raticidas na Paraíba entre 1999 e 2002 33,96% envolveram Aldicarbe (Canavieiras et alii, 2004). Sub-notificações • Notificação é um ato voluntário. • Os Centros de Informações Toxicológicas não vão atrás dos casos; • Os CITs só tomam conhecimento dos casos quando ocorrem consultas telefônicas por parte da população ou de médicos; • População quase não telefona por desconhecer o sistema; • Meio rural – dificuldade de acesso a telefone e internet; • Médicos só telefonam se tiverem uma duvida; • Nos locais com grande número de intoxicações, por terem mais experiência no diagnóstico e tratamento dos casos, os profissionais solicitariam menos a ajuda desses centros. Intoxicação acidental de seres humanos por aldicarbe Ingestão • Aldicarbe - ação sistêmica • Produto penetra a planta e resíduos podem ocorrer nos alimentos. • Lavagens não eliminam o agente tóxico. • Nos EUA constatou-se 1 mg de aldicarbe por quilo de batatas (WHO, 1991). • No Brasil, resíduos de aldicarbe em banana (0,10 mg/kg), batata (1,00 mg/kg) e laranja (0,20 mg/kg) (ANVISA, 2005). • A ingestão diária aceitável (IDA) para o aldicarbe é de 0,003 mg/kg p.c. (ANVISA, 2007). Ingestão • Crianças podem ingerir alimentos envenenados por chumbinho. • No 1º semestre de 2002 foram registradas 231 intoxicações por aldicarbe no Ceará. • A faixa etária de 0 a 9 anos registrou 23 casos, de 10 a 19 anos foram encontrados 61 casos e 147 ocorrências foram identificadas na faixa etária de 20 a 29 anos. CEATOX/CE, Envenenamento de crianças • Estudo de Vieira e colaboradores (2004) em Fortaleza, CE: – 52,30% dos envenenamentos por carbamatos eram crianças entre 1 e 3 anos, – 29,23% eram menores de 1 ano – 18,47% tinham idade entre 4 e 5 anos. – 96,92% das crianças zona urbana e – 3,1% da zona rural. • Crianças em idade pré-escolar respondem por mais de 80% de todos os casos de envenenamento e quase um terço de todas as mortes acidentais em razão de tais ocorrências – SINITOX (2003) . Inalação • É extremamente perigosa aos trabalhadores que fabricam, elaboram, manipulam e aplicam o veneno. • Felizmente casos de inalação são raros devido à forma como o produto se apresenta, em grânulos. • Casos ocorrem por negligência do trabalhador ou do empregador. Contato dérmico • Embora penetração pela mucosa seja mais eficiente, também ocorre penetração dérmica; • É a principal via de contaminação na exposição ocupacional do trabalhador rural (WHO, 1991). “Problema de nervos” • É comum o trabalhador rural se queixar de “problema de nervos” • Isso vem sendo associado ao seu contato com agrotóxicos, e seus possíveis efeitos sobre o sistema nervoso e imunológico (Levigard, 2001). Utilização do aldicarbe para tentativas de suicídios e homicídios Suicídio • “Chumbinho” é o principal agente tóxico utilizado. • Envolvido em mais de um terço das ocorrências. Fonte: Werneck et alii, 2006; Schanuel et alii, 1998 Auto-envenenamento • 11 presos da Agência Prisional de Goiás (APG), mantidos em ala de alta periculosidade • Consumo de doses sub-letais de aldicarbe • Idéia: apresentar sinais e sintomas de intoxicação, para transferência para um hospital e subseqüente fuga. • Descaracterizou-se aí a intenção de suicídio ou homicídio, e sim, indução de intoxicação por doses leves para obter uma tentativa arriscada de fuga. Fonte: Azeredo et alii, 2005 Envenenamento proposital • Facilidade de aquisição em qualquer mercadinho torna-o um produto de fácil acesso a criminosos. • O aldicarbe pode ser misturado a preparações alimentícias e na água de consumo, de modo a trazer envenenamento proposital de pessoas. Envenenamento proposital ou acidental de animais Finalidade de envenenamento de animais domésticos: • Facilitar ação de ladrões; • Vizinhos incomodados; • Vandalismo. • Animais que consomem ratos mortos por aldicarbe ou iscas para roedores morrem envenenados. • 89% dos cães e 94,4% dos gatos envenenados em São Paulo - aldicarbe (Xavier, 2004). Animais silvestres • Aves e pequenos mamíferos podem ingerir grânulos de aldicarbe não completamente incorporados ao solo. • Mais de 600 aves canoras mortas por ingestão de aldicarbe de uma só vez. • Fonte: WHO, 1991. Efeitos do aldicarbe ao meio ambiente Persistência no ambiente • Aldicarbe é persistente no ambiente. • Ele lixivia no solo e atinge águas subterrâneas. • Lixiviação em solos arenosos com pouca matéria orgânica é mais acentuada, particularmente onde o lençol freático é mais alto. • Contaminações de 1 a 500 microgramas de aldicarbe por litro de água foram detectadas em canais de drenagem e poços pouco profundos dos Estados Unidos e do Canadá. • Persistência no solo pode variar de 15 dias a 3 meses para aplicações na superfície e de 10 dias a 36 meses na zona saturada. Fontes:; Risher, Mink e Stara, 1987; WHO, 1991; Mutch et alii, 1992; MotasGuzmán, et alii 2003 Lixiviação Contaminação do solo • O pesticida não é seletivo e ataca também organismos do solo que não são alvo, comprometendo a qualidade do solo. Conclusões e recomendações • O aldicarbe é um produto extremamente tóxico. • O problema com seu uso não se restringe à “utilização inadequada”, na forma de “chumbinho”. • Em sua forma comercial é responsável por: – Contaminar alimentos; – Intoxicar trabalhadores rurais; – Intoxicar animais silvestres; – Contaminar o solo e as águas subterrâneas. • Em sua formulação clandestina, “chumbinho”, é responsável por: – Suicídios; – Envenenamento de seres humanos e animais, além de intoxicações acidentais de crianças. • Culpabilidade: Fabricantes querem se isentar alegando que órgãos de fiscalização não cumprem seu papel e permitem comércio clandestino. • Desvios acontecem em alguma dos seguintes processos: fabricação, importação, transporte e distribuição. • Portanto, esses deveriam ser solidários e coresponsáveis pelas conseqüências. • O controle de insetos e nematóides pode ser realizado nas culturas através de manejo adequado e da utilização de outros recursos menos danosos à saúde da população e ao meio ambiente. • Recomendamos que a importação e comercialização do aldicarbe seja proibida em todo o Território Nacional. Grato pela atenção