Competências e Desempenho Organizacional – Uma Polêmica Relação
Autoria: Bruno Henrique Rocha Fernandes, Maria Tereza Leme Fleury
Resumo
Como relacionar as competências e os recursos de uma organização ao seu desempenho é
um tema relevante, em que a literatura e os casos empíricos analisados têm dado respostas
parciais e pouco satisfatórias. Este trabalho procura se debruçar sobre esta polêmica, numa
tentativa de sistematizar as principais contribuições ao debate. Partindo da questão: quais são
os recursos que dirigem a performance organizacional, considerando todas as perspectivas de
performance do BSC (balanced scorecard) e observando outros indicadores, além dos
tradicionais indicadores financeiros, como a competência, realizamos um estudo em uma
empresa de saneamento. A empresa pesquisada dispunha de uma estrutura com 93 unidades
de negócio e um sistema de avaliação de performance baseado no BSC. O fato de possuir
unidades comparáveis, avaliadas pelos mesmos indicadores, possibilitou investigar a relação
entre recursos e indicadores de performance.
1. Introdução
O tema competências organizacionais, desde o sucesso do artigo de Prahalad e Hamel
sobre as core competence, vem ganhando importância crescente, tanto em debates
acadêmicos, como em fóruns profissionais. Como articular as competências e recursos de uma
organização ao seu desempenho é um tema relevante em que a literatura e os casos empíricos
analisados têm dado respostas parciais e pouco satisfatórias. Este trabalho procura se debruçar
sobre esta polêmica, numa tentativa de sistematizar as principais contribuições ao debate,
trazer o resultado de uma pesquisa empírica, testando relações e levantando novas questões.
Seguindo os princípios da Visão da Empresa baseada em Recursos (VBR), o trabalho
assume o conceito de competência organizacional como um conjunto de recursos coordenados
que afetam o desempenho. Entretanto, uma revisão da literatura, considerando a natureza dos
recursos e o modelo do balanced scorecard (BSC) como um referencial para organizar as
diversas dimensões do desempenho, revelou que muitos dos estudos empíricos quantitativos
na área focalizam recursos como práticas de RH, particularmente os chamados sistemas de
trabalho de alta performance. Poucos estudos abordam outros recursos como satisfação ou
competência dos empregados e, em geral, consideram apenas o desempenho financeiro.
Partindo assim da pergunta “quais são os recursos que dirigem a performance
organizacional, considerando outros indicadores além das práticas de RH, incluindo todas as
perspectivas de performance do BSC?”, realizamos um estudo em uma empresa do setor de
saneamento. Na ocasião, a empresa dispunha de uma estrutura com 93 unidades de negócio, e
um sistema de avaliação da performance baseado no BSC. O fato de possuir unidades
comparáveis, avaliadas pelos mesmos indicadores, estabeleceu uma interessante base para
investigar a relação entre recursos e indicadores de performance.
O trabalho está dividido em quatro partes, além desta introdução. A primeira faz a revisão
da literatura, do conceito de competência organizacional aos estudos empíricos relacionando
recursos à performance. A segunda discorre sobre os procedimentos metodológicos que
orientaram a pesquisa. A terceira consiste no caso que serve de base empírica para a análise.
A quarta, a conclusão, reflete sobre os resultados alcançados no estudo.
2. Construindo os conceitos e estabelecendo as relações entre competência e desempenho
organizacional – revisão teórica
Como mencionamos, desde o artigo de Prahalad e Hamel (1990) sobre as competências
essenciais da organização, este tema das competências organizacionais ganhou destaque na
literatura e na prática da administração. Mas um aspecto não tão enfatizado é a origem da
discussão sobre competências: a visão da empresa baseada em recursos (VBR), proposta por
Penrose (1959). Segundo esta visão, uma organização pode ser entendida como conjunto de
recursos empregados de maneira produtiva para gerar riqueza.
O próprio conceito de competência pode ser compreendido a partir da VBR. Mills et alii
(2002) afirmam que uma competência resulta de um conjunto de recursos coordenados de
modo tal que determina um nível particular de performance em uma atividade. Por exemplo,
considere-se a Figura 1, em que o triângulo ilustra a competência velocidade no lançamento
de novos produtos em uma dada organização. Quando analisada de perto, pode-se concluir
que tal competência resulta da combinação e coordenação de diversos recursos, como uma
equipe tecnicamente preparada e motivada, um sistema de recompensa à inovação e uma boa
integração entre marketing e P&D – os três representados no interior da Figura 1. Vale
destacar, a Figura não só ilustra a relação entre competências e recursos, mas assinala uma
metodologia para entender a competência a partir de seus recursos constitutivos, denominada
por Mills et alii (2002) como arquitetura de competências e recursos. Para representar a
interdependência entre e coordenação que resulta na competência organizacional, os autores
desenharam um triângulo com os recursos representados por círculos e as fronteiras e flexas
representando a coordenação.
Figura 1: Articulação de recursos e competências
Competência: velocidade no
lançamento de novos produtos
Equipe preparada
e motivada
Sistema de
recompensa à inovação
Integração entre
marketing e P&D
Fonte: Mills, Platts, Bourne e Richards, 2002, p. 14.
Usando termos distintos, outros autores compartilham a idéia da relação entre VBR e
competências. Por exemplo, Grant (1991, p. 120) propõe que “as capacidades de uma empresa
são o que ela pode fazer como resultado de grupos de recursos trabalhando juntos”. Da
mesma forma, Sanchez (2001, p. 7) define competência como “a habilidade de uma
organização de sustentar o emprego coordenado de ativos e capacidades de forma a ajudar a
atingir seus objetivos”. Hamel (1994, p. 11) afirma que competências são uma “integração de
habilidades e tecnologias, em vez de uma habilidade ou tecnologia única e isolada”.
Dentre os recursos organizacionais, uma categoria essencial é a competência das pessoas.
Fleury e Fleury (2000, p. 21) a definem como “um saber agir responsável e reconhecido, que
implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agreguem
valor econômico à organização e valor social ao indivíduo”. Dutra (2001) faz eco à idéia de
“agregar valor econômico”, ao sugerir que conhecimentos, habilidades e atitudes do indivíduo
devem ser “entregues” à organização, ou seja caracterizar uma real contribuição à
organização. As competências individuais, no entanto, podem ser encarados sob dois lados:
como recursos, enquanto elementos à disposição da organização para alcançar um particular
nível de performance, ou como instância coordenadora de recursos – e, neste caso, assume
destaque a competência gerencial.
Conseqüência direta destas idéias é que o desempenho organizacional dependerá, em
maior ou menor grau, da qualidade e quantidade dos recursos por ela possuídos, a
competência das pessoas entre eles, bem como do modo pelo qual a organização coordena tais
2
recursos. Desta forma, é razoável supor-se que um aumento na qualidade e quantidade dos
recursos, tomados como variáveis independentes, deverá se traduzir em melhor desempenho,
tomado como variável dependente.
Tal idéia remete ao outro lado da polêmica discussão deste trabalho: o desempenho ou
performance da organização. Desde o Tableau de Bord, desenvolvido por engenheiros
franceses em meados na década de 50 (Epstein e Manzoni, 1998), diversos autores vêm
chamando a atenção para a limitação de se avaliar o desempenho da empresa apenas por meio
de indicadores financeiros – erro ainda hoje freqüente em muitas organizações que monitoram
somente fluxo de caixa e resultados contáveis. Por exemplo, Meyer (1994), destaca a
inadequação de medidas financeiras para tomada de decisões: “o fato de que um projeto está
seis meses atrasado e US$2 milhões acima dos custos não diz nada sobre o que saiu errado e o
que fazer na seqüência” (p. 97). Este autor sugere, assim, outras dimensões a serem
monitoradas para se ter uma visão mais abrangente do desempenho.
A proposta mais famosa de avaliação abrangente do desempenho organizacional deve-se a
Kaplan e Norton (1992), o balanced scorecard (BSC). Propõem os autores que as empresas
monitorem seu desempenho segundo quatro perspectivas: financeira, clientes, processos
internos e inovação e aprendizagem. Sugerem que competências e recursos sejam
monitorados na quarta perspectiva, a de inovação, destacando que recursos atuam como
direcionadores da performance nas outras perspectivas. Para reforçar o argumento,
exemplificam: “se aumentarmos o treinamento dos empregados sobre produtos, então eles
terão maior conhecimento sobre a linha de produtos; se conhecem melhor a linha, então a
efetividade das vendas aumentará. Se a efetividade das vendas aumenta, então a margem dos
produtos crescerá” (Kaplan and Norton, 1992, p. 149). No seu livro de 2004 os autores
reforçaram este argumento enfatizando a quarta dimensão em termos dos seus recursos:
humanos, informação, e capital organizacional. Neste livro, Kaplan e Norton utilizam
explicitamente a idéia de ativos intangíveis como o conteúdo da perspectiva de aprendizagem
e crescimento.
Um outro comentário interessante, nesta linha foi levantado por Marr e Adams (2004) . Os
autores discutem o que significa realmente ativos intangíveis. Segundo eles, o último livro de
Kaplan e Norton é ainda algo confuso neste aspecto, pois os autores negligenciaram a vasta
literatura sobre o tema. Entretanto, os autores concordam com a importância ods ativos
intangíveis para direcionar o desempenho.
Entre os diversos recursos que guiam a performance, vários autores enfatizam os fatores
humanos. Como Becker e Gerhart (1996) escreveram:“de acordo com a VBR, as empresas
podem desenvolver vantagem competitiva sustentável somente criando valor numa maneira
que é escassa e difícil para os concorrentes imitarem. Embora as fontes tradicionais de
vantagem competitiva como recursos naturais, tecnologia, economias de escala, e assim por
diante, gerem valor, a VBR sugere que tais recursos são cada vez mais fáceis de imitar,
especialmente quando comparados com estruturas sociais complexas como o sistema de
trabalho. Se isto é assim, então as estratégias de recursos humanos podem ser especialmente
importantes como fonte de vantagem competitiva sustentável” (p.781-782).
A fim de testar em que medida os recursos relacionados ao fator humano impactam a
performance, vários estudos empíricos vêm sendo desenvolvidos recentemente. Em uma
revisão da literatura nesta área, considerando o tipo de recurso pesquisado, de um lado, e o
desempenho organizacional, de outro, Fernandes (2004) identificou três categorias de
pesquisas: os estudos ligados aos “sistemas de trabalho de alta performance”1 (HPWS), as
pesquisas alinhadas ao “espelho da satisfação” e outros indicadores de pessoas, e experiências
de implantação de sistemas de mensuração de performance.
3
Sistemas de trabalho de alta performance
O primeiro grupo inclui autores ligados à área de recursos humanos que visam testar em
que medida o uso de práticas mais sofisticadas de gestão de pessoas está associado a melhor
desempenho empresarial. Enquadram-se neste grupo os trabahos de Arthur (1994), abordando
o efeito de práticas de RH sobre turnover e performance operacional; Lawler, Mohman e
Ledford (1995), confrontando o desempenho financeiro de empresas que adotavam práticas
de “alto envolvimento dos empregados” e “Total Quality Management” (TQM) com as que
não adotavam; Macy e Farias (apud FARIA e VARMA, 1998), investigando indicadores
financeiros, desempenho comportamental e qualidade de vida no trabalho em empresas com
HPWS; Husselid (1995), avaliando o efeito da adoção conjunta de uma série de práticas, em
vez de práticas isoladas (esse estudo foi reeditado em 1997 e 1999 por BECKER, HUSSELID
e ULRICH, 2001), entre outros. Outros trabalhos olharam para outros contextos culturais
além do anglo-saxão, como o de Bae e Lawler (2000), focando empresas coreanas; e Guthrie
(2001), examinando empresas da Nova Zelândia.
Em geral, estes estudos vêm demonstrando relações entre recursos (no caso, práticas de
RH) e desempenho relativamente fracas ou inexistentes2 (MUELLER, 1996; BECKER e
GERHART, 1996; FARIAS e VARMA, 1998). Em particular, Mueller (1996) chamou a
atenção para o fato de que a simples existência de práticas não acarreta melhores resultados.
Sugeriu que tais práticas serão efetivas se:“acompanharem processos subjacentes de formação
de habilidades, que podem ser facilitados ou acelerados, mas não substituídos, pelas
atividades da ARH (...) [e] se os recursos humanos trabalharem em sintonia com outros
recursos, isto se houver interdependência entre os recursos” (MUELLER, 1996, p. 771);
reforça-se assim a idéia que as prática de gestão de pessoas precisam estar alinhadas à
estratégia organizacional.
Espelho da satisfação e outros indicadores relacionados a pessoas
Outros autores, com origem principalmente na área de marketing, concentraram seus
esforços para entender em que medida a satisfação dos empregados se transformava em
satisfação e lealdade do consumidor e, por extensão, em melhor performance. Inicialmente
proposto por Heskett et alii (1997), tais estudos privilegiaram o setor de serviços. Nesta linha
estão os trabalhos de Rucci et alii (1998), descrevendo a cadeia lucro-serviços na Sears, e a
pesquisa de Barber et alii e Bevan (1999) em empresas de varejo britânicas.
Também examinando a satisfação de empregados como driver está o trabalho de Varma et
alii (1999). Já Hitt et alii (2001) abordaram especificamente a relação do capital humano com
a performance. Por fim, Batt (2002) e Gales et alii (2002) incluem as habilidades dos
funcionários como recursos.
Experiências de implantação de sistemas de mensuração da performance
Este grupo é constituído de experiências de implantação de sistemas de mensuração da
performance em algumas empresas, com a investigação da relação entre os indicadores das
diversas perspectivas. São exemplos os relatos de Becker et alii (2001) na GTE; Schay et alii
(2002) no governo federal americano; Kaplan e Norton (2001), na Mobil e Store 24; e Neely e
Najjar (2003), na British Airways e em uma empresa de serviços denominada X. De forma
geral, estes estudos consistem em reflexões sobre projetos de consultoria para implantar
sistemas de avaliação do desempenho. Primeiro, desenvolvem indicadores para as diversas
perspectivas de performance, segundo a estratégia da empresa. Algum tempo após a
implantação, coletam dados referentes a estes indicadores. A seguir, investigam, mediante
técnicas estatísticas, a associação entre indicadores nas diferentes perspectivas.
O Quadro 1 apresenta um resumo de trabalhos empíricos que relacionam recursos ligados
à gestão de pessoas e performance organizacional, incluindo outras pesquisas levantadas na
revisão de Fernandes (2004). O referencial do BSC foi utilizado para classificar as dimensões
4
da performance. Os recursos correspondem às variáveis independentes, e as dimensões da
performance, às variáveis dependentes. Cada célula apresenta os estudos com os indicadores
que operacionalizaram a variável dependente. Não estão mencionados todos os indicadores e
variáveis de controle adotados em cada estudo. O quadro também informa, entre colchetes, a
empresa na qual se realizou a pesquisa quando se trata de estudo de caso. Quando não é feita
menção, trata-se de survey. Embora recursos pertençam à perspectiva de aprendizagem, esta
perspectiva também é apresentada no quadro sob forma de variável dependente, pois alguns
de seus indicadores podem ser considerados resultantes de outros indicadores antecedentes –
por exemplo, a influência de HPWS sobre o índice de turnover.
A análise dos estudos empíricos permite inferir algumas conclusões. Uma delas é que
ainda são relativamente poucos os estudos que cobrem todas as dimensões da performance
organizacional. Nesse sentido, observa-se um claro predomínio das pesquisas que
confrontaram recursos com desempenho financeiro, talvez pela fácil mensuração e pela
existência de indicadores comuns e disseminados entre organizações. Ainda, estudos que
abarcaram todas as dimensões, como o de Bae e Lawler (2000), basearam-se em indicadores
percebidos. Por exemplo, não verificaram se o uso de HPWS estava associado ao aumento
real na satisfação do cliente; testaram, sim, se HPWS estava correlacionado à percepção, pelo
respondente, de que o cliente estaria mais contente.
Uma segunda observação é que a maior parte dos estudos concentra-se nas práticas de RH
como direcionadores de performance, em particular, avaliando efeitos de HPWS’s. Observase que poucos estudos abordam outros recursos, como satisfação, capital intelectual ou
competências. Talvez isto ocorra porque direcionadores de performance são específicos à
empresa ou, pelo menos, ao setor. Assim, de acordo com a natureza do negócio, os
direcionadores são distintos. Por exemplo, a satisfação do funcionário pode ter impacto maior
na Sears, loja de departamento em que vendedores têm grande interação com clientes, do que
em supermercados, voltados ao auto-serviço. Ainda, a relação entre estabilidade de pessoal e
performance pode ser bem distinta na GTE e em uma cadeia de fast-food – ou mesmo dentro
da própria GTE, se analisada outra área. Isto sinaliza que, dependendo do negócio, deverá
ocorrer uma customização dos indicadores.
Ora, se cada empresa possui direcionadores diferentes para alavancar seu desempenho,
como escolher um determinado e avaliar seu impacto sobre negócios distintos? Isso pode
explicar porque estudos abordando outros direcionadores tendem a se concentrar em um setor
– por exemplo, escritórios de advocacia para Hitt et alii (2001), ou call centers para Batt
(2002) – ou mesmo em organizações específicas, como os estudos relacionados à implantação
do BSC.
Por outro lado, todas as organizações possuem práticas de RH, mais ou menos
formalizadas, mais ou menos sofisticadas. Daí que vários estudos tenham escolhido tais
práticas para testar até que ponto sua intensidade estaria relacionada à performance. Porém, a
não observação da relação em alguns estudos ou a constatação de relações relativamente
fracas apontam para a necessidade de mergulhar em outros drivers ou recursos para se
entender o que determina uma performance superior.
Outra dificuldade relacionada à escolha de direcionadores refere-se à operacionalização
dessas medidas. Considere-se o caso do conceito de competências/habilidades como
direcionador. Nos relatos, mesmo quando se pensou em incluí-lo não foi possível mensurá-lo
(caso da Mobil), ou acabou transfigurado para ser operacionalizado (como na empresa Store
24 ou na pesquisa de Batt, 2002, onde competência é operacionalizada como “anos de
exercício na função”), ou não se obteve resultados conclusivos (SCHAY et alii, 2002).
5
Batt (2002): crescimento nas vendas
Heskett et alii (1997): vendas
Rucci et alii (1998): crescimento receita
[Sears]
Barber et alii (1999): receita
Varma et alii (1999): eficiência; custos
Kaplan e Norton (2001): ROI [Mobil; Store
24]
Neely e Najjar (2003): vendas [British
Airways]
Batt (2002): crescimento das vendas
Kaplan &Norton (2004) :crescimento de
vendas, ROI (Northwestern, Mutual, Volvo)
Turnover
Motivação dos
empregados
(satisfação e
conscientizaçã
o para
estratégia)
Capital
humano
Habilidades
Fonte: Fernandes (2004).
Financeira
Lawler at alii (1995): performance financeira
Macy et alii (1995): performance financeira
Husselid (1995, 1997, 1999): lucro; valor de
mercado da empresa
Batt (2002): crescimento das vendas
Davidson et alii (1996): valor das ações
Welbourne et alii (1996): valor das ações,
sobrevivência
Delery et alii (1996): lucratividade
Delaney et alii (1996): crescimento vendas
Banker, Lee et alii (1996): vendas, lucros
Varma et alii (1999): eficiência; custos
Bae et alii (2000): vendas; força financeira
Batt (2002): crescimento vendas
Recurso
Práticas de
RH
Schay et alii (2002): satisfação do
cidadão
Heskett et alii (1997): satisfação do
cliente
Rucci et alii (1998): satisfação
consumidor [Sears]
Barber et alii (1999): satisfação e
lealdade do consumidor
Schay et alii (2002): satisfação do
cidadão
Kaplan e Norton (2001): satisfação
do cliente [Mobil; Store 24]
Neely e Najjar (2003): satisfação do
cliente [British Airways; X]
Schay et alii (2002): satisfação do
cidadão
Kaplan &Norton (2004) satisfação
do cliente, força da marca, novos
produtos
Clientes
Banker, Lee et alii (1996):
satisfação dos clientes
Delaney et alii (1996): participação
de mercado, satisfação dos clientes
Bae et alii (2000): imagem
Quadro 1: Estudos empíricos na relação recursos organizacionais e performance
Hitt et alii (2001): capital humano e receita/
empregado
Schay et alii (2002): tempo de resposta
Kaplan & Norton (2004) gestão de projetos,
apoio tecnológico, qualidade
Processos internos
Arthur (1994): eficiência, desperdício.
Husselid (1995, 1997, 1999): produtividade
(vendas/empregado)
Delaney et alii (1996): qualidade; inovação em
produtos
Yount et alii (1996): performance operacional
Banker, Lee et alii (1996): vendas
Banker, Field et alii (1996): produtividade,
qualidade do produto
Varma et alii (1999): velocidade, qualidade,
produtividade
Bae et alii (2000): qualidade; produtividade
Guthrie (2001): produtividade (vendas/
empregado)
Hitt et alii (2001): receita/empregado
Becker et alii (2001): inovação produtos [GTE]
Schay et alii (2002): tempo de resposta
Varma et alii (1999): velocidade, qualidade,
produtividade
Schay et alii (2002): tempo de resposta
Kaplan e Norton (2001): conhecimento da
estratégia, motivação; lead time [Mobil; Store
24]
Gales et alii (2002):
uso de tecnologia e
práticas
administrativas
7
Aprendizagem
Arthur (1994):
turnover
Macy et alii (1995):
comportamento e
qualidade de vida
Husselid (1995, 1997,
1999): turnover
Delaney et alii
(1996): habilidade
dos funcionários
Yount et alii (1996):
clima
Guthrie (2001):
turnover
Batt (2002): turnover
Todas essas constatações apontam para a necessidade de aprofundar os estudos sobre a
relação entre competências organizacionais e performance, tema deste trabalho. Em
particular, tais estudos deveriam privilegiar os seguintes aspectos:
• avaliar a performance em suas múltiplas dimensões;
• incluir outros recursos ou direcionadores da performance, como competências
individuais, ativos tangíveis, satisfação etc., além das práticas de RH – o que pode
implicar na restrição do estudo para setores ou empresas específicas.
3. Procedimentos metodológicos
Para investigar tais questões, desenhou-se uma pesquisa com os seguintes procedimentos:
a) identificar uma empresa e/ou setor com unidades comparáveis, e em número suficiente para
tratamento estatístico, e em que se pudesse medir recursos e graus de performance (usando
indicadores comuns); b) definir uma competência organizacional e seus recursos
componentes, para tais unidades, utilizando a metodologia arquitetura de competências e
recursos (Mills et alii, 2002); c) estabelecer ligações entre recursos e indicadores de
performance por meio de mapas causais, tomando por referência as quatro perspectivas do
BSC; d) coletar dados definidos juntos aos sistemas de informação quando já monitorados
pela empresa, e desenvolver e aplicar instrumento de coleta específico no caso de dados nãodisponíveis; e) aplicar técnicas de análise fatorial, visando identificar fatores que explicassem
parte significativa da variância em cada perspectiva do BSC; f) conduzir análises de regressão
para verificar correlações entre variáveis reduzidas, tomadas como recursos ou indicadores de
performance; e g) simular o impacto do aumento de direcionadores de performance
significativos sobre outras dimensões do desempenho, utilizando as equações de regressão.
Para o item a) a empresa escolhida cumpriu com os requisitos necessários para a
investigação em virtude de sua estrutura composta por unidades de negócio similares. Quanto
ao item b), os procedimentos foram: identificar um fator-chave de sucesso no setor; avaliar o
desempenho da empresa face este fator; avaliar valor, sustentabilidade e versatilidade do
fator, a fim de caracterizá-lo ou não como competência, sempre com o uso de questionários
estruturados. A partir daí, escolheu-se o fator que foi a maior competência organizacional
dentre as analisadas. Tal competência foi decomposta em recursos constitutivos. A etapa c)
consistiu na construção de mapas causais, ligando-se as variáveis que supostamente afetavam
outros indicadores. As relações da causalidade foram representadas mediante setas saindo da
variável independente para a dependente – que poderia transformar-se em independente em
relações consecutivas. As etapas b) e c) foram desenvolvidas mediante entrevistas e
workshops com um grupo de sete gestores da empresa.
Na etapa d), olhou-se para as diversas bases de dado da empresa, visando obter
informações necessárias à pesquisa. Em um caso concreto, a informação não estava
disponível, e criou-se e aplicou-se um questionário. As informações foram buscadas no nível
das unidades de negócio, e foram separadas em variáveis referentes a recursos, e variáveis de
desempenho. Via de regra, variáveis de recursos foram divididas por um denominador comum
– o número de ligações de água e esgoto da unidade – como forma de aumentar a
comparabilidade. Para as variáveis de desempenho, olhou-se o quociente entre metas e
valores realizados, ou seja, o quanto as unidades realizaram frente à meta. Só os resultados
alcançados, nesse caso, dizem pouco, pois há muitos outros fatores que intervêm. Por
exemplo, características geográficas como relevo da região influenciam significativamente os
resultados. Uma unidade de negócios A, atendendo uma região com grandes desníveis de
altitude, teria um alto consumo de energia elétrica para bombear água, algo que uma unidade
B, responsável por uma região plana, não teria. Nessa situação, se comparadas as unidades, A
teria desempenho superior a B em indicadores como custos e rentabilidade. Isso, porém, não
estaria relacionado à competência, mas a fatores geográficos.
8
As etapas e), f) e g) foram rodadas mediante o uso dos softwares estatísticos SPSS e
Excel, e nelas foram observadas as cautelas referentes às condições de uso das técnicas, no
que respeita à normalidade da amostra, e indicadores para aceitação ou não dos resultados. Na
etapa e), a redução no número de variáveis fez-se necessária porque muitas das variáveis
originais continham praticamente as mesmas informações. Além do mais, o número excessivo
de variáveis poderia revestir de complexidade e mascarar fenômenos relevantes. Para a
aceitação das variáveis reduzidas e seu uso em análises posteriores, observou-se a medida de
adequação da amostra de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO, ideal valores superiores a 0,7), que
avalia a validade do modelo como um todo. Os resultados foram rotacionados a fim de se
obter maior facilidade de interpretação dos fatores. Foi utilizado o método de rotação
ortogonal VARIMAX com normalização de Kaiser. O uso de um método de rotação
ortogonal deveu-se ao fato de que os resultados foram utilizados em análises estatísticas
posteriores, que exigiram multicolinearidade mínima nos dados. Foram calculados os valores
dos fatores como novas variáveis. Por fim, à exceção da perspectiva de aprendizado, para as
demais perspectivas tomaram-se as variáveis de maior poder explicativo da variância.
Para a etapa f) foram inseridas duas variáveis de controle. Já a última etapa, g), inspirou-se
em procedimentos adotados por Husselid et alii (1997) e Gales et alii (2002) para avaliar o
impacto de HPWS sobre o desempenho da empresa.
A investigação é horizontal e comparativa, olhando para diversas unidades de negócios e
seus recursos, e avaliando como estes influenciaram a performance. Ao mesmo tempo, a
pesquisa é qualitativa, ao modelar recursos constitutivos, competências e mapas causais; e
quantitativa, ao tratar estatisticamente dados obtidos da empresa.
A situação em estudo
a) Identificação da empresa
Para o estudo, foi escolhida uma empresa do setor de saneamento, a Sanepar – Companhia
Paranaense de Saneamento. Criada em 1963 para fornecer tratamento de água e esgoto no
Estado do Paraná, a empresa em 2002 faturou cerca de R$ 1 bilhão, empregando 4000
funcionários diretos. Os dados coletados para a pesquisa referem-se ao ano de 2002.
Desde 1997, sua estrutura organizacional consiste em dois níveis: uma holding no nível
corporativo, e unidades de negócio (UN’s) no nível operacional. O nível corporativo é
responsável por decisões centralizadas como o processo de investimento, planejamento de
longo prazo e P&D. As unidades de negócio são de dois tipos: as unidades de serviço (US),
cujo papel é oferecer serviços no mercado interno para outras UN’s, e as unidades de receita
(UR), que lidam com clientes externos. As US’s incluem Recursos Humanos, Manutenção,
Contabilidade, Engenharia etc., e obtêm sua receita por meio de um sistema de transferência
de preços internos. Por ocasião da pesquisa, a empresa possuía 93 UN’s, sendo 38 delas UR’s.
O sistema de gestão é inspirado no BSC, embora a empresa não siga o modelo
rigorosamente. No início do ciclo de planejamento anual, a UN detalha suas metas de acordo
com o planejamento estratégico central. Para cada perspectiva – financeira, clientes, processos
internos e aprendizado – existem indicadores de performance que devem ser preenchidos
como metas. Durante o processo de definição de metas, os gestores das UN’s negociam com
unidades fornecedoras, clientes e pares para chegarem a números factíveis. A seguir,
negociam com o nível corporativo. Os resultados da discussão são estabelecidos como metas
para a UN atingir no próximo exercício. Parte da remuneração variável está condicionada ao
alcance dessas metas. O Quadro 2 apresenta alguns indicadores adotados pela empresa para
UR’s, de acordo com a perspectiva do BSC.
O sistema de gestão é monitorado pelo software SGS, o qual armazena todos os
indicadores das UN’s. Em 2002 este software foi premiado pela Microsoft como a melhor
Solução em Business Intelligence na America Latina.
9
Quadro 2: Explicação de alguns indicadores de gestão da empresa
Perspectiva Indicadores
Financeira EBITDA
Evasão de receitas II
Margem despesa pessoal
Margem operacional
Receita operacional
ajustada
Clientes
Aumento ligações água
Aumento lig. esgoto
Satisfação dos clientes
Processos
Internos
Aprendi
-zagem
Explicação
Resultado UN antes de juros, impostos, depreciações e amortizações
Percentual da receita operacional que não foi arrecadada no período
Percentual de uso da receita operacional com despesas de pessoal
Percentual de uso da receita operacional com despesas de exploração
Somatória da receita tarifária mais a receita de serviços para clientes
externos (água, esgoto, e serviços)
Número de ligações de água que a UN efetivamente aumentou
Número de ligações de esgoto que a UN efetivamente aumentou
Pesquisa de satisfação para avaliar produtos e serviços, no que se
refere a operação, manutenção, atendimento e projetos e obras
Total de reclamações
Soma de todas as reclamações classificadas em: reclamações sobre o
faturamento; reclamações sobre os serviços prestados; reclamações
relativas a operação do sistema (falta de água, água suja, etc.)
Nível atendimento água Nível de cobertura com serviços de água
Nível atend. esgoto
Nível de cobertura com serviços de esgoto
No ligações de água
Quantidade de ligações de água da UN
No ligações de esgoto
Quantidade de ligações de esgoto da UN
Produtividade
Quantidade de ligações de água e esgoto para cada empregado da UN
Perdas no faturamento
Relação entre o volume produzido e o faturado. É uma composição
de perdas físicas e não-físicas que, além das atribuídas a desvios de
medição, incorporam volumes utilizados e não cobrados
Índice de perdas no
Volume produzido disponibilizado ao volume utilizado. Água
sistema distribuidor –
disponibilizada e não utilizada constitui parcela não contabilizada,
PSD12
que incorpora perdas físicas e não-físicas no sistema de distribuição
Refluxos de esgoto
Número de refluxos ocorridos para cada 1.000 ligações de esgoto
Reposição de
Percentual de serviços de reposição de pavimentos com prazo de
pavimentos
execução igual a 10 dias em relação ao total de serviços de reposição
Treinamento funcionário Quantidade de horas/ano
Satisfação funcionários Pesquisa de clima
Fonte: Sanepar.
Outro sistema importante é a gestão de pessoas baseado em competências. Inspirado no
modelo de Dutra (2001), usa os seguintes conceitos: competência, como conhecimentos,
habilidades e atitudes (inputs) aplicados dentro de um contexto profissional, de modo a
agregar valor social ao indivíduo e valor econômico à empresa (outputs ou entrega);
complexidade, que traduz o nível de abstração em que o indivíduo realiza seu trabalho; espaço
ocupacional, referente ao conjunto de atribuições e responsabilidades a encargo de uma
pessoa; e eixos de carreira, trajetórias naturais de crescimento profissional. O sistema
comporta uma etapa de enquadramento das pessoas dentro de um eixo de carreira e em um
nível de complexidade, caracterizado por um conjunto de competências. A partir daí, o
profissional é avaliado segundo seu grau de proficiência em cada competência, bem como seu
atendimento quanto aos requisitos de acesso (inputs). Um resultado desta avaliação é o
inventário do nível de competência em cada unidade de negócios. O modelo de competências
da Sanepar é monitorado por meio do software Sistema de Competências e Relações com
Empregados (SCRE). O software parametriza todos os critérios do modelo, permite a
avaliação on line dos funcionários, e armazena os resultados em uma base de dados, com a
distribuição de competências de todos os funcionários.
Essas circunstâncias de possuir um sistema de avaliação de performance, um sistema de
gestão de pessoas baseado em competências e uma estrutura organizacional com unidades
comparáveis fazem da empresa um campo privilegiado para investigar a relação entre
recursos e performance (MILLS e FERNANDES, 2004).
10
b) Arquitetura de competência e recursos
Todo este modelo de negócios está orientado à consecução de uma competência
organizacional julgada essencial nas entrevistas e workshops: atingir resultados. Assim,
utilizando a metodologia proposta por Mills et alii (2002), levantou-se quais os recursos
seriam necessários à efetivação da competência. O Quadro 3 apresenta tais recursos.
Quadro 3: Recursos constitutivos da competência “alcançar resultados”
Tipo recurso
Recursos tangíveis
Conhecimentos habilida-des
e experiências
Procedimentos e sistemas
Valores e cultura
Network
Recursos importantes para
mudança
Variáveis
Grau de automação da unidade
Recursos materiais (infra-estrutura física administrativa e rede)
Número de funcionários, aquisição x perda de funcionários, horas extras
Competência individual do gestor (orientação para resultado, liderança etc.)
Competências da equipe (orientação para resultado, trabalho em equipe etc.)
Satisfação do colaborador
Experiência da equipe
Treinamento da equipe
Sistema de monitoramento
Sistema de remuneração (participação nos resultados)
Sistemas de qualidade (ISO, 9.000 e 14.000; PARES)
Orientação para resultado
Orientação para o cliente (interno/ externo)
Grau de articulação/ do gestor/equipe com relação à empresa e ao negócio
Fornecedores de manutenção e produção da unidade
Gestor competente
Valores da equipe de abertura à mudança
Recursos financeiros
Fonte: Entrevistas e workshops.
c) Mapas causais
O grupo também concebeu o mapa cognitivo que liga estes recursos a dimensões da
performance. A metodologia utilizada consistiu em: primeiro, listar as variáveis mais
relevantes para a performance em cada perspectiva; em segundo, desenhar setas assinalando
que variáveis influenciam quais. O mapa resultante foi demasiado complexo, com16 variáveis
na perspectiva de aprendizado, 8 na de processos internos, 6 na de clientes e 8 na financeira,
com 37 relações de causalidade propostas entre as variáveis.
d) Coleta de dados
Para localizar onde poderiam ser obtidas informações referentes às variáveis de recursos e
de desempenho, olhou-se para os sistemas de gestão da empresa. O Quadro 4 mostra algumas
das fontes de variáveis de recursos. Variáveis de desempenho foram todas retiradas do SGS.
Quadro 4: Variáveis, formas de mensuração e indicadores
Variáveis
Grau de automação da unidade
Recursos materiais
Competência individual do gestor / equipe
Satisfação do colaborador
Treinamento da equipe
Sistema de monitoramento
Sistema de remuneração (participação nos resultados)
Sistemas de qualidade (ISO, 9.000 e 14.000; PARES)
Orientação para o cliente (interno/ externo)
Fornecedores de manutenção e produção da unidade
Mensuração
Direta
Indireta
Direta
Direta
Aproximada
Não há
Não há
Não há
Indireta
Direta
Indicadores (fonte)
Grau de automação (questionário)
Valor patrimonial da unidade (SGS)
Competência e entrega (SCRE)
Satisfação do colaborador (SGS)
Treinamento da equipe (SGS)
Observação: tais sistemas são comuns
a todas unidades, não explicam
diferença de desempenho.
Competência e entrega (SCRE)
Fornec. manutenção/ produção (SGS)
Fonte: Autores.
11
e) Análise fatorial
Face à complexidade do modelo proposto, foi realizada análise fatorial, a fim de obter,
para cada perspectiva do BSC qual fator explicaria a maior parte da variância. O Quadro 5
apresenta as variáveis aceitas, segundo critérios explicados na seção sobre metodologia.
Quadro 5: Síntese das variáveis do modelo após análise fatorial
Perspectiva
Financeira
Clientes
# var. Componentes
inicial
7
Receitas e despesas
Ind. financeiros líquidos
2
Satisfação dos clientes
Processos
Internos
6
6
Aprendizado
e
crescimento
7
9
Metas água
Metas esgoto
Perdas no sistema
Reparos e consertos
Interrupções abastecimto
Densidade recursos
Satisfação empregado
Entrega (competência)3
Variância
explicada
65,2
22,6
67,9
Aceitação
Sim
Não
Não
60,0
24,0
48,2
21,3
17,7
55,9
20,9
62,8
Sim
Não
Não
Não
Não
Sim
Sim
Sim
Observação
Fator escolhido
KMO<0,7. Uso da variável original
satisfação dos clientes.
Fator escolhido
KMO<0,7
Fator escolhido
Fator escolhido
Fator escolhido
Fonte: Autores.
f) Análise de regressão
Duas variáveis de controle foram adicionadas: realização das previsões de consumo e
desempenho dos fornecedores. A primeira foi incluída porque o modelo assume que previsões
realizadas no planejamento irão acontecer. Se não se efetivam, a performance pode ser afetada
por motivo não relacionado a recursos ou competência. A segunda variável visou controlar até
que ponto o fornecedor afeta o resultado da UN. Um novo mapa causal foi desenhado com as
novas variáveis reduzidas e variáveis de controle, conforme ilustra a Figura 2.
Figura 2: Mapa causal com variáveis reduzidas
interno UR
externo UR
Receitas e
despesas
Financeira
Consumo
residencial
Satisfação do
cliente
Clientes
Metas
água
Processos
internos
Crescimento e
aprendizagem
Entrega
Satisfação
empregado
Densidade
de recursos
Desempenho
fornecedor
Fonte: Autores.
Para resumir, o modelo propõe que as variáveis da base afetam as metas relativas ao
fornecimento de água. Tais metas, se alcançadas, influenciarão a satisfação do consumidor e
permitirão o atingimento das metas de faturamento e despesas. Uma análise de regressão foi
12
conduzida para testar tais relações, examinando pares de variáveis quando a associação entre
uma e outra tinham significado teórico. O Quadro 6 ilustra os resultados.
Quadro 6: Análise de regressão das relações no modelo
V independente Metas de água
V. dependente
Satisfação dos
empregados
Entrega
R2
Valor –p
R2
Valor –p
Densidade de
recursos
Desempenho
fornecedores
Consumo
residencial
Metas de
Água
R2
Valor –p
R2
Valor –p
R2
Valor –p
0,405
0,000
-0,017
0,538
0,110
0.023
0,021
0,189
0,620
0,000
R2
Valor –p
Satisfação dos
clientes
0,227
0,001
-0,014
0,492
-0,015
0,510
-0,026
0,822
0,059
0,077
0,232
0,001
Receitas e
despesas
0,090
0,037
-0,027
0,907
0,104
0,027
-0,013
0,472
0,405
0,000
0,377
0,000
Fonte: Excel.
Os resultados mostram associações significativas entre o recurso satisfação do empregado
e as três perspectivas da performance (p<0,05). A densidade de recursos revelou-se associada
com a perspectiva de processos internos e as metas financeiras, mas não com a perspectiva
dos clientes. As previsões de consumo residencial revelaram o efeito mais forte sobre os
processos internos e as metas financeiras. As competências dos empregados e o desempenho
dos fornecedores não demonstraram associação com a performance da UN.
g) Simulação da satisfação
Para entender melhor o impacto da satisfação dos empregados sobre o desempenho,
aumentou-se um desvio padrão na variável independente e observou-se o efeito nas demais. A
variável independente correspondeu à variável reduzida satisfação dos empregados, cujo
aumento de 1 desvio corresponde a 6% de acréscimo na variável original satisfação dos
empregados. O Quadro 7 mostra como o aumento se propaga em outras dimensões.
Quadro 7: Impacto da satisfação dos empregados sobre a performance
Aumento na
Satisfação do
empregado
6,0 %
Metas de água
0,72%
Incremento em
Satisfação do
consumidor
0,45%
Receitas e despesas
1,64%
Fonte: Autores.
Os resultados parecem apontar para o fato que, quando os funcionários estão mais
satisfeitos, aumenta o grau de alcance de metas operacionais; como conseqüência, os clientes
ficam mais satisfeitos e a UR aumenta seu atingimento das metas financeiras.
Outros trabalhos na área demonstram este impacto do aumento da satisfação do
empregado sobre a satisfação do cliente. O Quadro 8 ilustra alguns estudos. É interessante
notar como trabalhos no setor de varejo ou serviços, em que o cliente tem interação direta
com o funcionário, o impacto tende a ser maior que neste estudo, com relações mais remotas.
13
Quadro 8: Pesquisas com a relação entre satisfação do empregado e do cliente
Aumento satisfação
Aumento
dos empregados
satisfação clientes
5%
1,30%
1%
0,23%
1%
0,25%
6%
0,45%
Empresa / setor – país
Sears/varejo – EUA
Varejo – Inglaterra
Empresa serviço – Inglaterra
Empresa saneamento – Brasil
Autores
Rucci et alii (1998)
Barber et alii (1999)
Neely et alii (2003)
Presente estudo
Fonte: Autores.
Conclusão
Este artigo assume o conceito de competência como um conjunto de recursos que afeta a
performance. Entretanto, uma revisão da literatura utilizando o modelo do BSC para organizar
as dimensões da performance revelou que poucos estudos avaliam como diferentes recursos
(não apenas práticas de RH) afetam todas as dimensões do desempenho simultaneamente. O
presente artigo examina esta questão em uma companhia de saneamento. Em geral, recursos
pareceram estar associados à performance, mas outras questões surgiram:
• o grau de competência das pessoas, medido por meio de avaliação de competências
segundo o modelo de Dutra, não apresentou relação com o desempenho;
• os fatores ambientais relacionados ao consumo residencial apareceram como o mais
forte determinante da performance (e a competência para prevê-los torna-se assim
muito importante neste tipo de negócio);
• a satisfação dos empregados demonstrou associação com metas de processos
internos, com metas financeiras, e com a satisfação dos consumidores, ainda que
com impacto mais fraco que o revelado por estudos no setor de varejo e serviços.
O primeiro resultado é curioso. Sugere que o nível de desenvolvimento das pessoas não
conta muito nesta empresa. Possíveis explicações para tal resultado são:
• as pessoas podem ser competentes, mas se isto não é coordenado adequadamente,
tais competências individuais não se convertem em desempenho organizacional.
Uma aproximação do grau de coordenação seria a competência do gestor mas, na
pesquisa, não foi possível avaliar a competência do gestor separadamente da
competência de sua equipe. Assim, não se mensurou o grau de coordenação;
• o desenvolvimento de competências apresenta resultados no longo prazo, e a
pesquisa coletou e analisou dados no horizonte de um ano, tempo talvez insuficiente
para aparecer os frutos do desenvolvimento das pessoas;
• na pesquisa, as UN’s testadas eram de nível bem operacional, em que recursos como
normas pareciam ser o principal mecanismo de coordenação; nesta situação, seguir
procedimentos pode ser mais importante que o grau de desenvolvimento da pessoa.
Estes resultados reforçam a perspectiva adotada da RBV, mostrando uma situação
empírica, em que organizações com condições similares, com recursos comparáveis
apresentam desempenho diverso, em função da forma como coordenam seus recursos. O
trabalho também procurou avanças metodologicamente, ao propor uma metodologia que
avalia o link entre recurso e desempenho em condições particulares. Esta metodologia,
desenhando mapas casuais relacionando diferentes indicadores de desempenho, aplicando
análise fatorial, modelos de regressão procurou avançar nesta direção.
A pesquisa futura neste campo deveria focar empresas intensivas em conhecimento, nas
quais é possível que o grau de competência dos indivíduos surja como o fator mais relevante.
Outras investigações seriam estudos empíricos longitudinais sobre o tema e estudos avaliando
o impacto de competências pessoais específicas do gestor e da equipe no desempenho.
14
Referências
ARTHUR, J. Effects of Human Resource Systems on Manufacturing Performance and
Turnover. Academy of Management Journal, Briarcliff NY, v. 37. n. 3, p. 670 – 687, 1994.
BAE, J.; LAWLER, J. J. Organizational and HRM Strategies in Korea: Impact on Firm
Performance in an Emerging Economy. Academy of Management Journal, Briarcliff Manor
NY, v. 43, n. 3, p. 502 – 517, 2000.
BARBER, L; HAYDAY, S.; BEVAN, S. From People to Profits. Brighton: The Institute for
Employment Studies. Report 355, 1999.
BARNEY, J. B. Gaining and Sustaining Competitive Advantage. NY: Wesley, 1996.
BATT, R.. Managing Customer Services: Human Resource Practices, Quit Rates and Sales
Growth. Academy of Management Journal, Briarcliff NY, v. 45, n. 3, p. 587 – 597, 2002.
BECKER, B. E.; GERHART, B.. The Impact of Human Resources Management on
Organizational Performance: Progress and Prospets. Academy of Management Journal,
Briarcliff Manor NY, v. 39. n. 4, p. 779 – 801, 1996.
BECKER, B. E.; HUSSELID, M. A.; ULRICH, D. The HR Scorecard: linking people,
strategy and performance. Boston: Harvard Business School Press, 2001.
DUTRA, J. S. Gestão de Pessoas com base em Competências. In DUTRA, J. S. (org.). Gestão
por Competências: um modelo avançado para o gerenciamento de pessoas. São Paulo: Ed.
Gente, 2001, p. 23-40.
EPSTEIN, M.; MANZONI, J. F. Implementing Corporate Strategy: From Tableaux de Bord
to Balance Scorecards. European Management Journal. Oxford, v.16, n.2, p.190-203, 1998.
FARIAS, G.; VARMA. A. High Performance Work Systems: What We Know and What We
Need to Know. Human Resource Planning. New York NY, v. 21, n. 2, p. 50-55, 1998.
FERNANDES, B. H. R. Competências e Performance Organizacional: um Estudo
Empírico. Tese (Doutorado) – Faculdade de Economia e Administração. São Paulo:
Universidade de São Paulo, 2004.
FLEURY, A.; FLEURY, M. T. L. Estratégias empresariais e formação de competências:
um quebra cabeça caleidoscópico da indústria brasileira. S. Paulo: Atlas, 2000.
FOSS, N. J. Resources, Firms and Strategies: A Reader in the Resource-Based Perspective.
Oxford: Oxford University Press, 1997.
GALES, H. FREDERICK; WOJAN, TIMOTHY R.; OLMSTED, JENNIFER C. Skills,
Flexible Manufacturing Technology, and Work Organization. Industrial Relations, Malden,
MA, v. 41, n. 1, p. 48 – 79, Jan 2002
GRANT, R. M. The Resource-Based Theory of Competitive Advantage: Implication for
Strategy Formulation. California Management Review. Berkeley CA, v. 33: n. 3, p. 114135, Spring 1991.
GUTHRIE, J. P. High-Involvement Work Practices, turnover, and productivity: evidence
form New Zealand. Academy of Management Journal, Briarcliff Manor NY, v. 44, n. 1, p.
180 – 190, Feb 2001.
HAMEL, G.. The Concept of Core Competence. In HAMEL, G.; HEENE, AIMÉ (Ed.)
Competence based Competition. Chichester: John Wiley and Sons, 1994, p. 11-34.
HESKETT, J.; SASSER, W.; SCHLESINGER, L. The Service Profit Chain: How Leading
Companies Link Profit and Growth to Loyalty, Satisfaction and Value. NY: Free Press, 1997.
HITT, M.; BIERMAN, L.; SHIMIZU, K.; KOCHHAR, R. Direct and Moderating Effects of
Human Capital on Strategy and Performance in Professional Service Firms: a Resource-Based
Perspective. Academy of Management Journal, Briarcliff NY, v. 44, n. 1, 13-28, 2001.
HUSSELID, M. Impact of Human Resource Management on Turnover, Productivity and
Corporate Financial Performance. Academy of Management Journal, Briarcliff Manor NY,
v. 38, n. 3, p. 635-672, 1995.
15
HUSSELID, M. A.; JACKSON, S. E.; SCHULER, R. S. Technical and Strategic Human
Resource Management Effectiveness as Determinants of Firm Performance. Academy of
Management Journal, Briarcliff Manor NY, v. 40, n. 1, p. 171-188, 1997.
KAPLAN, R.; NORTON, D. The Balanced Scorecard – Measures That Drive Performance.
Harvard Business Review, Boston, v. 70, n. 1, p. 71-79, Jan-Feb 1992.
KAPLAN, R.; NORTON, D. Organização orientada para a estratégia: como as empresas
que adotam o balanced scorecard prosperam no novo ambiente de negócios. Tradução Afonso
C. Cunha Serra. Rio Janeiro: Campus, 2001.
KAPLAN, R.; NORTON, D. Mapas Estratégicos: convertendo ativos intengíveis em
resultados tangíveis. Tradução Afonso C. Cunha Serra. Rio Janeiro: Campus, 2004.
LAWLER, E. E.; MOHMAN, S.; LEDFORD, G. Creating High Performance
Organizations. San Francisco, CA: Jossey-Bass, 1995.
MARR, B.; ADAMS, C.(2004). The Balanced scorecard and intangible assets: similar ideas,
unaligned concepts. Measuring Business Excellence,Vol. 8, No.3,pp18-27.
MEYER, C. How the Right Measures Help Teams Excel. Harvard Business Review.
Boston, v. 72, n. 3, p 95-192, May-Jun 1994.
MILLS, J.; PLATTS, K.; BOURNE, M.; RICHARDS, HUW. Competing through
competences. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
MILLS, J.; FERNANDES, B. H. R.. Linking Resources and Organizational Performance:
replicated research designs, a case and a warning. In Performance Measurement
Association Conference, 2004, Edinburgo, Escócia. Anais Performance Measurement
Methodology. Cranfield: Cranfield University, 2004, v. 1, p. 715-722.
MUELLER, F. Human Resource as Strategic Assets: An Evolutionary Resource-based
Theory. Journal of Management Studies, Oxford, v. 33, n. 6, p. 757-785, Nov 1996.
NEELY, A.; NAJJAR, M. Linking financial performance to employee and customer
satisfaction. In NEELY, A. (Ed.) Business Performance Measurement: theory and practice.
Cambridge: Cambridge University Press, 2003. p. 295-303.
PENROSE, E. T. The theory of growth of the firm. London: Basil Blackwell, 1959.
PRAHALAD, C. K.; HAMEL, G. The core competences of the corporation. Harvard
Business Review, Boston, v. 68, n. 3, p. 79-91, May/ Jun 1990.
RUCCI, A. J., KIM, S. P., QUINN, R. T. The Employee-Customer-Profit Chain at Sears,
Harvard Business Review, Boston, v. 76, n. 1, p. 83-97, jan-feb 1998.
SANCHEZ, R. Managing Knowledge into Competence: The Five Learning Cycles of the
Competent Organization. In SANCHEZ, R. (ed.) Knowledge Management and
organizational competence. Oxford: Oxford University Press, 2001. cap. 1, p. 3-37.
SCHAY, B. W., BEACH, M. E.; CADWELL, J. A.; LaPOLICE, Christelle. Using
Standardized Outcome Measures in the Federal Government. Human Resource
Management, New York, v. 41, n. 3, p. 355-368, Fall 2002.
VARMA, A.; et alii. High Performance Work Systems: Exciting Discovery or Passing Fad?
Human Resource Planning, New York NY, v. 22, n. 1, p. 26- 37, 1999.
1
Sistemas de trabalho de alta performance ou high performance work systems (HPWS) é a expressão que a
literatura na área tem usado para definir (vagamente) uma série de inovações no ambiente de trabalho, como
equipes semi-autônomas, sistemas sócio-técnicos, sistemas de planejamento participativos, desenhos inovadores
de plantas, remuneração elevada, uso intensivo de práticas de RH etc. (Farias e Varma, 1998).
2
Nos estudos considerados, R2 ajustado médio da relação entre práticas de RH e performance era de 0,15.
3
A variável reduzida “entrega” consolidou num só constructo todas as competências dos gestores e dos
indivíduos da equipe, incluindo o gestor.
16
Download

Competências e Desempenho Organizacional – Uma