V FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES
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08 a 10 de setembro de 2011
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A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS IDENTITÁRIOS COMO ALTERNATIVA DE
TRABALHO E RENDA EM MIAI DE BAIXO - CORURIPE/AL
Rafaela dos Santos1 (UFS)
Paula Yonara S. Hora2 (UFS)
Sonia de Souza M. Menezes3(UFS).
INTRODUÇAO
Este trabalho poderia ser desenvolvido por qualquer ciência que considere o homem
como um ser cultural. No campo da geografia, consideraremos a abordagem cultural, uma
vez que serão analisadas as experiências e as práticas que caracterizam o espaço vivido de
um determinado grupo humano. Como iremos tratar sobre os traços culturais, portanto
identitários, que caracterizam os habitantes de um povoado, cabe ressaltar que as discussões
que abarcam o conceito de cultura também permeiam as abordagens da geografia cultural
quando o utiliza.
Com a finalidade de discutir essa questão, Corrêa (2001) apresenta de forma
simplificada duas perspectivas geográficas em que podemos tratar esse conceito. Uma é a
perspectiva da geografia cultural saueriana que evidencia o conceito de cultura como
abrangente, como tendo um papel determinante e ainda como tendo uma evolução específica.
Por outro lado, quando analisamos as práticas humanas em determinado espaço usando a
perspectiva da geografia cultural renovada, podemos seguir pela vertente que considera o
conceito de cultura como sendo restrito ou aquele entendido como um contexto e ainda como
tendo uma evolução sincrônica.
É certo que não cabe aqui uma discussão sobre as perspectivas que norteiam as
temáticas desenvolvidas nesse campo geográfico, mas é interessante ressaltar, pois qualquer
que seja ela, é necessário que o termo cultura seja usado criticamente. Assim sendo tomemos
esse conceito como um conjunto de práticas, de conhecimento e de valores que cada um
1
Aluna do curso de geografia (licenciatura)/ UFS, pesquisa aplicações de SIG na questão Municipal e participa do Grupo de
Estudo sobre Alimentação-GRUPAM.
2
Aluna do curso de geografia (licenciatura)/ UFS, monitora da disciplina de Didática-2011/2.
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Professora do Departamento de Geografia, coordenadora do Grupo de Estudos sobre Alimentação.
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recebe e adapta a situação evolutiva, seja como uma realidade individual ou social, (CLAVAL
2001).
O geógrafo encontra possibilidades para fazer análises que englobam as
problemáticas culturais. Como exemplos podemos citar os modos de vestir, falar, a toponímia
dos lugares, seus sistemas produtivos dentre outros. Além disso, podemos utilizar as diversas
escalas de análise para tais investigações, uma vez que essas questões se referem à
significações abstratas e simbólicas isto é, o que conferem à valores individuais e o que
marca a coletividade de um grupo.
Os estudos que abordam a produção dos alimentos são bastante discutidos no campo
das ciências agrárias, no entanto, o saber-fazer carregado de símbolos e significados que
permeiam a prática de produzir os alimentos podem ser abordados dentro da perspectiva das
ciências humanas incluindo aí a geografia cultural.
Tendo por referência as concepções sobre Ciências Humanas em Foucault
(2000), de que o comer e o nutrir, como fenômenos humanos, se fundem no
amálgama empírico e simbólico da alimentação deste ser único que,
distintamente de qualquer outro animal, trabalha na produção, distribuição e
consumo da comida, faz dela expressão de sua linguagem e a tem em suas
representações. (SILVA ET ALL, 2010 p.4)
É partindo desse abrangente campo de estudos que nesse trabalho será apresentado as
relações entre as práticas que caracterizam a produção de alimentos identitários como
alternativa de trabalho e renda para o sustento de famílias do povoado Miai de Baixo –
Coruripe/AL. A complexidade é tamanha que mesmo delimitando o recorte espacial e os
sujeitos que re(produzem) esse espaço, ainda assim definiremos os elementos que comporão
essa análise.
A pesquisa de campo realizada com a observação e entrevistas acompanhadas de
registros fotográficos caracterizam uma pesquisa empírica com recorte espacial, embasada
com um levantamento teórico no campo da geografia cultural.
As entrevistas foram direcionadas as guisadeiras e seus familiares, aos fornecedores
de matéria-prima e aos consumidores dos produtos em questão. Os questionamentos se deram
em torno das variedades das receitas, sobre o saber-fazer das guisadeiras, produção,
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comercialização e renda, origem dos consumidores, tempo aproximado de consumo e
posicionamento sobre preços dos produtos.
Através de entrevistas feitas in locu com os sujeitos envolvidos no processo de
cultivo, colheita e preparação, identificamos essa força da tradição, em falas emocionantes
que expressaram um tempo passado. Assim a relação que existe entre a produção dos
alimentos como fonte de renda e os traços culturais dos miaienses são evidenciados através a
permanência de práticas passadas de geração a geração.
As conversas com as guisadeiras foram suficientes para se fazer um recorte temporal
para averiguação do processo de aquisição desses materiais relacionadas à elementos
identitários que permeiam o saber-fazer as fases que caracterizam o processo de produção e
comercialização dos produtos. A partir desse recorte foi possível apontar algumas mudanças
referentes a esse processo.
O RECORTE ESPACIAL-MIAI DE BAIXO - CORURIPE/ALAGOAS
A área estudada chama-se povoado Miaí de Baixo esta localizado a 10º12’54’’S e
36º13’14’’W a oeste de Greenwich. Faz parte do município de Coruripe que segundo o IBGE,
ocupa uma área de 913 Km², 3,48% do território de Alagoas. Está localizado no litoral Sul do
Estado, na mesorregião do leste alagoano e microrregião de São Miguel dos Campos. Dista 85
Km da capital, Coruripe limita-se ao norte com os municípios de Teotônio Vilela, São Miguel
dos Campos e Junqueiro; ao Sul, Feliz Deserto; a oeste, Penedo e Igreja Nova; e a leste com o
Oceano Atlântico.
È um município que apresentação concentração de terras e a utilização das mesmas
está sob o domínio da produção de cana de açúcar com destaque para três grandes usinas, a
Usina Coruripe, a Usina Guaxuma e Cooperativa Pindorama, além das grandes fazendas de
coqueirais de criação de gado. Em contraste com as grandes extensões de terras destinadas a
monocultura tem-se várias povoações tanto ao longo da costa litorânea como no seu interior.
Miai de Baixo que está entre Feliz Deserto e a cidade de Coruripe, sede do município é um
deles e está a uma distância aproximada de 13km da sede. Veja na figura abaixo.
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Coruripe
Figura 01
Miai de Baixo
Fonte: site da prefeitura de Coruripe / dawnload
Caracterizado durante muito tempo por casas de taipa, sem energia e água encanada
as famílias desse povoado apropriaram-se dos recursos naturais para sobreviverem. Desde o
final da década de 1980 esse espaço vem sofrendo varias transformações como a construção
da rodovia estadual que liga o povoado a outros núcleos de povoações e a cidades próximas. A
energia elétrica e a água encanada provocaram novos hábitos ao cotidiano monótono dos
miaienses e as distâncias foram encurtadas como a utilização de transporte que não fosse
animais de tração.
Como o povoado é composto por famílias de pescadores e agricultores,
consideremos apenas as práticas que envolvem o segundo ofício, abordando o cultivo da
mandioca e a produção de alimentos derivados do referido produto agrícola. Assim
apontaremos quais os traços culturais que envolvem a preparação de bolos, broas, pés de
moleque, farinhas, beijus que caracterizam a cultura daquele lugar apesar das transformações
que o povoado vem passando.
O lugar recria cultura a partir de um cotidiano vivido coletivamente, nas
tramas constitutivas das identidades de resistência [...] esse processo baseiase em um saber–fazer onde se enquadram crenças, formas de manejo do
meio ambiente, tecnologia, ciência da natureza, criação e recriação das
estratégias de vida como apontado por Furtado (op.cit) e Maldonado (1993),
(SOUZA, 2009 p. 27).
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As transformações que o povoado vem passando, não anula a força da tradição
entendida aqui como identidade de um povo. É bem verdade que novos hábitos são
incorporados a práticas antigas, pois não devemos considerar os traços culturais isentos das
mudanças que ocorrem atualmente. No entanto, é a força do valor identitário sobre a produção
dos guisados das mulheres miaienses, uma das proposições argumentativas que explica a
permanência de traços culturais diante das transformações tempo-espacial daquele lugar.
TRANSFORMAÇÕES ESPACIAIS EM MIAI DE BAIXO
A produção de guisados constitui em uma marca identitária do povoado Miai de
Baixo, cujo saber-fazer foi repassado por gerações. No processo produtivo é perceptível o
envolvimento dos membros familiares, que buscam com a manutenção da tradição arraigada
na história da comunidade uma alternativa de sobrevivência diante das transformações
ocorridas no espaço geográfico nas últimas décadas. Como ressaltam Canesqui e Garcia
(2005):
Os produtos tradicionais são aqueles que se constituem e fazem parte da
história social de uma determinada cultura, local ou região. Vindos de um
longo tempo, através de gerações que os foram produzindo e recriando, esses
produtos marcam um processo que reúne relações sociais e familiares, num
encontro entre o saber e a experiência; portanto, a produção desses alimentos
é, ainda, uma arte construída ao longo do tempo através da tradição familiar
(CANESQUI E GARCIA, 2005).
Diferentemente dos traços culturais mantido pela comunidade, o lugar passa por
diversas transformações que resultará em novas formas de uso e apropriação do espaço, ou
seja, de um espaço eminentemente familiar com possessão de terras através de herança, os
miaienses se depararam nas últimas décadas com a entrada de grandes produtores de cana de
açúcar e coqueirais. As empresas e/ou os latifundiários que investiram no povoado e cercanias
utilizaram vários artifícios que resultaram na venda ou no arrendamento de seus pedaços de
“chão” onde plantavam a mandioca, matéria-prima principal para a produção dos guisados.
Com essas novas formas de apropriação da terra, tornou-se impossível plantá-las. Logo, para
a continuidade da elaboração dos guisados, as mulheres que se ocupam nesse ofício são
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obrigadas a comprar a raiz em outros povoados e até em municípios circunvizinhos como
Feliz deserto e Pindorama.
Outro ingrediente utilizado na produção dos derivados – o coco - também é um
indicio de que o povoado passou por essas transformações uma vez que, em anos passados
seus nativos possuíam seus próprios sítios de coqueiros e retiravam deles seus frutos para
preparar as iguarias. Ultimamente a aquisição dos cocos se dar por meio da compra. Alem de
fazendeiros, há um aumento constante da população local, significando dizer que, as
propriedades familiares adquiridas por herança são divididas entre filhos e netos que formam
suas próprias famílias e com isso as porções de terras destinadas para o plantio de coqueiros
quase não existem mais Tais mudanças ocasionaram a redução da taxa de lucro, mas não a
disposição das guisadeiras para o oficio.
As técnicas de fabricação dos produtos permanecem ainda rudimentares com
tecnologia elementar e trabalhos manuais, como o motor movido a roda (manual) que serve
para triturar a raiz (figura 2).
Os guisados são feitos, em sua maioria, pelas mulheres
envolvendo seus saberes e assim, valorizando a produção e a cultura dos alimentos, pois “para
serem comidos, ou comestíveis, os alimentos precisam ser elegíveis, preferidos, selecionados
e preparados ou processados pela culinária, e tudo isso é matéria cultural” (CANESQUI e
GARCIA, 2005).
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Figura 02
Embora as dificuldades na atividade sejam atenuadas, observamos a continuidade dessa
prática cultural e a inserção da população jovem que residem no povoado, sendo comumente
denominadas como as “novatas” ao aderir a referida atividade, como observou uma
entrevistada.
Nossas mães e avós trabalharam na produção e comercialização dos
bolos e tapiocas para sustentar a família, também fazemos o mesmo,
principalmente por que existem poucas opções para adquirir renda
para sobreviver. Com o dinheiro compramos de tudo, comida, moveis,
pagamos as contas e outras coisas mais” (E.M.S. Agosto, 2011. Miai
de Baixo).
É notável que os motivos que levam as famílias miaienses ao oficio, sempre foi
a necessidade de se ter uma fonte de trabalho renda, igualmente é impossível negar que a
influência da cultura não esteja arraigada nessa prática, sobretudo porque as família que hoje
se insere nesse contexto são filhas e netas com histórico dos guisados.
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ALTERAÇÕES NO PROCESSO DE PRODUÇAO DOS GUISADOS
Com relação aos meios de produção, não só no quesito terra que podemos apontar
mudanças, mas também nas casas de farinhas que segundo relatos até a década de 1980
existiam várias e que estas eram coletivas, isto é, em cada núcleo familiar havia uma casa de
farinha aonde os parentes usavam para fazer os guisados. Atualmente não encontramos mais
essas casas, em substituição, as mulheres utilizam pequenos fornos nos quintais de suas casas
e os utensílios usados para a preparação das massas são miniaturas do que compunham uma
casa de farinha tradicional, como a prensa que serve para retirar a umidade da mandioca, e a
peneira para deixar a massa mais fina.
O processo de preparação da matéria prima também passou por mudanças uma vez
que houve alterações nos hábitos cotidianos dos miaienses. A água encanada e a energia
elétrica foram disponibilizadas para o povoado e a rotina da população foi toda modificada
inclusive na forma de preparar os guisados. A mandioca, por exemplo, antes da água encanada
era colocada de molho com casca, para ser amolecida em cacimbas ou riachos. Atualmente as
mulheres colocam a raiz em galões ou baldes grandes onde estas passam em media três dias
para pubar e amolecer.
Já a eletricidade trouxe a vantagem de poder conservar as massas da mandioca e da
macaxeira. Antigamente a preparação dos produtos era feita após o processo de triturar a raiz
ou quando lavava e secava à prensa a massa puba, pois a mesma não se conservava por
muitos dias. Exceto quando se queria fazer a farinha azeda, pois para fazê-la é preciso deixar
a massa azedar por vários dias.
Figura 03
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se referirem às receitas, as senhoras apontaram algumas mudanças na forma de preparo, pois
muitos ingredientes foram agregados. Por exemplo, na preparação do pé de moleque, onde a
margarina toma lugar de destaque ocupando a importância que antes era do sumo do coco.
Todas as entrevistadas citaram em suas falas que suas mães não utilizavam a margarina ou
quando isso ocorria, a quantidade era mínima, “não sei como, mais minha mãe e minha avó
não usavam a margarina, mas os bolos eram deliciosos e molinhos, elas usavam muito sumo
do coco e hoje a gente tem que colocar muita margarina para deixar o bolo amarelinho,
molinho e gostoso” (D. H. Agosto 2011, Miai de Baixo).
É como argumenta Ramos (2007 p.15) “as praticas alimentares falam do processo de
indivíduos, famílias e comunidades revelando como diversos elementos do cotidiano
influenciam e são influenciados pela alimentação dentro de um contexto de desenvolvimento
próprio de cada local e grupo” uma vez que atualmente as influências derivadas da
globalização alcançam desde os grandes conglomerados urbanos até as pequenas povoações.
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Outro ingrediente que está presente na receita do bolo de macaxeira que não era
utilizado é o queijo mussarela ralado. Sua utilização para tal fim é muito recente, isso por que
o próprio produto alimentício não era feito para ser comercializado, mas para o consumo da
própria família a base da massa da macaxeira, leite de coco e sal. Atualmente o bolo de
macaxeira é um dos produtos mais procurados e o queijo é um dos ingredientes que não pode
faltar em sua receita.
Um motivo citado para tais modificações nas receitas, foi a acessibilidade dos novos
ingredientes, uma vez que as distâncias entre o povoado e a feira da cidade e de
estabelecimentos comerciais se encurtaram devido a construção da rodovia BR101 AL no
final da década de 1980 como ressalta o entrevistado, “antigamente a gente ia pra feira de
Coruripe de burro era muito longe e não dava pra trazer muitas coisas só o mais importante e
também por que antigamente não se usava essas coisas de hoje não”( R..R.S, Agosto 2011,
Miai de Baixo).
Todavia a forma de comercialização também foi se alterando. Os produtos eram
colocados em sacos de pano e levados em cima do “lombo” dos burros para as feiras de
Coruripe, Pindorama, Piaçabuçu dentre outras. Atualmente as iguarias de mandioca são
arrumados em caixas de isopor na pretensão de ser mais higiênico e de conservá-los novos e
com a temperatura ideal (quentinhos).
A PRODUÇÃO DE GUISADOS COMO IMPORTÂNCIA ECONÔMICA
O valor identitário do saber-fazer dos derivados da mandioca com técnicas próprias
que caracterizam a cultura dos miaienses caminha paralelamente com a importância
econômica que têm para com estas famílias, uma vez que, a finalidade de produzi-los é a
comercialização para a geração de renda destinada a subsistência das famílias.
Foi evidenciado a partir das entrevistas com os idosos, que até o último quartel do
século passado o motivo para tal produção era a complementação de renda para a
sobrevivência familiar no caso das mães de família, já as moças trabalhavam nesse oficio com
a pretensão de arrecadar verbas para comprar seus enxovais de casamento. Assim como em
décadas atrás, atualmente os motivos são bastante semelhantes: comprar mantimentos,
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vestimentas, construir residências, pagar suas dividas, são apenas alguns dos vários destinos
da renda adquirida a partir dos guisados do Miai de Baixo.
De um universo de dezessete famílias entrevistadas e que fazem parte do processo de
produção e comercialização dos guisados, dez atuam diariamente no oficio e dessas, sete
fazem os guisados para complementar a renda familiar a mais de 30 anos. E as outras três são
núcleos familiares recentes, que casaram há pouco tempo. As outras sete são famílias
liderados por mulheres, ex-guisadeiras que deixaram de participar diretamente da produção
devido à idade avançada ou por motivo de doenças.
A produção era voltada apenas para a tapioca amassada, chamada no povoado e
redondeza de “má casada”, e para o pé de moleque. Atualmente várias receitas estão sendo
preparadas para a comercialização como o bolo de macaxeira com e sem queijo, a tapioca
dobrada, além disso, outros produtos eram feitos apenas para o consumo da família e hoje
também são comercializados como os beijus, as broas e os bolos de puba. Na tabela abaixo
estão listados os produtos derivados da mandioca produzidos em Miai de Baixo.
Variedade de guisados produzidos - Miai de Baixo - Coruripe/Alagoas, 2011
Macaxeira
Bolos
Macaxeira com queijo
Puba
“Má casada” (tapioca amassada)
Tapiocas
Tapioca “ripiada”
Tapioca dobrada
Pé de moleque – comprido
Pé de moleque
Pé de moleque – redondo “bolo cagão”
Beiju grosso
Beiju
Beiju fino “chapéu de couro”
Broas
Farinha comum
Farinhas
Farinha d’água
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Os produtos são vendidos nas feiras das cidades de Coruripe, Feliz Deserto,
Piaçabuçu e em Pontal de Coruripe seja em feiras ou a domicilio de porta em porta. Os
produtos mais procurados são: a tapioca amassada, o pé de moleque e o bolo de macaxeira
com queijo.
Os preços variam entre cinqüenta centavos a dois reais a depender do tamanho dos
produtos. Todas as guisadeiras vendem as variedades de produtos com exceção das farinhas, e
o lucro entre elas não tem muita diferença variando de um a dois salários mínimos mensais,
sendo que a produção se dar semanalmente.
Como se trata de uma atividade de caráter familiar, a mão de obra se restringe aos
membros da família, no entanto há casos como a preparação de farinha por exemplo, que é
evidenciado uma coletividade maior, ocorre o denominado mutirão, inerente as comunidades
que valorizam os traços culturais.
Quanto aos consumidores, estes são fregueses fiéis, consomem os produtos desde
longas datas, ou seja, por muitos anos. Em entrevista feita a alguns deles na feira de Coruripe
eles demonstraram satisfação tanto no sabor como no preço dos guisados. “O número de
compradores aumentam a cada ano”(A.D.S. Agosto 2011, Miai de Baixo). Tratam-se de
sujeitos que
incentivam permanência à produção dos alimentos. Como o povoado está
localizado no litoral existem algumas casas de veraneio onde em feriados, quando há um
número considerável de consumidores, as guisadeiras aproveitam para vender seus produtos a
domicilio.
CONCLUSÃO
Os traços culturais de um povo são evidenciados no falar, vestir, nos hábitos
alimentares, nas formas de produzir etc, foi a partir dessa última circunstancia que apontamos
as características que permeiam a produção dos guisados no povoado como sendo elementos
que compõe a cultura daquela comunidade.
A preservação das ferramentas usadas na preparação dos bolos, beijus, broas, pés de
moleques dentre outros derivados da mandioca assim como os nomes característicos daquele
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lugar passados de geração a geração dão a estes, titulo de traços culturais, que são tão
importantes quanto a produção dos alimentos para o sustento das famílias.
Toda a produção é realizada entre família e a renda é utilizada para o sustento da
mesma. Nesse contexto, torna-se um importante instrumento de renda e de crescimento da
população local. É uma atividade que envolve varias etapas, exigindo que todos os membros
participem de forma direta ou indireta da produção, no entanto, as etapas finais isto é, da
ralagem da mandioca até a venda dos guisados são feitos pelas mulheres autodenominadas de
guisadeiras.
As transformações espaciais ocorrida em Miai de Baixo, modificaram os hábitos
cotidianos de sua população, mas não o suficiente para descaracterizar o saber-fazer que foi
transmitido de geração a geração. E uma forma de não deixa isso acontecer é a apropriação
desse saber utilizando-o para adquirir renda.
Diante das evidências vistas e ouvidas no povoado Miaí de Baixo sobre as fases de
produção dos guisados, conclui-se que esse processo passa por ressignificações no tocante as
transformações espaciais ocorridas no lugar como as novas formas de apropriação da terra, o
fim das casas de farinha comunitárias e a inserção de novos ingredientes na produção dos
derivados. Entretanto, diante das dificuldades as mulheres de Miai de Baixo resistem na
atividade de produzir guisados alicerçadas pela demanda do mercado consumidor.
REFERÊNCIAS
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diálogo
possível.
Rio
de
Janeiro,
Editora
FIOCRUZ,
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cultural”
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http://www.mercator.ufc.br/index.php/mercator/article/viewArticle/192
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http://www.ihgrgs.org.br/Contribuicoes/Geografia_Cultural.htm
Publicado
Publicado
em
em
RAMOS, Mariana Oliveira. A “comida da roça” ontem e hoje: um estudo etnográfico dos
saberes e práticas alimentares e agricultores de Maquiné (RS). Porto Alegre, 2007.
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SILVA, Juliana Klotz et all. Alimentação e cultura como campo cientifico no Brasil. Physis
Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 2010.
SOUZA, Rosimere Melo. Natureza, Espaço e Cultura em Comunidades Haliêuticas in:
Espaço e Cultura, Julho-dezembro, nº26/2009.
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