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O ESTRESSE E A REPRODUÇÃO*
Aspectos relativos ao estresse
O conceito de estresse ainda é abstrato, a despeito de décadas de pesquisa nesta
área. Todos os animais respondem a estímulos como manipulação física e traumas, com
diferentes componentes de ordem neural, humoral ou metabólica visando a manutenção
ou reposição da homeostase. As alterações impostas por estes estímulos são
genericamente denominadas como resposta ao estresse (WAGNER, 1991).
Experimentos em ratos mostraram que um organismo severamente agredido
por um agente inespecífico como exposição ao frio, trauma cirúrgico, produção de
choque medular, excessivo exercício muscular ou intoxicações com doses sub-letais de
diversos fármacos, desenvolve uma síndrome típica, cujos sintomas independem da
natureza do agente agressor ou do grupo farmacológico do medicamento utilizado.
SELYE (1936) descreveu o desencadeamento e desenvolvimento do processo em três
estágios. Ele considera que o primeiro estágio seja a expressão de um alarme geral do
organismo quando subitamente confrontado com uma situação crítica. A partir do
contato com o agente estressante, o organismo iniciaria um processo de adaptação a este
agente, o que configuraria o segundo estágio. Em permanecendo o contato com o fator
promotor do estresse o indivíduo perderia a capacidade de reagir e entraria no estágio de
exaustão o qual levaria a alterações orgânicas semelhantes ao primeiro estágio e que
poderia levar a falência de órgãos e a morte. Como os sintomas descritos representam
um esforço generalizado do organismo para adaptar-se a nova condição, seria definida
uma "síndrome geral de adaptação" (SELYE, 1937).
O termo estresse, como utilizado em um contexto veterinário não se refere a
um simples parâmetro ou conjunto de reações corporais mas sim a uma classificação
heterogênea do fenômeno. Conseqüentemente, não é uma definição a ser considerada
como explanatória ou como um parâmetro hipotético que reflete a influência combinada
de diferentes condições adversas. O fenômeno é usualmente vinculado a uma profunda
*
Seminário apresentado na disciplina de Endocrinologia da Reprodução (VET00169) do Programa de
Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da UFRGS, pela aluna VALESCA PETER DOS SANTOS, no
segundo semestre de 2003. Professor da disciplina: Félix H. Díaz González.
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alteração fisiológica, geralmente associado a um processo de doença. Há também
controvérsia quando consideradas algumas posições de pesquisadores sobre o assunto já
que, para alguns, estresse é uma situação extrema e indesejável enquanto outros
consideram-no um parâmetro normal e desejável já que representa uma reação para
adaptação do indivíduo (FRASER et al., 1975).
O entendimento do mecanismo de estresse em animais toma importância pelo
fato de que se deseja evitar o sofrimento ao tratarmos com outras espécies. A
capacidade de definir e medir o estresse imposto aos animais pode proporcionar um
caminho para prevenção de causas e obtenção do bem-estar geral (MOBERG, 1987b).
A viabilidade da existência depende da habilidade de reagir a uma variedade de
desafios e fatores estressantes com respostas adequadas a cada situação particular.
Enquanto um conceito de estresse pode ser facilmente entendido, uma definição
aceitável ainda permanece obscura. Estudos visando o bem-estar dos animais,
trabalharam no sentido de dimensionar índices de estresse e tomaram a ativação do eixo
hipotálamo-hipofisário para este propósito. Uma definição aceita envolve uma resposta
neuro-endócrina e que se baseia na ativação do eixo hipotálamo-hipofisário-adrenal
(HHA). O estágio final desta ativação é a secreção de glicocorticóides a partir da córtex
adrenal (HARBUZ E LIGHTMAN, 1992; BROOM & JOHNSON, 1993).
O estresse pode ser definido como uma reação do organismo a forças deletérias
e que geralmente manifesta-se por alterações neuroendócrinas ou adrenocorticais. O
estresse em animais geralmente é considerado de dois tipos: o estresse mental o qual
pode ser desencadeado por um meio-ambiente hostil ou não familiar e o estresse físico
ou participatório que pode ser causado por técnicas de contenção, anestesia ou cirurgia
(STOTT, 1981; MUIR, 1990).
O organismo responde a uma demanda física ou psíquica pela liberação de
ACTH da hipófise anterior, glicocorticóides pela córtex adrenal, adrenalina a partir da
medula adrenal e noradrenalina originada dos nervos simpáticos. Estes hormônios
servem para adaptar o organismo aos agentes estressores que podem induzir desde leves
alterações psicológicas até intensas agressões físicas, afetando os sistemas
cardiovascular, imune e a produção energética (AXELROD & REISINE, 1984).
A agressão a um organismo, seja acidental ou cirúrgica promove alterações
metabólicas, hormonais e hemodinâmicas que podem ser reproduzidas. Estas respostas
são caracterizadas por alterações na homeostase de proteínas, hipermetabolismo,
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alteração no metabolismo de carboidratos, retenção de água e sódio e um aumento na
lipólise. As alterações no metabolismo dos carboidratos incluem estímulo à
gliconeogênese e redução na captação da glicose por inibição da insulina o que resulta
em hiperglicemia. A fonte principal de energia do organismo baseia-se em lipídios,
sendo reduzida a lipogênese e elevada a lipólise. A tendência catabólica manifesta-se
nas proteínas ocasionando um balanço negativo de nitrogênio. A magnitude destas
alterações está relacionada com a intensidade da agressão (WEISSMAN, 1990).
Um animal submetido a uma situação estressante ativa três respostas biológicas
principais para reagir: o comportamento, o sistema nervoso autônomo e o sistema
neuroendócrino (MOBERG, 1987a). A teoria psicobiológica do estresse envolve o
sistema límbico, uma região do córtex cerebral, envolvido em alterações fisiológicas,
psicológicas e comportamentais. O sistema límbico estaria relacionado com estados de
prazer e dor, recompensa e punição, satisfação e aversão. A soma deste fenômenos
regularia comportamentos como defesa, busca de alimento, reprodução e outras
respostas ligadas a preservação da espécie (BECKER, 1987).
A ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal (HHA) pelo estresse, gera
uma cascata de mensagens hormonais que culminam em um aumento nas concentrações
do cortisol plasmático. A regulação hipotalâmica do eixo é aparentemente complexa,
envolvendo a interação de vários fatores liberadores e provavelmente um fator inibidor.
Experimentos in vitro, utilizando células hipofisárias de ratos demonstraram que há um
hormônio liberador de corticotropinas (HLC) que se constitui no mais importante
secretagogo para o ACTH. Entretanto, outras substâncias incluindo arginina
vasopressina (AVP), ocitocina, catecolaminas e interleucinas, também liberam ACTH
e/ou potencializam a ação do HLC como liberador (ALEXANDER et al., 1996).
A avaliação do estresse promovido por fatores como frio e privação grave de
alimento foi realizada por Dieterich & Holleman (1973) que utilizaram em seu estudo
parâmetros
bioquímicos
e
hematológicos.
Não
foram
detectadas
alterações
significativas nos parâmetros estudados, levando a conclusão que condições intrínsecas
dos grupos estudados não permitiram e deterioração imposta por condições adversas de
temperatura e alimentação.
James et al. (1970), estudaram a função adrenocortical no eqüino. Constataram
que a administração de corticotropina assim como eventos cirúrgicos produziam uma
elevação nos níveis plasmáticos de cortisol. Estas alterações no cortisol foram
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acompanhadas por variações na contagem de eosinófilos. Concluíram que o mecanismo
de controle da função adrenocortical no eqüino é similar ao das outras espécies. Ao
determinar variações diurnas na concentração de cortisol, detectaram que os níveis a
tarde, a partir das 16:00 h seriam inferiores aos da manhã. Registraram ainda que à noite
os valores atingiam 68% dos valores matinais.
As respostas ao estresse começam no cérebro como uma atividade neural que é
integrada no hipotálamo. O hipotálamo produz hormônios específicos que regulam as
atividades das células anteriores da hipófise que, no caso do eixo adrenal agem como
liberadoras de ACTH (Figura 1). Os principais hormônios liberadores de ACTH, o CRH
e a AVP, produzem alguns efeitos distintos. O CRH influencia o comportamento em
parâmetros como a ansiedade e a fome. A AVP tem pouca influência no comportamento
mas, por outro lado, possui uma marcante atividade na função renal inclusive a qual
atribui a este hormônio o nome de anti-diurético (HAD). Uma vez na hipófise, estes
dois hormônios estimulam a secreção de ACTH o qual atua nas glândulas adrenais,
liberando cortisol. A elevação do cortisol plasmático inibe a atividade de hipotálamo e
hipófise, produzindo um estímulo negativo a manutenção da resposta orgânica ao
estresse (ALEXANDER & IRVINE, 1998a).
Parâmetros de cortisol plasmático e ACTH em eqüinos Hanoveranos
submetidos a exercícios sob condições controladas levaram a diferenças na elevação do
cortisol plasmático. No entanto, não houve necessariamente reflexo da secreção de
ACTH, estabelecendo-se um intervalo entre a liberação dos dois hormônios (MARC et
al., 2000).
O ACTH plasmático permanece estável em sangue total a 19° C por períodos
além de 3 horas, permitindo coletas para esse fim em condições de campo. Situações
especiais a serem consideradas prevêem a utilização de EDTA como anti-coagulante e
separação do plasma em até três horas. O plasma separado pode ser refrigerado a -20° C
em um tubo plástico e mantido por períodos além de um mês. Comparando-se eqüinos
normais e com Síndrome de Cushing, Couëtil et al. (1996) consideraram surpreendente
que os níveis de cortisol plasmático não corresponderam a elevação observada nos
valores de ACTH, tornando este parâmetro inadequado para avaliação desta patologia.
Os valores registrados de ACTH no eqüino normal oscilaram entre 6,50 e 30,85 pg.ml-1.
O cortisol plasmático é amplamente ligado a globulinas que regulam sua
biodisponibilidade restringindo sua saída dos capilares (ALEXANDER & IRVINE,
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1998b). Os níveis destas globulinas podem ser influenciados por vários fatores
incluindo o estresse e, este fato pode interferir na quantidade de cortisol liberado pelas
células. Se não houvesse variação nestas proteínas, sua consideração na interpretação do
cortisol total seria irrelevante. No entanto diferentes fatores podem fazê-las variar. Os
autores submeteram eqüinos a estresse social (introdução em um novo ambiente) e não
detectaram alterações no cortisol em até 20 horas de exposição. Consideraram como
explicativo para a espécie eqüina que a concentração de cortisol total não reflete a
situação do eixo hipotalâmico-adrenal.
Linden et al. (1990) compararam a resposta ao estresse quando este era
provocado por atividades esportivas ou através do uso de fármacos (ACTH).
Concluíram ocorrer uma resposta individual, específica, independente do tipo de
estresse.
O efeito de exercícios de alta intensidade em esteira sobre os valores
plasmáticos de ACTH, cortisol, adrenalina e noradrenalina foi avaliado por Kurosawa
et al. (1998). O ACTH plasmático aumentou significativamente durante o exercício, em
valores até setenta vezes os obtidos antes do exercício. Houve também um efeito
significativo no cortisol plasmático, porém com uma dinâmica de variação não
correspondente ao ACTH. Concluíram que a resposta adrenocortical pode ser limitada
pela habilidade de produção da córtex adrenal. Detectaram uma alta correlação entre as
concentrações plasmáticas de ACTH e lactato, reforçando a hipótese de que o aumento
do lactato ativa o eixo hipofisário-adrenal.
Grossman et al. (1982) e Luna (2000) pesquisaram a influência dos opióides
endógenos na liberação do ACTH. Utilizaram um antagonista opióide, a naloxona, que
provocou uma elevação nas concentrações plasmáticas de ACTH, lipotropina e cortisol.
Concluíram que há uma inibição tônica constante durante as 24 hs do dia e que as
alterações circadianas não são devidas a variações nos opióides. Entretanto, a inibição
do bloqueio é responsável, pelo menos em parte, pelo aumento de cortisol na resposta
ao estresse hipoglicêmico.
Mills (1997) coloca que um estresse agudo provoca uma elevação nos níveis de
cortisol. Já durante o estresse crônico, os níveis totais de cortisol podem aumentar ou
diminuir o que sugere que a variação pode estar relacionada com a espécie animal e
com o estímulo. Reporta ainda alguns estudos que detectaram a liberação de fatores
inibidores de ACTH durante o processo de estresse crônico que viriam a bloquear a
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resposta a secretagogos. Em seus resultados, obtiveram que processos inflamatórios
crônicos reduzem significativamente os níveis de cortisol plasmático.
A correlação entre níveis plasmáticos de glicose e atividade adrenérgica foi
estabelecida por Smythe et al. (1984) que detectaram uma relação direta entre a ativação
do eixo hipotalâmico pelo estresse e a elevação da glicemia, independente da atividade
adrenal. Por outro, lado há uma razão inversa entre a concentração plasmática de glicose
e a atividade neuronal hipotalâmica.
Nogueira & Barnabe (1997) dosaram cortisol em grupos de eqüinos separados
em diferentes idades. Nos animais mais velhos detectaram uma diferença
estatisticamente significativa o que os levou a concluir que o estresse prolongado pode
resultar em uma redução da liberação de corticotropina pela hipófise. A secreção de
opióides endógenos podem também levar a uma redução no cortisol sérico.
ESTRESSE
HIPOTÁLAMO
AUMENTO DE CRH
REDUÇÃO DE GnRH
ADENO-HIPÓFISE
AUMENTO DE ACTH
REDUÇÃO DE GONADOTROPINAS
córtex adrenal
cortisol e glicocorticóides
Figura 1: Resposta endócrina ao estresse.
Estresse na reprodução
Selye (1939), sugeriu uma relação entre os hormônios do eixo hipatalâmicohipofisário-adrenal (HPA), que são liberados durante o estresse, e os hormônios do eixo
hipotalâmico-hipofisário-gonadal (HPG). O estresse é acompanhado por um aumento na
atividade do eixo HPA e por uma redução das funções reprodutivas (fenômeno que
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atribuiu à necessidade de preservação da função do córtex adrenal em detrimento da
função gonadal, em casos de emergência).
O hormônio liberador de corticotropina (CRH), os peptídeos derivados da próopiomelanocortina (POMC) e os corticóides adrenais desempenham uma importante
função na modulação dos efeitos do estresse sobre a função reprodutiva (RIVIER &
RIVEST, 1991). A influência destes hormônios sobre o eixo HPG se dá em três níveis:
a) no hipotálamo através da inibição da secreção de GnRH;
b) na glândula pituitária, por interferência do GnRH na liberação de hormônio
luteinizante (LH) e folículo estimulante(FSH);
c) nas gônadas, por alteração do efeito estimulatório das gonadotropinas na
secreção de esteróides sexuais.
O estresse prolongado inibe a secreção de LH e FSH e bloqueia a ovulação.
Verificou-se que a remoção dos corticosteróides circulantes através de adrenalectomia
provoca aumento de ACTH e possivelmente de CRH (Dallman et al.,1985; Swanson &
Simmons, 1989). A administração de CRH exógeno, que atua em nível de hipotálamo
inibindo a secreção de GnRH e gonadotropinas, (Rivier & Vale, 1984) altera a atividade
do eixo HPA. Aumentos nos níveis de corticosteróides podem provocar alterações em
nível de pituitária, alterando a liberação de gonadotropinas por indução do GnRH, e de
hipotálamo, modulando a secreção de CRH.
Estresse prolongado e função reprodutiva
A liberação de CRH durante o estresse e a proximidade anatômica dos
neurônios secretores de CRH e GnRH , sugerem um envolvimento do CRH endógeno
como mediador da função reprodutiva induzida por estresse (MacLusky et al., 1988).
Rivier et al., 1986, observaram que injeções de CRH nos ventrículos cerebrais de
roedores e primatas inibia a secreção de GnRH. A relevância fisiológica desta
observação foi demonstrada por experimentos com administração de antagonistas de
CRH nos ventrículos cerebrais de ratos, o que reverteu o efeito inibitório do estresse
sobre a secreção de LH.
Taché et al., 1980, verificaram que o estresse agudo ou crônico, não altera a
sensibilidade da pituitária ao GnRH e que, ratos adrenalectomizados também
respondem ao estresse prolongado reduzindo de forma significativa os níveis
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plasmáticos de LH. Em ratos, níveis aumentados de corticosteróides não são os
principais responsáveis pela inibição da secreção de FSH e LH durante o estresse.
Ação gonadal
Existem evidências de que os hormônios secretados durante o estresse tenham
poder de exercer efeito inibitório sob as gônadas, principalmente através da redução da
sensibilidade gonadal às gonadotropinas. As gônadas de roedores possuem receptores
para CRH e peptídeos derivados da POMC, além de receptores para corticosteróides
adrenais. Na presença das glândulas adrenais, a infusão de ACTH em roedores machos,
reduz os níveis basais de testosterona por alteração na sensibilidade testicular ao LH. O
CRH também está presente nos testículos de roedores onde exerce função inibitória na
esteroidogênese. A observação de que o estresse aumenta a biossíntese de CRH no
cérebro, sugere a possibilidade de que a produção testicular de CRH deva ser
igualmente estimulada e que este peptídeo deva exercer um papel importante na inibição
da produção de esteróides sexuais (RIVIER & RIVEST,1991).
A
interação
entre
o
eixo
hipotalâmico-pituitário-adrenal
e
o
eixo
gonadotrópico-pituitário foi estudada tanto em humanos quanto em animais. O
hormônio liberador de corticotropina foi detectado como inibidor da secreção de LH em
ratos. Baldwin & Sawer (1974), demonstraram que a dexametasona provoca inibição da
secreção de LH.
Alterações centrais induzidas pelo estresse
Um dos principais fatores com poder de inibir a secreção de GnRH é o CRH,
que atua como um neurotransmissor ou neuromodulador no sistema nervoso central e
desempenha um importante papel na integração das respostas orgânicas ao estresse.
Entretanto, os mecanismos pelos quais o CRH influencia a secreção de GnRH não estão
completamente desvendados e provavelmente envolvam a ativação de outras rotas,
como as que dependem de opiódes endógenos e/ou catecolaminas. Além disso, existem
conexões anatômicas diretas entre os terminais axônicos de neurônios secretores de
CRH e os dendritos de neurônios secretores de GnRH.
Os neurônios parvocelulares do núcleo paraventricular (NPV) do hipotálamo
contêm a maioria das fibras secretoras de CRH que alcançam a lâmina externa da
eminência média (EM). Outras estruturas, como a área pré-optica medial (APOM)
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também possuem tais fibras. Estudos comprovaram que a infusão bilateral de CRH na
área pré-optica medial, reduzem significativamente a liberação de GnRH e os níveis
plasmáticos de LH em fêmeas ovariectomizadas (RIVIER & RIVEST,1991).
Outra região com potencial importância na relação CRH e GnRH durante o
estresse é o núcleo amigdalóide central (CeA). Este núcleo contém um grande número
de corpos celulares e terminais celulares de CRH e estão envolvidos na secreção de
corticosterona induzida pelo estresse em ratos. É possível que o CeA, através da
ativação de neurônios liberadores de CRH na área pré-optica medial, module a secreção
de GnRH durante o estresse severo.
Opióides endógenos e peptídeos derivados da POMC
Os opiódes reduzem a concentração de GnRH sangüíneo e a naloxona aumenta
a liberação de GnRH. A morfina suprime a liberação de GnRH durante o proestro e
altera a atividade eletrofisiológica do pulso gerador de GnRH em macacos. Os opiódes
endógenos exercem a influencia inibitória tônica no eixo HPG e atuam diretamente nos
neurônios liberadores de GnRH.
Os peptídeos derivados da POMC são sintetizados no lobo anterior da glândula
pituitária e núcleo arqueado do hipotálamo, no núcleo tractus solitarius (NTS) e na
placenta. A β-endorfina, liga-se a receptores µ, presente em grande quantidade no
hipotálamo, e receptores δ. Os neurônios da POMC participam de forma direta ou
indireta, via receptores µ, na inibição da atividade neuronal de GnRH durante o estresse.
O CRH é um importante regulador da síntese de moléculas da POMC na
adenohipófise. O hipotálamo contém neurônios da POMC e o CRF estimula, in vitro, a
liberação de β-endorfina pelo hipotálamo. Como o núcleo arqueado é a principal zona
hipotalâmica a sintetizar peptídeos derivados da POMC, considera-se que o CRH atue
nesta região para aumentar a produção de peptídeos derivados da POMC.
É possível que tanto o CRH quanto os peptídeos derivados da POMC atuem de
forma sinérgica na região pré-optica medial, exercendo efeito pós-sináptico direto sob
os neurônios de GnRH e influenciando sua secreção durante o estresse. No entanto, não
foi demonstrado que este efeito sob a secreção de GnRH seja via sinapses existentes nos
neurônios de GnRH. Este efeito, deve ser indireto, através de outros sistemas de
neurotransmissores hipotalâmicos (RIVIER & RIVEST,1991).
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A dinorfina também representa um possível mediador da função reprodutiva
durante o estresse. Foi verificado que, a administração de dinorfina na APOM altera
significativamente o comportamento reprodutivo. A importância do sistema
dinofinérgico central nos efeitos anti-reprodutivos do CRH durante o estresse,
provavelmente não seja essencial, mas atue em conjunto com outros múltiplos sistemas
que regulam os neurônios secretores de GnRH durante o estresse.
Aminas biogênicas
O sistema catecolaminérgico é intensamente ativado pelo estresse. Existem
evidências do envolvimento das catecolaminas na regulação do eixo hipotalâmicohipofisário-gonadal. Os neurônios catecolaminérgicos são responsáveis por inibir a
secreção de CRH via receptores hipotalâmicos α2 enquanto os receptores α1 e β ativam
a liberação de CRH pelos neurônios parvocelulares no PVN. O PVN é a região
hipotalâmica com maior quantidade de inervação noradrenérgica (RIVIER &
RIVEST,1991).
Os efeitos noradrenérgicos sob os neurônios de GnRH da APOM são
estrógeno- dependentes. A ativação central do sistema noradrenérgico tanto inibe
quanto facilita a liberação de LH em animais não estressados. A noradrenalina é
excitatória na presença de estrógeno e inibitória na ausência.
A liberação de CRH por neurônios do PVN não é o mecanismo pelo qual a
noradrenalina inibe a secreção de LH durante o estresse. No entanto, o CRH pode ativar
o sistema noradrenérgico durante o estresse, agindo desta forma sob os neurônios de
GnRH. Também ativa diretamente neurônios catecolaminérgicos no locus coeruleus
(LC).
As rotas dependentes de monoaminas no hipotálamo, mediam a ação antireprodutiva de opióides endógenos. A administração sistêmica de morfina reduz
significativamente as concentrações hipotalâmicas de noradrenalina e plasmáticas de
LH, mas aumenta a atividade da dopamina e serotonina no hipotálamo. Enquanto
muitos autores consideram que a serotonina (5-HT) é favorável à ovulação, outros
sugerem que a mesma inibe a atividade do eixo HPG. Em condições de não-estresse, os
neurônios de 5-HT, podem favorecer ou inibir a secreção de LH na dependência de
esteróides. Por outro lado, durante o estresse físico, a 5-HT está envolvida na redução
de atividade dos neurônios liberadores de GnRH. O mecanismo preciso de inibição da
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atividade neuronal de GnRH desempenhada por rotas serotoninérgicas durante o
estresse ainda são pouco conhecidas (RIVIER & RIVEST,1991).
Estresse calórico em vacas leiteiras
Em vacas leiteiras, há uma queda na fertilidade durante os meses quentes do
ano. Os fatores responsáveis por esta situação são, principalmente, a ausência de
manifestação de estro e redução de apetite provocados pelo aumento de temperatura e
humidade.
O estresse calórico reduz a eleição de um folículo dominante, o que pode ser
encarado como uma redução na capacidade esteroidogênica das células da teca e
granulosa e queda das concentrações sangüíneas de estradiol. Os níveis de progesterona
podem aumentar ou diminuir dependendo da intensidade do estresse e do estado
metabólico do animal. Estas alterações endócrinas reduzem a atividade folicular e
alteram o mecanismo ovulatório, promovendo uma diminuição na qualidade do oócito e
do embrião (Rensis & Scaramuzzi, 2003).
O ambiente uterino também é afetado, desfavorecendo o ambiente para a
implantação do embrião. O apetite e o consumo de matéria seca são reduzidos,
prolongando o balanço energético negativo do período pós-parto e aumentando o
intervalo entre partos, principalmente em vacas leiteiras de alta produção Estudos
recentes sugerem o uso de gonadotropinas para induzir o desenvolvimento folicular e a
ovulação, visando reduzir a severidade da infertilidade pós-parto induzida por estresse
calórico em vacas de leite (Rensis & Scaramuzzi, 2003).
Efeito do estresse calórico no eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal
Os efeitos do estresse calórico nas concentrações de LH circulantes são
inconsistêntes. Alguns estudos reportam redução nos níveis de LH, sugerindo que o
folículo dominante se desenvolva num ambiente de baixa concentração de LH e isto,
reduz a secreção de estradiol pelo folículo dominante, ocasionando falhas na expressão
de estro e redução da fertilidade. As concentrações de FSH estão aumentadas durante o
estresse calórico, provavelmente devido à redução plasmática de inibina produzida
pelos folículos comprometidos. Porém, o aumento de FSH parece não ser suficiente
para reverter os efeitos da queda na concentração de LH e a redução da disponibilidade
de precursores androgênicos para a síntese de estradiol (Rensis & Scaramuzzi, 2003).
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As concentrações plasmáticas de estradiol estão reduzidas pelo estresse
calórico. Estudos demonstram que as concentrações plasmáticas de progesterona são
afetadas de forma variável pelo calor (Rensis & Scaramuzzi, 2003).
O mecanismo pelo qual o estresse calórico afeta as concentrações dos
hormônios reprodutivos não é conhecido. Sugere-se que o aumento da secreção de
corticosteróides iniba GnRH e LH. O estresse inibe a secreção de gonadotropinas de
forma mais severa em vacas com baixas concentrações plasmáticas de estradiol. Isto
indica que, o mecanismo neuroendócrino é mais sensível ao estresse calórico quando os
níveis de estradiol são altos.
Wolfenson et al., 1997, sugeriram que o estresse calórico pode também agir
diretamente sobre as gônadas reduzindo sua sensibilidade à estimulação das
gonadotropinas (Rensis & Scaramuzzi, 2003).
Desenvolvimento folicular
O desenvolvimento folicular é afetado pelo estresse calórico por atraso na
seleção folicular e prolongamento da onda folicular, atuando de forma adversa na
qualidade do oócito e da esteroidogênese folicular. Há uma redução do grau de
dominância do folículo e maior quantidade de folículos de tamanho médio se
desenvolvem, aumentando a incidência de gestações gemelares nos meses quentes
(Rensis & Scaramuzzi, 2003).
Balanço energético
A performance reprodutiva é afetada por ação direta no sistema reprodutivo e
por ação indireta mediada por alterações no balanço energético.
Em vacas leiteiras, a redução da secreção de LH esta diretamente relacionada
ao estágio de lactação, a produção de leite, ao balanço energético e estresse calórico.
Uma das principais causas de anovulação em vacas de leite, especialmente na fase
inicial do período pós-parto, é o prolongado balanço energético negativo.
O balanço energético negativo provoca redução das concentrações plasmáticas
de insulina, glicose e IGF-I, e aumento de GH e ácidos graxos não esterificados. Estes
agem no eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal, mediando os efeitos inibitórios do
balanço energético negativo na fertilidade pós-parto. Tanto o IGF-I quanto a glicose são
estimulatórias ao crescimento folicular e a implantação. A glicose é a fonte de energia
13
primária para os ovários. A disponibilidade de glicose está diretamente envolvida com a
modulação da secreção de LH e a hipoglicemia severa inibe a secreção pulsátil de LH,
impedindo a ovulação (Rensis & Scaramuzzi, 2003). Além disso, a prolactina, pode
inibir o crescimento folicular, é sensível à temperatura e seus níveis encontram-se
aumentados no verão.
Estresse em machos
Baker et al. (1982) compararam a concentração plasmática de cortisol e
testosterona entre garanhões em repouso e treinamento. Na espécie eqüina, foi
verificado que garanhões com melhor performance em treinamento produziam sêmen de
melhor qualidade. Se supõem que garanhões com melhor performance lidam de forma
mais eficiente com situações de estresse através de uma resposta vigorosa no momento
da agressão, com retorno a níveis basais de cortisol imediato após a agressão. Linden et
al. (1990) constataram que tanto o treinamento como a estimulação por ACTH
desencadeiam um aumento altamente significativo de cortisol na corrente sangüínea.
Intervenções cirúrgicas, doenças agudas, insuficiência respiratória, reduzem os
níveis de testosterona em 24 horas. Estudos sugerem que há uma boa correlação entre a
severidade da doença e a magnitude do declíneo.
Existem muitos mecanismos possíveis para o rápido declínio dos níveis de
esteróides sexuais circulantes por causa do estresse:
1)
aumento na testosterona livre poderia reduzir a secreção de gonadotropina,
levando a uma diminuição da produção de testosterona;
2)
metabolismo da testosterona e estradiol devem ser acelerados sem aumento
compensatório na secreção, por alterações na proteína de ligação;
3)
as gônadas devem ficar refratárias ao estímulo das gonadotropinas;
4)
a estimulação hipotalâmica para a
secreção de gonadotropinas deve ser
inadequada ou a pituitária deve ser incapaz de responder a tal estímulo;
5)
a ativação da secreção adreno-cortical ou a administração de glicocoticóides
devem afetar a função gonadal.
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