ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO: Ana Cristina da Jorge Manoel Mendes Cardoso UM ESTUDO Silva DE CASO Araújo ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO Ana Cristina da Silva Araújo1 Jorge Manoel Mendes Cardoso2 RESUMO EXPANDIDO Palavras-Chave: Assédio Moral; assediador; integridade psíquica; confecção, sindicato. Introdução O crescimento da população mundial, em razão do consumo em massa, obrigou a transformação dos meios e formas de produção, principalmente, após o inicio da industrialização. No setor do vestuário, não é de forma diferente, isso porque, até pouco tempo, a produção do vestuário era predominantemente artesanal e diferenciada, ou seja, homens (alfaiates) costurando o vestuário masculino e, sob medida e, o mesmo acontecendo com as mulheres (costureiras), que confeccionavam as roupas femininas, também sob medida. Os artesões (alfaiates e costureiras), atualmente não tem maior significado no setor do vestuário, já que a maioria absoluta da produção é confeccionada em indústrias. Nessas, a maioria dos trabalhadores são pessoas do sexo feminino, já que as atividades exigem movimentos rápidos, destreza manual, delicadeza, paciência e submissão a disciplina industrial. Dentro deste cabedal de questões, existe um lado que não é divulgado, de que as trabalhadoras são mais facilmente dominadas e aceitam sem maiores discussões as tarefas que lhes são passadas, além do que, por ter sua "emancipação política trabalhista" ainda em busca de espaços, também se resignam com tratamentos diferenciados e salários menores em relação ao dos trabalhadores (masculinos). O tratamento diferenciado, por vezes, se dá, por exigência de submissão, punições arbitrárias, promessas não cumpridas, etc., o que, recentemente, passou a ser considerado, no mundo jurídico e psicológico, como "assédio moral no trabalho". 1 2 Psicóloga da Associação Médica do Sindicato das Costureiras, noroeste do Paraná. Psicólogo, Professor da Faculdade Ingá – Maringá Pr. Diante desse quadro, o assédio moral no trabalho é o tema a ser abordado neste trabalho, em particular, em relação a uma trabalhadora do setor do vestuário da cidade de Cianorte. Revisão de Literatura Conceituação do Assédio Moral no Trabalho Para Hirigoyen, apud Freitas, Heloani e Barreto (2008), assédio moral no trabalho é “toda e qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou a integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho.”(p. 29). Este conceito induz a conclusão de que o assédio moral caracteriza-se por uma conduta abusiva, intencional, freqüente e repetida, ou seja, uma violência continuada. Aliás, esta é uma de suas características, que visa diminuir, humilhar, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo ou grupo, degradando suas condições de trabalho, atingindo-a na sua dignidade e comprometendo a sua integridade pessoal e profissional. É uma ação estrategicamente desenvolvida para destruir psicologicamente a vítima e, com isso, afastá-la do mundo do trabalho. Os métodos de imposição do assédio moral no trabalho O ser humano, em sua grande maioria, é dependente de um emprego remunerado para garantir sua sobrevivência e de sua família e, como o número de empregos normalmente é inferior ao número de desempregados, essa situação permite que a forma de tratamento seja sempre impositiva, originando assim, a possibilidade do assédio moral no trabalho. Em outras palavras, é a forma de violência perversa que contamina o cotidiano da vitima, ataca sua dignidade afetando sua personalidade e, até mesmo, à sua integridade física ou psíquica, Ainda, degrada o ambiente de trabalho em que a vítima está inserida e, pode, inclusive, propiciar a perda do emprego. O Assediador Sempre ao se discutir o assédio moral no trabalho é necessário a distinção, além do assediado, também do assediador. Partindo desta afirmação, tem-se como distinção que o assediador é uma pessoa com problemas de personalidade, de conduta e de ética. Na maioria das vezes, o assediador age dessa forma deliberadamente e sabe exatamente o que faz. Na verdade, esses agressores possuem traços narcisistas e destrutivos, estão freqüentemente inseguros quanto à sua competência profissional e podem exibir, às vezes, fortes características de personalidade paranóica, pela qual projetam em seus semelhantes sua “sombra”, ou melhor, aquilo que não conseguem aceitar em si mesmos. O assediado Da mesma forma como se delineou o assediador e se expôs suas características e formas de agir, também se faz em relação ao assediado, que no caso é a vítima. Pra se estabelecer esses critérios ou parâmetros, Freitas (2001), afirma que, em princípio, o assediado (vítima) não possui patologia ou fraqueza psíquica e que, na maioria das vezes, é o assédio que desencadeia a reação, posto que a vítima reage ao autoritarismo. É, pois, a sua recusa a submeter-se à autoridade, apesar das pressões, que a designa como alvo. Para Freitas (2001), o assediado, inicialmente passa a ser desqualificado e aceita em silêncio ou tem essa desqualificação, endossada pelo grupo. Os procedimentos do assédio e a crueldade desenvolvida pelo mesmo conseguem induzir o assediado a pensar que merece o que aconteceu e que, na verdade, “ela estava pedindo por isto”. O impacto do assédio no assediado No discorrer de suas explanações, Santos, (2005), relata que os efeitos do assédio moral na saúde dos trabalhadores são diversos e inúmeras são as doenças causadas, tais como, a hipertensão arterial, distúrbios digestivos, alcoolismo, vício em drogas proibidas, estresse, agravamento do diabetes e tantos outros males que se instalam. Para a autora, além do cansaço constante, falhas na memória, etc; manifestamse ainda problemas psíquicos que podem alterar o comportamento e modificar a personalidade, perda da auto-estima e até mesmo levar a vítima ao suicídio. Material e métodos Local: O questionário foi aplicado na residência da própria costureira. Após o término do questionário, realizou-se uma entrevista onde a entrevistada forneceu diversos dados e comentários que propiciaram maior fidedignidade e compreensão ao caso. Instrumentos: Aplicou-se um questionário com questões fechadas e abertas, com o objetivo de investigar a existência de assédio moral no trabalho e suas consequências. Participante: Constitui-se do estudo de um caso de assédio moral ocorrido com uma costureira, sexo feminino, de 42 anos, casada, mãe de dois filhos, ex-trabalhadora da indústria de confecções da região de Cianorte. A entrevistada será aqui identificada somente pelo nome fictício de EME para proteger e garantir o sigilo de sua identidade. Resultados e discussão As respostas da entrevistada - Freqüência dos comportamentos: No começo, as pressões eram dirigidas a todos os empregados da indústria. Quando o sindicato chamava a diretoria dessa indústria para discutir as denúncias, seu proprietário fazia reunião e pressionava os funcionários para dizerem quem estava fazendo as denúncias. Por algum tempo a pressão se dirigia a todos os funcionários, como um assédio moral coletivo ... Ao mencionar o assédio moral coletivo, a entrevistada foi feliz na manifestação, pois a forma de praticá-lo era coletiva quando o proprietário assim se manifestava: “Nas reuniões ele diz que não precisa dos funcionários, que ele tem dinheiro suficiente para viver uma vida muito boa, e que se mantêm as empresas abertas é porque gosta de Cianorte e quer dar emprego para nós.” Em uma reunião, entre o patrão e os empregados, sua manifestação mais severa foi contra o sindicato profissional, ao qual fez acusações e, com ameaça de fechar a indústria, incitou os empregados a promoverem uma manifestação. Bem antes desta última reunião o proprietário da indústria de confecções ficou sabendo que EME era cunhada da presidente do sindicato. O proprietário da empresa soube que EME tinha parentesco com a presidente do sindicato. Então, mandou chamá-la para dar-lhe conhecimento sobre esta descoberta. A partir dessa descoberta, o seu comportamento mudou e a violência passou a ter destino certo, ou seja, a ser dirigida a EME por meio da fixação de um olhar fixo e ameaçador durante as reuniões. “... sempre chama reuniões para tentar descobrir quem denunciou a empresa e nessas reuniões sempre ficava olhando prá mim.” - Qual o estilo do seu chefe? “Ele dá muita importância para a produção e demonstra um interesse mínimo pelo indivíduo, é por que ele falava que com o império que ele tem, não precisava da gente, que ele mantinha a fábrica para ajudar a cidade.” Nesse sentido, Freitas (2001), argumenta que a maior parte dos agressores usa o seu charme e suas faculdades adaptativas para deixar atrás de si pessoas fluidas e vidas devastadas. Ainda assim, a agressão foi tão violenta que resultou em uma pessoa despedaçada emocionalmente, aviltada em sua dignidade e apartada da vida social, isso é o que se pode perceber das respostas dadas em vários momentos da entrevista e ao questionário: “... não volto mais para uma fábrica, queria arrumar um idoso ou uma criança para cuidar. Não quero passar por tudo aquilo de novo. “ - Quais as conseqüências desta situação sobre sua saúde? Passei a ter insônia, tremedeira, hemorragias (tive que retirar o útero), o braço inchava no final do dia (depois que sai de lá descobri que tinha um quisto no braço e precisei operar), não consigo comer direito, o coração acelera, tenho medo de conversar com outras pessoas, quando estava na fábrica e falava que ia ter reunião eu começava a suar frio. Me chamava de fofoqueira. Freitas (2007), ao se manifestar sobre o impacto assédio moral na vida do trabalhador adverte que o assédio gera desordens na vida psíquica, social, profissional, familiar e afetiva do indivíduo, provocando diversos problemas particularmente de os de natureza psicossomática, de saúde, duração variável, que desestabiliza a sua vida. Essas desordens reduzem a capacidade de concentração do indivíduo, o induzem ao erro e colocam em risco tanto o seu emprego como a sua vida. Considerações finais A realização do trabalho permitiu de maneira clara, objetiva e produtiva, a possibilidade de estudar o assédio moral no trabalho e, ao mesmo tempo, verificar como ele se desenvolve e qual o impacto que provoca no assediado e na organização empresarial. Uma análise mais concisa e aprofundada sobre este tema, evidencia que um dos poucos e mais forte caminhos a se trilhar para conseguir superar esse problema, que data do inicio do trabalho subordinado, é o caminho da solidariedade com as vítimas de assédio moral. A solidariedade pode ser prestada por vários motivos, dentre eles o senso de justiça e bondade. Mas também envolve um senso de proteção própria, porque todas as vezes que amparamos o assediado e revertemos ou amenizamos o assédio, estamos agindo em nossa própria defesa, pois amanhã qualquer um de nós poderá vir a ser atingido por ele, principalmente diante de uma estrutura social em que, como vimos, impera o egoísmo e a híper competitividade, e onde se valoriza muito mais a capacidade de competir, e vencer, do que o altruísmo e a generosidade. A punição aos agressores, que agem de maneira torpe – egoísta e covarde – será sempre bem-vinda e imporá limites criando barreiras e evitando procedimentos antiéticos nos ambientes de trabalho. Referências Freitas, M. E. (2001). Assédio moral e sexual: faces do poder perverso nas organizações. RAE-FGV, São Paulo, v. 41, n. 2, p. 8-19, abr.-jun. Freitas, M. E. (2007). Quem paga a conta do assédio moral no trabalho? eletrônica, São Paulo, v. 6, n. 1, jan.-jun. RAE- Freitas, M. E., Heloani, J. R.; Barreto, M. M. S. (2008). Assédio moral no trabalho. Cengage Learning, São Paulo: Coleção Debates em Administração. Santos, A. A. Assédio moral nas empresas públicas ou privadas e a posição do trabalhador: aceitação do assédio moral ou enfrentamento do desemprego. Disponível no site: http://conpedi.org/manaus/arquivos/Anais/Andrea/%20Aparecida%20dos%Santos.pdf. Acessado em 06 agosto, de 2008.