X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 CONSTRUINDO SABERES DOCENTES EM ATIVIDADES DE CONSTRUÇÃO DE TRIÂNGULOS Ana Teresa de C. C. de Oliveira Universidade Federal do Rio de Janeiro [email protected] Resumo: Neste minicurso pretende-se aplicar e discutir com professores (6º ao 9º anos e ensino médio) uma seqüência didática visando desenvolver a habilidade de comunicar idéias matemáticas no contexto do ensino de Geometria. As atividades são de construção de triângulos com compasso, régua e esquadros, sem o uso da graduação. Como objetivos principais destacam-se: estimular os professores a valorizar a resolução de problemas na aprendizagem matemática; significar alguns objetos geométricos no contexto da construção de triângulos como mediana, bissetriz, altura, ângulo adjacente, ângulo oposto; permitir a revisão e o aprofundamento de conhecimentos geométricos pelos docentes; incentivar o confronto e a comunicação, na forma oral e escrita, dos processos de construção de triângulos usando o vocabulário adequado, visando uma prática que contribua para o desenvolvimento da argumentação e do vocabulário geométrico dos alunos; incentivar os docentes para a valorização dos registros escritos dos alunos e sua análise como uma estratégia para elaborar modificações e adaptações necessárias à uma aprendizagem significativa em Geometria; mobilizar os professores para a uma prática reflexiva. Os professores participantes deverão ter compasso e esquadros. Palavras-chave: Geometria; Terminologia; Comunicação; Argumentação. INTRODUÇÃO O objetivo deste texto é, brevemente, dar suporte teórico e metodológico a um minicurso intitulado Construindo saberes docentes por meio de construção de triângulos, a ser realizado com professores do 6º ao 9º anos e ensino médio, no X ENEM. É certo que dominar os conteúdos matemáticos é fundamental para o bom desempenho da profissão docente. Contudo, apesar de podermos afirmar que sobre este domínio se constrói, também, o sucesso do ensino e aprendizagem de matemática, com a mesma ênfase constatamos que, como nos diz Sztajn (2002), a relação entre o saber disciplinar e a qualidade da aula de um professor não é direta e nem óbvia. Muitas outras relações são constitutivas de uma rede complexa que envolve o ensino e a aprendizagem, o que nos faz ter a clareza do quanto é difícil pensarmos sobre a questão da qual, atualmente, se ocupam muitos pesquisadores da Educação Matemática: o que precisa saber um bom professor de Matemática? Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 1 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Com semelhante complexidade se delineiam outras questões afins, como as que se dirigem diretamente a qualificação do professor de Matemática, seja ela pré ou pósserviço. Que atividades de formação podem contribuir para a construção de um saber pedagógico disciplinar do professor de Matemática? (BELFORT, 2003) Isto é, para a construção de um saber que se estende para além do domínio dos conteúdos matemáticos, que é o que podemos tratar por conhecimento do professor, de acordo com Shulman (1986). Vários pesquisadores, nacionais e internacionais, têm se debruçado sobre esta questão e foge ao objetivo deste trabalho tratar dos diferentes aspectos que podem nortear a reflexão em torno da formação e da prática docente em Matemática. Pretendemos, apenas, voltar a atenção para a questão da comunicação eficiente de idéias matemáticas como uma habilidade básica a ser desenvolvida nos alunos, e para algumas atividades didáticas a serem realizadas com professores com vistas à motivá-los a objetivar o desenvolvimento desta habilidade em seus alunos, nas aulas de Matemática. REFLEXÕES TEÓRICAS As contribuições teóricas e práticas nas quais nos apoiamos encontram-se, expressivamente, no campo da formação dos professores, do desenvolvimento dos saberes docentes, dos estudos da importância e influência da escrita como veículo da aprendizagem matemática, além de outras que enfatizam a importância da aprendizagem significativa da geometria e sua importância na educação básica. Nesse sentido, trazemos aqui idéias de Sztajn (1997, 2002), Belfort (2003), Shulman (1986), D’Ambrósio (1993), Ball e seus colaboradores (2009a, 2009b), Powell (2001), Rabelo (1996) e as orientações curriculares propostas pelos documentos do NCTM (1990). Trazemos, também, Chevallard (2001), que nos ajuda a sublinhar a importância de desenvolvermos nos alunos a capacidade de validarem os procedimentos adotados e resultados que encontram para os problemas matemáticos. É preciso termos a clareza de que comunicar idéias matemáticas corretamente não requer e não envolve, unicamente, competências em linguagem, mas a capacidade de resolver problemas, a veiculação de conceitos tratados corretamente, o estabelecimento de Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 2 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 relações entre os conceitos, relação lógica entre causa e conseqüência, capacidade de validação de hipóteses e justificativa de respostas e de encaminhamentos, entre outras muitas competências. Ao pensarmos em alinhar a formação de professores com esta visão acerca do que se deve desenvolver nos alunos da educação básica ficamos, sem dúvidas, diante de questões que, ao mesmo tempo que são relevantes e carentes de definições urgentes, não são simples e nem imediatas. Tem sido muito valorizada pelas pesquisas em Educação Matemática, e em Didática, a estratégia que consiste em levar os alunos a atuarem atuem como resolvedores de problemas, responsabilizando-se pelas suas respostas, pela validação, e pelos procedimentos que adotam para solucionar os problemas propostos (SZTAJN, 1997; NCTM, 1990; D’AMBRÓSIO, 1993). Contudo, em diferentes níveis da escolaridade, os alunos tendem a colocar nos professores a responsabilidade por validar as suas respostas, como se o fato de serem alunos isentasse-os do compromisso com a coerência e validade dessas respostas. E como se o professor fosse o único a ter a tarefa de corrigir os resultados obtidos pelos alunos para as tarefas propostas. Esta “irresponsabilidade matemática dos alunos” (CHEVALLARD, 2001), este descompromisso pelo que apresentam como respostas e procedimentos a ponto de não se interessarem por validá-los é, certamente, uma questão de razões diversas. Entre as muitas razões para este fato poderíamos pensar que o descompromisso ao qual nos referimos pode ser atribuído ao fato de que o aluno, em muitas práticas docentes, não é um sujeito ativo no seu processo de aprendizagem, ou que o aluno não tem uma boa atitude diante da Matemática ou, ainda, que não está motivado para aprender e desta forma não se interessa pela validade de suas respostas, entre outras. Apesar de não intencionarmos analisar estas possíveis razões e, tampouco, apresentar soluções que dêem conta da complexidade das relações e processos envolvidos no ensino e aprendizagem de Matemática, das singularidades envolvidas no trabalho com os diferentes temas etc, não podemos deixar de enfatizar a importância de, como professores, pensarmos em caminhos e estratégias que podem contribuir para um melhor desempenho de nossos alunos. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 3 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 A formação pré-serviço e continuada de professores deve incorporar estas discussões e outras, e levar os professores a refletirem sobre a prática docente visando ampliar suas estratégias de ensino de Matemática. Indo ao encontro das idéias de Ball e seus colaboradores (2009a, 2009b), as questões da prática devem estar no âmago da formação profissional dos professores. Essa é a idéia que nos orienta nesse mini-curso - a partir tarefas e atividades voltadas para situações de ensino na educação básica, desenvolver saberes docentes que possibilitem aos professores enfrentar as dificuldades matemáticas dos seus alunos. Acreditamos que essas experiências, a partir de atividades, e as discussões sobre as questões conceituais envolvidas, são de grande contribuição para a formação de professores. A questão de nosso interesse específico nesse mini-curso é: De que maneira podemos nós, professores, conduzirmos o processo didático em Matemática de forma a desenvolvermos nos alunos a comunicação de idéias matemáticas e a validação de respostas e procedimentos adotados na resolução de problemas? No âmbito desta argumentação, a seqüência apresentada a seguir destina-se a discutir com professores de Matemática a importância da escrita em Matemática (POWELL, 2001; RABELO, 1996) para comunicar idéias, procedimentos adotados e validar respostas, na realização de problemas que envolvem construções geométricas. Nosso ponto de vista é que a resolução de problemas que compõem essa sequência é uma estratégia de formação de professores, que possibilita colocá-los no lugar de seus alunos, levando-os a refletirem acerca de sua prática, a aprofundarem seus conhecimentos matemáticos, e desenvolverem recursos para favorecerem em suas aulas uma melhor aprendizagem de geometria. A SEQUÊNCIA DIDÁTICA A elaboração de seqüências didáticas por professores, bem como a análise dos resultados observados, é um dos caminhos que pode promover a construção do saber pedagógico disciplinar do professor (SHULMAN, 1986), na medida em que implica a articulação das dimensões disciplinar e didática no ensino dos diversos temas matemáticos. As experiências destes professores com seqüências destinadas a eles em cursos de formação é Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 4 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 fundamental para que conheçam diferentes estratégias que podem estar em questão, de forma que possam criar seqüências para seus alunos. A proposta desta seqüência envolve a construção de triângulos a partir de distintos elementos básicos de construção com compasso, régua e esquadros não graduados. A solução do problema consiste da construção da figura e da explicação acerca do modo de realizá-la feita oralmente e por escrito. O problema será considerado resolvido se forem apresentados o modo de construção utilizado e a justificativa que garanta que, realizandose as construções sugeridas, obtém-se, efetivamente, a figura com as características pedidas. Alguns pesquisadores do ensino e aprendizagem de Matemática defendem que a escrita, além de possibilitar a captação do pensar matemático, pode também servir como veículo de aprendizagem. É importante a busca de uma palavra adequada que corresponda às percepções e ações de quem resolve um problema. À medida que o processo se repete, adquire-se domínio do assunto e vocabulário técnico (POWELL, 2001; RABELO, 1996). Destacamos como objetivos principais desta seqüência significar alguns objetos geométricos no contexto da construção de triângulos como mediana, bissetriz, altura, ângulo adjacente, ângulo oposto em atividades de construção para as quais estes objetos se constituem em ferramentas; permitir a revisão e o aprofundamento de conhecimentos geométricos pelos docentes; incentivar o confronto e a comunicação, na forma oral e escrita, dos processos de construção de triângulos usando o vocabulário adequado, visando uma prática que contribua para o desenvolvimento da argumentação e do vocabulário geométrico dos alunos; desenvolver nos docentes a capacidade de valorização dos registros escritos dos alunos e incentivar a análise destes registros como uma estratégia para elaborar modificações e adaptações necessárias à uma aprendizagem significativa em Geometria. ATIVIDADES DA SEQUÊNCIA Problema 1: Construir um triângulo dados dois lados e o ângulo por eles compreendido. Problema 2: Construir um triângulo dados um lado e os dois ângulos adjacentes. Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 5 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 Problema 3: Construir um triângulo dados duas alturas e o ângulo de cujo vértice parte uma das alturas dadas. Problema 4: Construir um triângulo dados um lado, um ângulo adjacente e o ângulo oposto a este lado. Problema 5: Construir um triângulo conhecendo a altura e a mediana relativas a um mesmo lado (a) e a/b. Problema 6: Construir um triângulo conhecendo dois lados e a altura relativa ao terceiro lado. Problema 7: Construir um triângulo conhecendo dois lados e a mediana relativa a um deles. Problema 8: Construir um triângulo conhecendo-se dois ângulos e a altura relativa ao lado determinado pelos vértices destes ângulos. Problema 9: Construir um triângulo conhecendo duas alturas e o lado correspondente a uma delas. Problema 10: Construir um triângulo conhecendo duas alturas e o lado correspondente a terceira altura. METODOLOGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA SEQUÊNCIA Os alunos (professores) trabalharão cooperativamente, em grupos de três componentes ou mais, dependendo da freqüência do número de inscritos. Cada grupo se encarregará de determinada(s) construção(ões). O trabalho se desenvolverá em 4 etapas. 1a etapa: discussão com os docentes sobre as implicações da proposta de construção de triângulos com compasso, régua e esquadros não graduados. O objetivo específico desta etapa é levar os docentes a concluírem e formalizarem suas conclusões sobre as possibilidades e limitações do uso dos instrumentos citados acima. Isto é, que a régua não graduada como instrumento de construção geométrica permite traçar uma reta qualquer, ou seja, uma reta que passa por um ponto ou uma reta que passa por dois pontos e não permite transportar segmentos; o compasso como elemento de construção geométrica permite descrever a partir de um centro uma Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 6 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 circunferência de raio dado, construir um segmento em uma reta dada a partir de um ponto dado e construir um ângulo dado; os esquadros não graduados substituem a régua nas situações já mencionadas e permitem a construção de linhas paralelas. Levá-los ainda a concluírem que, como conseqüência da construção com os referidos instrumentos, os elementos dados para a construção dos triângulos devem ser fornecidos através de desenho, como o que está fornecido a seguir como exemplo. b c A 2a etapa: realização das construções pedidas. 3a etapa: apresentação das soluções dos problemas Cada grupo deverá apresentar a solução de seu problema, justificando o procedimento, fundamentando-se na justificativa escrita, permitindo a avaliação crítica do procedimento, da clareza de idéias e pertinência do vocabulário geométrico utilizado na justificativa dos passos da construção. 4a etapa: discussão de orientações didáticas Motivar a reflexão sobre orientações didáticas que permitam um desempenho profissional adequado para o ensino e aprendizagem de Geometria como a importância das atividades de construção geométrica, da compreensão do processo do outro, da defesa do método ou solução adotado contra diferentes proposições, das adaptações necessárias a serem feitas nos livros para suprirem as carências conceituais dos alunos. As questões norteadoras para estas reflexões serão: o que você acha que está ensinando ao aplicar esta seqüência didática? Qual é para você a importância de escrever e relatar para outros os passos da construção feita? Que conhecimentos devem estar disponíveis para a resolução destes problemas? Que objetivos você desenharia como sendo aqueles que esta seqüência poderia atingir? Estas possibilidades de construção de triângulos são novas para você? Anais do X Encontro Nacional de Educação Matemática Minicurso 7 X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010 RESULTADOS ESPERADOS Intencionamos obter uma troca significativa de idéias sobre a importância das competências de comunicação de idéias matemáticas e de argumentação. Tratam-se de competências fundamentais a serem desenvolvidas na educação básica, nas aulas de matemática. Pretendemos, ainda, nesse minicurso, evidenciar a relevância da geometria na escola básica e das atividades de construção, visando o desenvolvimento das referidas competências, estimulando os professores a inseri-las nas suas aulas de matemática. REFERÊNCIAS BALL, D.L., FORZANI, F. (2009a). The Work of teaching and the challenge for teacher education. Journal of Teacher Education, 60(5), 497-511. BALL, D.L., HILL, H. (2009b). R and D: The curious - and crucial - case of mathematical knowledge for teaching. Phi Delta Kappan, 91(2), 68-71. BELFORT, E. Formação de Professores de Matemática: A Aritmética como Ferramenta para a Construção do Saber Pedagógico Disciplinar, II SIPEM, Santos, out. 2003. CHEVALLARD, Y. Estudar Matemáticas- o elo perdido entre o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre:Artmed, 2001. D’AMBRÓSIO, B. S. Formação de professores de Matemática para o século XXI: o Grande Desafio. In: Pró-Posições, F E Unicamp, SP: Cortez, vol.4, n. 1, mar. 1993, p.3541. NCTM. 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