Direito Penal Militar Dos Crimes Militares em Tempo de Paz e de Guerra Professora: Lorena Braga Raposo Dos Crimes Contra a Pessoa arts. 205 a 239 do CPM Genocídio Art. 208. Matar membros de um grupo nacional, étnico, religioso ou pertencente a determinada raça, com o fim de destruição total ou parcial desse grupo: Pena - reclusão, de quinze a trinta anos. Casos assimilados Parágrafo único. Será punido com reclusão, de quatro a quinze anos, quem, com o mesmo fim: I - inflige lesões graves a membros do grupo; II - submete o grupo a condições de existência, físicas ou morais, capazes de ocasionar a eliminação de todos os seus membros ou parte deles; III - força o grupo à sua dispersão; IV - impõe medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; V - efetua coativamente a transferência de crianças do grupo para outro grupo. GENOCÍDIO é a eliminação, a destruição da vida de membros de grupo humano praticado pelo homem. Esse grupo constitui-se biológico e culturalmente homogêneo (etnia), de determinada religião ou, como diz o texto, de determinada raça. O tipo subjetivo consiste no dolo, que é a vontade refere-se à especial finalidade de agir, representada pela intenção de destruir total ou parcialmente esse grupo. O sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar. O sujeito passivo é representado por pessoas com vida que constituam membros desse grupo. Neste caso, cabe à doutrina fixar o número mínimo de pessoas que constituem membros do grupo para que o fato delituoso venha constituir-se no delito de genocídio. O parágrafo único dispõe a respeito de diversas hipóteses de destruição total ou parcial desse grupo, com exceção da morte de seus membros. Ressalta-se que também nesses casos o fim é o mesmo. Ofensa às forças armadas Art. 219. Propalar fatos, que sabe inverídicos, capazes de ofender a dignidade ou abalar o crédito das forças armadas ou a confiança que estas merecem do público: Pena - detenção, de seis meses a um ano. Parágrafo único. A pena será aumentada de um terço, se o crime é cometido pela imprensa, rádio ou televisão. Este dispositivo não constava das legislações anteriores. No caso da leitura do texto, o legislador pretendeu proteger da ofensa as forças armadas em 03 situações: a) quanto a sua dignidade; b) quanto a seu crédito perante o público; c) quanto à confiança do público. Não foi feliz, contudo. A primeira delas constitui a ofensa à dignidade das forças armadas. Ora, já vimos que entende-se por dignidade o aspecto interno da honra subjetiva, o sentimento do próprio valor moral da pessoa. Assim, são exemplos as expressões “cachorro”, “canalha”, “ladrão”, etc. Logo, não é necessária, portanto, a atribuição do fato, mas a menção à falta de qualidade, e a existência de vícios e defeitos. Trata-se de manifestação de opinião pessoal, sem referência a fatos ou a acontecimentos n mundo exterior. Consequentemente, entendemos que não procedeu corretamente o legislador. Quanto às demais hipóteses, ambas se equivalem, pois se o fato divulgado é apto a abalar o crédito que o público deposita nas forças armadas, evidentemente abalada estará a sua confiança. No caso, o agente, civil ou militar, propala (torna público, divulga, espalha, publica) fatos que ele sabe não serem verídicos. Vê-se, pois, que o tipo subjetivo é constituído pelo dolo direito e o elemento subjetivo do tipo é a intenção de ofender. O parágrafo único dispõe a respeito de causa de aumento de pena, se o crime é cometido pela imprensa, rádio e televisão. Representam meios de comunicação que facilitam a divulgação. Desafio para duelo Art. 224. Desafiar outro militar para duelo ou aceitar-lhe o desafio, embora o duelo não se realize: Pena - detenção, até três meses, se o fato não constitui crime mais grave. Afirma-se que o DUELO surgiu entre os povos em que a ordem do Estado ainda era fracamente constituída e insuficiente para proteger direitos individuais, o que, aliás, observa-se na Idade Média e de onde esse instituto constitui um resquício. O duelo, na lição de Osmar de Macedo Soares, pode-se definir como o combate singular para desafronta de honra, ou desagravo de uma ofensa ou injúria grave. Os motivos do duelo podem ser de ordem particular quando afetam a honra privada, ou de ordem pública, quando se referem a serviço público. Trata-se de delito de mera conduta em que a ação ou a omissão bastam para constituir o elemento material da figura típica penal. O núcleo do tipo é expresso pelo verbo desafiar, que significa chamar a desafio, provocar, afrontar. O sujeito ativo é o militar e o passivo “outro militar”, como diz o texto. O crime se consuma com o desafio ou com a aceitação desse desafio. Se houver o duelo, diz-se que houve o exaurimento do crime. Por se trata de delito de mera conduta, inadmissível a forma tentada. Violação de recato Art. 229. Violar, mediante processo técnico o direito ao recato pessoal ou o direito ao resguardo das palavras que não forem pronunciadas publicamente: Pena - detenção, até um ano. Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem divulga os fatos captados. Trata-se de uma novidade em nossa legislação penal militar. Como corolário, dispõe a CF em seu art. 5º, inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Vê-se, pois, que o legislador teve em vista a proteção do direito de intimidade pessoal seja no aspecto do recato individual, seja no aspecto à inviolabilidade das ideias, opiniões, não expressas publicamente. O núcleo do tipo é expresso pelo verbo “violar”, que significa no caso devassar ou divulgar abusivamente; revelar. O meio empregado pelo agente é o processo técnico consistente no uso de instrumento visual, como o binóculo, etc., ou gravadores ou qualquer instrumento de gravação de voz ou imagem. O conceito de recato abrange toda a gama de resguardo como manifestação essencial da personalidade. O direito à intimidade foi reconhecido pelo Congresso Internacional de Trento, realizado em 18 de maio de 1962. A intimidade do homem tem de ser resguardada pelo Direito como expressão da liberdade individual. O elemento subjetivo é o dolo do autor, manifestado na vontade consciente de violar o direito ao recato pessoal ou ao direito ao resguardo das palavras que não forem pronunciadas publicamente, cônscio de que procede ilegitimamente. O delito consuma-se no momento em que o agente toma conhecimento do ato decorrente da violação. Admissível, portanto, a tentativa. O sujeito ativo é o militar da ativa. Adverte o art. 231, do CPM: Natureza militar do crime ”Art. 231. Os crimes previstos nos arts. 228 e 229 somente são considerados militares no caso do art. 9º, nº II, letra a”. Significa, pois, que o militar deve estar na ativa e que o crime deve ser praticado contra outro militar na mesma situação. Consequentemente, o sujeito passivo também deve ser o militar da ativa. Em face do que dispõe o parágrafo único do dispositivo legal em estudo, “na mesma pena incorre quem divulga os fatos captados”. O divulgador no caso só pode ser o militar da ativa. Pederastia ou outro ato de libidinagem Art. 235. Praticar, ou permitir o militar que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar: Pena - detenção, de seis meses a um ano. Trata-se de inovação da atual legislação penal militar, conforme adverte a própria Exposição de Motivos em seu item 17, in verbis: “Inclui-se entre os crimes sexuais nova figura: a pederastia ou outro ato de libidinagem, quando a sua prática se der em lugar sujeito à administração militar. É a maneira de tornar mais severa a repressão contra o mal, onde os regulamentos disciplinares se revelarem insuficientes”. O núcleo do tipo é expresso pelo verbo praticar que significa realizar, executar. No caso, o militar pratica ato libidinoso, como ocorre na masturbação ou na fellatio. Permitir significa consentir, autorizar que com ele se pratique ato libidinoso. Ensina Damásio de Jesus que “ato libidinosos é o que visa ao prazer sexual. É todo aquele que serve de desafogo à concupiscência (desejo por bens materiais, luxúria). É o ato lascivo, dirigido para satisfazer o instinto sexual”. Como exemplo, podemos citar o coito anal, etc. Trata o dispositivo de pederastia, que consiste no homossexualismo masculino ou perversão sexual consistente no coito anal entre indivíduos do sexo masculino. Observa-se, pois, que a intenção do legislador foi ressaltar a pederastia como espécie de ato libidinoso. Exige o dispositivo que a prática delituosa ocorra em local sujeito à administração militar, isto é, sob comando militar, tais como quartel, navio de guerra, etc. A consumação ocorre com a prática do ato libidinoso. O sujeito ativo será sempre o militar, nos termo do art. 22. O sujeito passivo à evidência, pode ser qualquer pessoa, a não ser quando se trata de ato libidinoso homossexual, onde o sujeito passivo é o homem, seja ou não militar. Dos Crimes Contra o Patrimônio arts. 240 a 267 do CPM Furto simples Art. 240. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, até seis anos. Furto atenuado § 1º Se o agente é primário e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou considerar a infração como disciplinar. Entende-se pequeno o valor que não exceda a um décimo da quantia mensal do mais alto salário mínimo do país. Verifica-se, pois, que o magistrado tema a faculdade de atenuar a pena imposta ao delito de furto, que é de reclusão até seis anos (art. 240), desde que ocorram dois pressupostos: a) ser o agente primário; b) que a coisa furtada seja de pequeno valor. Primário é aquele que ao ser condenado ainda não sofrera qualquer condenação. Na lição de Manoel Pedro Pimentel, seria o primário em sentido estrito. Nessa categoria se coloca o réu processado anteriormente, mas que viu arquivado o inquérito policial ou que logrou a definitiva absolvição. Entende Damásio de Jesus que o primário é o não reincidente. Assim, é primário não só o sujeito que foi condenado ou está sendo condenado pela primeira vez, como também aquele que tem várias condenações, não sendo reincidente. A parte final do dispositivo legal define que deve se entender por pequeno valor, ou seja, aquele que não exceda a um décimo de quantia mensal do mais alto salário mínimo do país. Por sua vez, a segunda parte do art. 17 dispõe: “Para os efeitos penais, salário mínimo é o maior mensal vigente no país, ao tempo da sentença”. Outra hipótese de furto atenuado vem disposta no parágrafo 2º do mesmo dispositivo legal: “§ 2º º A atenuação do parágrafo anterior é igualmente aplicável no caso em que o criminoso, sendo primário, restitui a coisa ao seu dono ou repara o dano causado, antes de instaurada a ação penal.” Portanto, a atenuação prevalece também no caso em que o criminoso considerado primário, antes do iniciado o processo de furto, restitui a coisa furtada a seu dono ou repara o dano causado. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E FURTO ATENUADO Cabe ao Magistrado desclassificar a infração penal militar para infração disciplinar, em casos de pequena monta, pequena proporção, insignificante, irrelevante. O Princípio da Insignificância ou Princípio da Bagatela tem sua origem no Direito Romano e tem por base a máxima "minimis non curat praetor", isto é, "o pretor (no caso o magistrado, responsável pela aplicação da lei ao caso concreto), não cuida de minudências (questões insignificantes)". Foi introduzido no sistema penal por Claus Roxin, na década de 60, tendo em vista questões sociais. Furto de uso Art. 241. Se a coisa é subtraída para o fim de uso momentâneo e, a seguir, vem a ser imediatamente restituída ou reposta no lugar onde se achava: Pena - detenção, até seis meses. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se a coisa usada é veículo motorizado; e de um terço, se é animal de sela ou de tiro. O FURTO DE USO não é contemplado pelo Código Penal. Justifica-se da exigência típica de o fato ser praticado pelo sujeito “para si ou para outrem”, numa demonstração inequívoca da intenção do agente de assenhorar-se em definitivo da coisa. Em seu parágrafo único, verifica-se que o legislador estabeleceu o aumento da pena de metade em se tratando de veículo motorizado como sendo a coisa usada e, se trata de anima de sela ou de tiro, a pena é aumentada de um terço. Vale a pena esclarecer que entende-se por animal de sela o considerado de montaria e o de tiro. Infere-se, pois, que no furto de uso o agente não tem a intenção de ter para si, definitivamente. A sua vontade manifesta-se no sentido da posse temporária da coisa. Dano simples Art. 259. Destruir, inutilizar, deteriorar ou fazer desaparecer coisa alheia: Pena - detenção, até seis meses. Parágrafo único. Se trata de bem público: Pena - detenção, de seis meses a três anos Dispõe a Exposição de Motivos da legislação penal militar, em seu item 18, que “criou-se entre as modalidades do crime de dano a ação de fazer desaparecer coisa alheia, que ocorre, por vezes, na vida militar. Não se confunde com o furto, que é a destruição, fato que nem sempre se pode provar. Com facilidade, o agente determina o desaparecimento da coisa, o que não ficará impune, como agora acontece, pelo princípio estrito da tipicidade. Foi mantida com maior precisão, a modalidade culposa do crime de dano”. Assim, exemplificando, se o sujeito solta animal de propriedade alheia, fazendo desaparecer, o fato passa a ser típico perante a legislação penal castrense, ao contrário da legislação penal, por se tratar de uma lacuna da norma penal incriminadora. Outra hipótese de fazer desaparecer contempla o art. 265, que assim dispõe: Desaparecimento, consunção ou extravio Art. 265. Fazer desaparecer, consumir ou extraviar combustível, armamento, munição, peças de equipamento de navio ou de aeronave ou de engenho de guerra motomecanizado: Pena - reclusão, até três anos, se o fato não constitui crime mais grave. O crime se consuma com o desaparecimento da coisa, admitindo-se a forma tentada. O crime de dano em regra é doloso, mas na legislação penal militar ocorrem algumas hipóteses de dano na sua modalidade culposa, como neste caso, conforme dispõe o art. 266: Modalidades culposas Art. 266. Se o crime dos arts. 262, 263, 264 e 265 é culposo, a pena é de detenção de seis meses a dois anos; ou, se o agente é oficial, suspensão do exercício do posto de um a três anos, ou reforma; se resulta lesão corporal ou morte, aplica-se também a pena cominada ao crime culposo contra a pessoa, podendo ainda, se o agente é oficial, ser imposta a pena de reforma. A objetividade jurídica é o patrimônio, podendo o sujeito ativo ser civil ou militar, salvo o proprietário. O sujeito passivo é o titular do direito da propriedade da coisa móvel ou imóvel.