Universidade Federal do Rio Grande – FURG Curso de Psicologia TTP –Abordagem Cognitivo-Comportamental Cristiane Hirdes – 45893 Patrícia Goulart - 45894 A prevenção de recaída é um programa de automanejo destinado a melhorar a fase de manutenção do processo de mudança de hábito. O objetivo da PR é ensinar os indivíduos que estão tentando mudar seu comportamento a como antecipar e enfrentar o problema da recaída. Em um sentido muito geral, a recaída refere-se a um lapso ou revés na tentativa de um indivíduo de mudar ou modificar qualquer comportamento-alvo. (Marlatt e Donovan, 2009) Baseada em uma estrutura cognitivo-comportamental a PR busca identificar situações de alto risco, em que o indivíduo é vulnerável à recaída, e usar estratégias de enfrentamento cognitivas e comportamentais para prevenir futuras recaídas em situações similares. A PR pode ser descrita como estratégia de prevenção terciária com dois objetivos específicos: 1. Prevenir um lapso inicial; 2. Proporcionar o manejo do lapso quando de sua ocorrência, a fim de prevenir uma recaída. O objetivo fundamental é proporcionar habilidades de prevenção de uma recaída completa, independentemente da situação ou dos fatores de risco iminentes. (Marlatt e Donovan, 2009) Criada por Marlatt e Gordon em 1985, a PR é amplamente utilizada nos tratamentos de comportamentos aditivos. 1. 2. 3. Caracteriza-se por combinar: treinamento de habilidades comportamentais, intervenções cognitivas, e mudanças no estilo de vida. A recaída é considerada como parte do processo de mudança que, muitas vezes, pode ser vista como a forma pela qual o paciente recomeça o tratamento mais consciente do seu problema. (Oliveira, Jaeger & Schreiner, 2003) 1. 2. 3. 4. 5. Descreve como (processos) e quando (estágios) os indivíduos mudam sua conduta. Permite compreender as frequentes recaídas, bem como a oscilação da motivação dos pacientes para cessarem o comportamento mal-adaptativo. Pré-contemplação Contemplação Preparação Ação Manutenção Entendendo os estágios é possível elaborar e aplicar intervenções adequadas ao nível de motivação do paciente. (Prochaska, DiClemente e Norcross, 1992) O terapeuta estimula o paciente a agendar as sessões de PR após o término da terapia, por várias razões: Havendo quaisquer dificuldades, ambos poderão discutir como o paciente as dirigiu e avaliar se ele poderia tê-las manejado de um modo melhor. 1. Prever dificuldades futuras que poderiam surgir; 2. Formular um plano para lidar com as situações (Beck, 1997) O paciente verá a recaída como indicação de que as coisas não tem jeito mesmo. “Torne o sofrimento seu amigo reconhecendo que ele, às vezes, é um aspecto essencial da aprendizagem e está tentando ajudá-lo a reconhecer o que não funciona para você.” (Leahy, 2006) Possíveis perguntas do terapeuta para PR: “Embora você esteja sentindo-se mal por ter tido uma recaída, seria muito útil encarar esse lapso como importante experiência de aprendizagem O que você aprendeu sobre si mesmo? O que aprendeu sobre o que funciona e o que não funciona para você? Como você pode usar o sofrimento e o desapontamento para que o orientem no futuro?” (Leahy, 2006) Formulário como tarefa de casa: O que estava dando certo antes O que fez “cair” O que aprendi para melhorar as coisas no futuro (Leahy, 2006) Na TCC, pacientes que conseguem redução completa ou quase completa dos sintomas têm menos riscos de recaídas, mas, mesmo nesse caso, a recaída é sempre uma possibilidade. (Cordioli, 2008) Pela natureza crônica do transtorno, por sua etiologia neuropsiquiátrica e pela possibilidade de que fatores genéticos concorram, criando uma predisposição que não pode ser removida, é de se esperar que, com o tempo, aconteçam recaídas. No entanto, o mais comum é que na fase final do tratamento, quando as melhoras ainda não estão bem consolidadas, lapsos passageiros ocorram. (Cordioli, 2008) Em geral, os lapsos são involuntários e de curta duração – minutos ou horas – e muitas vezes a pessoa só os percebe durante ou após a sua ocorrência. Em outros casos, os lapsos são conscientes e a pessoa se sente frustrada, interpretando como falha ou recaída. A forma como esses lapsos podem ser interpretados é importante, pois a interpretação negativa pode fazer com que o paciente transforme o lapso em verdadeira recaída. (Cordioli, 2008) Também pode ser considerado lapso o retorno, por curto espaço de tempo – menos de duas semanas –, de obsessões não acompanhadas de rituais, mas de nível de ansiedade suficiente para causar desconforto. Normalmente, isso ocorre em consequência dos pensamentos automáticos que são ativados nessas circunstâncias, os quais podem produzir uma cascata de outros pensamentos negativos ou distorcidos e, como consequência, a necessidade de executar rituais ou de evitar contatos. (Cordioli, 2008) As recaídas correspondem ao retorno dos sintomas de forma mais consistente e duradoura, acompanhada de desconforto ou de interferência nas atividades diárias depois de uma fase em que estavam muito diminuídos ou ausentes. Se, mesmo depois do tratamento, os sintomas persistem em certo grau (melhora parcial ou nãomelhora), o aumento de sua intensidade deve ser considerado como piora. (Cordioli, 2008) Identificar as situações-gatilho que ativam as obsessões e o impulso de realizar rituais. Ex: hora de deitar ou de sair de casa para os verificadores. (Cordioli, 2008) Distração: procurar se entreter, durante situações de risco, com outros pensamentos ou com atividades práticas, como forma de reduzir a aflição e o impulso de ritualizar. (Cordioli. In: Knapp, 2007) Preparar estratégias de enfrentamento com antecedência: preparar uma lista de situações-gatilho e decidir, com antecedência, o que fazer ou deixar de fazer na ocasião, além de automatizar alguns exercícios cognitivos. É importante, também, prever como se comportar no enfrentamento das situações: por quanto tempo, onde, de que forma. Vigilância: estar atento para o autocontrole e evitar as situações ou não fazer de forma automática os rituais aos quais estava habituado. (Cordioli, 2008) Conversar consigo mesmo: conversar com o lado racional auxilia no autocontrole. Repetir mentalmente instruções de enfrentamento, dizendo para si mesmo: “eu tenho condições de me controlar”, “não vá verificar se a torneira ficou fechada”. Essas instruções não devem se transformar em compulsões mentais! (Cordioli, 2008) Usar lembretes: lembretes auxiliam em vários aspectos: distinguir entre comportamentos normais e sintomas, lembrar estratégias, interromper a execução de rituais, etc. (Cordioli, 2008) Identificar PA ativados nas situações de risco e questionar sua validade: a aflição que os acompanha pode provocar lapsos, que são rituais ou evitações eventuais: “Se eu não ler de novo esse trabalho, erros podem escapar!”. Questionamento: “Se escapar um erro, o que de pior pode acontecer?” Prevenir consequências de cometer um lapso: um lapso pode ativar a crença de ser fraco, incapaz de se autocontrolar, de o tratamento ter fracassado, acompanhada de sentimentos de culpa, de diminuição da autoestima, de depressão. Deve-se lembrar que lapso não é recaída! (Cordioli. In: Knapp, 2007) Procurar se comportar como as pessoas que não têm TOC: é muito comum o portador de TOC não saber mais distinguir as compulsões do TOC de comportamentos aceitáveis, “normais”. Aprender a lidar com os estresses da vida: tem que aprender a lidar com os problemas existenciais que podem agravar os sintomas. Ex: perdas, separações, gravidez, ascensão na carreira. (Cordioli, 2008) Tratar depressões ou outras condições mentais associadas: a depressão é muito comum em portadores do TOC. Nesses casos, há risco maior de não resistir às obsessões e de executar rituais novamente. Fazer revisões periódicas com o terapeuta: Caso tenham ocorrido lapsos, esses devem ser analisados. (Cordioli, 2008) Não interromper o uso de medicamentos: se estiver utilizando medicamentos, somente deve suspendêlos se o médico concordar. A interrupção de psicofármacos sempre deve ser gradativa. Participar de associações de portadores deTOC Saber tudo sobreTOC (Cordioli, 2008) Essa técnica objetiva abordar crenças típicas do uso de drogas e promover habilidades de enfrentamento para situações que ameacem a abstinência do paciente, motivando para a mudança e prevenindo a recaída. Estimula o paciente a pensar em novas possibilidades de agir e em formas diferentes de refletir quando estiver frente a uma situação que lhe ative o comportamento do uso de drogas. (Williams, Meyer & Pechansky, 2007) Durante o jogo o terapeuta estimula o questionamento de crenças comuns que usuários de drogas costumam cultivar, como por exemplo “Não vale a pena largar as drogas, porque me sinto um fracasso quando recaio.” (Williams, Meyer & Pechansky, 2007) Nos transtornos alimentares as técnicas de PR são semelhantes àquelas aplicadas em casos de dependência química. Trata-se de um comportamento aditivo, cujo tratamento envolve a entrevista motivacional, considerando o estágio de mudança do paciente. (Colins. In: Marlatt & Donovan, 2009) Um pequeno estudo sugere que, apesar do tratamento medicamentoso não ser muito eficaz para a Anorexia Nervosa, a fluoxetina poderia ser eficiente na PR após o peso ter sido restaurado. (Kaye et al., 2001. In: Barlow, 2008. p. 321) Aumentar o controle sobre as relações entre ambiente e controle discriminativo de estados internos: O importante da descoberta dos estados internos é que ela guiará a atenção para a descoberta das situações provocadoras de ansiedade. É sobre estas situações que a ação psicológica deverá ser dirigida. (Banaco, 1999) De mudança de comportamento: discriminar com precisão alterações sutis tanto em seu estado interno quanto em seu ambiente, precursores do comportamento de jogar; • discriminados os estados internos, descrever os controles ambientais que os provocam e levam ao jogar patológico, planejar sua eliminação ou, caso isto não seja possível, construir esquivas mais adaptativas; • tornar a resposta de jogar menos provável, aumentando o custo da resposta, ou mesmo impedindo praticamente que ela ocorra. • (Banaco, 1999) • • • • • Algumas técnicas para isto: construir controle de estímulos para evitar contato indesejável com estímulos precipitadores de JOGAR; carregar pouco dinheiro no bolso, não portar cartão de crédito ou talão de cheques; deixar que terceiros administrem seus recursos financeiros; combater regras disfuncionais como "Jogo só uma vez e paro", "Se ganhar agora saio do sufoco" etc. Pode-se utilizar mais regras para combater as disfuncionais. Algo como "você não é confiável", ou "estou sempre em risco de recaída“; ampliar o repertório comportamental, incentivando e implementando atividades prazerosas alternativas, de forma que elas compitam com o JOGAR, diminuindo sua probabilidade de ocorrência e sua frequência. (Banaco, 1999) No caso de comportamentos prazerosos, porém indesejáveis, é preciso ter cuidado ao ensinar ao paciente habilidades de enfrentamento a fim de evitar descuido ou reincidência. Nesses casos, a PR instrui os pacientes a reconhecer os primeiros sinais de tentação e a instituir diversos procedimentos de autocontrole antes de esses impulsos se tornarem muito fortes. (Barlow & Durand, 2008) Mindfulness é indicado na prevenção de recaída da depressão em pacientes que passaram pela terapia cognitiva com sucesso. A intenção deste treino é que a pessoa aprenda a detectar, reconhecer amistosamente e logo depois soltar (permitir que vão embora) os pensamentos e os sentimentos depressogênicos, antes que estes reiniciem o espiral rumo à depressão. (Segal, Williams e Teasdale, 2002) O programa padrão inclui 8 oito sessões com intervalos semanais, mas os grupos são menores, normalmente atendendo doze participantes, sendo que estes não podem estar deprimidos à época em que participam do treino. Primeiro, discute-se o fenômeno do piloto automático. Depois, as habilidades de mindfulness são treinadas. Finalmente, ensina-se como usá-las para lidar com pensamentos automáticos e como cortar o espiral depressivo no seu início. (Segal, Williams e Teasdale, 2002) O terapeuta oferece aos pacientes um conjunto sólido de habilidades para a vida, dizendo-lhes: “Ao aprender essas habilidades terapêuticas, vocês terão maior capacidade de lidar com os ativadores e os padrões que têm causado problemas. Parte do tratamento, especialmente nos estágios finais, é reforçar essas habilidades, de modo que as pessoas continuem a usá-las por si mesmas, ficando assim acima das velhas tendências.” (Write, 2003) Pacientes que finalizaram a TCC com sucesso, alcançaram a resolução de problemas. É importante levar adiante o que aprenderam durante o grupo. Nesse sentido, é dito: “Quando o grupo terminar, vocês devem permanecer atentos aos velhos padrões ativadores que possam sinalizar uma tendência para a recaída. Se isso ocorrer, não pense nisso como um fracasso pessoal ou do tratamento. Ao contrário, concentrem seus esforços para fazer tudo o que for necessário para reconquistar o domínio sobre o problema. Vocês sempre poderão tomar o rumo de volta para uma resolução sólida dos problemas.” (Write, 2003) Retomada as estratégias cognitivas e comportamentais aprendidas no contexto grupal através da dramatização de situaçõesproblema. PR e escolha de um adulto-referência para solicitar ajuda em situações de risco. (Habigzang et al., 2008) Os objetivos da intervenção foram: reestruturar pensamentos, emoções e comportamentos disfuncionais relacionados à experiência de violência sexual; reduzir sintomas de TEPT, estresse, depressão e ansiedade; e aprender habilidades de autoproteção para prevenir futuras revitimizações. A etapa final, de PR, promoveu a elaboração de estratégias de proteção, por meio da identificação de situações de risco e das oficinas sobre sexualidade e das oficinas sobre sexualidade e sobre o ECA. (Habigzang et al., 2008) No estudo foi identificado que a PR foi pouco trabalhada durante o estágio de clínica dos terapeutas iniciantes e foi insatisfatoriamente avaliada pelos alunos. A PR foi ensinada apenas no último semestre do estágio e muitos deles não tiveram tempo de aplicar a técnica. Os que tiveram não se sentiram aptos para tal função. Cabe lembrar que a PR, ainda que seja deixada para o final da terapia, deve ser trabalhada durante todo o processo terapêutico. (Barletta, Delabrida & Fonsêca, 2011) A recaída é um enorme desafio no tratamento de todos os transtornos de comportamento. Os indivíduos que trabalham com mudança de comportamento são confrontados com premências, gatilhos e pensamentos automáticos com relação aos comportamentos mal adaptativos que tentam mudar. Pesquisas futuras devem se concentrar no desenvolvimento de estratégias de análise dos dados para avaliação da mudança do comportamento. (Marlatt & Donovan , 2009) Banaco, R.A. (1999) Tratamento do jogar patológico e prevenção de recaída. Rev. bras. ter. comport. cogn. [online]. Vol.1, n.1, pp. 33-40. Barletta, J. B., Delabrida, Z. N. C. & Fonsêca, A. L. B. (2011) Conhecimento, habilidades e atitude em TCC: percepção de terapeutas iniciantes. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas. Vol. 7, n. 1, pp. 21-29. Barlow, D. H. & Durand, V. M. (2008) Psicopatologia: uma abordagem integrada. São Paulo: Cengage Learning. Beck, J. S. (1997) Terapia Cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed. Cordioli, A. V. (2008) Vencendo o transtorno obsessivo-compulsivo. Porto Alegre: Artmed. Habigzang, L. F.; Hatzenberger, R.; Corte, F. D.; Stroeher, F. & Koller, S. (2008) Avaliação de um modela de intervenção psicológica para meninas vítimas de abuso sexual. Psicologia: Teoria e Pesquisa. Vol. 24, n. 1, pp. 067-076. Knapp, P. (2007) Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto Alegre: Artmed Leahy, R.L. (2006) Técnicas de Terapia Cognitiva: manual do terapeuta. Porto Alegre: Artmed. Marlatt, G. L. & Donovan, D. M. (2009) Prevenção de recaída: estratégias de manutenção no tratamento de comportamentos adictivos. Porto Alegre: Artmed. Vandenberghe, L.; Sousa, A. (2006) Mindfulness nas terapias cognitivas e comportamentais. Rev. bras.ter. cogn., Rio de Janeiro, v. 2, n. 1. Williams A. V., Meyer, E. & Pechansky, F. (2007) Desenvolvimento de um Jogo Terapêutico para Prevenção da Recaída e Motivação para Mudança em Jovens Usuários de Drogas. Psicologia: Teoria e Pesquisa. Vol. 23, n. 4., pp. 407-414. Write, J. R. (2003) Introdução. In: Write, J. R. & Freeman, A. S. Terapia Cognitivo-comportamental em grupo para populações e problemas específicos(p. 23). São Paulo: Roca.