O concubinato e a mulher: a cultura jurídica no
Brasil colonial no século XVIII
Karolyne Mendes Mendonça Moreira
PIBIC/CNPq
Ricardo Marcelo Fonseca
Introdução/Objetivos: A presente pesquisa é fruto de um
complexo de indagações acerca dos traços da opressão do
gênero feminino e da cultura jurídica no século XVIII.
Elencando-se o concubinato enquanto lócus de observação
desses dois aspectos, buscar-se-á: i) uma visão diferenciada
a respeito da experiência jurídica pré-moderna e ii)
compreender se, em alguma medida, a interação entre
direito, imaginário e concubinato corroboraram com a
construção do cenário jurídico e social de opressão da
mulher brasileira. Para tanto, buscou-se compreender o
objeto de estudo com as seguintes etapas:
•Análise dos conceitos de cultura, cultura jurídica,
circularidade e circularidade da cultura jurídica;
•Compreensão da Cultura e do Imaginário no Antigo Regime
(Português e Meridional);
•Compreender a Cultura Jurídica do Antigo Regime
(Português e Meridional) e analisar os traços de exclusão da
mulher no Direito do Antigo Regime.
•Analisar o concubinato, sob a ótica da cultura jurídica do
século XVIII, buscando entender se esse espaço corroborou
com a construção do imaginário da mulher lasciva.
Método: Esta foi uma pesquisa eminentemente bibliográfica,
por ser realizada através da leitura de obras de Historiadores
do Direito e Historiadores sobre o assunto.
Referências Bibliográficas:
•BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento
•DEL PRIORE, Mary. Festas e utopias no Brasil Colonial.
•HESPANHA, Antônio Manuel. A constituição do Império português. Revisão
de
alguns enviesamentos correntes.
•_____________. Cultura jurídica européia: síntese de um milênio
•LONDOÑO, Fernando Torres-. A Outra Família: Concubinato, Igreja e Escândalo na Colônia.
Resultados/Conclusões: A análise do imaginário Português e Meridional por
intermédio dos festejos, com o suporte de Bakhtin e Del Priore, nos permitiu concluir
que havia uma dualidade, na prática e no discurso, em relação à promiscuidade das
mulheres. A promiscuidade da festa no Brasil do séc. XVIII é enganosa; os
comportamentos dos ali presentes são aceitos socialmente. Mas, todavia, existia
ainda uma legislação canônica que reprimia e condenava tais práticas; que produzia
discurso moralizante, que não refletia os princípios da ordem vigente e que
corroborava com a estigmatização do imaginário feminino. Ainda, através da
formulação de um novo significado à palavra concubinato, realizado pelo Concílio
Tridentino, pudemos observar o caráter criador (poiético) não só do Direito Canônico,
mas do Direito. O direito cria, produz valores, olhares e concepções sobre o que é
certo ou errado. Desse modo, compreendemos que o Direito Canônico teve sim o
seu papel fundamental na construção do imaginário pecaminoso e lascivo em
relação às mulheres daqui. Mas é importante ressaltar que não fora ele o único
responsável. Através da análise de Hespanha, observamos que havia uma imensa
peculiaridade presente na cultura jurídica do Antigo Regime dos Trópicos. Era uma
cultura extremamente plural, mais calcada na práxis, costumes e na imensa
variabilidade de corpos que diziam o direito. Logo, imperioso é dizer que não era o
Direito Canônico o único produtor de normas, e, consequentemente, o único a
corroborar com a lógica da estigmatização. Necessária, ainda, é a constatação de
que -contrariando as concepções que afirmam ser a cultura jurídica brasileira colonial
mero espelho da cultura portuguesa- tivemos a oportunidade de, através das
legislações que envolviam a prática do concubinato, concluir acerca da eficácia
própria e da característica autônoma das normatizações brasileiras. A
desclassificação das mulheres indígenas, por serem escravas e por sua identificação
com as mancebas portuguesas, deu à mancebia dos portugueses uma condição de
naturalidade, contrariando, assim, o disposto nas Ordenações advindas do Império e
corroborando com a produção de uma cultura jurídica própria. Um outro elemento
muito importante que nos permitiu compreender melhor a formação da simbologias
do ser mulher, reside na noção de “escândalo”, trazida por Londoño. A infâmia, o
escândalo e a perseverança no pecado representavam a prova necessária para que
por direito se pudesse proceder, sendo que a simples fama de concubinato não era
suficiente para pronunciar uma condenação. O escândalo pode, assim, ser
compreendido como uma estratégia no interior da comunidade para se conseguir
que ela se dissocie de algo aceito e passe a reprova-lo pela aceitação de uma nova
ordem de coisas, gerada e imposta – também pelo direito canônico- que visa
transformar-se em normas que estruturam a sociedade. Por fim, concluímos que a
devassa era o instrumento primordial na construção desse imaginário do escândalo.
Nela o concubinato aparecia como crime generalizado.
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O concubinato e a mulher: a cultura jurídica no Brasil