LITERATURA NA ESCOLA Eu entendo por lúdico na literatura, de uma forma geral, como o ato de jogar com o mundo por meio do poder recriador das palavras. No sentido de ludus – ludibundus – aquele que brinca, que se diverte, que subverte as normas. Isto é, como forma de expressão que recria o código, investe na expressividade das palavras em busca de novos sentidos e é sobretudo linguagem sugestiva que joga com a realidade, sem nunca querer dar conta dela, e por isso mesmo se oferece ao diálogo, à indagação e a um leque de múltiplas interpretações. A literatura é uma forma de saber, mas um saber singular que se diferencia dos outros domínios do conhecimento, porque recria e reinventa a realidade. Nesse sentido, é uma pena que a literatura seja utilizada e reduzida ao ensino de conhecimentos utilitários e pragmáticos, ficando de lado a sua força vital que é o exercício do imaginário - o conhecimento casado com o prazer, motivado pela sua natureza lúdica. “Uma concepção estreita da literatura, que a desliga do mundo no qual ela vive, impôs-se no ensino, na crítica e mesmo em muitos escritores. O leitor, por sua vez, procura nos livros o que possa dar sentido à existência. E é ele quem tem razão. /.../ O conhecimento da literatura não é um fim em si, mas uma das vias régias que conduzem à realização pessoal de cada um. O caminho da literatura tomado atualmente pelo ensino literário, que dá as costas a esse horizonte (‘nesta semana estudamos metonímia, semana que vem passaremos à personificação’), arrisca-se a nos conduzir a um impasse – sem falar que dificilmente poderá ter como consequência o amor à literatura.” A literatura em perigo, Tzvetan Todorov. A literatura revela o que falta no mundo e aquilo que nele deveria estar, no plano real ou no imaginário, que é de fato um modo de busca ou de recriação da vida nos caminhos da imaginação. “O que eu pediria à escola, se não me faltassem luzes pedagógicas, era considerar a poesia como primeira visão direta das coisas, e depois como veículo de informação prática e teórica, preservando em cada aluno o fundo mágico, lúdico, intuitivo e criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética... Alguma coisa que ‘se bolasse’ nesse sentido, no campo da educação, valeria como corretivo prévio da aridez com que costumam transcorrer os destinos profissionais, murados na especialização, na ignorância do prazer estético, na tristeza de encarar a vida como dever pontilhado de tédio...” Carlos Drummond de Andrade