“Olha, descobre este segredo:
uma coisa são duas – ela mesma
e sua imagem.”
Drummond
O sol é grande, caem coa calma as aves,
do tempo em tal sazão, que sói ser fria;
esta água que d’alto cai acordar-m’-ia
do sono não, mas dos cuidados graves.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
qual é tal coração qu’em vós confia?
Passam os tempos, vai dia trás dia,
incertos muito mais que ao vento as naves.
Eu vira já aqui sombras, vira flores,
vi tantas águas, vi tanta verdura,
as aves todas cantavam d’amores.
Tudo é seco e mujdo; e, de mestura,
Também mudando-m’eu fiz doutras cores:
E tudo o mais renova, isto é sem cura!
(Francisco de Sá de Miranda)
A idéia
De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites de uma gruta
Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas
Que, em desintegrações maravilhosas
Delibera, e depois, quer e executa!
Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida as cordas da laringe,
Tísica, Tênue, mínima e raquítica...
Quebra a força centrípeta que a amarra,
Mas de repente, e quase morta , esbarra
No molambo da língua paralítica
(Augusto dos Anjos)
A construção da imagem no poema:
• O sentido da narrativa
• A relação entre o desconhecido e a gruta.
• Utilização do eixo combinatório semântico:
nebulosas,misteriosas, gruta, estalactites.
• Utilização do estrato fônico: bruta, grutas, criptas,
Incógnitas.
“[...]Pode-se pintar uma idéia por meios de sons;[...]”
(Grammont. Em Le Vers Français, 2ª parte- Les sons consideres
comme moyens d’ expression”, p.193)
A língua paralítica
Octávio Paz em O Arco e a Lira afirma :
“[...]A imagem (poética) é uma frase em que a pluralidade de
significados não desaparece.[...]” p.130
“[...]A linguagem do poema, diferente da linguagem convencional,
não indica nem representa, ela apresenta.[...]”p.137
“[...] Saussure precisa primeiramente a respeito do signo: a língua não
é o reflexo da realidade (as palavras da língua não são etiquetas
colocadas sob as realidades do mundo), nem do pensamento (a
língua não traduz o pensamento que teria uma forma precisa
anterior a ela) [...]”
(Paveau, Marie-Anne, 2006, p. 70)
Definições de IMAGEM
• imagem - s. f.
• 1. Representação de pessoa ou coisa.
• 2. Figura ou efígie de um santo, da Virgem ou
de Cristo.
• 3. Semelhança.
• 4. Representação (no espírito) de uma ideia.
• 5. Infrm. Pessoa formosa.
• 6. Gram. Metáfora.
Alguns pontos – Alfredo Bosi
• Imagem é a sensação visual
• Aparência x Parecência
• Simultaneidade da imagem
• Valorização do Olho
• Analogias
Pequena crônica policial
Jazia no chão, sem vida,
E estava toda pintada!
Nem a morte lhe emprestara
A sua grande beleza...
Com fria curiosidade,
Vinha gente a espiar-lhe a cara,
As fundas marcas da idade,
Das canseiras, das bebidas...
Triste da mulher perdida
Que um marinheiro esfaqueara!
Vieram uns homens de branco,
Foi levada ao necrotério.
E quando abriram, na mesa,
O seu corpo sem mistério,
Que linda e alegre menina
Entrou correndo no céu?!
Lá continuou como era
Antes que o mundo lhe desse
A sua maldita sina:
Sem nada saber da vida,
De vícios ou de perigos,
Sem nada saber de nada...
Com a sua trança comprida,
Os seus sonhos de menina,
Os seus sapatos antigos!
(Mário Quintana)
Momento
O mundo é frágil
E cheio de frêmitos
Como um aquário...
Sobre ele desenho
Este poema: imagem
De imagens!
(Mário Quintana)
Referências
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ANJOS, Augusto dos. EU, e outras poesias por Antônio Houaiss. Ed.Livraria AGIR.
Rio de Janeiro, 1960.
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Cultrix, 1993.
CÂNDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema. 3ª Edição. São Paulo:
Humanitas publicações, 1996.
DICIONÁRIO PRIBERAM DA LÍNGUA PORTUGUESA. Disponível em:
http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=imagem
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MIRANDA, Francisco de Sá de. Sonetos. In: Obras completas. Lisboa: Sá da Costa
Ed., 1976)
PAVEAU, Marie-Anne. As grandes teorias da lingüística: da gramática comparada
à pragmática/ Marie-Ánne Paveau,Georges-Elia Sarfati; Trad. M. R. Gregolin et al.
– São Carlos: Claraluz, 2006.
PAZ, Octavio; Tradução de Olga Savary. Rio de janeiro. Nova fronteira, 1982
QUINTANA, Mário. 80 anos de poesia / Mário Quintana. Organização e Seleção
de Tania Franco Carvalhau. São Paulo: Globo, 2008.
SAUSSURE, Ferdinand de. Cours de Lingüistique Générale. 5ª ed.. Paris: Payot,
1962.
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