Direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos na esfera trabalhista Expositor: Flávio Henrique Freitas Evangelista Gondim Procurador do Trabalho Considerações iniciais - Revolução social, cultural e tecnológica: o surgimento de novos modelos de conflito de interesses; - Inaptidão do direito processual clássico para a resolução dos novos conflitos de massa; - Instrumentalidade do processo: a tutela jurisdicional coletiva como meio de facilitação do acesso à “ordem jurídica justa”; Necessidade de ruptura dos paradigmas individualistas/patrimonialistas inspiradores do processo civil clássico e criação de uma Teoria Geral dos Processos Coletivos; O acesso à justiça, tema dos mais caros aos olhos dos processualistas contemporâneos, não indica apenas o direito de aceder aos tribunais e deduzir pretensões jurídicas, mas também o de obter, por meio de um processo cercado das garantias do devido processo legal, a tutela adequada e efetiva de direitos lesados ou ameaçados de lesão. Na feliz expressão de Kazuo Watanabe, o acesso à justiça, quando concretamente alcançado, resulta no “acesso à ordem jurídica justa”. A “lógica” do processo coletivo (em apertada síntese): - tem como objeto direitos de uma categoria/classe/grupo/coletividade (diferentemente do que se verifica em relação ao processo individual, que tem como objeto direitos cuja titularidade recai sobre uma pessoa física ou jurídica concretamente identificada); - embora interessando a uma série de sujeitos distintos (identificáveis ou não), é deflagrado por iniciativa de uma pessoa/instituição/entidade legitimada por lei para agir na defesa dos interesses da categoria/classe/grupo/coletividade (doutrinariamente denominada de parte “ideológica”); - pressupõe a existência de mecanismos de representação judicial de direitos “alheios” e de extensão da eficácia subjetiva da coisa julgada a terceiros não integrantes da lide; Processo coletivo x litisconsórcio multitudinário Código de Processo Civil “Art. 6º – Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.” “Art. 472 – A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.” Tutela jurisdicional coletiva no direito comparado - Direito romano (antecedentes remotos da ação popular); - Direito inglês (bill of peace, século XVII); - Direito norte-americano (1842: primeira regra escrita sobre as class actions; 1938/1966: Rule 23 – Federal Rules on Civil Procedure); O sistema brasileiro de proteção aos direitos metaindividuais Evolução histórica da tutela coletiva no direito brasileiro - Constituição Federal de 1934 (previsão da ação popular - art. 113, XXXVIII) - Constituição Federal de 1946 (previsão da ação popular - art. 141, XXXVIII) - Constituição Federal de 1967/69 (previsão da ação popular - art. 153, XXXI) - LF n.º 4.717/65 - regulamentação, no plano ordinário, do procedimento aplicável à ação popular - LF n.º 6.938/81 - Política Nacional do Meio Ambiente LF n.º 7.347/85 - Lei da Ação Civil Pública (LACP) – ampliação do número de legitimados ativos (art. 5º) - Constituição Federal de 1988 (art. 129, III) - LF n.º 7.853/89 – Defesa das pessoas com deficiência - LF n.º 7.913/89 – Defesa dos investidores no mercado de valores mobiliários (autênticos interesses individuais homogêneos) - LF n.º 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente - LF n.º 8.078/90 – normas processuais do Código de Defesa do Consumidor (CDC) - LF n.º 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa - LF n.º 8.625/93 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados) - LC n.º 75/93 – Lei Orgânica do Ministério Público da União - LF n.º 8.884/94 – Lei Antitruste - LF n.º 10.527/2001 – Estatuto das Cidades - LF n.º 10.741/2003 – Estatuto do Idoso A evolução do tema no plano legislativo não foi marcada apenas por progressos. Ao contrário, apresentou e ainda poderá apresentar marchas e contramarchas. Entre os principais assaltos que a tutela coletiva sofreu nesse percurso sobressaem as restrições impostas ao objeto das ações coletivas por meio da Medida Provisória n.º 2.180-35 e a malsinada tentativa de “confinamento” dos efeitos do julgado coletivo aos limites da competência territorial do órgão judicante prolator, veiculada por meio da Lei Federal n.º 9.494/97. Constituição Federal “Art. 129 - São funções institucionais do Ministério Público: (...) III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;” Lei Complementar 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União) “Artigo 83 - Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: (...) III - promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos;” O MICROSSISTEMA DE “VASOS INTERCOMUNICANTES” FORMADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PELA LEI DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA, PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E PELA LEI DA AÇÃO POPULAR (entre outros diplomas) STJ – 2ª Turma – REsp 1108542/SC – Ministro CASTRO MEIRA – Publicado no DJe em 29/05/2009 “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA. ART. 19 DA LEI Nº 4.717/64. APLICAÇÃO. 1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário. Doutrina. 2. Recurso especial provido”. Veto presidencial ao art. 89 do CDC: irrelevância prática Conforme adverte a doutrina, o veto presidencial ao art. 89 do CDC, que declarava expressamente a extensão dos dispositivos do Título III daquele Código a todas as ações voltadas à tutela de direitos metaindividuais se relevou ineficaz, uma vez que continuaram vigentes as disposições inscritas nos arts. 110, 111 e 117 do mesmo diploma. Aplicação supletiva do processo comum ao microssistema normativo que disciplina a tutela jurisdicional coletiva A invocação supletiva do CPC jamais poderá significar um retrocesso na garantia dos direitos metaindividuais. Havendo lacuna no microssistema e dispondo o CPC de maneira conflitante com os princípios que orientam a tutela coletiva, deverá o intérprete “densificar” tais princípios em busca de solução que assegure a efetiva proteção dos direitos coletivos em jogo (sobretudo na esfera trabalhista). “Ainda que pareça contraditório, o “rigoroso” em matéria de direito processual coletivo é ser flexível.” (Antonio Gidi) Análise crítica do sistema normativo vigente - - Possibilidade de aperfeiçoamento; Necessidade premente de eliminação de barreiras “culturais” (sobretudo no Judiciário Trabalhista); O anseio de codificação das normas que disciplinam o processo coletivo Código-Modelo de Processos Coletivos para Ibero-América Aprovado em outubro de 2004; Participação de comitiva brasileira, composta por Ada Pellegrini Grinover, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, Antonio Gidi e Kazuo Watanabe; Anteprojetos do Código Brasileiro de Processos Coletivos - - Universidade de São Paulo (USP) e Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP); Programas de pós-graduação stricto sensu da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Estácio de Sá (UNESA); Projeto de lei n.º 5.139/2009 (oriundo do Ministério da Justiça) Disciplina a ação civil pública para a tutela de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos “Tipologia” dos direitos metaindividuais Aspectos terminológicos direitos X interesses Setores abalizados da doutrina têm criticado o emprego conjunto dessas duas expressões, atribuindo tal equívoco a uma desastrada tentativa de incorporação, ao direito pátrio, da figura dos “interesses legítimos”, instituto que, no direito italiano, se contrapõe à noção de “direitos subjetivos” Aspectos terminológicos direito = interesse juridicamente reconhecido Aspectos terminológicos A dupla acepção da expressão “direitos coletivos” STF, RE n.º 163.231/SP (Relator Ministro Maurício Corrêa) “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. (...) 4. DIREITOS OU INTERESSES HOMOGÊNEOS SÃO OS QUE TÊM A MESMA ORIGEM COMUM (art. 81, III, da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990), CONSTITUINDO-SE EM SUBESPÉCIE DE DIREITOS COLETIVOS. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. (...) Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.” (destaques da transcrição) DIREITOS E INTERESSES ESSENCIALMENTE COLETIVOS (difusos e coletivos stricto sensu) E DIREITOS E INTERESSES ACIDENTALMENTE COLETIVOS (individuais homogêneos) Crítica doutrinária ao entendimento de que os direitos individuais homogêneos constituiriam “direitos individuais passíveis de tratamento processual coletivizado” Definição legal das diversas espécies de direitos metaindividuais TÍTULO III – Da CDC Defesa do Consumidor em Juízo CAPÍTULO I - Disposições Gerais Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum; Aplicação dos conceitos estabelecidos no CDC em todas as esferas de proteção a interesses metaindividuais A expressa alusão feita pelo projeto de lei n.º 5.139/2009 aos direitos metaindividuais de caráter trabalhista Projeto de lei n.º 5.139/2009: “Art. 1o Regem-se pelas disposições desta Lei as ações civis públicas destinadas à proteção: I - do meio ambiente, da saúde, da educação, do trabalho, do desporto, da segurança pública, dos transportes coletivos, da assistência jurídica integral e da prestação de serviços públicos; II - do consumidor, do idoso, da infância e juventude e das pessoas portadoras de deficiência; III - da ordem social, econômica, urbanística, financeira, da economia popular, da livre concorrência, do patrimônio público e do erário; IV - dos bens e direitos de valor artístico, cultural, estético, histórico, turístico e paisagístico; e V - de outros interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos.” Decomposição analítica do conceito legal de direitos difusos Difusos “(...) transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato” * indeterminabilidade absoluta! Difusos Situações ensejadoras de lesão a direitos difusos (dentro e fora da esfera trabalhista): - - Lesão ao meio ambiente; - Veiculação de publicidade enganosa pela imprensa (falada, escrita ou televisionada); - Veiculação de conteúdo inadequado em programa televisivo; - Colocação no mercado de produto nocivo à saúde humana; - Lesão à moralidade administrativa; - Lesão ao patrimônio histórico, artístico e paisagístico; - Lesão ao patrimônio urbanístico; - Violação à regra do concurso público; - Inobservância das políticas de cotas para pessoas com deficiência; - Veiculação de anúncios de emprego de conteúdo discriminatório; - Infrações à ordem econômica; - Sonegação de contribuições previdenciárias; - Sonegação de FGTS; TST – 3ª Turma – Processo n.º 664850/2000.0 (RR) – Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira – DEJT em 04/09/2009 “2. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. A ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho visa a compelir a empresa a dar efetividade à norma inserta no art. 93 da Lei nº 8.213/1991; tem por escopo a contratação da cota mínima legal de empregados portadores de deficiência, na forma especificada pela legislação. Tem-se, assim, que o deferimento da tutela jurisdicional assegurará ao portador de deficiência o direito ao trabalho, com interferência direta nas relações entre empregados e empregadores. Patente a competência desta Justiça Especializada. Recurso de revista não conhecido. 3. ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. O Ministério Público do Trabalho tem legitimidade para o ajuizamento de ação civil pública que tenha por objeto a garantia de direito difuso, qual seja, no caso, o de assegurar a contratação de empregados portadores de qualquer tipo de deficiência, física ou mental, direito esse que se encontra resguardado pelo art. 93 da Lei n.º 8.213/1991. Recurso de revista não conhecido.” LACP, art. 1º, parágrafo único: “Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.’ TST – SDI-1 – Processo n.º 98903/2002-002-09-00 (RR) – Relatora Ministra Rosa Maria Weber Candiota da Rosa – DJET em 26/06/2009 “MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEGITIMIDADE. PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA VEICULAR PRETENSÃO ENVOLVENDO O FGTS. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 1º DA LACP. 1. No caso em exame, tendo em vista que a ação civil pública foi ajuizada para a defesa de direitos coletivos e individuais homogêneos de trabalhadores ligados às reclamadas, todas integrantes do mesmo grupo econômico, pela mesma relação jurídica base, notadamente o contrato de trabalho, presente, ainda, a nota da relevância social e da indisponibilidade, bem como o intuito de defesa do patrimônio social, consubstanciado na busca dos aportes necessários ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, tem-se como insuperável a necessidade de interpretação conforme à Constituição do parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/85, para reconhecer não só a propriedade da via eleita como a legitimidade do Ministério Público do Trabalho. (...) TST – SDI-1 – Processo n.º 98903/2002-002-09-00 (RR) – Relatora Ministra Rosa Maria Weber Candiota da Rosa – DJET em 26/06/2009 (continuação) (...) 2. Concorrem à viabilização da proposta de interpretação conforme à Magna Carta os métodos gramatical ou lingüístico, histórico-evolutivo, teleológico e sistemático, mediante os quais são alcançadas as seguintes conclusões: i) o parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/85, introduzido pela Medida Provisória 2.180-35/2001, veda a veiculação de pretensão envolvendo o FGTS quando vinculada a interesses meramente individuais, não abarcando hipótese como a presente, em que, para além dos depósitos nas contas vinculadas dos empregados, busca-se o resguardo do patrimônio público e social – escopo de cariz indivisível; ii) a finalidade dos idealizadores da Medida Provisória 2.180-35/2001 foi a de obstar a tutela coletiva nas ações a respeito dos índices de atualização monetária expurgados das contas vinculadas dos trabalhadores, questão já superada na atualidade e que nenhuma correlação guarda com a presente ação civil pública, manejada com a finalidade de garantir o aporte de recursos ao FGTS, mediante eventual condenação das rés na obrigação de regularizar os depósitos nas contas vinculadas dos seus empregados; e iii) o sistema de ações coletivas, em cujo vértice impera a Carta de 1988, expressamente garante ao Ministério Público a função institucional de promover ação civil pública na defesa do patrimônio público e social e de outros interesses difusos e coletivos, estes últimos tidos, na autorizada dicção da Corte Suprema, como gênero no qual se encontram os interesses coletivos em sentido estrito e os interesses individuais homogêneos. Embargos conhecidos e providos." Controvérsia em torno da formação do pólo passivo das demandas coletivas em que se combate contratação irregular de pessoal no âmbito do serviço público TST – Órgão Especial – PROC. Nº TST-AG-RC-195697/2008000-00-00.4 – Relator Ministro João Oreste Dalazen “RECLAMAÇÃO CORREICIONAL. DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL. INVIABILIDADE. 1. Em ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho para a defesa dos princípios da legalidade e da moralidade, de modo a garantir a observância da regra constitucional que condiciona a investidura em cargo ou emprego público à prévia aprovação em concurso público, não há lugar para a assistência litisconsorcial de empregados da empresa estatal requerida. Em sede de ação civil pública estão em jogo direitos transindividuais de que são titulares pessoas indeterminadas, o que não se coaduna com aplicação de normas processuais eminentemente concebidas para demandas de natureza individual, sob pena de se inviabilizar as ações coletivas. 2. Liminar em mandado de segurança que permite a intervenção de terceiros em ação civil pública é ato tumultuário da boa ordem procedimental, passível de suspensão mediante manejo de reclamação correicional. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” TST – SDBI-2 – PROC. Nº TST – ROAR-814.964/2001.2 – DJU de 20.08.2004 “RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE PROCESSUAL. Tratando-se de direitos difusos, transindividuais, de natureza indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas, inexiste campo propício à aplicação de normas processuais eminentemente concebidas para a citação em demandas de natureza individual, sob pena mesmo de se inviabilizarem as ações coletivas. Não se há de falar, no caso dos autos, em obrigatoriedade de citação dos eventualmente atingidos pelos efeitos da decisão proferida na referida ação coletiva, visto que o legitimado para figurar no pólo passivo da ação civil pública é aquele ou aqueles que praticaram o ato causador do dano, ou aquele que tinha ou tem o dever jurídico de evitar a ocorrência do dano. Recurso ordinário a que se nega provimento”. Atuação do MPT no combate aos anúncios de emprego de conteúdo discriminatório Decomposição analítica do conceito legal de direitos coletivos (stricto sensu) Coletivos (estrito senso) “(...) transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base” Coletivos (estrito senso) Anulação de cláusula de CCT; Não-fornecimento de equipamento de proteção coletivo; Invalidação de ato normativo veiculador de cerceamento a prerrogativa profissional; Pretensão de grupo de alunos do curso de Medicina de determinada Universidade à manutenção das atividades de Hospital Universitário; Elementos comuns à definição legal de direitos difusos e direitos coletivos (stricto sensu): transindividualidade e indivisibilidade Indivisibilidade (segundo Barbosa Moreira): situação “tipificada pelo fato de que a satisfação de um só implica por força a satisfação de todos, assim como a lesão de um só constitui, ipso facto, lesão da inteira coletividade” Conceito legal de direitos individuais homogêneos Individuais Homogêneos “(...) decorrentes de origem comum” - Lei Federal n.º 7913/89 – instituiu uma forma de class action para a tutela dos investidores no mercado de valores mobiliários; - Vítimas de acidente aéreo; - Colocação de veículo defeituoso no mercado; Casuística (na área trabalhista) - Sonegação de reajuste salarial; - Demissão em massa sem pagamento de verbas rescisórias; - Não-pagamento de adicional de periculosidade; - Manipulação de controle de jornada (com supressão das horas extras prestadas – diferenças pretéritas); - FGTS (depósitos pretéritos); - Rescisão indireta do contrato de trabalho de trabalhadores flagrados em condição análoga à de escravo (grupo móvel); Tutela coletiva de direitos individuais homogêneos: juízo de conveniência ou imposição legal? Interesses individuais homogêneos Tutela “atomizada” X Tutela “molecularizada” As virtudes da defesa coletiva de direitos individuais homogêneos - racionalização da atividade do Poder Judiciário (redução do número de processos e minimização do risco de decisões conflitantes); - o problema das lesões individuais que, isoladamente consideradas, são diminutas, mas que, coletivamente visualizadas, são imensas; Pressupostos básicos para o trato coletivo dos direitos individuais homogêneos: (segundo clássica lição de Ada Pellegrini Grinover) a) predominância das questões comuns de fato e de direito (homogeneidade); b) superioridade da tutela coletiva frente à tutela individual em termos de justiça e eficácia da decisão; Incorporação da orientação doutrinária à redação do PL n.º 5.139/2009 Projeto de lei n.º 5139/2009: “Art. 2o A tutela coletiva abrange os interesses ou direitos: (...) III - individuais homogêneos, assim entendidos aqueles decorrentes de origem comum, de fato ou de direito, que recomendem tutela conjunta a ser aferida por critérios como facilitação do acesso à Justiça, economia processual, preservação da isonomia processual, segurança jurídica ou dificuldade na formação do litisconsórcio.” Direitos individuais “heterogêneos”? TST – SBDI-1– Processo n.º 98903-2002-002-09-00 (RR) – Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi “AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITOS INDIVIDUAIS NÃO-HOMOGÊNEOS - ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO 1. Conforme dispõe o artigo 81, inciso III, do CDC, são direitos individuais homogêneos aqueles decorrentes de origem comum. Quer isso dizer, a contrario sensu, que, verificada em certa hipótese não haver circunstância única - comum - de fato e de direito da qual decorram as pretensões individuais, não há falar na implementação da figura. 2. Na espécie, pretende o Ministério Público obter determinação judicial para que a empresa vede a realização de horas extraordinárias além do limite legal de duas horas diárias e respeite os intervalos intrajornada de uma e entrejornada de onze horas (fls. 15/16). 3. O fato constitutivo do direito alegado (causa de pedir remota) não se resume à identidade do empregador origem comum apontada pelo parquet -, mas sim à eventual inobservância, por parte da Reclamada, de normas legais que guardam direitos individuais de cada um dos empregados. A causa de pedir remota - fática - diz respeito, em verdade, à suposta situação experimentada, individualmente, por cada um dos trabalhadores da empresa. 4. Não se cogita, pois, da existência de certo aspecto fático-jurídico - origem comum - cuja demonstração daria ensejo ao reconhecimento de todos os direitos individuais em questão, a evidenciar sua homogeneidade. 5. Não há falar, portanto, em legitimação extraordinária do Ministério Público do Trabalho para atuar na condição de substituto processual.” Falta de legitimidade ativa ad causam x Falta de interesse de agir Situações de fraude à relação de emprego e pedido coletivo de reconhecimento de vínculo Nos casos em que se combate fraude à relação de emprego (utilização, pelo empregador, de artifícios para sonegação de vínculo de emprego – desvirtuamento do instituto do estágio, utilização de mão-de-obra intermediada por cooperativa fraudulenta, terceirização de atividade-fim, falso trabalho autônomo, contratação por intermédio de pessoa jurídica etc.), é possível a formulação, em demanda coletiva, de pedido de reconhecimento de vínculo direto de emprego em benefício dos trabalhadores flagrados em situação irregular? Há, nesses casos, lesão a direitos individuais homogêneos? TST – 3ª Turma – Processo n.º 98903-2002-002-09-00 (RR) – Relatora Ministra Rosa Maria Weber Candiota da Rosa – DJ 26/06/2009 “RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. Ostenta o Ministério Público do Trabalho legitimidade para ajuizar ação civil pública para pleitear o reconhecimento de vínculo de emprego das trabalhadoras denominadas massagistas com o conseqüente registro nas CTPS´s, por se tratar de tutela de direitos individuais homogêneos. Violação dos arts. 6º, XII, da Lei Complementar nº 75/93 e 127 da Constituição Política configurada. Recurso de revista conhecido e provido.” Ação civil coletiva: o procedimento diferenciado previsto no direito brasileiro para a tutela coletiva de direitos individuais homogêneos Lei Complementar n.º 75/93 (LOMPU): “Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: (...) XII - propor ação civil coletiva para defesa de interesses individuais homogêneos;” Para viabilizar a tutela eficaz dos interesses individuais homogêneos, o legislador brasileiro instituiu a chamada ação civil coletiva, cujo disciplinamento se encontra estabelecido no art. 92 e ss. do Código de Defesa do Consumidor. Inspirada nas class actions norte-americanas, a ação civil coletiva permite que situações idênticas e de origem comum, naturalmente ensejadoras de múltiplos e análogos litígios individuais, sejam tratadas – segundo feliz expressão de KAZUO WATANABE – numa perspectiva “molecularizada”, o que contribui, sensivelmente, para a racionalização da atividade do Poder Judiciário. O que se pleiteia na ação civil coletiva é a emissão de uma declaração de responsabilidade genérica (CDC, art. 95), para que os interessados promovam, futuramente, as competentes ações de liquidação e execução (CDC, art. 97). Com base nesse título judicial coletivo, que já terá reconhecido a existência da dívida (an debeatur) e a responsabilidade do(s) réu(s) pelo seu adimplemento (quis debeati), bastará a cada um dos interessados comprovar que se enquadra no provimento-tipo emitido no bojo desta ação civil coletiva (cui debeatur) e demonstrar, através de simples procedimento de liquidação por artigos, os valores que lhes são devidos (quantum debeatur). Fica deferida para esse segundo momento a verificação dos prejuízos pessoalmente sofridos por cada trabalhador e a quantificação do respectivo crédito. Com a prolação de um provimento jurisdicional de caráter coletivo, obtém-se o alívio da sobrecarga do Judiciário e a certeza de que situações análogas receberão tratamento uniforme. LUIZ PAULO DA SILVA ARAÚJO FILHO (in Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2002): “o Código de Defesa do Consumidor criou um sistema peculiar para as ações coletivas em defesa de interesses individuais homogêneos, permitindo aos entes legitimados pelo art. 82, quando a origem comum estabelece a homogeneidade dos interesses individuais e divisíveis em jogo (art. 81, III), a formulação de pedido de condenação genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados (art. 95). A verificação dos danos pessoalmente sofridos e a determinação do valor das respectivas indenizações, para posterior execução, todavia, será objeto das ações de liquidação da condenação genérica, a serem ajuizadas pelos interessados, nos termos do art. 97”. Disciplina legal (CDC) Título III – Da Defesa do Consumidor em Juízo Capítulo II Das Ações Coletivas para a Defesa de Interesses Individuais Homogêneos “Art. 91 - Os legitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, de acordo com o disposto nos artigos seguintes”. Disciplina legal (CDC) “Art. 94 - Proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte dos órgãos de defesa do consumidor”. “Art. 95 - Em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados”. Controvérsia doutrinária em torno do cabimento da ação civil coletiva no processo do trabalho Posicionamento de Ives Gandra da Silva Martins Filho Posicionamento de Carlos Henrique Bezerra Leite e Manoel Antonio Teixeira Filho O tema na jurisprudência das Cortes Trabalhistas TST A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que não cabe ação civil pública para cobrar o recolhimento do FGTS atrasado de trabalhadores, pois essa destina-se à solução dos grandes conflitos socioeconômicos e não da reparação da lesão passada. A decisão foi adotada no julgamento do recurso da empresa L.G. Engenharia, Construção e Comércio Ltda, contra a qual o Ministério Público do Trabalho propôs ação para cobrar o recolhimento de parcelas atrasadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, de outubro de 2002 em diante, dos atuais e ex-empregados. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF e Tocantins) havia decidido pela legitimidade do Ministério Público, por se tratar de um fundo público cujos recursos são destinados à política de desenvolvimento urbano, porém a Quarta Turma do TST deu provimento parcial ao recurso da empresa para declarar a ilegitimidade do MPT nessa ação. “A ação civil pública, pela natureza de ação cominatória (imposição de obrigação de fazer ou não fazer, sob pena de pagamento de multa) ou condenatória genérica (indenização para um fundo genérico de reparação dos interesses lesados), não tem feição reparatória, pois seria impossível a reparação individualizada de um conjunto indeterminado de lesados”, disse o relator, ministro Ives Gandra Martins Filho. O objetivo da ação civil pública, afirmou, é solucionar o problema da lesão em relação ao futuro, impedindo que se perpetue no tempo uma situação contrária ao ordenamento jurídico. O ministro ressaltou que a ação civil coletiva visa, justamente, à reparação da lesão que já ocorreu, relacionada à defesa dos interesses individuais homogêneos, como é evidente nessa ação do MPT. O pedido feito nela refere-se a fatos passados e com sujeitos indeterminados, não cabendo a legitimidade do Ministério Público, nos termos da Lei 7.437/85, que trata da ação civil pública, afirmou. O ministro esclareceu que “interesses individuais homogêneos”, definidos na lei como “decorrentes de origem comum”, tratam de lesão que não é potencial, mas efetiva, como, por exemplo, empregados portadores do vírus HIV demitidos por esse motivo. No caso, a lesão demanda uma reparação determinada e o Código de Defesa do Consumidor criou instrumento idôneo para defender esses interesses, que é a ação civil coletiva, que supõe a habilitação dos lesados, para o recebimento da indenização a que fazem jus, esclareceu. Ives Gandra explicou que, por expressa limitação constitucional, a ação civil pública destina-se apenas à defesa dos interesses difusos e coletivos, “à solução dos macroconflitos socioeconômicos”. Interesses difusos, afirmou, supõem a existência de lesão a um bem usufruído por muitos, sem que se possa definir previamente os lesados. Assim, são típicas de caráter difuso as lesões ao meio ambiente, ao patrimônio histórico, aos direitos do consumidor. (RR 443/2004) Tutela de direitos individuais homogêneos na esfera trabalhista: ACP ou ACC? Entendimento do STF Entendimento pessoal Casuística Encerramento irregular de atividades da empresa (demissão em massa sem pagamento de verbas rescisórias); Declaração de nulidade de “acordo coletivo de trabalho” dispondo sobre renúncia a reajuste salarial (pedido de pagamento de diferenças salariais pretéritas); Manipulação de controle de jornada (supressão de horas extras); Declaração da responsabilidade de trabalhistas de determinada empresa; terceiro por créditos É necessário distinguir em que situações a propositura de ação civil coletiva pelo MPT poderá agregar proveito jurídico aos trabalhadores, projetando-os numa situação de vantagem Possibilidade de cumulação, numa mesma demanda, de pretensões típicas de ACP e de ACC - CPC, art. 292; - Como batizar a ação? - Necessidade de observância, quanto aos pedidos voltados à proteção de interesses individuais homogêneos, do procedimento estabelecido no CDC para a ação civil coletiva (sob pena de conversão da demanda coletiva num sucedâneo de reclamação plúrima); CPC, art. 292: “É permitida a cumulação num único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1.º São requisitos de admissibilidade da cumulação: I – que os pedidos sejam compatíveis entre si; II – que seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III – que seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento; § 2.º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, admitir-se-á a cumulação, se o autor empregar o procedimento ordinário.” CDC, art. 83 (princípio da não-taxatividade): “Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.” ACC x Reclamação plúrima * o caso específico dos Grupos Móveis A importância da correta identificação da natureza do direito lesado: reflexos na demonstração da legitimidade ativa ad causam * Crítica à utilização de linhas de argumentação excessivamente genéricas para justificar a legitimidade ativa ad causam do MPT Lesões “pluriofensivas” O lançamento de efluentes num rio (ato de poluição) pode causar danos ao meio ambiente (lesão de caráter difuso), a bens que pertençam a uma coletividade determinada (sede de uma associação) e também a um sujeito (propriedade ribeirinha) ou milhares deles individualmente considerados (intoxicação individual pela ingestão de água contaminada) Reflexos da questão na esfera trabalhista Legitimidade do Ministério Público para tutela de direitos individuais homogêneos Diversas correntes formadas em torno do tema: - 1ª corrente: propõe uma interpretação literal do art. 129, III, da Constituição Federal e do inciso IV do art. 1º da Lei Federal n.º 7.347/85; - 2ª corrente: admite a legitimação do MP apenas em relação a direitos individuais homogêneos indisponíveis (interpretação literal do art. 127, caput da Constituição Federal); - 3ª corrente: admite a legitimação do MP para a tutela de direitos individuais homogêneos indisponíveis e direitos individuais homogêneos disponíveis dotados de relevância social; Constituição Federal, art. 129: “São funções institucionais do Ministério Público: (...) III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;” Lei Federal n.º 7.347/85, art. 1º: “Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: l – ao meio-ambiente; ll – ao consumidor; III – à ordem urbanística; IV – a bens e direitos de valor artístico, estético, turístico e paisagístico; V – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo; VI – por infração da ordem econômica; VII – à ordem urbanística;” Constituição Federal, art. 127: “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” Constituição Federal, art. 129: “São funções institucionais do Ministério Público: (...) IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas;” O tema na jurisprudência do STF RE n.º 163.231/SP (Relator Ministro Maurício Corrêa) “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. (...) 4. DIREITOS OU INTERESSES HOMOGÊNEOS SÃO OS QUE TÊM A MESMA ORIGEM COMUM (art. 81, III, da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990), CONSTITUINDO-SE EM SUBESPÉCIE DE DIREITOS COLETIVOS. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. (...) Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.” (destaques da transcrição) RE 213.015 (Rel. Min. Néri da Silveira) – legitimidade do Parquet Laboral para pleitear, em ACP, a limitação a seis horas da jornada de trabalhadores da PETROBRAS submetidos a turnos ininterruptos de revezamento “Recurso extraordinário. Trabalhista. Ação civil pública. 2. Acórdão que rejeitou embargos infringentes, assentando que ação civil pública trabalhista não é o meio adequado para a defesa de interesses que não possuem natureza coletiva. 3. Alegação de ofensa ao art. 129, III, da Carta Magna. Postulação de comando sentencial que vedasse a exigência de jornada superior a 6 horas diárias. 4. A Lei Complementar n.º 75/93 conferiu ao Ministério Público do Trabalho legitimidade ativa, no campo da defesa dos interesses difusos e coletivos, no âmbito trabalhista. 5. Independentemente de a própria lei fixar o conceito de interesse coletivo, é conceito de Direito Constitucional, na medida em que a Carta Política dele faz uso para especificar as espécies de interesses que compete ao Ministério Público defender (CF, art. 129, III). 6. Recurso conhecido e provido para afastar a ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho.” (Rel. Min. Néri da Silveira, DJU de 24.05.2002 – destaques da transcrição) Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 394.180 (Rel. Min. Ellen Gracie) legitimidade do Parquet Laboral para pleitear, em ACP, a vedação à transferência compulsória de empregados do Banco do Brasil no Estado do Ceará “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS NA ESFERA TRABALHISTA. 1. Assentada a premissa de que a lide em apreço versa sobre direitos individuais homogêneos, para dela divergir é necessário o reexame das circunstâncias fáticas que envolvem o ato impugnado por meio da presente ação civil pública, providência vedada em sede de recurso extraordinário pela Súmula STF nº 279. 2. Os precedentes mencionados na decisão agravada (RREE 213.015 e 163.231) revelam-se perfeitamente aplicáveis ao caso, pois neles, independentemente da questão de fato apreciada, fixou-se tese jurídica no sentido da legitimidade do Ministério Público ajuizar ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos na esfera trabalhista, contrária à orientação adotada pelo TST acerca da matéria em debate. 3. Agravo regimental improvido”. (Rel. Min. Ellen Gracie, DJU de 10.12.2004 – destaques da transcrição) INFORMATIVO Nº 488 (Transcrições) Direitos Individuais Homogêneos - Ação Civil Pública - Ministério Público Legitimidade Ativa RE – 472489 RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO “EMENTA: DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. SEGURADOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. CERTIDÃO PARCIAL DE TEMPO DE SERVIÇO. RECUSA DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. DIREITO DE PETIÇÃO E DIREITO DE OBTENÇÃO DE CERTIDÃO EM REPARTIÇÕES PÚBLICAS. PRERROGATIVAS JURÍDICAS DE ÍNDOLE EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. EXISTÊNCIA DE RELEVANTE INTERESSE SOCIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMAÇÃO ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO”. INFORMATIVO Nº 504 Ação Civil Pública e Legitimidade do Ministério Público RE – 472489 O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil pública com o fim de obter certidão parcial do tempo de serviço que segurado tem averbado em seu favor. Com base nesse entendimento, a Turma negou provimento a agravo regimental em recurso extraordinário em que o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS sustentava ofensa aos artigos 127 e 129, III, da CF. Considerou-se que o direito à certidão traduziria prerrogativa jurídica, de extração constitucional destinada a viabilizar, em favor do indivíduo ou de uma determinada coletividade (como a dos segurados do sistema de previdência social), a defesa (individual ou coletiva) de direitos ou o esclarecimento de situações, de tal modo que a injusta recusa estatal em fornecer certidões, não obstante presentes os pressupostos legitimadores dessa pretensão, autorizaria a utilização de instrumentos processuais adequados, como o mandado de segurança ou como a própria ação civil pública, esta, nos casos em que se configurasse a existência de direitos ou interesses de caráter transindividual, como os direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Enfatizou-se que a existência, na espécie, de interesse social relevante, amparável mediante ação civil pública, restaria ainda mais evidenciada, ante a constatação de que os direitos individuais homogêneos ora em exame estariam revestidos, por efeito de sua natureza mesma, de índole eminentemente constitucional, a legitimar desse modo, a instauração, por iniciativa do parquet, de processo coletivo destinado a viabilizar a tutela jurisdicional de tais direitos. RE 472489 AgR/RS, rel. Min. Celso de Mello, 29.4.2008. (RE472489) De acordo com a jurisprudência do STF, os direitos individuais homogêneos: (a) constituem subespécie do gênero “direitos coletivos”; (b) podem ser tutelados por meio de ação civil pública; (c) quando socialmente relevantes (ainda que individualmente disponíveis), atraem, para a sua defesa em ACP, a legitimidade concorrente do Ministério Público. É absoluta a legitimação do Ministério Público para a tutela de direitos individuais homogêneos? Há uma distinção a ser feita: - direitos individuais homogêneos de natureza indisponível; - direitos individuais homogêneos de natureza disponível; Direitos individuais homogêneos de natureza disponível: a questão da relevância social O tema na jurisprudência do TST TST “EMBARGOS – VIOLAÇÃO DO ARTIGO 896, C, DA CLT – LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – INTERESSE SOCIAL RELEVANTE – DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. O Ministério Público do Trabalho tem legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos. A situação da sociedade cooperativa, em que se denuncia a fraude no propósito de intermediação de mão-de-obra, com a não-formação do vínculo empregatício, configura direito individual homogêneo revestido de interesse social relevante. Embargos conhecidos e providos.” (Processo TST-E-RR-473.110/98.4 – SDI-1 – Rel. Juiz Convocado Vieira de Mello Filho – j. 02.12.2002) TST “MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS – DEFESA – LEGITIMIDADE. Constitui entendimento consolidado nesta Corte e no STF de que o Ministério Público do Trabalho ostenta legitimidade para ajuizar ação civil pública, visando à defesa de direitos individuais homogêneos dos trabalhadores, dada a metaindividualidade de tais direitos. Isso porque, em decorrência de os mencionados direitos possuírem origem comum - ensejando o seu desrespeito, portanto, grave repercussão social - possível a sua defesa pelo órgão encarregado pela Constituição Federal de garantir a incolumidade da ordem jurídica. Precedentes. Recurso de revista não conhecido”. (TST – 1ª Turma – RR 1784/2003-011-08-00 – DJ 13/06/2008) A postura seletiva assumida pelo Ministério Público do Trabalho na tutela dos interesses individuais homogêneos de caráter disponível (e suas justificativas) Precedente n.º 17 do CSMPT (publicado no DJU em 18/10/2005) VIOLAÇÃO DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS – ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – DISCRICIONARIEDADE DO PROCURADOR OFICIANTE. Mantém-se, por despacho, o arquivamento da Representação quando a repercussão social da lesão não for significativamente suficiente para caracterizar uma conduta com conseqüências que reclamem a atuação do Ministério Público do Trabalho em defesa de direitos individuais homogêneos. A atuação do Ministério Público deve ser orientada pela “conveniência social”. Ressalvados os casos de defesa judicial dos direitos e interesses de incapazes e população indígena. A legitimidade do Ministério Público para tutela de interesse individual indisponível Constituição Federal, art. 127 “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” Posicionamento do STF RE 554088 AgR/SC - SANTA CATARINA AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. EROS GRAU Julgamento: 03/06/2008 Órgão Julgador: Segunda Turma EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. DEFESA DE DIREITOS SOCIAIS E INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS. PRECEDENTES. 1. A Constituição do Brasil, em seu artigo 127, confere expressamente ao Ministério Público poderes para agir em defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis, como no caso de garantir o fornecimento de medicamentos a hipossuficiente. 2. Não há que se falar em usurpação de competência da defensoria pública ou da advocacia privada. Agravo regimental a que se nega provimento. Decisão A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a Senhora Ministra Ellen Gracie. 2ª Turma, 03.06.2008. Posicionamento (vacilante) do STJ