TRIBUTOS: UMA CARGA PESADA Rita de Cássia Martins de Andrade Diante do esvaziamento do Congresso na campanha eleitoral, aliado ao clima de CPIs, vê-se, por assim, esgotados os prazos inicialmente previstos para a aprovação da PEC 285/2004, que trata de mais uma etapa da reforma tributária com a unificação das 27 legislações do ICMS, tendo como ponto importante o fim das concessões isoladas, trazendo como alternativa novos incentivos, como a criação de um fundo com recursos assinalados para obras de infra-estrutura, verba que atenderia principalmente os Estados e regiões menos desenvolvidas, pondo fim, assim, a famigerada guerra fiscal. Sabemos que sem um sistema tributário eficiente, todos os esforços funcionarão apenas como paliativos, e não terão força suficiente para reduzir a carga tributária de forma global no país. Visando emagrecer os impostos e contribuições do setor produtivo, o governo federal baixou a Medida Provisória de nº 252 conhecida como “MP do Bem”, transformada na lei 11.196/2005, que representou um certo incentivo à exportação de bens e serviços, mas ao mesmo tempo cria dificuldades de enquadramento, quando limita o número de empresas que podem se ajustar ao Regime Especial de Aquisição de Bens de Capital para Empresas Exportadoras- Recap e no Regime Especial de Tributação para Plataforma de Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação - Repes, os dois principais benefícios trazidos pela MP do Bem. O Recap reduz a zero as alíquotas de PIS/PASEP e Cofins nas compras internas e na importação de máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos novos destinados à incorporação no ativo imobilizado do beneficiário. Já o Repes autoriza a suspensão do PIS/PASEP e Cofins na importação de bens novos destinados ao desenvolvimento, do programa de softwares ou de serviços e tecnologia da informação, destinados à incorporação no ativo imobilizado do beneficiário. Nos dois casos, entretanto, somente as empresas que exportem 80% ou mais da receita bruta anual podem usufruir dos benefícios. A nova lei prevê, ainda, outros benefícios, dentre eles o prazo de até 240 meses para que municípios financiem suas dívidas com a previdência e permite que a venda e a compra de imóveis em até 6 meses seja isenta do Imposto de Renda sobre ganhos de capital. Além disso, amplia de dois para três anos o prazo de troca de carro por taxistas com isenção sobre produtos industrializados (IPI). De maneira que pelo tempo de debate dessa lei no Congresso Nacional, e pela propaganda que continua sendo feita pelo governo em torno da mesma, como um pacote de medidas de estimulo ao investimento, deixa muito a desejar, pois apesar da boa intenção, se trata de uma lei de aplicabilidade limitada, cujos maiores beneficiários são os grandes exportadores, os quais estão situados em setores produtivos bastante restritos e regionalizados na economia do país. Já no dia 29 de junho de 2006, o governo editou a Medida Provisória de 303, criando uma nova forma de parcelamento em condições especiais para devedores de tributos perante a União, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), chamado popularmente de Refis III, o que vem recebendo duras críticas, dos mais diversos setores da sociedade. Sustentam opositores à medida que sua adoção prestigia a cultura da sonegação, em detrimento dos contribuintes que optam por quitar suas obrigações fiscais em dia. Outros já não exercem o mesmo pensamento, pois será que à concessão do parcelamento é tão perverso assim? Mas será que todos os contribuintes inadimplentes agem de má-fé? Uma pergunta que, em situação de tributação normal, seria facilmente respondida. Mas que gera dúvida em casos como o nosso, onde Estado percebe quase metade do que produzimos. Onde o contribuinte do imposto renda pessoa física, conforme o caso, tem retido na fonte quase 28% do seu salário ou subsídio. Na verdade esses blocos de regras baixadas pelo governo federal são estratégias altamente superadas dentro do sistema tributário brasileiro, pois ao contrário do que apregoa, favorece apenas determinados setores da economia, sem o estímulo visível do investimento do país, e sem a redução da carga tributária no seu contexto nacional. 2 Já em 1994, quando escrevíamos como colaboradora dos Diários Associados, tivemos a oportunidade de destacar o trecho de uma entrevista do diretor-gerente do FMI, Michael Camdessus, quando da sua passagem pelo Brasil, o qual falou da economia brasileira e suas perspectivas, e na sua visão, sem o ajuste fiscal, o programa econômico de qualquer governo ficará coxo. Disse ainda que é necessário um sistema fiscal e tributário que permita enfrentar as necessidades básicas em termos de educação, saúde, formação profissional e infra-estrutura. “Não há país moderno sem um sistema tributário eficiente, ressaltou”. Sabemos que tecnicamente tanto o governo e FHC quanto o de Lula, concordam com a lógica desse pensamento, e desenvolvem internamente a mesma racionalidade, e em alguns momentos até mobilizaram forças para que a reforma fiscal fosse efetivada, mas as divergências políticas, a complexidade partidária, atreladas aos interesses difusos, não tem permitido que isso até agora viesse acontecer. Recentemente a Comissão de Finanças e Tributação aprovou o projeto de Lei 5477/01, que concede isenção do Imposto de Renda para aposentados com 70 anos de idade ou mais. A proposição é de autoria do Deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL). Vale lembrar que essa isenção era prevista na Constituição de 1988, mas foi excluída pela reforma da previdência (Emenda Constitucional 41/98). Tal projeto, se aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, constitui uma medida justa e pertinente, pois é imperiosa a isenção de imposto de renda ao idoso que já contribuiu com o Estado durante todo o período de sua força de trabalho. Tramita, ainda, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde receberá decisão terminativa, projeto de lei de autoria do Senador João Alberto Souza (PMDB-MA), que permite a dedução de despesas com medicamentos no Imposto de Renda Pessoas Físicas, avalia o senador que as despesas com medicamentos estão entre as providências mais importantes para a eficácia do tratamento de saúde. Outro fator apontado pelo parlamentar é a tendência cada vez maior ao envelhecimento da população brasileira, em função da queda dos índices de natalidade e do aumento da expectativa de vida, fatores que levam à elevação do consumo de medicamentos de uso contínuo. 3 Mais recentemente foi editada a Medida Provisória de nº 315, de 3 de agosto em curso, que trata do pacote cambial,e reduz de 15% para 0% a alíquota do Imposto de Renda sobre o leasing financeiro de aeronaves. A medida se aplica aos contratos feitos até dezembro de 2008. A alíquota permanecerá zerada até 2013. Hoje já existe a previsão legal de alíquota zero para aluguel e arrendamento mercantil de aeronaves. Mas esse tipo de contrato não permite à empresa a possibilidade de adquirir o bem ao final do contrato. Todos esses preceitos normativos postos, ou em processo de formação, envolvem uma avaliação de dupla ordem: num primeiro momento servem de alívio, de duração variável para alguns setores de produção e serviços, com o fim de atenuar uma situação emergencial, procrastinando uma crise. Já numa segunda análise, sabemos que a efetiva reforma tributária, de fato, não se reduz a essas frações de mudanças. É preciso que se defina um verdadeiro projeto de reforma tributária no país, com a supervalorização dos setores básicos de formação de uma grande nação, com incentivos a educação, saúde, infra-estrutura, e redução da carga tributária aviltante e pungente, e fundamental eficácia no combate à sonegação. Sem esses mecanismos, e, como já se fala em uma nova Constituinte, talvez se vislumbre uma mudança substancial no sistema tributário, mas enquanto isso repele-se por temerária ao regime democrático, toda a carga tributária patrocinada pelos governos, de forma direta ou indireta, a que somos compelidos a suportar. João Pessoa, agosto de 2006 Rita de Cássia Martins de Andrade 4