AS NUANCES DOS CARGOS DE GERÊNCIA E COMISSÃO ANTE A SUBORDINAÇÃO E AS CONSEQUENCIAS JURÍDICAS DO ROMPIMENTO DA CONFIANÇA THE SHADES OF MANAGEMENT POSITIONS AND COMMISSION BEFORE THE SUBORDINATION AND LEGAL CONSEQUENCES OF BREACH OF TRUST Thábata Biazzuz Veronese – Mestre em Direito Negocial – Unisalesiano e Funepe – [email protected] RESUMO O presente artigo destaca as nuances dos cargos de gerência e comissão, especialmente em relação à presença ou ausência de subordinação. Os empregados promovidos a gerentes e aqueles que recebem uma comissão maior em razão de uma função a mais assumida têm tratamentos distintos, mas ambos têm por base a confiança da relação jurídica instaurada entre as partes. A quebra desta confiança pode ocasionar a perda da posição e o retorno ao cargo anterior, sem que haja impedimento da lei. A linha tênue entre o cargo de gerência e o cargo em comissão pode gerar confusão por seus ocupantes, os quais adotam medidas que levam à sua destituição do cargo, sem saber os efeitos jurídicos acerca de seus direitos. Ante a grande ocorrência de casos concretos, incumbe investigar as particularidades que permitem a identificação clara de um ou outro cargo e as consequências jurídicas de sua destituição, fundada no rompimento de confiança. PALAVRAS CHAVES: gerente, cargo em comissão, subordinação, confiança. INTRODUÇÃO O histórico de desenvolvimento da legislação trabalhista mostra a necessidade de intervenção do Estado nas relações jurídicas laborais. Durante séculos a humanidade presenciou o descaso com a classe trabalhadora e o desrespeito ao ser humano, abusando da mão de obra e cometendo atrocidades contra as pessoas dos trabalhadores. Aos poucos, os movimentos sociais impulsionaram os primeiros gérmens do início da legislação trabalhista, até o reconhecimento dos direitos trabalhistas como direitos fundamentais, inclusive no Brasil. Hoje, a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT – regulamenta as relações trabalhistas e protege dentre estas aquelas que preenchem as qualidades do contrato de emprego, atribuindo um rol mínimo de direitos. Nem todas as relações de trabalho MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 1 são protegidas pela CLT, mas apenas aquelas consideradas como relações de emprego. Neste contexto, destaca-se a figura do gerente da empresa, o qual, assumindo uma posição de hierarquia, pode ter a supressão da subordinação do seu contrato. Outra imagem em evidência diz respeito ao cargo em comissão, no qual, embora haja uma atribuição maior de responsabilidades, não se esvai a subordinação. Muitas vezes a empresa nomeia um funcionário como gerente, sem que de fato ele seja. Ou, outras vezes, nomeia um empregado em um cargo de gestão, caracterizado pela comissão maior em razão da confiança inerente ao cargo, mas não se enquadrando como gerente. O problema reside na leitura da linha tênue que separa essas duas funções que não permite a identificação imediata de um ou outro. De qualquer modo, a confiança se apresenta como a base de ambas as relações contratuais. A perda da confiança pode ensejar a destituição do cargo e, com esta, a diminuição do salário e outras consequências jurídicas muitas vezes desconhecidas às partes. Diante do grande número de casos concretos e a surpresa das implicações jurídicas advindas da ruptura da relação, mister averiguar as nuances entre as duas funções, em um comparativo com os efeitos jurídicos em relação a cada uma destas, a fim de se esclarecer os reais direitos de um ou outro trabalhador. OBJETIVOS Como objetivo geral da pesquisa, pretende-se determinar a caracterização do contrato de trabalho e seus requisitos, demonstrando como a subordinação pode ser considerada o elemento essencial para se diferenciar uma relação de trabalho qualquer de uma relação de emprego. A temática enfatiza o tratamento jurídico do cargo de gerência e do cargo de comissão, ante a existência ou não de subordinação nestas relações. Pretende-se, especificamente, analisar as orientações traçadas em manuais e em artigos doutrinários que defendem a diferenciação das relações jurídicas trabalhistas em razão de sua interferência do superior hierárquico na prestação de serviço, e, tecendo-se aí a teia que envolve o presente tema, atingir os limites da destituição do cargo em razão da extinção da confiança inerente à ocupação da posição, bem como as consequências jurídicas no que tange a eventuais direitos MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 2 trabalhistas. METODOLOGIA A metodologia adotada no trabalho a ser realizado seguirá o método dedutivodogmático. Inicialmente, será abordado o reconhecimento da relação jurídica trabalhista como vínculo de emprego e a identificação dos requisitos do contrato de trabalho. Neste enredo, procurar-se-á analisar, de forma enfática, os contornos da subordinação, e sua presença ou ausência na relação jurídica existente entre a empresa e o cargo de gerente ou o cargo em comissão. O tema proposto demandará o uso da lógica dialética, que estuda as condições subjetivo-objetivas do conhecimento da realidade com o fim de alcançar a verdade objetiva. O método dedutivo será utilizado, haja vista que o projeto parte da hipótese tida como verdadeira de que a ausência de subordinação no cargo de gerência não se confunde com a maior responsabilidade existente no cargo em comissão, sendo que a linha tênue que separa os dois institutos deve ser bem delineada a fim de que evitar consequências indesejadas em razão do rompimento da confiança. Por fim, concatenando todos os dados pesquisados, através do silogismo das premissas delineadas, esboçar-se-á uma conclusão dedutiva lógica no sentido validar a diferença de regime jurídico do cargo de gerência e de comissão e suas consequências jurídicas. 1. CARATERIZAÇÃO DO EMPREGADO E DO CONTRATO DE TRABALHO Segundo o art. 3º da CLT, empregado é a pessoa física que presta serviços contínuos ao empregador, sob a subordinação deste e mediante pagamento de salário. Constituem requisitos do contrato de trabalho: empregado pessoa física, continuidade, subordinação, salário e pessoalidade. Para ser empregado, deve ser pessoa física. A continuidade significa a habitualidade ou não eventualidade na prestação de serviço. A subordinação significa a dependência do empregado em relação ao empregador, no sentido de cumprimento das ordens deste. Há a MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 3 necessidade de remuneração paga pelo empregador. E, por fim, a pessoalidade representa a contratação com certa e determinada pessoa em relação a empregador. Nos mesmos contornos, define-se o contrato de trabalho como o acordo expresso ou tácito entre empregado e empregador correspondente à relação de emprego. Explica-se que nem toda relação de trabalho é relação de emprego, sendo esta uma espécie da primeira. O resultado da combinação dos artigos 2º e 3º da CLT permite a identificação dos elementos necessários à configuração do contrato de trabalho, quais sejam, continuidade, pessoalidade, onerosidade, subordinação, alteração. A continuidade ou não eventualidade exige a prestação do serviço de forma habitual, para diferenciar do trabalho eventual. Onerosidade pede o pagamento de remuneração, para diferenciar do trabalho voluntário e trabalho escravo. Pessoalidade representa a prestação de trabalho por certa e determinada pessoa física, de forma infungível. Alteridade significa que o trabalho deve ser prestado por conta alheia, donde decorre a proibição de o empregador repassar os riscos do negócio para o empregado. E, a subordinação, como elemento mais importante, representa a existência de poder de direção, controle e fiscalização do empregador sobre a prestação de serviços do empregado. Além desses requisitos específicos, devem estar presentes os requisitos essenciais de todos os contratos, os quais se resumem em sujeito capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei. 2 CARGO DE GERENTE E CARGO EM COMISSÃO O empregado eleito diretor de sociedade, gerente, administrador ou outra denominação com a mesma função tem o contrato de trabalho suspenso, salvo se mantiver a subordinação, conforme Enunciado n.º 259 do Tribunal Superior do Trabalho e Súmula 269 do TST. Trata-se de um contrato de mandato, em que o gerente atua como representante do empregador pessoa jurídica, mas a responsabilidade permanece com o mandatário, ou seja, a sociedade empresarial. O cargo em comissão ou cargo de confiança atribuído a um empregado dentro da empresa pode ser um cargo de gerência ou um simples cargo de comissão em MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 4 que recebe um valor a mais na remuneração, em razão de uma responsabilidade maior assumida. A incumbência de uma tarefa de supervisão nem sempre significa necessariamente a ausência total de hierarquia. Pode ser que mesmo o empregado tendo um afazer de chefia, o que significa uma direção ou comando na empresa, exclui a hierarquia a seu superior. Em regra, a alta hierarquia dentro da empresa substitui o empregador, porque o cargo de confiança faz com que ele represente a empresa. Não está subordinado a horário e não tem estabilidade. Neste caso, ocorre a suspensão do contrato de trabalho. Quando a hierarquia persistir na relação entre o empregado e a empresa, ainda que este empregado receba o nome de gerente, verdadeiramente não o será, porque segundo o princípio da primazia da realidade vale mais a verdade real do que a formalidade. Neste caso, o contrato de trabalho é válido, sob a égide dos artigos 2º e 3º da CLT. O princípio da primazia da realidade diz que os acontecimentos reais são muito mais importantes do que os documentos (ALMEIDA, 2013, P. 36). De qualquer forma, seja gerente, administrador, cargo em comissão, ou qualquer outra denominação, a recondução ao cargo anterior não constitui ilegalidade. Isso independentemente de ser um legítimo gerente, o qual teve a suspensão do contrato de trabalho, ou se ainda vigente o contrato de trabalho mesmo com a função em comissão. 3 DISPARIDADES ENTRE O CONTRATO DE TRABALHO E O CARGO DE GERENTE E COMISSÃO Cargo pode ser definido como o posto ocupado pelo empregado na empresa, enquanto função consiste na atividade efetivamente exercida pelo empregado dentro da empresa. Segundo o princípio da primazia da realidade, a nomenclatura atribuída ao cargo não se apresenta suficiente para provocar efeitos jurídicos no contrato, uma vez que prevalece a realidade dos fatos em sobreposição à formalidade. Destarte, imprescindível a verificação da verdadeira função desemprenhada pelo empregado na empresa. MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 5 Assim, muitas vezes o empregado detém um cargo com o nome de gerente, administrador, supervisor, chefe, entre outros semelhantes, sem que realmente exerça uma fiel função de gestão ou confiança. Uma atividade de gestão será naturalmente de confiança, mas nem sempre uma função de confiança será exercida por um gestor. É possível que haja um cargo de gestão, em que o funcionário seja responsável por gerir um determinado setor e a prestação de serviços de seus respectivos funcionários, mas sem que haja necessariamente confiança. Pode haver outros funcionários responsáveis pela fiscalização, inclusive sobre este gestor. Se o empregado da empresa é eleito para exercer o cargo de diretor da sociedade ou se alguém este foi contratado externamente, para esse fim, a dúvida ao seu enquadramento persiste nas duas situações. A doutrina se divide. Segundo a teoria clássica ou tradicional, direção e subordinação são elementos excludentes entre si, havendo incompatibilidade entre a função do diretor e a posição do empregado. Para a teoria moderna ou intervencionista, pode haver contrato de trabalho entre o executivo escolhido como diretor e a companhia (DELGADO, 2010, p. 347-349). Na verdade, o contrato de trabalho tem implícita em sua natureza uma confiança genérica, também chamada de ordinária. A confiança especial ou extraordinária depositada ao gerente ou ao cargo em comissão constitui uma particularidade do cargo. 3.1 Confiança A confiança posta ao gerente lhe atribui poderes de representar a empresa, vinculando-a em relação aos compromissos assumidos. Por agir como se fosse o próprio titular da empresa, considera-se como uma extensão do empregador. Deste modo, não espera ordens do empregador, mas se dispõe a tomar as decisões por si, dando sequencia ao funcionamento da atividade empresarial. Não há uma definição legal de cargo de confiança, cabendo à doutrina a definição e identificação dos limites do exercício deste tipo de trabalho. O legislador faz apenas uma enumeração não taxativa desses cargos, ao estabelecer um critério geral no art. 62, II, da CLT, e um critério especial relativo aos empregados bancários, no art. 224, § 2º, da CLT. Em suma, são considerados gerentes os exercentes de MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 6 cargo de gestão e que recebam uma remuneração diferenciada com uma gratificação de função de no mínimo 40% a mais do salário respectivo (ROMAR, 2014, p. 152153). Embora o contrato de trabalho deva determinar as funções específicas do contratado, alguns poderes geralmente são repetidos nas jurisprudências para identificar a existência de confiança necessária ao reconhecimento do cargo de gerência. Citem-se, por exemplo, a capacidade de decidir sobre questões técnicas e ações gerenciais de estratégia que tenham relevância para a empresa, bem como possuir procuração com poderes de mandatário, e, principalmente, possuir subordinados e poder fiscaliza-los e aplicar-lhes penalidades em casos de descumprimento de suas obrigações. Perceba-se que o poder não é absoluto, mas apenas diferenciado dos demais trabalhadores. O ideal seria que todo contrato de trabalho, o contrato social ou o estatuto social da empresa estabelecessem claramente as especificações dos poderes concedidos aos seus administradores, gerentes, subgerentes, supervisores, etc. Assim, estar-se-ia evitando, ou ao menos, tentando-se evitar comportamentos de excessos ou desvios de poder, bem como a dificuldade de identificação do cargo e seu regime jurídico. O art. 62, inciso II da CLT preceitua que não se forma contrato de trabalho com os “gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial”. Para os bancários, não se aplica a norma do art. 62, II, da CLT, mas aquela contida no art. 224, § 2º, CLT, porque possuidores de uma confiança especial ou fidúcia especial. A diferença consiste que a confiança genérica do art. 62, II, da CT se aplica a qualquer atividade, enquanto a denominação de fidúcia especial é reservada para os bancários que exerçam função de direção, gerência, chefia, supervisão ou outra equivalente. 3.2 Subordinação Os seres humanos se organizam em grupos na sociedade para alcançar seus objetivos. Os grupos humanos em geral necessitam líderes competentes para sobreviverem, crescerem e desenvolverem seus recursos e potencialidades na MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 7 consecução de suas metas. Da mesma forma, as organizações sociais necessitam líderes competentes para sua sobrevivência, crescimento e desenvolvimento cabal de recursos e potencialidades no alcance de objetivos organizacionais. Nem todo cargo de direção será necessariamente de confiança. Mas, igualmente, não basta tratar-se de função técnica para que se considere, desde logo, afastada a hipótese de cargo dessa natureza. Não é certo, por igual, que o fato de o empregado ter poderes de representação o classifique só por isso, como exercente de uma função de confiança. (MARANHÃO, 2000, pág. 316) O fato do gerente não estar sujeito a um controle de sua jornada de trabalho não é suficiente, por si só, para caracterizá-lo como ocupante de um cargo de confiança. Neste sentido, o Ministro do TST João Oreste Dalazen, da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho não conheceu um recurso de revista interposto por uma empresa rural gaúcha, ao afirmar que "O cargo de confiança não se confunde com a mera chefia" (TST, RR 100/2001-771-04-00.8). Assim, o nome dado ao cargo pouco importa. Se a empresa rotula o empregado de diretor, mas permanece algum elemento do contrato de trabalho, principalmente a subordinação, nada irá mudar sua situação de empregado (MARTINS, 2014, p. 169). Neste sentido, já se pronunciou o TST na Súmula 269: SÚMULA 269 DIRETOR ELEITO. CÔMPUTO DO PERÍODO COMO TEMPO DE SERVIÇO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 O empregado eleito para ocupar cargo de diretor tem o respectivo contrato de trabalho suspenso, não se computando o tempo de serviço desse período, salvo se permanecer a subordinação jurídica inerente à relação de emprego. De fato, a subordinação, enquanto elemento imprescindível para a caracterização do contrato de trabalho e sua consequente submissão à CLT somente se considera ausente quando o trabalhador gerente possui ampla autonomia de decisão das questões de gestão da empresa, aliada à confiança especial que lhe é depositada, não sendo suficiente uma mera formalidade constante no papel do contrato de trabalho. 3.3 Particularidades MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 8 Os cargos de gerência e comissão que tenham afastada a subordinação, em razão da confiança empreendida na relação, devem ter um acréscimo na remuneração em razão da ampliação das tarefas e da responsabilidade. Por outro lado, devido ao maior leque de tarefas e da extensa responsabilidade, somado à exigência de grande competitividade inerente à hodierna sociedade moderna, o gerente ou ocupante de outra função de comissão trabalha além da jornada de trabalho ordinária de 8 horas diárias ou 44 horas semanais, conforme art. 58 da CLT. No entanto, a empresa tem o direito de não pagar horas extras pelas horas trabalhadas além da jornada de trabalho normal, em razão do adicional de 40% sobre o salário, como uma espécie de compensação. Neste sentido, o art. 62, II, da CLT determina que o cargo de confiança deva ser remunerado com uma gratificação de função correspondente a um acréscimo de 40% do salário respectivo. 4 O ROMPIMENTO DA CONFIANÇA E A DESTITUIÇÃO DO CARGO E SUAS CONSEQUENCIAS JURÍDICAS Confiança, de acordo com o dicionário Michaelis significa ação de confiar, segurança íntima com que se procede, crédito, fé; boa fama; segurança e bom conceito; esperança; familiaridade. Empregado de confiança, com que se pode contar em qualquer situação. Dar confiança a alguém significa permitir ser tratado com familiaridade ou com menos respeito que o devido. De confiança seria em quem se pode confiar. Tomar confiança representa tornar-se confiado, perder o respeito (MICHAELIS). A confiança própria dos contratos entre empresas e gerente exige respeito à política empresarial e estrita obediência à ética profissional. Os efeitos do contrato de confiança restringem-se aos direitos e garantias dos empregados comuns, excluindo-se a aplicação das normas celetistas, a irredutibilidade salarial, a inalterabilidade da função e o não pagamento das horas extras. A inalterabilidade contratual não se aplica ao cargo de comissão no que tange à possiblidade de reversão ao cargo anterior. O empregado comissionado interinamente ou em substituição eventual tem a garantia das vantagens do tempo daquele serviço e a volta ao cargo anterior. Para a reversão lícita, a ocupação deve MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 9 ser em comissão ou com gratificação de função, substituição do empregado de forma temporária e ciência do empregado da interinidade da função (VIEIRA, 2010). [...] o empregado que exerce cargo de confiança só pode ser considerado um tipo especial de empregado num ponto, a restrição de direitos trabalhistas que sofre, no mais nada diferindo do empregado comum, a não ser, também, pelas vantagens econômicas inerentes ao cargo (NASCIMENTO, 2003, p. 596). A quebra de confiança em razão de um comportamento destoante daquele bom sendo que se espera da pessoa contratada, pode acarretara consequências jurídicas desastrosas para o então gerente ou administrador ou outro cargo em comissão com a nomenclatura que receber. Comportamentos graves podem gerar não apenas a destituição do cargo, mas a rescisão do contrato por justa causa. Como exemplos de comportamentos graves cite-se o empregado que se vale da condição de gerente para usar notas fiscais de clientes para obter pontuação, veiculação de informação falsa, não fornecimento de crédito aos clientes, etc. Comportamentos leves seriam condutas não desejadas, mas que não caracterizam uma falta grave, ou, até mesmo, sequer poderiam ser faltas, como, por exemplo, o ingresso de ação trabalhista, que nada mais é do que o exercício regular de um direito. No primeiro caso, pode ensejar até mesmo a rescisão do contrato de trabalho por demissão com justa causa, o que retira muitas verbas trabalhistas rescisórias do empregado, o qual receberá apenas o saldo de salários e as férias vencidas. No segundo caso, a utilização do poder disciplinar do empregador pode impulsionar diversas penalidades, como uma advertência, uma suspensão ou até mesmo a demissão com justa causa em caso de reincidência. Mas o que parece mais comum consiste simplesmente na perda da função de gerência ou comissão, passando a assumir uma posição inferior na escala de hierarquia dentro da empresa. Nesta hipótese, o empregado não pode exigir a reversão ao cargo anterior, pois não possui estabilidade ou outra garantia. O art. 469 da CLT dispõe que não se considera alteração do unilateral do contrato de trabalho a determinação do empregador para que o empregado reverta ao cargo anterior, deixando a função de confiança. MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 10 Todavia, ao empregado destituído do cargo em comissão é assegurado a manutenção da gratificação da remuneração, se ocupara o cargo por mais de 10 (dez) anos, tendo em vista o princípio da estabilidade financeira, conforme inciso I da Súmula 372 do TST: O problema reside em que os artigos da CLT não definem claramente quem é diretor, gerente ou exerce mero cargo de confiança. O ideal seria que o legislador estabelecesse um único e claro conceito do que é cargo de confiança ou os elementos necessários para sua identificação (MARTINS, 2014, p. 206). A importância da identificação de gerente ou simples cargo de confiança reside nos efeitos da retirada do cargo. Se simples cargo de confiança sem subordinação, tem todos os direitos trabalhistas, como salário, férias, 13º salário, FGTS, etc., perdendo apenas a continuidade do recebimento da gratificação de função. Se gerente, não se trata de contrato de trabalho, o qual se encontra suspenso, e a retirada da gerência importa no retorno ao emprego se era empregado promovido, ou a extinção da relação de trabalho se não era empregado e foi contratado diretamente para a gerência. Mas para o gerente, embora suspenso o contrato de trabalho, o empregador pode recolher facultativamente o FGTS do período. No entanto, uma vez recolhido, deve fazê-lo durante todo o contrato. A diferenciação do tratamento jurídico em se tratando de gerente ou cargo de confiança, estando presente a subordinação e a confiança, ou não, justifica a necessidade de se identificar as características de cada caso concreto. Somente uma análise individual permitirá a aplicação de um direito justo. RESULTADOS Cumpridas as exigências formais em relação às atribuições exercidas pelo ocupante do cargo denominado de gerência, nem sempre o empregador cumpre a regra emanada do art. 62 da CLT. “(...) A denominação usada na empresa não é importante; a gerência pode ser no campo administrativo somente (em grande ou pequenas empresas) ou no administrativo e no técnico (geralmente só nas médias e pequenas empresas) (...)” (CARRION, 2012, p. 150). A consequência da violação concreta do referido dispositivo resulta em MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 11 decisões jurisprudenciais deferindo o pedido de horas extras a gerentes. Entre todas as matérias debatidas na Justiça do Trabalho, o cargo de gerente encontra-se entre os mais questionados, em razão das particularidades de cada caso concreto e dos contornos firmados em cada contrato de trabalho. Frisa-se, novamente, que o estudo se refere à gerência em geral do art. 62 da CLT, e não aquela dos contratos de trabalhos de bancários, própria do art. 224 da CLT, inclusive tratada na Súmula n.º 287 do TST. Portanto, para a ação trabalhista, por precaução, deve-se fazer o pedido alternativo, pleiteando ou as horas extras ou o acréscimo salarial de 40% não percebido, a fim de que o juiz declare a função efetivamente exercida e as verbas correspondentes as quais faz jus. Como exemplos colacionam-se as seguintes jurisprudências: EMENTA - HORAS EXTRAS - GERENTE – Tendo restado demonstrado que, não obstante o exercício de funções gerenciais, não percebia o reclamante salário nos moldes previstos no parágrafo único do art. 62 da CLT, devido o pagamento das horas laboradas excedentes à 44ª. hora semanal como extras. (TRT 4ª Região – Proc. 01159-2004-009-03-00-4 - JUIZ RELATOR: Maria Lúcia Cardoso de Magalhães - ORIGEM: 9a. Vara do Trab.de Belo Horizonte - RECORRENTE(S): Arapua Comercial S.A. e outra RECORRIDO(S): Robson Jose da Silva - DATA DA PUBLICAÇÃO: 12/02/2005). RECURSO ORDINÁRIO. HORAS SUPLEMENTARES. GERENTE DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL PANIFICADORA. Há confissão do preposto quanto ao excesso da jornada. Aplicação do art. 7º, inciso XIII, da Constituição Federal. Interpretação sistemática do disposto no art. 62 e incisos da CLT. Condeno porque estão presentes os pressupostos subjetivos e objetivos estabelecidos na Lei para essa finalidade. Alega que não faz jus às horas suplementares porque era gerente do estabelecimento, como está anotado na CTPS. E, alega, atuava com total autonomia. Traz jurisprudência. Desprovejo. Ainda que em tese, o fato de o recorrido atuar como gerente não exclui a remuneração da sobrejornada, nos termos do art. 7º, inciso XIII, da Constituição Federal. Mas o trabalhador era caixa/atendente. (TRT/SP, Processo n.º 00633200638102000. Presidente e Relator Carlos Francisco Berardo. São Paulo, 27 de Fevereiro de 2007). A jurisprudência tem reconhecido a máscara da função de gerente utilizada pelas empresas com o objetivo de não pagar horas extras, e, com isso, tem deferido o pagamento das horas extras e verbas trabalhistas reflexas, inclusive quando o empregado laborou como gerente. Evidenciada a fraude ou desvirtuamento da relação de emprego, quando a prestação de serviços por parte do diretor é feita co subordinação, atrai-se a aplicação do art. 9º da CLT, considerando-se nulo o mascaramento da MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 12 relação tida como de diretor-órgão da sociedade, sendo despiciendo o argumento de que haja representação pelo diretor em relação à empresa e irrelevante o fato de ter sido eleito para ocupar cargo de direção (MARTINS, 2014, p. 169). Infelizmente, na atual sociedade capitalista moderna, em que a empresa visa o lucro acima de qualquer coisa, as fraudes nas relações de trabalho são muito comuns. Por esse motivo, multiplicam-se as jurisprudências reconhecendo o pagamento de horas extras a trabalhadores que não são reconhecidos como gerentes, ou até mesmo a estes, dependendo das circunstâncias do caso concreto. CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho se propôs a levantar informações relevantes acerca da delimitação das características do cargo de gerência e outros cargos de comissão, identificando a linha tênue que separa a confiança e a subordinação da função de gestão e administração. A pesquisa se baseou na confiança da gerência em geral, prevista no art. 62, II, da CLT, e não daquela específica dos contratos de trabalhos de bancários, a qual tem um tratamento especial no art. 224 da CLT. Os contornos traçados em manuais e artigos científicos, aliados às previsões legais permitiram concluir que a subordinação constitui elemento essencial ao reconhecimento do vínculo de emprego, sendo que sua ausência impede a relação de trabalho, nos termos dos arts. 2º e 3º da CLT. Portanto, ao propósito de delinear a distinção entre o cargo de gerência e o cargo em comissão simples, os resultados alcançados demonstraram que nem sempre a nomenclatura do cargo corresponde à verdadeira função desemprenhada pelo trabalhador. A jurisprudência consultada demonstrou como os tribunais trabalhistas tem se posicionado acerca do tema, para desmascarar o rótulo de um cargo de gerência ou comissão, quando não o seja efetivamente, e condenar o empregador a pagar as horas extras. Outras decisões exigiram o reconhecimento da gerência ou comissão, diante da caracterização da confiança, e, em parte, exigiram o pagamento de horas extras, enquanto outras excluíram esta verba em razão do adicional de 40%. As linhas gerais da pesquisa permitiram concluir que, embora seja uma linha MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 13 tênue que separa o cargo de gerência de um cargo de comissão sem confiança, somente cada caso concreto poderá permitir a identificação de um ou outro instituto. De qualquer maneira, os jurisconsultos pátrios tem procurado fazer cumprir o papel de aplicar o Direito ao caso concreto no sentido de fazer justiça, determinando o pagamento das verbas devidas quando assim não o foram. A divergência faz parte da interpretação das normas jurídicas e é inclusive fundamento de muitos recursos. De todo o exposto, pode-se concluir que cada caso merece uma análise e um julgamento individualizado. Cada julgamento consiste em uma tentativa de aplicar satisfatoriamente o Direito de acordo com o seu fim último de fazer justiça. No fim, o que realmente importa é a evolução da legislação e da jurisprudência permitindo a construção de um Direito justo. REFERÊNCIAS ALMEIDA, André Luis Paes. Direito do Trabalho: material, processual e legislação especial. 12ª ed. São Paulo: Rideel, 2013. CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. Atualizado por Eduardo Carrion. 37ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. MARTNS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 30ª ed. São Paulo: Atlas, 2014. MICHAELIS. Dicionário. Disponível http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=confian%E7a. Acesso em 13/05/2015. em: MOSCOVIA, Fela. Competência interpessoal no desenvolvimento de gerentes. Revista de Administração de Empresas. Vol. 21. N. 2. São Paulo: Abril/Junho. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S003475901981000200002&script=sci_arttext. Acesso em: 14/05/2015. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho: história e teoria geral do direito / relações individuais e coletivas de trabalho. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. ROMAR, Carla Teresa Martins. Direito do Trabalho Esquematizado. Coordenador Pedro Lenza. São Paulo: Saraiva, 2013. SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho. 20. ed. atual. por Arnaldo Süssekind e João de Lima Teixeira Filho. São Paulo: LTr, 2001. TRT/SP. Recurso Ordinário. Processo n.º 00633200638102000, Presidente e Relator Carlos Francisco Berardo. São Paulo, 27 de Fevereiro de 2007. MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 14 TRT 4ª Região, Processo n.º 01159-2004-009-03-00-4, Juíza Relatora Maria Lúcia Cardoso de Magalhães, Data da publicação: 12/02/2005. VIEIRA, Max Antônio Silva. Cargos de Confiança: situação jurídica no contexto do Direito do Trabalho. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4106. Acesso em 15/05/2015. MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO – MANTENEDORA UNISALESIANO LINS – Rua Dom Bosco, 265 – Vila Alta – CEP 16400-505 – Fone (14) 3533-5000 Site: www.unisalesiano.edu.br - E-mail: [email protected] 15