Unidade IV
5
Unidade IV
10
15
20
8 TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO
8.1 Definição e conceituação
25
Negociar é uma prática antiga e mais comum do que se pensa.
30 Negociamos muitas vezes em nossa vida. Estamos negociando
não só quando compramos ou vendemos algo, nem esse ato se
35 restringe ao ambiente de trabalho.
As crianças negociam bastante e sabem empiricamente
como fazer, além de não temerem uma resposta negativa.
Porém, quando crescemos, crenças e ideias equivocadas
nos fazem pensar que só quem precisa saber negociar são os
profissionais de vendas e grandes empresários. Ledo engano!
Negociamos muito em várias situações profissionais e pessoais,
seja a data de entrega de um trabalho, na resolução de um
problema na escola dos filhos ou ainda para fechar um contrato
de trabalho.
Negociar não depende apenas de habilidades inatas. Técnicas
desenvolvidas por especialistas e baseadas no comportamento
humano e nas questões culturais podem ser aprendidas. E o
mundo corporativo necessita que seus profissionais, de qualquer
que seja a área, tenham condições de negociar, trazendo
benefícios para o desenvolvimento da empresa como um todo.
Esta unidade visa ajudá-lo a desenvolver habilidades de
negociação por meio de técnicas que vão deixá-lo mais seguro
no seu dia a dia profissional.
212
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
É importante deixar claro que negociar não é mesma coisa
que pechinchar ou insistir em alguma coisa, tentando vencer a
outra parte pelo cansaço.
Existem diversas definições e visões sobre o ato de negociar
que perpassam aspectos e enfoques dos mais diversos. Veja a
seguir algumas definições clássicas reunidas por Martinelli e
Almeida (1998): “negociação é um campo de conhecimento e
empenho que visa à conquista de pessoas de quem se deseja
alguma coisa” (Cohen, 2005).
“Negociação é um negócio que pode afetar profundamente
qualquer tipo de relacionamento humano e produzir benefícios
duradouros para todos os participantes” (Nierenberg, 1981).
Segundo Raiffa (1982), a negociação pode ser classificada
em ganha/perde (os resultados de uma parte são prejudicados
em detrimento da outra), ganha/ganha (resultado positivo
para ambos os lados) e perde/perde (ambos os lados saem
prejudicados).
Acuff (2004) também apresenta sua definição para
negociação: “uma coleção de comportamentos que envolve
comunicação, vendas, marketing, psicologia, sociologia e
resolução de conflitos.”
Há quem defenda que negociar implica o desejo de
conquistar alguém para se conseguir algo desejado,
estabelecendo um processo de ganho de vantagem sobre a
outra parte. Nesse caso em que o há o interesse de conduzir
o processo de negociação para a obtenção de vantagens e
ganhos específicos, o resultado pode ser uma negociação
do tipo ganha/perde. Porém, diferentemente desse tipo
de condução, o ato de negociar pode levar a resultados
vantajosos e até mesmo duradouros para ambas as partes.
Esse ponto de vista leva à ideia de que a negociação afeta
de forma profunda as partes e que todo o desejo está
213
Unidade IV
relacionado à satisfação de necessidades, o que estabelece
o início ou a possibilidade da negociação, resultando no
ganha/ganha.
Apesar das várias formas se definir negociação, bem como
da necessidade de se discutir o tema sob vários pontos de vista,
diversos estudiosos concordam com a ideia de que negociação
é um processo em que as pessoas atuam de forma a interferir
nos resultados que, por sua vez, dependem do desempenho dos
participantes.
Roger Fisher (1980) afirma que qualquer negociação, seja
em uma transação imobiliária, em uma situação corriqueira da
área de compras da sua empresa ou até em acordos políticos
internacionais, possui sete elementos-chave: comunicação,
relacionamento entre as partes, interesse, opções, formas justas
de convencimento, alternativas e compromisso.
Esses sete elementos pressupõem a ideia de que a negociação
demanda então um processo de análise de metas tangíveis,
emocionais e simbólicas, e ainda da observação e entendimento
de impactos no relacionamento e a obtenção dos resultados
esperados. O ato de planejar uma negociação traz uma visão
estratégica ao tema e coloca os negociadores estratégicos
em posição de vantagem sobre os negociadores comuns ou
convencionais. O planejamento da negociação segue regras
e traz benefícios, pois além de determinar as metas citadas
anteriormente, permite escolher a estratégia mais adequada à
situação.
8.2 Habilidades para a negociação
O negociador com experiência sabe que um de seus trunfos
é o bom-senso. O bom-senso se reflete, por exemplo, no
conhecimento de onde imprimir esforços para que não ocorra
perda de tempo. Além disso, a administração de conflitos,
levando-se em consideração interesses da outra parte, é
214
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
fundamental para se chegar ao fim da negociação obtendose os resultados esperados. Comunicação clara, percepção,
observação, princípios, saber ouvir, concentração nos objetivos
e flexibilidade são recursos rotineiramente utilizados pelo bom
negociador.
Além disso, o bom negociador não se desvia da sua ética e das
questões culturais das partes envolvidas, portanto contextualiza
para poder ter um entendimento claro da situação, dos interesses
comuns e das possibilidades de conflito.
Um negociador experiente cerca-se de informações e se
prepara para o momento da negociação. Portanto, o ato de
negociar pode ser planejado, o que traz mais segurança para
o negociador ao ter em mente opções e visão de como a
negociação poderá ser conduzida pela outra parte.
O estudo de Brodow que descreve as dez características mais
importantes do negociador bem-sucedido é comentado por
Martinelli, Ventura e Machado (2004).
Dez características mais
negociador bem-sucedido
importantes
do
Saber ouvir: esta habilidade favorece o recebimento de
todas as informações importantes para a negociação,
sem distorções.
Ter consciência da negociação: os bons negociadores
acreditam que tudo é negociável e por isso são
assertivos – são diretos e honestos, transmitindo uma
impressão de respeito por si próprios e pelos outros
- e aceitam desafios.
Ter aspirações: acreditam que podem conseguir chegar
a um resultado eficiente o que confere segurança ao
negociador.
215
Unidade IV
Ser investigativo: saber fazer as perguntas certas,
o que significa saber o que deve ser questionado e
quando.
Não ter medo de assumir riscos: assumir riscos
pressupõe disposição para enfrentar desafios que é
uma premissa básica de um processo de negociação.
Naturalmente, os riscos devem ser razoáveis o que se
traduz em uma negociação consciente.
Ser paciente: esta característica resulta no tempo
necessário para o negociador pensar sobre a situação
e aspectos importantes, tanto antes como durante a
negociação.
Ser flexível: novos fatos ou circunstancias podem
surgir durante a negociação, por isso, é necessário
que o negociador saiba se adequar às mudanças e aos
imprevistos. A elaboração antecipada de hipóteses e
a análise detalhada das premissas colaboram com a
manutenção da flexibilidade.
Focar na satisfação do outro: a satisfação da outra
parte é sinal positivo para a obtenção dos resultados
esperados. Portanto, a negociação exige foco nos
objetivos de todas as partes envolvidas.
Focar na solução de problemas: outro foco importante
para o negociador é a solução de problemas. Focar
nos problemas significa separá-los das pessoas,
eliminando qualquer possibilidade de interferência de
questões pessoais.
Ter disposição frente às adversidades para seguir em
frente: é necessário ter opções durante a negociação
para que o processo não resulte em um impasse. A
alta dependência de um único resultado e a falta
216
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
de flexibilidade para se aceitar mudanças de planos
são ingredientes perfeitos para o enfraquecimento
da negociação (Brodow apud Martinelli, Ventura e
Machado 2004).
8.3 Planejamento da negociação
O objetivo da negociação é o problema que deverá ser
resolvido e, portanto determiná-lo com clareza é fundamental
para o seu planejamento. Porém, a busca da solução do problema
requer que sejam levadas em conta quatro considerações, que são
igualmente importantes nesse processo. Observe atentamente
quais são e como evoluem estas ações:
• Problemas e pessoas: separe-os; o problema deve ser
separado da pessoa. Isso quer dizer que a concentração
do negociador deve estar no problema e não na pessoa
envolvida na negociação. É bastante comum não dissociar
a outra parte do objetivo que se pretende alcançar. Quando
não se separa as pessoas dos problemas, questões pessoais
acabam interferindo no ato da negociação, abrindo espaço
para as emoções e, por isso, dificultando o entendimento
das questões que estarão sendo discutidas.
• A concentração deve estar nos pontos de interesse: é de
suma importância colocar os interesses no ponto focal.
Além disso, o negociador deve entender quais são os
interesses de cada uma das partes envolvidas, identificando
quais são comuns e quais são conflitantes.
• Procurar alternativas de ganhos comuns às partes:
acomodação em um determinado ponto de vista, falta
de criatividade, falta de costume de olhar para diferentes
opções, receio de experimentar novas opções são os
motivos que levam as pessoas a se fixarem em apenas
uma ou poucas soluções para o mesmo problema.
Pensar em diferentes ganhos que possam ser comuns às
217
Unidade IV
partes envolvidas traz o benefício de se encontrar outras
opções de soluções satisfatórias e elimina a necessidade
de se fazer um acordo que não seja tão bom quanto o
esperado.
• Procurar critérios objetivos: esta etapa visa à conciliação.
Avaliar diversas soluções é o caminho que leva o
negociador ao melhor acordo possível, sempre tendo em
vista interesses em comum. Para isso, é necessário pensar
em padrões justos de comparação para as alternativas
que sejam de consenso entre os envolvidos. Opiniões
especializadas, emitidas por pessoas idôneas, uma prática
tradicional na área de atuação, e leis são alguns padrões
que podem ser utilizados para se chegar a um acordo
razoável e satisfatório.
O planejamento que compreende as considerações citadas
chama-se método de “negociação baseada em princípios” e
possui etapas que compreendem todo o período da negociação
que tem início no momento em que se começa a pensar nela
até o alcance dos objetivos desejados. Essas etapas são: análise,
planejamento e discussão.
Durante o período de análise, o negociador deve fazer um
diagnóstico da situação, ou seja, coletar informações relevantes
sobre o problema em questão, organizando-as e avaliando-as.
Já nesse momento é importante que o negociador separe o
problema da pessoa com quem vai negociar - o oponente. Além
disso, o negociador deve identificar quais são os interesses das
partes que estão envolvidas na negociação quais são os critérios
para o acordo.
A seguir, vem a etapa do planejamento, quando se busca ideias
e se toma decisões sobre o que fazer. Durante o planejamento, o
negociador deve ter em mente as quatro considerações já vistas:
como lidar como as pessoas e os problemas; quais interesses são
realmente importantes e devem ser considerados e atendidos;
218
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
quais opções existem para a solução do problema; e quais são
os critérios para a tomada de decisão.
Finalmente chega-se a etapa de discussão. Nesse momento
as partes se comunicam para o alcance do objetivo. Durante
a discussão, as partes têm condições de reconhecer e abordar
diferenças de percepção, sentimentos de frustração e problemas
de comunicação.
A negociação baseada em princípios é um método mais
eficiente que o método chamado de barganha posicional,
em que as partes se posicionam perante a situação, tomam
atitudes de defesa e fazem concessões para a finalização do
acordo.
É importante lembrar ainda que existem três variáveis em
qualquer tipo, importância e situação de uma negociação:
poder, tempo e informação.
O negociador que sabe quais opções existem para a
negociação, testa hipóteses, assume riscos calculados e considera
as informações obtidas, exerce o que se chama de poder positivo.
A forma positiva de poder traz autoconfiança e pode resultar em
acordos razoáveis para as partes.
O tempo deve ser analisado, pois afeta diretamente
o processo. O negociador define o limite de tempo para
a negociação e o controla, porém os prazos podem ser
negociados. É importante lembrar que é nos momentos que
antecedem o final do prazo que as pressões aumentam e
também que as concessões ocorrem. É também quando o
prazo limite se aproxima que pode acontecer a inversão de
poder entre as partes, uma vez que as circunstancias até
esse momento podem também ter se alteradas.
O poder também se estabelece com o conhecimento das
necessidades das partes, portanto, a obtenção das informações
219
Unidade IV
é ponto chave nas negociações. Não raro, boa parte das
informações é buscada em momentos de maior dificuldade
ou de crise. O bom negociador deve saber ouvir e entender a
comunicação não verbal para um bom entendimento da situação
e do contexto.
8.4 Estratégias de negociação
Diversos especialistas em negociação acreditam que o
ponto mais importante nas negociações é a construção do
relacionamento. O foco na construção do relacionamento facilita
a solução das controvérsias que provavelmente existam entre as
partes envolvidas. A solução das controvérsias é chamada de
conciliação. Mais uma vez, salientamos a importância em se
separar as pessoas dos problemas ou objetivos que levaram as
partes ao processo de negociação.
O relacionamento no processo de negociação deve
ser recíproco. O princípio de reciprocidade implica a troca
equilibrada de favores ou concessões. Essa condição requer
habilidade das partes para lidar com as suas diferenças o que
se traduz em:
• racionalidade de ambas as partes;
• compreensão precisa das diferenças de percepção;
• comunicação efetiva - com vistas ao alcance dos objetivos;
• autoconfiança e segurança;
• ausência de tentativas de coerção;
• entender que o outro é alguém de interesse na negociação;
• levar em conta a opinião de outro.
O fato é que muitas vezes as pessoas apenas levam em conta
o tipo de relacionamento existente entre as partes ao invés de
seguir uma estratégia. Seguir uma estratégia significa ter como
220
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
base regras específicas, guias de conduta. O mais comum é as
partes reagirem frente às situações ou até mesmo deixar que a
emoção fale mais alto do que a lógica.
A importância do relacionamento e a relevância do
resultado são os aspectos básicos que norteiam a elaboração
de estratégias de negociação. Dessa ideia surgem 5 tipos
básicos de estratégias possíveis, segundo Martinelli e Almeida
(1997):
• Estratégia de evitar: tipo de estratégia em que nenhum
aspecto é importante o bastante para se evitar o conflito
e por isso a tendência é que a uma negociação resulte em
perdas para ambas as partes (“perde/perde”).
• Estratégia de acomodação: neste caso a escolha é abrir
mão do resultado pretendido em favor da manutenção
do relacionamento, ou seja, uma parte perde (a que abre
mão) e a outra acaba ganhando (“perde-ganha”).
• Estratégia competitiva: neste caso uma das partes tenta
ganhar a qualquer custo em detrimento do alcance dos
objetivos da outra parte (“ganha/perde”).
• Estratégia colaborativa: nesta estratégia relacionamento
e resultados são priorizados, resultando em ganhos para
ambas as partes (“ganha/ganha”).
• Estratégia de compromisso: este tipo de estratégia é
bastante utilizada e retrata a situação de quando as
partes não conseguem atingir um nível satisfatório de
colaboração, mas almejam mesmo assim conseguir alguns
resultados.
Você deve estar se perguntando sobre como escolher o tipo
mais adequado de estratégia. Essa decisão deve se basear em
dois pontos considerados fundamentais:
221
Unidade IV
• nível de importância do resultado a ser obtido com a
negociação;
• nível de importância do relacionamento com a parte
oponente no passado, no presente e no futuro.
As estratégias também podem ser identificadas de acordo
com os papéis desempenhados pelos negociadores:
Negociador efetivo: é aquele que conhece em profundidade
os detalhes da negociação, documenta as posições das partes
e as ocorrências e fornece informações complementares. São
ainda muitas vezes insensíveis a reações emocionais, e podem
falhar por se deterem em demasia aos detalhes da negociação
pelo excesso de documentação, realismo e transmissão de
informações.
Negociador analítico: é aquele que se prende muito aos
argumentos e aos contra-argumentos, precisa ter certeza da
forma como a negociação é conduzida, além de permanecer em
uma posição fria, acreditando que a lógica responde a todas as
questões.
Negociador relativo: tem como ponto forte ser um facilitador
entre as partes, mantendo boas relações com no mínimo alguma
das partes; costuma ser sensível às emoções e consegue então
construir um bom relacionamento. Porém, corre o risco de se
envolver demais com a relação humana perdendo o foco dos
objetivos.
Negociador intuitivo: é criativo, tem habilidade para
enxergar opções, identificando com mais clareza os pontos de
relevância da negociação e tendo visão do todo. Porém, pode
se afastar da realidade por não perceber os riscos e problemas
de suas ideias.
222
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
A previsão de reações e a decisão sobre o melhor
comportamento a ser adotado durante o processo de negociação
devem se basear no entendimento do perfil dos diferentes tipos
de negociação.
8.5 Negociação e ética
Antes de começarmos este assunto é importante que o
conceito de ética esteja bem claro.
Da definição de ética encontrada no dicionário, os pontos
que vêm ao encontro do nosso estudo são “parte da Filosofia
que estuda os valores morais e os princípios ideais da conduta
humana”, “conjunto de princípios morais que se devem observar
no exercício de uma profissão” e “parte prática da filosofia social,
que indica as normas a que devem ajustar-se as relações entre
os diversos, membros da sociedade.”
Ética,
segundo
Michaelis:
o
dicionário
ética: é.ti.ca, sf (gr ethiké) 1 Parte
da Filosofia que estuda os valores
morais e os princípios ideais da conduta
humana. É ciência normativa que serve
de base à filosofia prática. 2 Conjunto
de princípios morais que se devem
observar no exercício de uma profissão;
deontologia. 3 Med Febre lenta e
contínua que acompanha doenças
crônicas. É. social: parte prática da
filosofia social, que indica as normas a
que devem ajustar-se as relações entre
os diversos membros da sociedade.
Portanto a ética estabelece parâmetros sobre certo e
errado, bom e mau na conduta das pessoas e na tomada de
decisões. A ética, então, é um ingrediente de alta relevância nas
negociações.
Você deve ter em mente que uma negociação é parte de um
processo competitivo em que as partes estão tentando conseguir
o melhor resultado – o acordo – possível, muitas vezes em
situações críticas. Existe a possibilidade dos oponentes lançarem
mão de atitudes pouco honestas, de acordo com seus pontos de
vista. A linha divisória entre o que se pode ou não deve ser clara,
pois só assim os oponentes poderão ter consciência dos limites
durante o processo.
O conhecimento da legislação e o domínio do livre arbítrio
direcionam o comportamento ético nos processos de negociação.
Esses dois aspectos delimitam o campo da ética e levam as
pessoas a definir os seus padrões. O comportamento ético se
estabelece quando se leva em consideração tanto as questões
223
Unidade IV
pessoais, quanto as sociais, além da observância da legislação
vigente.
8.6 Conflito
Para o nosso estudo sobre o que é conflito, as definições
propostas pelo dicionário on-line Michaelis que nos atendem
são: “Embate de pessoas que lutam.”; “Conjuntura, momento
crítico.”; “oposição.”; “Tensão produzida pela presença
simultânea de motivos contraditórios.”; “Competição consciente
entre indivíduos ou grupos que visam a sujeição ou destruição
do rival.”
A possibilidade de conflito está presente no dia a dia das
pessoas. Esta situação nem sempre pode ser evitada, portanto é
necessário entender suas causas e naturezas.
Pode-se encarar os conflitos tanto de forma negativa, como
positiva. Os indivíduos que encaram o conflito de forma negativa
são aqueles que acreditam que todo conflito é prejudicial e por isso
deve ser minimizado ou evitado a qualquer preço. Mas há aqueles
indivíduos que veem o conflito de forma positiva. Nesse caso o
indivíduo procura obter benefícios na situação de conflito, como
oportunidades de enriquecimento cultural e de aprendizagem. A
visão positiva do conflito também considera a existência de riscos,
que naturalmente devem ser minimizados, porém, tendo em vista
todos os benefícios que podem ser obtidos.
Processos de negociação geram situações de conflito, é
importante entender qual a sua origem e qual é a sua natureza.
A natureza dos conflitos pode assumir várias formas, como
diferenças de interesses, necessidades, opinião, personalidade,
metas, informação; a existência de atividades interdependentes;
a utilização de recursos compartilhados e muitas outras.
Se os conflitos não existissem, não haveria a necessidade de
negociação entre os indivíduos. A negociação, portanto, é um
224
Conflito
Michaelis:
segundo
o
dicionário
conflito: con.fli.to, sm (lat conflictu)
1 Embate de pessoas que lutam. 2
Altercação. 3 Barulho, desordem,
tumulto. 4 Conjuntura, momento crítico.
5 Pendência. 6 Luta, oposição. 7 Pleito. 8
Dissídio entre nações. 9 Psicol.: Tensão
produzida pela presença simultânea
de motivos contraditórios; segundo
a psicanálise, há em todo conflito um
desejo reprimido, inconsciente. 10
Sociol.: Competição consciente entre
indivíduos ou grupos que visam a
sujeição ou destruição do rival. C. cultural,
Sociol: incompatibilidade entre valores
culturais cujos portadores humanos
estabelecem contato. C. de atribuições,
Dir.: fato que ocorre entre autoridades
judiciárias e administrativas, quando
cada uma delas se julga, ao mesmo
tempo, competente para deliberar sobre
determinado caso. C. de jurisdição,
Dir.: questão sobre competência entre
juízes ou tribunais da mesma jurisdição.
C. de leis: a) divergência entre as leis
de diferentes estados ou jurisdições,
quanto aos direitos do mesmo indivíduo;
b) divergência entre as leis atuais de um
país e as que anteriormente regiam a
mesma matéria.
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
meio de solucionar os conflitos que surgem no dia a dia, seja no
trabalho ou em casa, e a interpretação do conflito é pessoal, de
acordo com as percepções do indivíduo.
Uma situação de conflito normalmente surge da vivência de
uma frustração ou da incapacidade ou insucesso no alcance de
metas e objetivos. A parte que sofre essa experiência negativa
faz uma projeção de sua frustração e passa a se comportar de
acordo com este sentimento.
Os conflitos normalmente nascem antes e durante as
negociações e precisam ser analisados de acordo com as
possibilidades de sua resolução. Veja a seguir a classificação dos
conflitos por Sparks (1992), que tem como base as possibilidades
de solução:
• Conflito terminal: este tipo de conflito aparentemente
não tem solução por meio de um acordo. Trata-se de um
conflito “ganha/perde”.
• Conflito paradoxal: neste caso, a solução do conflito é
questionável e com frequência o negociador entende
que o mesmo estava relacionado a uma questão que não
pertencia àquela negociação. Portanto o conflito não é
nem “ganha/perde” nem “ganha/ganha”.
• Conflito litigioso: aparentemente este conflito tem solução
e, por conseguinte, é um conflito “ganha/ganha”.
Depois de se analisar as possibilidades de solução do conflito
é necessário verificar a sua intensidade, classificando-os em
conflitos:
• Muito intensos: os interesses em questão são de alta
importância para negociador e oponente e por isso a
tendência é que as partes imprimam muita energia na
negociação.
225
Unidade IV
• Menos intensos: o grau de importância dos interesses
é bem menor, assim a tendência é que negociador e
oponente imprimam energia mais moderada para a sua
solução.
Administração de conflito
Acomodação, dominação, compromisso e solução integrativa
de problemas são as quatro formas propostas por Hampton
(1991) para a administração de problemas.
A acomodação pode ser usada para manipular o conflito,
por meio do seu acobertamento, o que se dá através da
diminuição da seriedade do problema, negando a sua existência
ou ainda tratando-se dele superficialmente. Questões culturais
direcionam a intensidade do uso da acomodação. A cultura
americana sugere a prática da confrontação, porém aplicam a
acomodação mais frequentemente. Já a cultura chinesa preza
a harmonia e evitam os confrontos abertos. Na acomodação o
problema pode ter seu grau de dificuldade aumentado por não
ter sido resolvido.
O extremo exercício do poder gera a atitude de dominação,
que se traduz na imposição da solução desejada por uma das
partes. O poder faz a solução chegar mais rapidamente, porém
não garante a sua eficácia. O exercício do poder pode acontecer
também quando se tem a ideia de que a derrota não pode
acontecer, pois poderá comprometer a obtenção de apoio em
negociações futuras. Algumas culturas aceitam a possibilidade
de forte exercício do poder e até mesmo atitudes radicais.
Compromisso é a ideia de que ambas as partes podem
ceder um pouco no processo de negociação com intuito de
solucionar o conflito, gerando resultados satisfatórios, mesmo
que parcialmente para todos. Porém, especialistas criticam essa
forma, não a considerando uma técnica por não ocorrer solução
plenamente satisfatória para as partes.
226
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
A técnica mais favorável é a solução integrativa dos
problemas por vislumbrar a possibilidade de solução satisfatória
para ambas as partes. Nesse caso a busca é de uma solução plena
para as partes, sem a necessidade de concessões e consequente
diminuição do grau satisfação dos envolvidos.
8.7 Estilos de negociação
O comportamento adequado para cada situação pode ser
definido com o conhecimento e entendimento de cada estilo
de negociação. Reconhecer os estilos que podem ser assumidos
pelos negociadores opositores colabora no desenvolvimento do
processo, de sua efetividade e, consequentemente, favorece a
condução da negociação. Isso porque muitos negociadores
agem muito mais com base em um estilo do que com base em
uma orientação.
É importante lembrar que os problemas que estarão em
pauta, o local onde vai ocorrer a negociação e mais outros
tantos aspectos são fatores de impactam no comportamentos
de todos os envolvidos.
Neste módulo vamos estudar os modelos propostos por Carl
Jung, Marcondes, Gottschalk, Matos, Márcio Miranda e Junqueira.
Esses modelos de estilos se apresentam normalmente de forma
combinada nas pessoas, que possuem sempre um estilo primário
e no mínimo um estilo secundário.
Modelo de Jung
O modelo desenvolvido por Carl Jung é baseado em estilos de
personalidade e discute quatro táticas que podem ser utilizadas
pelos oponentes, lembrando que essas táticas não são exclusivas
de cada personalidade e, portanto, podem se sobrepor.
Jung descreve quatro estilos primários, que podem se
sobrepor dois a dois, baseados em um conjunto de suposições,
que podem ser usadas pelos oponentes.
227
Unidade IV
Esta abordagem combina a capacidade de controle ou
aceitação do controle em de uma pessoa com relação à outra
com o nível de consideração ou desconsideração dessa pessoa
com os indivíduos do relacionamento.
• Controle: impulso para dominar e comandar o outro; o
indivíduo acredita que pode retificar a rivalidade.
• Desconsideração: impulso para desvalorizar o outro;
o indivíduo crê que a tolerância passiva é altamente
importante.
• Deferência: impulso para permitir que o outro domine;
o indivíduo crê na importância da impaciência e do
desinteresse.
• Confiança: impulso para incluir o outro; crê na importância
da colaboração.
Esses impulsos, ao se combinarem, produzem quatro
oponentes estilísticos – os estilos do modelo de Jung –
representados na figura 15 – que são:
• Estilo restritivo: retrata os negociadores que agem
segundo os seus interesses, combinando o seu poder
de controle com a desconsideração com o outro; não
são cooperativos e esperam que os outros ajam em seu
próprio interesse.
Aplicabilidade: adequado quando for fundamental se
chegar a um acordo.
• Estilo ardiloso: retrata o negociador que age sempre
com base em regras e procedimentos; a combinação
de desconsideração com deferência sugere que estes
negociadores sejam evitados.
228
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Aplicabilidade: adequado em ações rotineiras e muito
detalhadas ou ainda quando não for prioritário se chegar
a um acordo.
• Estilo confrontador: retrata os negociadores que trabalham
em colaboração; o confrontador combina o seu controle
com confiança no outro.
Aplicabilidade: adequado em situação que envolva altos
interesses.
• Estilo amigável: retrata o negociador que alia consideração
com confiança para a obtenção e manutenção de um
relacionamento cooperativo com o seu qualquer que seja
o resultado da negociação.
Aplicabilidade: adequado quando o objetivo é tranquilizar,
acalmar ânimos inflados, em casos que requeiram
diplomacia.
Impulso para
o controle
Restritivo
(1+2)
Confrontador
r (4+1)
Impulso para a
desconsideração
Impulso para
a confiança
Ardiloso
(2+3)
Amigável
(3+4)
Impulso para
deferência
Figura 15: os quatro estilos básicos do modelo de Jung
Fonte: MARTINELLI, D. P. (1998)
229
Unidade IV
Modelo de Gottschalk
Segundo Martinelli, Ventura e Machado (2004), Gottschalk
desenvolveu o conceito de estilos de negociação baseado
na análise de um conjunto de fatores que, se analisados
individualmente, não proporcionam muita ajuda, mas se vistos
em conjunto, permitem uma negociação mais eficiente. Esses
fatores incluem, por exemplo, impressões prévias, a impressão
inicial, o comportamento durante a negociação e outros.
Gottschalk cita quatro estilos totalmente diferentes, e ressalta
que todos nós somos atraídos naturalmente para um deles. Isto
não significa que esse estilo individual permanece o mesmo,
pois há também a tendência de se adaptar às circunstâncias da
mesa de negociação.
Estilo duro
O negociador deste estilo é agressivo, dominante e orientado
para o poder. Tem foco em tarefas, objetivos e prazos, costuma ser
direto, precisa dirigir e dominar. Apesar de saber o que quer, precisa de
ajuda para desenvolver um comportamento mais balanceado. Entre
os seus pontos positivos destacam-se as posições firmes e claras;
almeja o melhor; sabe com certeza quais são os seus objetivos; busca
manter o controle; não se deixa intimidar pelos conflitos; tende à
liderança; é competitivo e assertivo; não teme e gosta de mudanças
e reage bem às crises. Mas entre o seus pontos negativos destacamse o desconhecimento com relação aos interesses da outra parte e
falta de disposição para identificá-los, além de utilizar-se de coerção
e ser muito crítico, inclusive com os colegas do time e ter visão de
curto prazo.
Estilo caloroso
O negociador caloroso busca a resolução dos conflitos e almeja
construir e fortalecer os relacionamentos. É um bom ouvinte, o que
lhe permite uma boa visão das questões e do processo, e trabalha
230
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
baseado no relacionamento já existente. Tem perfil apoiador e
compreensivo e é orientado para pessoas e processos. Apesar de
parecer um estilo só com pontos positivos, por outro lado este
estilo tende a gerar menos lucros na negociação em si, pois tem
um foco em acomodar a situação e evitar perdas para o futuro,
além de aceitar perder o controle da negociação se isto acomodar
melhor a situação. Entretanto, ao se pensar em longo prazo, os
relacionamentos construídos por este estilo podem gerar recursos
por muito tempo.
Estilo dos números
Trata-se do negociador analítico, conservador, reservado e
orientado para a resolução de questões complexas. Por isso, prefere
que haja certa ordem e previsibilidade no processo. Quer ser
reconhecido como negociador competente e para isso lança mão de
análises detalhadas. A parte do relacionamento com vistas a longo
prazo normalmente não é levada em consideração, a não ser que
apoiada em números relevantes. O negociador aqui trabalha baseado
em fatos e não em percepções.
Estilo negociador
Quer ter o controle da situação e para isto estabelece
relacionamentos estratégicos. Tem perfil flexível e comprometido,
integrado e orientado para resultados. Busca reconhecimento
e apreciação pela sua capacidade de resolver situações difíceis.
Como negociador, aprecia ter o controle da situação e procura
estabelecer relacionamentos que resultem em resultados
satisfatórios para ambas as partes. Ao contrário do estilo
caloroso, não investe nos relacionamentos a não ser que seja
efetivamente uma vantagem para si.
Modelo de Marcondes
Este modelo aponta para a ideia de que para negociar é necessário
levar em consideração o ambiente e adaptar-se a ele. A observação
231
Unidade IV
do ambiente e sua correta percepção favorecem a adaptação
necessária. Nesse processo, a comunicação é instrumento chave
para que as partes possam trocar suas impressões em informações.
Marcondes descreve quatro tipos de negociadores baseados
em formas de classificação de comportamento. O modelo é
baseado em comportamentos que podem ser ativos, que são
aqueles que provocam uma ação sobre os outros para que estes
exponham seus pontos de vista e julgamentos, para então iniciar
uma argumentação de persuasão; e receptivos, que constroem
a negociação provocando a participação e o envolvimento do
outro com a sua questão. Marcondes postula que um bom
negociador frequentemente muda seu comportamento entre
ativo e passivo, fazendo a negociação evoluir em etapas.
Desses comportamentos, Marcondes classifica os estilos de
negociação:
Estilo afirmação
A assertividade é o instrumento do negociador para o
alcance dos seus objetivos. Para algumas pessoas, este estilo
é muito agressivo, pois deixa claro os desejos e expectativas,
as condições para negociar e frequentemente lança mão do
recurso de explicitar as consequências negativas para o outro
lado caso não se chegue a um acordo. Se este estilo for utilizado
em excesso, a outra parte considerará como uma imposição, e
os resultados podem trazer mais perdas que ganhos.
Estilo de persuasão
Informação e raciocínio direcionam o processo para o alcance
dos objetivos. Frequentemente fazem-se sugestões (ao invés de
determinações) e apresentam-se propostas argumentadas a
partir de dados concretos. Um negociador que adote este estilo
sem ter o respaldo de dados e justificativas, pode ser considerado
inconsistente, levando a negociação a um término (ou a um
232
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
acordo ruim). Por outro lado, este estilo exercido com muita
rigidez pode levar o outro lado a se sentir em uma armadilha,
pois não foi convencido o suficiente.
Estilo ligação
Empatia é o ponto de partida do negociador para a
compreensão dos objetivos da outra parte; o estilo ligação
abrange comportamentos como demonstração de apoio,
abertura para opiniões e sugestões, disponibilidade em escutar,
levar em consideração as posições e sentimentos da outra
parte, verificar o correto entendimento dos pontos e buscar por
acordos comuns. Não se trata de uma postura passiva, e sim
construtivista, visto que envolve a outra parte na construção da
solução do problema.
Estilo atração
Este estilo se utiliza de um conjunto de comportamentos para
provocar o envolvimento do oponente. Esses comportamentos
visam ao estímulo e motivação da outra parte, com o intuito de
elevar o seu moral, reconhecendo os próprios erros e limitações
e enfatizando as qualidades do outro. O risco é de assumir
este estilo com exagero, e criar uma percepção de tentativa
subjacente de sedução, o que pode colocar toda a negociação
em risco.
Estilo “destensão”
Estilo que busca a convergência em uma negociação o que
significa circunscrever o conflito, levantando os pontos que
possam resultar em um acordo ou interromper a negociação
por algum tempo para garantir a sua continuidade e resultados.
Dessa forma, em momentos de alta agressividade ou imposição
de força, o negociador tem a oportunidade de deixar mais claro
os pontos em discordância, voltar ao foco do embate, destacar
pontos importantes com transparência, resgatando a confiança.
No caso de interrupção da negociação, ou ainda em um período
de interrupção ou cenário de ataques e defesas, a obtenção da
233
Unidade IV
convergência pode se dar com a explicitação clara das posições,
proposição de soluções alternativas que sejam interessantes
para as partes, foco no conteúdo principal da negociação ou
até a proposição de interrupção da negociação. A expressão
“destensão” traduz a necessidade de diminuir a tensão originada
no conflito.
Uso dos estilos de negociação
Normalmente as pessoas têm dificuldade em saber qual o seu
estilo de negociação, porém a escolha do estilo mais adequado é
fundamental para um desenvolvimento eficaz.
É importante então que haja flexibilidade por parte dos
negociadores. A flexibilidade leva a melhores possibilidades de
solução dos conflitos existentes.
Portanto, há diversos estilos que podem ser mais adequados,
dependendo do perfil das partes envolvidas, do momento, da
situação e do próprio conflito.
Vamos verificar aqui os estilos para administração de conflitos
descritos por Hodgson (1996), baseados nas circunstâncias dos
conflitos e nos objetivos almejados. Esses estilos são divididos
em dois grupos (1) confrontadores e não confrontadores e (2)
cooperativos e não cooperativos. Observe a figura 16, logo a
seguir:
Confrontador
CONTESTADOR
Total envolvimento
(ganha/perde)
Não
cooperativo
COLABORATIVO
Solução de problemas
(ganha/ganha)
Compromisso
DA RETIRADA
Afastamento
(não-envolvimento)
DA ACEITAÇÃO
Encontrar um caminho
(ganha/perde)
Não confrontador
Figura 16: Conflitos X Objetivos
Fonte: Hodgson (1996)
234
Cooperativo
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Estilo colaborativo
Este estilo é simultaneamente confrontador e cooperativo
e por isso é adequado quando os interesses de ambas as partes
são igualmente muito importantes e requerem compromisso
mútuo. Muito esforço e tempo são requeridos e, portanto
é inadequado para questões do dia a dia ou de pouca
importância. Exemplo: negociação entre duas montadoras
de automóveis interessadas em formar uma joint-venture
para fabricação de motores e câmbios de utilização comum
entre as duas. A Fiat e a GM fizeram recentemente uma
joint-venture dessa natureza.
Estilo contestador
É também um estilo confrontador, mas não cooperativo. Pode
ser aplicado quando são necessárias ações rápidas e decisivas
(situações de emergência, por exemplo) ou em questões que
desagradam os interesses das pessoas envolvidas no processo.
Exemplo: negociação de corte de pessoal diretamente com as
gerências envolvidas.
Estilo de aceitação
É um estilo cooperativo e não confrontador. Adequado
quando o negociador percebe que está errado, ou quando
é importante garantir crédito no futuro, ou ainda quando
a questão que está sendo tratada é muito mais importante
para a outra parte. Trata-se de um obter um caminho para a
as demandas do oponente. Exemplo: negociação de aumento
salarial com o chefe, que oferece menos do que se pretendia,
mas que pode garantir o emprego.
Estilo de retirada
É ao mesmo tempo não confrontador e não cooperativo.
Tem aplicabilidade quando a questão que está sendo
235
Unidade IV
tratada é trivial ou quando prevalece a necessidade de não
confrontação. É o caso de quando o negociador tem pouco
poder, ou não existem muitas chances de obtenção dos
resultados almejados, ou a solução traga conflitos para outros
interesses do grupo envolvido. Assim, evitar o conflito pode
ser o melhor resultado a se obter, salvaguardando ganhos
e evitando-se prejuízos maiores. Exemplo: negociação de
aumento de preço com um varejista importante, que não
aceita o aumento.
Estilo de compromisso
Este estilo possui características de todos os estilos
anteriores. É apropriado quando os resultados pretendidos
são de importância relativa, ou não são vitais a ponto de
justificar a utilização de meios de alto confronto, ou ainda
quando a pressão exercida pelo tempo exija uma solução
imediata. É o caso quando as partes envolvidas não estão
plenamente satisfeitas com os resultados, mas estão
tranquilas com essa finalização. Para tanto é necessário que
haja certa dose de negociação e concessões e que isso seja
satisfatório. Exemplo: negociação de venda de automóvel
usado em que as partes atingem um preço que não é o
inicialmente pedido, mas que também não é o inicialmente
ofertado.
8.8 Negociação internacional
A globalização traz a necessidade das organizações
desenvolverem e aprimorarem técnicas de negociação voltadas
para interlocutores de diferentes culturas, etnias e crenças
religiosas.
Para se discutir negociações internacionais, é necessário
entender o contexto da globalização, os desafios da comunicação
intercultural e características dos negociadores de diversos
países.
236
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Globalização
Segundo Martinelli, Ventura e Machado (2004), o termo
globalização surge da necessidade de minimizar distâncias
e custos, atendendo interesses comuns e buscando o
contentamento de duas ou mais partes envolvidas localizadas
em regiões/ nações diferentes.
No período compreendido entre as duas guerras mundiais
no século passado (décadas de 1920 a 1940), os países europeus,
arrasados sob o ponto de vista social e financeiro, começaram
a se movimentar em busca de aproximação em torno de
interesses comuns de reconstrução e afirmação econômicas.
Após a segunda guerra mundial, em 1948, os Estados Unidos,
que haviam se firmado como potência econômica e militar no
período, assinaram junto com outros países o Acordo Geral
de Tarifas e Comércio (Gatt), criando um conjunto de regras
internacionais para nortear as transações comerciais entre
os signatários. O Gatt foi substituído pela criação da OMC
(Organização Mundial do Comércio) em 1994.
Na prática, a globalização só passou a ser reconhecida como
uma força no início da década de 1980, e sua importância vem
crescendo desde então.
O sociólogo canadense Marshall McLuhan, em 1969, cunhou a
expressão “aldeia global”, afirmando que o progresso tecnológico
estava reduzindo todo o planeta à mesma situação que ocorre
em uma aldeia: proximidade e facilidade de comunicação. Na
época, o conceito era baseado no fenômeno da televisão via
satélite. Com a evolução das tecnologias da informação e da
comunicação, principalmente da internet, o conceito encontrou
sua melhor aplicação: podemos nos comunicar por voz, dados,
texto e imagens com a maioria das pessoas no planeta.
Martinelli, Ventura e Machado (2004) afirmam que três fatores
formam a aldeia global: o avanço da tecnologia da informação,
a necessidade de novos compradores e a necessidade de novos
237
Unidade IV
fornecedores. Hoje, automóveis, cosméticos, alimentos, aviões e
outros produtos são produzidos com componentes oriundos de
diversos países, muitas vezes em continentes diferentes, e são
oferecidos no mundo inteiro.
Rhinesmith (1998) contribuiu para a discussão afirmando
que “O paradigma da globalização é a mudança das consciências
e comportamentos das pessoas”. Essa mudança nos traz ao
desafio da comunicação intercultural.
Multiculturalismo e os desafios da comunicação
No México, após séculos de miscigenação entre
descendentes dos antigos astecas e os descendentes
dos conquistadores espanhóis, há restaurantes finos
que não aceitam clientes descendentes de astecas
(Martinelli, Ventura e Machado, 2004).
Nos países islâmicos, homens e mulheres, quando
não se conhecem previamente, só se cumprimentam
com um aceno de cabeça, sem nunca apertar as mãos
(Costa e Sancovsky, 2005).
Recentemente, a TV Globo apresentou a novela Caminho
das Índias em que percebemos claramente (muito embora de
maneira dramaturgicamente exagerada) a questão das castas e
de que maneira isso interfere na relação com estrangeiros.
Há vários exemplos de situações semelhantes: fatores
culturais e sociais que afetam a comunicação (e, por conseguinte,
a negociação) com pessoas de outros países.
Acrescente ainda o fator língua e sotaques. Um brasileiro
fluente em inglês provavelmente vai ter alguma dificuldade em
entender claramente um indiano falando inglês.
E, se pensarmos em termos gerais, essas negociações não
ocorrem somente entre empresas. Há também negociações
238
Saiba mais: procure por referências
em sites de busca com as palavras-chave
“globalização e comércio internacional”
e “aldeia global”
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
envolvendo governos, ou representantes governamentais, e a
comunicação continua sendo um desafio.
Características dos negociadores de diversos países.
Alguns países têm importância maior no comércio mundial
e apresentam tradição em negociações internacionais. As
características a seguir não são regra, e sim fruto da observação
de diversos estudiosos do assunto.
Estados Unidos da América
O maior player global (talvez só superado pela China) tem
negociadores com estilo direto e duro, voltados para a ação e
decisão rápidas. É comum ouvir “Vamos pular as formalidades
e ir ao que interessa”. Aquilo que no Brasil é conhecido com
“quebra-gelo” (conversa amena para estabelecer contatos iniciais)
normalmente não encontra eco junto aos americanos. Eles
são competitivos, com tendência patriótica, e prefere decisões
rápidas. Costumam usar o primeiro nome, sendo superficialmente
amigáveis. O aperto de mão é firme, demonstrando poder. A
pontualidade é apreciada, e há a tendência de se pressionar por
processos acelerados (Acuff, 1998).
China
O segundo maior player mundial (talvez o primeiro quando
você estiver lendo estas páginas) tem um povo com o comércio nas
veias através dos séculos. Um ocidental desavisado se surpreende
com a habilidade dos chineses em negociações, provavelmente
por estarem em um regime político socialista. Assuntos políticos,
por sinal, não devem ser discutidos. Os chineses tendem a fazer
com que negociações durem dias, pois acreditam que podem
vencer pelo cansaço. É comum ocorrer rodadas de negociações
em mesas de restaurantes, onde se abordam questões pessoais
consideradas relevantes. Esse traço, das relações pessoais, é
importantíssimo para os chineses. Caso em uma comemoração
brindes ocorram, é considerado educado que o ocidental brinde
239
Unidade IV
com água (uma heresia para os padrões brasileiros). Presentes
são muito bem-vindos, e o respeito às tradições é altamente
considerado (Martinelli, Ventura e Machado, 2004).
Ao conduzir negociações com chineses é essencial
ter conhecimento da etiqueta chinesa para que
gafes consideradas imperdoáveis pelos chineses
não sejam cometidas. Algumas regras diretamente
ligadas às tradições e crenças chinesas são aplicadas a
formalidades relacionadas aos negócios. Ao negociar
com chineses, negociadores sempre devem ter cartões
de visitas em mãos no dia do primeiro contato.
Negociações sempre serão conduzidas primariamente
pelo funcionário em maior grau de hierarquia que
também sentará no lugar de maior destaque na mesa
de negociação. Pontualidade é um fator básico dentro
das negociações com chineses. Apesar desse caráter
relacional atribuído às negociações, contatos físicos
devem ser evitados. Atualmente demonstrações
públicas de afeto já são toleradas pelos chineses, no
entanto estas demonstrações podem não ser toleradas
quando veem de estrangeiros. (Fernandes, 2008)
Curiosidade: manual de sobrevivência - expressões em
mandarim
Chinês
Ni Hao!
Zaoshàng hão!
Huanyíng!
Wo shì Baxi Rén
Zàijiàn!
Duoshao qián?
Wo zhi néng fú...
Qing gei wo càidan.
Wo Yao Bing píjiu.
Maidan!
Português
Olá Tudo bem?
Bom dia!
Bem vindo!
Eu sou brasileiro.
Tchau!
Quanto custa?
Só posso pagar...
Menu, por favor
Eu quero cerveja gelada!
Conta!
Fonte: ACUFF, F L. Como negociar qualquer coisa com qualquer pessoa em
qualquer lugar do mundo. São Paulo: Edit. Senac, 1998
.
240
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
França
O francês normalmente tem boa base intelectual, possui
formação clássica e se considera o centro cultural da Europa. É
orgulhoso da sua nacionalidade e, naturalmente, aprecia a boa
mesa e viagens. A negociação dos franceses utiliza persuasão
e emoção. É comum haver conversações com fala baixa e
constante – eles adoram se expressar. Apreciam novidades,
desde que considerem de estilo interessante. O melhor horário
para negociar é durante o almoço, quando apreciam elogios à
culinária e vinicultura francesas. O aperto de mão é rápido, sem
muita pressão, e é costume utilizar os títulos/cargos, e não o
primeiro nome. Há muitas discussões e deliberações, portanto as
decisões não são muito rápidas (Martinelli, Ventura e Machado,
2004).
Reino Unido
É importante saber que a Grã-Bretanha é constituída pela
Inglaterra, Escócia e País de Gales, recebendo a denominação
Reino Unido ao se acrescentar a Irlanda. É de bom-tom não
confundir o cidadão inglês com o britânico. Os britânicos são
formais, pontuais e protocolares, e exigem que os interlocutores
também o sejam. Frios, metódicos e rápidos, os britânicos
possuem senso de humor peculiar: não é boa ideia tentar fazêlos rir (o risco de fracasso é grande), e é sempre bem-vindo rir das
piadas deles. Falar da cultura, dos animais e dos esportes é uma
boa forma de aproximação, mas é preciso evitar a proximidade
física: cumprimente estendendo a mão mantendo uma boa
distância do outro. Nunca critique a monarquia ou a família
real. A pontualidade é uma exigência importante: um atraso
de alguns minutos pode fazer a situação complicar (Martinelli,
Ventura e Machado, 2004).
Argentina
São passionais e buscam normalmente uma relação amigável
para negociar. Tendem à informalidade, mas mesmo assim
241
Unidade IV
exigem que no início da relação a tratativa seja pelo título/ cargo,
passando depois para o primeiro nome. Não discuta política
ou religião, pois são muito ligados a esses temas e qualquer
deslize pode encerrar uma negociação. A base cultural é grande,
e isso deve ser elogiado. Exigem detalhamentos em contratos
e acordos. Uma boa negociação pode significar negócios por
muito tempo, pois quando sentem confiança as portas se abrem.
(Acuff, 1998).
Alemanha
Alemães são rápidos nas negociações e exigem pontualidade.
As piadas sobre trens que saem às 14:38h da estação e que são
considerados atrasados se saírem às 14:39h são verdadeiras.
Há obsessão por controles rígidos, processos eficientes e
pontualidade, tanto para iniciar quanto para terminar uma
reunião. Um relacionamento profissional para se tornar amizade
enfrenta um processo longo e demorado. A hierarquia é
respeitada, e apreciam quem também respeita. Como é um país
de economia fundamentada na indústria, e como os alemães são
orgulhosos da excelência de seus produtos, falar elogiosamente
sobre automóveis, vinhos, cerveja e alimentos locais é considerado
de bom-tom. São muito formais, resguardando suas intimidades
aos muito próximos. As pessoas são tratadas pelo título (senhor,
doutor etc.) acrescido do sobrenome, confirmando a formalidade.
As negociações são duras e exigem uma pauta com sequência
lógica, sempre com vestimenta bastante formal. É imprescindível
demonstrar profundo conhecimento técnico daquilo que se
está negociando, pois qualquer deslize faz com que percam
a confiança na sua capacidade. Pessoas que demonstram
autoridade e organização são apreciadas (Martinelli, Ventura e
Machado, 2004).
Trecho de negociação internacional baseada na
influência cultural
Cumprimentos: os cumprimentos na Alemanha são
os mesmos de qualquer cultura, porém na língua
242
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
nacional, tais como: Hallo, Guten Tag (olá), Guten
Morgen (bom dia), Guten Abend (boa noite), Danke
(obrigado), Vielen Dank (muito obrigado), Bitte schön
(por nada), Willkommen (bem-vindo).
Os alemães são mais cerimoniosos, um simples
aperto de mão e às vezes um aceno ao cumprimentar
alguém é o suficiente para cumprir com a parte de
um relacionamento social. Beijos no rosto são para
familiares e amigos mais chegados.
Primeiro nome: os alemães dão muito valor ao status
e por isso, chamá-los pelo primeiro nome pode lhes
parecer invasão de privacidade. Ao telefone ou mesmo
em conversas são usadas palavras como: Herr (senhor),
Frau (senhora) ou Fräulein (senhorita) seguidos do
último nome transparecendo-se respeito, devido, aos
primeiros nomes serem utilizados geralmente para
familiares e amigos.
Além disso, os alemães gostam de ser reconhecidos
pelo título acadêmico, ou seja, é ideal dirigir-se
a estas pessoas como Herr Doktor (quando este
tem doutorado) e Herr Professor (quando for
professor).
Outra questão muito importante é a utilização do Sie
(a forma formal de dizer, você), sempre utilizado com
pessoas que não temos tanta afinidade, ao contrário
do Du (você, informalmente).
Tempo: na Alemanha, a pontualidade é um fator
cultural fundamental no processo de negociação,
se você chegar de cinco a dez minutos atrasado isso
já será considerado um ponto crucial para atingir
o sucesso da negociação. Caso haja algum motivo
para um atraso, o melhor a ser feito é ligar para a
243
Unidade IV
pessoa que está lhe esperando comunicando o fato e
posteriormente notificar seu atraso por escrito.
E, se necessário remarcar a data e horário de uma
reunião, prepare-se para uma explanação consistente,
pois, como mencionado, a pontualidade para os
alemães é algo sagrado.
Outro detalhe a ser observado, é o período de férias,
entre Julho e Agosto, pois estar in Urlaub (férias) para
alemães é importantíssimo.
Horário de trabalho: os alemães preferem que as
reuniões de negócios sejam marcadas entre as 10:00
e 13:00 horas e/ou das 15:00 as 17:00 horas. É
considerável evitar reuniões em tardes de sexta-feira,
pois em alguns casos os escritórios encerram suas
atividades entre as 14:00 e 15:00 horas neste dia.
Linguagem Corporal: Os alemães são pessoas mais
cerimoniosas, jamais cumprimente uma pessoa como
se faz no Brasil, beijando no rosto. E, quando se for
cumprimentar uma pessoa, simplesmente dê um
simples aperto de mão e jamais deixe a outra no bolso,
pois isto é tido como uma grande ofensa a eles.
Evitar encostar-se nas pessoas enquanto está falando,
e manter-se a certa distância da pessoa é ideal porque
os alemães são extremamente formais.
Os alemães não gostam que façam perguntas sobre a
sua vida pessoal, consideram este ato como invasão
de privacidade.
Senso de humor: algo muito curioso é o humor dos
alemães, que varia conforme o tempo. Assim, no verão
as pessoas ficam mais felizes e bem humoradas.
244
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Logo, não há como ser diferente, no inverno, onde as
16:00 horas já é noite, assim ficam mais quietos, de
cara fechada, entretanto no verão a hora do pôr do
sol é às 22:00 horas. Mas de forma geral, os alemães
sorriem pouco.
Idioma: o alemão padrão, ou seja, o Hochdeustch é a
língua oficial da televisão, dos negócios, dos jornais,
mas a língua alemã é rica em dialetos, está também
presente na forma escrita, em muitos casos com o
dialeto pode-se reconhecer o lugar de origem do
alemão, todos os alemães possuem orgulho da cidade
onde nasceram.
Uma diferença muito grande com o Brasil é a
pronuncia dos números, onde todos são falados ao
contrário, ou seja, de trás para frente.
Presentes: presentes são sempre bem vindos em
qualquer cultura, porém é necessário ter alguns
cuidados, na Alemanha não é diferente, evite
presentear roupas, perfumes, é algo muito pessoal, e
cuidado ao levar cerveja porque é a bebida oficial da
Alemanha.
A cultura do país é conservadora, então se decidir
presentear alimentos, cuidado para não ser algo exótico.
Se for convidado a um jantar ou a uma festa,
considere uma honra, o povo alemão é bastante
individualista. E se assim for, leve flores com
número ímpar, dito como mais educado e, como
no Brasil, rosas vermelhas significam amor, todavia
os lírios são utilizados em funerais.
Roupas: os alemães tendem a vestir-se com
cores conservadoras. Geralmente em um negócio,
245
Unidade IV
homens e mulheres vestem ternos formais, de
tons escuros e conservadores. No entanto, as
mulheres devem evitar joias de forma demasiada
e artigos que possam indicar riqueza (Bornhofen,
Kistenmacher, 2007).
Itália
Povo orgulhoso de sua origem, os italianos têm formação
cultural e religiosa bastante profunda. Por serem latinos e
bastante ligados às relações familiares, e consequentemente
às relações amorosas, são negociadores em que a emoção
entra na balança de qualquer negociação. Processos de
negociação podem ser longos, pois discutem detalhes
e revisam partes que não ficaram claras. Os horários de
refeições são apropriados para iniciar negociações, e é de
bom-tom elogiar a culinária e os vinhos locais. É bastante
comum convidar o negociador estrangeiro para suas casas,
onde presentes são bem-vindos. Horários nem sempre são
cumpridos, e é útil carregar consigo muitos cartões de visita,
pois é comum que várias pessoas sejam apresentadas durante
o processo. Ser conhecido é uma das chaves do sucesso,
então o negociador estrangeiro deve buscar proximidade
com as pessoas chave, bem como ter relacionamento com
as pessoas de acesso. O sul da Itália é mais informal que o
norte, mas em qualquer parte o importante é não ter pressa.
Mulheres estrangeiras são tratadas de maneira galante –
muitas vezes em excesso – por negociadores italianos, que
prezam a arte da conquista e a técnica do convencimento
(Acuff, 1998).
Japão
Faz parte da etiqueta, tão prezada pelos japoneses, esperar
que a outra parte defina como será o cumprimento: reverência
tradicional ou aperto de mãos ocidental. Os japoneses
246
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
apreciam que o início das conversas seja sobre as belezas do
país, ou sobre a cultura e culinária. É muito útil, ao invés de
apresentar a si mesmo, ser apresentado por algum japonês,
pois a cultura da apresentação formal é muito valorizada.
Perguntas de cunho pessoal, mas sem detalhamentos, são
consideradas uma boa maneira de começar uma negociação.
Caso perguntado, responda educadamente e retribua
com perguntas do mesmo tipo: isso mostrará interesse e
provavelmente aproximará as partes. Os japoneses são por
definição uma sociedade coletiva, portanto não é prudente
entrar numa sala sozinho para negociar: há o hábito de
negociações coletivas, com pausas silenciosas que devem
ser respeitadas, e com a frequente interrupção para obter
aprovações de escalões superiores não presentes. Não se deve
ter pressa, e deve-se respeitar o fluxo normal das negociações
japonesas. Muitas vezes, um “sim” dito por um japonês não
significa aceitação, mas simplesmente reconhecimento de ter
entendido o que você falou. Agradecer sempre, com respeito
e com deferência com o de maior nível é visto como positivo
(Martinelli, Ventura e Machado, 2004).
E, caso vá a um karaokê ou restaurante com
japoneses participantes da negociação, onde são
razoavelmente comuns exageros comportamentais,
nunca traga para o dia seguinte comentários sobre
a noite anterior: os japoneses separam muito
claramente os momentos de lazer e os momentos de
trabalho (Costa e Sancovsky, 2005).
Acuff (1998) destaca que além dos fatores macro
econômicos que condicionam as negociações internacionais
o fator cultural é um dos mais importantes. Destaca ainda
o uso do tempo, o individualismo vs. orientação coletiva,
a estabilidade de funções e conformidade, e padrões de
comunicação, entre os fatores culturais que afetam as
negociações entre culturas. Estas ideias do autor são
desenvolvidas a seguir:
247
Unidade IV
Fator tempo: o uso do tempo varia conforme a
cultura. Muitas culturas avaliam os americanos
como obcecados com o horário, comportando-se
como prisioneiros do relógio e das limitações do
horário. Impossível imaginar a Bolsa de Valores de
Nova York abrindo, nos dias úteis, entre 9h e 10h,
ou o segundo turno de uma fábrica começando por
volta das 15h. Na América Latina, pode-se esperar
que uma sessão comece meia hora depois da hora
marcada. Um atraso de dois meses num projeto
no Oriente Médio pode ser considerado normal do
que anormal.
Fator individualismo vs. orientação coletiva: a
questão do “eu” vs “nós” é abordada a exemplo da
cultura norte-americana onde as pessoas são bem
individualistas, enquanto que os japoneses somente
possuem a consciência do grupo, explicando assim
a lentidão com a qual tomam decisões, sendo
necessário que todos os integrantes do grupo
concordem com a decisão sobre a negociação. Os
norte-americanos ainda buscam negociar com o
representante mais importante para não perderem
tempo, ao contrário das culturas centradas no
grupo, foco da negociação.
Fator estabilidade de funções e a conformidade:
podem ser percebidos em culturas que valorizam o
modo como as coisas são feitas, enquanto outras
culturas valorizam o conteúdo. Os japoneses, valorizam
o ritual, a formalidade, aspectos que permitem
conhecer a outra pessoa garantindo estabilidade e
previsibilidade nas negociações. Em contrapartida,
os norte-americanos, suíços e alemães despendem
maior atenção ao conteúdo das negociações do que à
maneira que as mesmas são conduzidas, geralmente
com pouca rigidez.
248
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Fator padrões de comunicação: a clareza na
comunicação, tanto verbal e não verbal, é um
aspecto essencial das negociações internacionais.
Em termos de cultura, os padrões podem ser
entendidos como de “denso” ou de “baixo”
conteúdo. O conteúdo é do tipo “denso” quando
o significado está embutido na mensagem no
contexto de comunicação, enquanto no conteúdo
do tipo “baixo”, o significado está naquilo que foi
explicitamente enunciado e não no contexto em
que foi enunciado, isto é, enquanto em alguns
países a comunicação do tipo “denso” exige que o
receptor identifique a intenção da mensagem, em
outros a comunicação deve ser aberta e direta. O
conflito surge quando, por exemplo, o negociador
cuja comunicação é de “denso” conteúdo, percebe
seu interlocutor como insensível e agressivo ou o
contrário acontece, quando o negociador de “baixo”
conteúdo acredita que a outra parte não responde
(ALMEIDA e al. 2005).
8.9 Casos práticos de negociação e solução de
conflitos
Os exemplos que você vai analisar a seguir foram
extraídos do livro Negociação e solução de conflitos de
Dante P. Martinelli e Ana Paula de Almeida.
O objetivo desta leitura é verificar práticas de negociação
relacionadas aos tópicos que você estudou nesta apostila.
Os autores analisaram os casos baseados em informações
publicadas pela imprensa e estão aqui transcritos na íntegra,
conforme publicado na obra citada.
Caso 1 - O Estilo de Negociação de Hitler e de Gandhi em
Casos Célebres
249
Unidade IV
Este exemplo procurou levantar alguns estilos de
personalidades importantes de épocas históricas, Hitler e Gandhi,
segundo os respectivos contextos.
A Primeira Guerra Mundial propiciou novos conflitos, pois o
Tratado de Versalhes disseminou forte sentimento nacionalista,
dando origem ao nazi-fascismo. A política de paz, adotada por
muitos líderes no período entre guerras, e que se caracterizou por
concessões para evitar um conflito, não conseguiu garantir a paz
internacional. Consolidaram-se, assim, os regimes totalitários,
visando conquistas territoriais, o que desencadeou a Segunda
Guerra Mundial.
Com os nazi-fascistas governando a Alemanha e a Itália, a
política internacional foi aos poucos tornando-se conflituosa,
pois as pequenas nações sentiram-se lesadas em seus direitos
territoriais e políticos, ficando a mercê dos Estados mais
poderosos.
O Japão, descontente com sua posição internacional, invadiu
a Manchúria em 1931; a Itália invadiu a Etiópia; a Alemanha,
desobedecendo às decisões do Tratado de Versalhes, em 1935,
reincorporou o Sarre, restabelecendo o serviço militar obrigatório
e, em 1936, ocupou militarmente a Renânia — zona com a
fronteira francesa, desmilitarizada pelo Tratado de Versalhes.
Para evitar mais confrontos, outros países assistiram ao fato
resignadamente.
A Guerra Civil Espanhola deu a Hitler e Mussolini, associados
ao militar golpista espanhol Francisco Franco, condições de
testar seus novos armamentos e acabar com a Nova República
Espanhola, consolidando a aliança Hitler-Mussolini, denominado
eixo Berlim-Roma. Pouco depois, o Japão se uniu ao eixo,
encontrando na passividade geral ânimo para novas investidas
territoriais, assinando o Pacto Antikomintern para combater o
comunismo internacional.
250
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
A primeira manifestação significativa da expansão nazista
aconteceu na Áustria, anexando-a ao Terceiro Reich; depois foi
a vez da Tchecoslováquia, que por melo de um acordo entre
Inglaterra, França, Alemanha e Itália, entregou-a aos nazistas.
Hitler desejava conquistar o corredor polonês, área que
dava a Polônia saída para o mar. Então, fixou o Pacto Germanosoviético de não agressão e neutralidade, por dez anos, com a
União Soviética. Em 1939, Hitler invadiu a Polônia que, apoiada
pela Inglaterra e França, reagiu, dando início à Segunda Guerra
Mundial.
A Alemanha de Hitler rompeu o tratado com a União Soviética,
quando decidiu buscar minérios, petróleo e cereais neste país. O
sucesso nos primeiros meses levou os nazistas até os subúrbios
de Moscou, mas, no final, os alemães experimentavam duras
derrotas, devido principalmente ao vasto território, a resistência
da população e a chegada do inverno rigoroso. O Japão, ao
atacar a base americana no Pacífico, é guerreado pelos EUA,
pondo fim a expansão totalitária do eixo europeu.
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo organizou-se sobre
novas bases, destituindo a Europa como eixo do poder mundial,
e elegendo Washington e Moscou como os novos centros de
poder, reativando o confronto entre socialistas e capitalistas.
Fixou-se, assim, a bipolarização do mundo, marcada pela tensão
internacional, alimentada pelo conflito ideológico e político dos
EUA e URSS. Diante desses conflitos, as classificações dos estilos
podem ser feitas conforme os autores estudados. No modelo de
Jung, Hitler possuía estilo restritivo, no qual o negociador tem
impulsos de controle e desconsideração para forçar um acordo,
já que não há possibilidade de cooperação entre os envolvidos
e cada um se preocupa com seus próprios interesses. Então, o
único resultado aceitável para esse negociador é ganhar.
Segundo a classificação feita por Cohen (1980:120), Hitler
tinha estilo ganha/perde. As características extremamente
251
Unidade IV
nacionalistas que determinavam seu governo (antidemocracia,
antioperariado, antissocialismo) priorizavam interesses da
minoria e centrada em Hitler. A Guerra, por si só, já buscava
o ganha/perde, pois o líder alemão acreditava que a luta era
tudo, podendo transformar qualquer coisa desejada... Assim, sua
política era centrada em suas vontades, em sua posição.
Na teoria de Fisher e Ury (1985:47), Hitler teve como estilo
negociador o de reconhecer as necessidades e interesses do
povo alemão da época, que a fez o maior líder.
Também podiam ser identificadas, no líder alemão, algumas
características do estilo duro de Gottschalk (Apud Rojot, 1991),
tais como:
• estabelecimento de posição firme e clara, visto que
a doutrina nazista tinha princípios básicos bem
definidos (racismo, totalitarismo, anti-imperialismo,
nacionalismo);
• conhecia muito bem seus objetivos, que eram vingar-se
da humilhação do Tratado de Versalhes; era determinado
a atingir sempre o melhor, tentando reunir todo a povo
germânico da Europa numa grande nação;
• era líder nato, procurando manter a controle, governando
de forma centralizada; identificava suas oportunidades,
aproveitando, por exemplo, as humilhações do Tratado de
Versalhes e a crise econômica para promover a expansão
do nazismo;
• não se importava com o pensamento dos outros sobre o
nazismo;
• era dominador e agressivo, prova disso foi a eliminação dos
partidos políticos, supressão das organizações sindicais,
ampliação do poder central.
252
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Em se tratando de Mahatma Gandhi, foi figura importante
no processo de independência da Índia, propondo consegui-la
por melo da resistência pacífica, desobediência civil e ação não
violenta contra os colonizadores ingleses. Assim, promoveu greves,
passeatas, boicotes e envolveu a maioria da população hindu e
muçulmana, obrigando a Inglaterra a abandonar gradualmente
a Índia, evitando confronto racial com a metrópole.
A Índia tornou-se domínio britânico em 1763, após o Tratado
de Paris, que excluiu a França da colonização da Península
lndostânica. Em 1858, o território deixava de ser administrado
pela companhia das Índias Orientais Britânicas, passando a ser
diretamente controlado pela coroa. A luta pela independência
começa em 1885, com a criação do Congresso Nacional Indiano
(ou Partido do Congresso), partido nacionalista da população
hindu. Em 1906, era criada a Liga Muçulmana, organização
nacionalista da população muçulmana.
Em 1947, foi confirmada a retirada inglesa, acirrando os
conflitos étnicos e religiosos entre hindus e muçulmanos,
permitindo a divisão do país, e causando milhares de mortes.
A partir daí, surgiram três novos países: a União da Índia,
essencialmente hinduísta, e governada pelo líder do Partido do
Congresso, Jawaharal; o Paquistão, predomínio muçulmano e
governado por All Jinnah e o Sri Lanka, antiga ilha do Ceilão
com predomínio budista.
As desigualdades sociais, as rivalidades étnico-religiosas e a
instabilidade política marcavam continuamente toda a região.
Em 1948, em meio aos conflitos religiosos e políticos, Gandhi
foi assassinado. Em 1984, a sucessora de Nehu, Indira Gandhi,
teve o mesmo fim. Em 1991, durante campanha eleitoral, seu
filho, Rajiv Gandhi, também foi assassinado. As tentativas
governamentais de evitar a generalização dos conflitos não têm
conseguido eliminar a constante ameaça de fragmentação, o
aumento da miséria e as crescentes ações extremistas de diversos
grupos políticos.
253
Unidade IV
Assim, conforme o modelo de Jung, Gandhi apresenta
aspectos do estilo confrontador, pois a questão envolvida busca
necessariamente um resultado e envolve altos interesses e um
conflito litigioso. Utiliza táticas como a virtude e a reunião,
apesar de apresentar características de outros estilos, quando
opta pelo baixo risco, ou seja, o uso da não violência.
Na Índia, tem-se a figura de Gandhi como libertador dos
domínios ingleses. Todavia, segundo a visão proposta por Cohen
(1980:120), houve nesse estilo um pouco de ganha/perde, na
negociação Índia-Inglaterra, visto que Gandhi se utilizava de
táticas emocionais (desobediência civil, não violência, resistência
pacífica), colocando-se numa posição extremada de passividade,
para sensibilizar o povo indiano, na tentativa de liderá-los
contra a Inglaterra. Mostrava-se a favor do povo e por isso tinha
autoridade limitada. Se não eram satisfeitas suas vontades,
fazia greve de fome, boicotes, passeatas contra o regime inglês.
Contudo, Gandhi consegue instituir o ganha/ganha entre o povo,
quando uniu muçulmanos e hindus em função de um objetivo
comum: libertar a Índia da Inglaterra, mesmo que, depois, esses
povos começassem a brigar. Vale lembrar que a Inglaterra cedeu
à Índia aos poucos, para não perder a influência regional.
É possível perceber também os esforços do líder indiano
em não se concentrar em garantir ganhos mútuos, mas
corrigir injustiças, mudar uma situação desfavorável ao seu
país, ou melhor, tentar alterar uma relação ganha/perde,
considerando a possibilidade de um relacionamento futuro
entre esses países. Em momento algum Gandhi desviou-se
de seus objetivos, não atacou os ingleses, concentrando-se
nos problemas. Porém, foi incapaz de identificar os interesses
ingleses, o que talvez tivesse lhe poupado muitos esforços,
principalmente depois da Segunda Guerra, quando a
Inglaterra, afetada diretamente pela mesma, não podia mais
arcar com os custos de manter uma colônia como a Índia,
sendo este um dos principais motivos que levou o governo
inglês a reconhecer a independência da Índia.
254
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Na classificação de Gottschalk (apud Rojot, 1991),
Gandhi possui alguns traços importantes do estilo caloroso.
Era amigo, não se preocupava apenas com as pessoas de
seu país, se dispôs a ajudar nativos e miseráveis, moral e
materialmente, organizou colônias agrícolas e hospitais e
continuou a exortar seus compatriotas, ensinando-lhes seus
princípios de fraternidade. Tinha também características
do estilo duro, visto que era homem que não se intimidava
diante do conflito.
Nesse contexto, nota-se a importância de se identificar os
estilos dos negociadores envolvidos, a fim de que se possam
definir ações correspondentes a eles, sendo igualmente
importante conhecer o próprio estilo para desenvolver
habilidades que permitam melhorar alternativas possíveis
na negociação. Como exemplo, pode-se citar a derrota de
Hitler na Segunda Guerra Mundial, que rompeu o tratado de
não agressão, pelo interesse em petróleo, cereais e minérios
existentes na URSS. Talvez, se se conhecessem os interesses
russos, fosse possível negociar um acordo mais lucrativo para
as partes. Hitler, porem, não permitiu o desenvolvimento de
melhores alternativas para a situação.
Ainda é possível concluir que, quanto mais se conhecem os
estilos de negociação, mais os negociadores são flexíveis em
seus estilos, assumindo posturas diversas em função da situação
em que se encontram, para obter resultados desejáveis as partes,
sem que seja necessário fazer concessões ou assumir posições
para se chegar a um acordo sensato.
Caso 2 - Negociação internacional — Rondini Comércio Exterior
Essa negociação analisa uma empresa, Rondini Comércio
Exterior, intermediária na importação e exportação de produtos
de uma cooperativa de comerciantes da área de pescados e
similares na região de Ribeirão Preto. Essa empresa estava
interessada na importação de uma grande quantidade de
255
Unidade IV
bacalhau da Noruega, que deveria suprir o mercado regional
durante a Semana Santa.
Como a exigência prioritária era de um preço
competitivo, ganhou o fornecedor norueguês que satisfazia
tal exigência. O exportador, entretanto, só realizaria o
negócio mediante pagamento antecipado da encomenda.
A condição foi aceita pelos importadores, com um porém:
o Incoterm (International Commercial Terms — regras de
âmbito internacional que definem responsabilidades quanto
ao pagamento de frete, seguro e despesas portuárias) a ser
adotado seria do tipo CIF (Cost, Insurance and Freight).
Efetuado o pagamento, restava apenas receber a
mercadoria no Porto de Santos, prevista para dez dias antes
da Semana Santa, e transportá-la até a região, através de
caminhões.
Na última hora, os exportadores noruegueses comunicaram
que haveria um atraso de sete dias na entrega da mercadoria,
sendo esta entregue, então, três dias antes da Semana Santa.
Apesar de tudo, os importadores aceitaram, pois não tinham
nenhuma outra opção.
A mercadoria chegou dentro do novo prazo previsto, porém
ficou retida no porto devido à greve, por prazo indeterminado,
adiando a liberação do produto para vinte dias depois da Semana
Santa.
Por ser um produto sazonal, após a Semana Santa o consumo
cairia drasticamente, o que significaria dificuldade de vender
todo o produto importado. Essa demora acarretaria sérios
problemas de liquidez para a cooperativa, já que esta não teria a
receita esperada com a venda do bacalhau, e ao mesmo tempo
enfrentaria problemas referentes aos custos de armazenamento
muito altos.
256
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Na tentativa de obter uma solução favorável para as partes
envolvidas, a Rondini negociou com os noruegueses, que se
preocupavam em manter a boa imagem no mercado global, e
com a cooperativa, que queria o ressarcimento da quantia paga
antecipadamente.
Como a devolução da mercadoria era inviável, devido à
continuidade da greve e aos altos custos de frete, sugeriu-se
a busca de opções de ganhos mútuos, as que satisfizessem os
interesses de ambas as partes, ou seja, a distribuição de quase
toda a mercadoria, via transporte rodoviário, para a região
centro-sul do país, com prioridade para aquelas de maior
concentração de descendentes de imigrantes portugueses,
grandes consumidores de bacalhau, sendo o custo do transporte
arcado pelos noruegueses.
Na região de Ribeirão Preto, o produto seria vendido por
preço 10% superior ao combinado, sendo, ainda assim, valor
competitivo no mercado nacional, estabelecendo-se que a
acréscimo de 10% na receita seria dividido igualmente entre a
cooperativa e os exportadores.
Analisando a negociação, pode-se constatar que o importador
falhou quando tinha como única opção o exportador norueguês.
O ideal seria criar várias alternativas e estabelecer a sua MAANA,
ou seja, várias opções possíveis e o mínimo que poderia ser
aceito para, no caso de uma não dar certo, ter-se outra “à mão”,
ou mesmo para se ter condições de exigir melhores acordos.
Por exemplo, o importador poderia negociar com o norueguês
a questão de pagar antecipado, se tivesse outro fornecedor
do produto que aceitasse pagamento na data de entrega do
produto.
A questão do tempo é fator primordial para a negociação, já
que se trata de produto perecível e de consumo sazonal, sendo
necessária a venda até determinado momento; caso contrário,
perde-se a produto. Isto possibilita que o acordo realizado não
257
Unidade IV
seja verdadeiramente o melhor, já que as decisões e acordos
devem ser tomados rapidamente, talvez deixando escapar
uma melhor análise de determinado ponto, mais favorável à
situação.
Embora a negociação tivesse sido apressada, a empresa
intermediadora procurou negociar com exportadores
noruegueses e importadores brasileiros, baseada nos
interesses de cada um, já que sabia de suas necessidades
(poder de conhecer as necessidades), buscando opções de
ganhos mútuos. Esse intermediador, apesar de também ter
interesses econômicos num bom acordo entre exportador e
importador, serviu como uma terceira pessoa para encaminhar
a solução mais viável para os envolvidos, não favorecendo
nenhum dos lados. O poder da legalidade também esteve
presente quando do firmamento do negócio, no qual foi
utilizada a condição Incoterm.
Dessa forma, pode-se verificar que o estilo da Rondini
para lidar com o impasse foi o confrontador, analisado por
Sparks (1992:157), já que, como mediador, buscava o melhor
acordo global diante da circunstância dada, apreciando as
necessidades e interesses de cada um, trabalhando com
todos os envolvidos para chegar a um acordo sólido. Outro
estilo que pode ser detectado na empresa intermediadora é o
negociante, estando atento à flexibilidade, ao compromisso
e à integração e orientação para resultados ganha/ganha,
aproveitando as oportunidades que surgem no momento em
que se está negociando.
O estilo toma e controla, proposto por Atkins e Katcher (apud
Bergarnini, 1980:67), também tem alguns aspectos presentes
na negociação em questão, pois tem como orientação básica
os objetivos e metas a serem alcançados, buscando aproveitar
sempre todas as oportunidades que surgem no ambiente,
respondendo eficazmente às situações de pressão que possam
surgir.
258
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
Nesse contexto, é possível ressaltar que os conflitos
originados durante as negociações são solucionados na forma
do “empurra para solução do conflito”. Essa tentativa de solução
de conflito procura desenvolver a criatividade, trazendo
novas ideias para a negociação, a fim de se estabelecer os
objetivos a serem atingidos, dando ênfase à ação, movimento
e cumprimento do acordo, valorizando a flexibilidade dos
negociadores.
Além disso, a solução do conflito busca um compromisso,
o qual faz com que cada parte ceda um pouco para não haver
prejuízos maiores. A empresa norueguesa cede ao pagar o frete do
produto estocado, e a empresa brasileira, que estava comprando
o produto aumenta um pouco o preço do produto para dividir
os lucros igualmente com os exportadores e a cooperativa. Há,
pois, um enfoque de barganha para lidar com o conflito.
Caso 3 - Negociação comercial internacional — empresa
Frateschi
Essa negociação enfoca uma transação internacional da
empresa Frateschi, produtora de locomotivas (modelos) para
os mercados interno e externo. A negociação era a respeito do
valor dos trenzinhos a serem exportados para os EUA, primeiro
cliente de um mercado ainda não atingido pela empresa. Esse
cliente comprava artigo parecido de Hong Kong. Contudo, com a
valorização do Yen, tornou-se inviável a negociação do produto.
Então, o cliente convidou a Frateschi para trabalharem juntos.
Em reunião com o novo cliente da empresa Frateschi, nos
EUA, o presidente desta mostrou a tabela de preços, que não foi
bem aceita pelo cliente americano, dizendo ser impraticável um
acordo, pois a antigo fornecedor (de Hong Kong) tinha preços
menores.
Sem querer perder a viagem, o empresário brasileiro
argumentou sobre a diferença de qualidade do produto que
259
Unidade IV
produzia e do produto do fornecedor de Hong Kong, que
realmente era inferior. Também esclareceu ao novo cliente que
não poderia perder tal oportunidade, pois estava ali a possibilidade
de aumentar o mercado da empresa e, consequentemente,
as vendas, propondo-se, inclusive, reestruturar o plano de
produção para atender a demanda adicional proveniente desse
possível acordo e, dentro disso, reavaliar os custos envolvidos,
para determinar o quanto poderia ceder na proposta feita
anteriormente.
Retornando aos EUA, durante um almoço informal num
restaurante agradável, com conversa descontraída, em clima
de amizade, o empresário apresentou a nova tabela, bem como
todo o know-how que a empresa possuía para produzir as
mercadorias que estavam em negociação.
Ao final do almoço, fornecedor brasileiro e cliente americano
fecharam a conta do restaurante e firmaram o acordo sobre o
negócio.
Dentro dessa perspectiva, pode-se verificar que os moldes de
negociação internacional diferem dos existentes no Brasil. Nesse
caso, percebe-se que o americano valoriza a sinceridade de seus
fornecedores ou clientes, colocando as cartas na mesa para
a conquista da credibilidade, e certeza de um acordo ganha/
ganha, bem como um relacionamento posterior duradouro, que
possibilite novas negociações.
Em se tratando do empresário americano, pode-se constatar
a utilização do poder do precedente, afinal o fornecedor de Hong
Kong fornecia produtos mais baratos. A questão foi resolvida
quando o empresário brasileiro citou sua habilidade em produzir
produtos parecidos, no entanto, de melhor qualidade (poder da
habilidade/especialidade).
A situação informal e descontraída em que a negociação
aconteceu também soma favoravelmente para um acordo
ganha/ganha, em que se conhece melhor as partes pessoalmente,
seus hábitos, maneiras de se comportar, tendo-se a certeza
260
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
de que realmente é interessante e viável a discussão sobre
determinado assunto.
Já para o empresário brasileiro, o bom relacionamento com
o cliente, após a negociação, é imprescindível, dando margem a
novos negócios, além do mais “... o sucesso de meu cliente é meu
próprio sucesso”.
Isso pode ser retratado no fato de que as partes não
participaram efetivamente de um conflito de interesses, mas de
uma discussão construtiva sobre o que seria mais interessante
para os envolvidos nas questões que estavam sendo negociadas.
A discussão de uma melhor alternativa de acordo pode ser
caracterizada pela apresentação clara e aberta dos fatos, das
impressões e dos interesses de cada um nas negociações.
Assim, negociar com pessoas em alguns países no exterior
pode ser bem diferente de negociar com empresários nacionais.
Aqueles são extremamente profissionais, entendem as limitações
de seus clientes/fornecedores, dão abertura para a exposição
de interesses e criação de laços de confiança, enquanto estes
são extremamente desconfiados, espertalhões, “embrulhões” e
desejam tirar vantagem sempre que for possível.
De acordo com o empresário brasileiro, o importante em
uma negociação com o exterior é “colocar as cartas na mesa”,
ou seja, expor todos os seus interesses e necessidades. Isso
permite confiança por parte do cliente na negociação a ser
firmada.
Por isso, o estilo adotado nesta negociação é o amigável,
visto que há a preocupação de manter um relacionamento
duradouro, com possibilidades de negociações futuras. Os
negociadores são simpáticos e cooperativos, utilizam certa
diplomacia para buscar soluções efetivas dos interesses. Sob
a classificação de Gottschalk (1974), o estilo característico
é o caloroso, que indica como aspectos básicos a ênfase
nos interesses e metas comuns, o reconhecimento da
261
Unidade IV
interdependência, a compreensão dos valores das partes,
confiança e disposição para colaborar.
Caso 4 - J. Walter Thompson Publicidade — Caso Lux Luxo
Este exemplo foi extraído de uma das negociações
realizadas pela empresa de publicidade J. Walter Thompson
com seus clientes. A empresa, atuando no Brasil desde 1929,
possui departamento de criação, mídia, planejamento,
pesquisa e desenvolvimento, atendimento, entre outros.
A empresa ressalta a importância dos conceitos de
negociação, inclusive pelo fato de atuar num ramo em que a
parceria, a habilidade, o estilo, a ética e uma boa finalização das
negociações são essenciais, dirimindo possíveis conflitos sem
utilizar subterfúgios e truques que denigram o relacionamento
cliente-agência, de forma que o ápice da negociação seja
alcançado, isto é, um acordo ganha/ganha.
A negociação analisada deu-se com a Gessy Lever, produtora
do sabonete Lux Luxo e Lux Suave (desde a década de 60);
envolvia valor monetário de uma campanha a ser desenvolvida
pela agência, já que em 1986 a Gessy Lever perdia participação
de mercado nesse segmento.
A perda era devida ao surgimento de novas opções do
mesmo produto (sabonete), a perda da imagem do produto de
alta qualidade, e também ao fato de ter ocorrido mudança no
comportamento feminino a partir de 1970, passando este da
concepção de se tornar uma estrela de cinema para tornar-se
uma mulher dinâmica do dia a dia, trabalhadora e lutadora
por seu espaço. Então, anteriormente, a estratégia utilizada
pela Gessy Lever era a de atrair as mulheres que queriam
consumir o sabonete das grandes estrelas de Hollywood; com a
mudança de comportamento, era necessário atrair as mulheres
independentes, que saíam de casa para trabalhar, ajudando a
construir o mundo igualitário.
262
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
A partir de então, a agência de publicidade propôs uma
solução criativa de elaborar uma alta e inédita qualidade de
produção, que iria custar a Gessy Lever US$ 1,2 milhão.
Dado que a empresa se dispunha a pagar apenas US$ 400
mil, inicia-se o impasse e o surgimento de um conflito.
O projeto ficou parado na área de marketing, embora a
empresa quisesse aperfeiçoar sua qualidade. A área de marketing
não tinha como levar em frente um projeto que ultrapassava
três vezes seu orçamento previsto.
A agência de publicidade envolveu o diretor de
atendimento, um nível hierárquico acima do qual se costuma
trabalhar nos casos de orçamento, dada a existência do
impasse e a importância do fechamento do acordo para a J.
Walter Thompson.
O responsável pela agência começou a buscar outros canais
de comunicação, procurando explicar ao diretor de marketing
que o projeto era ambicioso e invariavelmente precisaria
de um investimento adicional, ou seja, a agência buscou o
maior número possível de alternativas para o acordo, além de
fornecer informações mais detalhadas sobre o trabalho a ser
desenvolvido, visando facilitar para a empresa decidir a favor do
desenvolvimento do projeto.
As técnicas utilizadas propiciavam que o conflito fosse
gerenciado de forma positiva, sem que as posições fossem
consideradas, e que os interesses fossem satisfeitos. A ação para
lidar com o conflito foi a que empurrou a solução, visto que
o responsável pela agência, assumindo sua autoridade dentro
da hierarquia da empresa, buscou novas ideias e definiu ações
que iam ao encontro dos objetivos estabelecidos. O conflito
litigioso, conforme proposto por Sparks (1992:102), que permite
solução ganha/ganha, pode ser considerado característica dessa
negociação, pois o ponto negociado era de alta importância
para todos os envolvidos.
263
Unidade IV
Vale lembrar que a solução desse conflito litigioso foi
imperativa, pois não houve tentativas de dominação, nem mesmo
barganha de posições; em vez disso, buscou-se uma solução que
atendesse completamente aos interesses das partes. Foi utilizada
também a mediação para a solução do conflito. No caso, o diretor
de atendimento, que, mesmo não sendo imparcial no processo
de negociação, foi imprescindível para que novas visões fossem
agregadas à solução do impasse, ajudando a buscar o melhor
caminho para o acordo.
Nesse contexto, o estilo característico que permitiu melhor lidar
com o conflito foi o colaborativo, estilo que é, ao mesmo tempo,
confrontador e cooperativo, apropriado para buscar solução na qual
os interesses dos envolvidos são muito importantes.
Sob a ótica do modelo de Jung, o estilo utilizado por esses
negociadores foi mistura do amigável, visto que houve cooperação
das partes na busca do melhor acordo, com o objetivo de manter
um bom relacionamento, vislumbrando oportunidades futuras
de trabalho, com algumas características do estilo confrontador,
no qual a confiança e o controle se combinam para buscar a
equidade de um acordo sólido para solucionar altos interesses
envolvidos.
E na classificação de Gottschalk (1974), o estilo utilizado pode
ser caracterizado como caloroso, o qual favorece a colaboração,
a compreensão, o conhecimento das necessidades e os interesses
dos negociadores, ávidos por respostas positivas às negociações,
solucionando da melhor maneira possível eventuais conflitos
que possam existir.
Assim, o diretor de marketing da Gessy Lever, após conversa
com a agências de publicidade para buscar mais informações, fez
uma proposta: queria negociar com a produtora a possibilidade
de o pagamento ser parcelado em quatro vezes e propôs que
a agência abrisse mão de seus honorários, já que recebia 15%
sobre o montante pago à produtora.
O critério que o diretor de marketing usou para persuadir
a agência a aceitar a proposta foi a questão da repercussão;
264
MARKETING DE VAREJO E NEGOCIAÇÃO
caso esta fosse boa, geraria mais negócios para a agência. Nesse
caso, o diretor soube utilizar sua capacidade persuasiva. Foi
estipulado, então, um prazo de 24 horas para que a agência
apresentasse uma resposta. Terminado o prazo, a agência tinha
uma contraproposta: o custo da produção seria parcelado, só que
em dólar, para não haver perda do valor. Além disso, a mesma
se disporia a não receber os honorários sobre a produção, mas
queria maior investimento em mídia (a agencia recebe 20%
sobre o valor destinado a mídia).
O resultado do acordo foi a marca reconquistar a liderança
de mercado e a agência sair fortalecida, pois a campanha teve
muito sucesso e repercussão. Ou seja, consumou-se um acordo
ganha/ganha.
A partir de então, é possível detectar a busca do melhor
meio de se comunicar com o cliente e fazê-lo aceitar o projeto
elaborado. A presença nas negociações de um contato de nível
superior na hierarquia da agência, algo incomum no processo
normal de conversação, define a importância dada pela agência
ao cliente. Isto sinalizava à Gessy Lever a necessidade de
contar com a agência de publicidade para realizar a campanha,
podendo utilizar este poder de maneira a conseguir o acordo
que desejava. É importante ressaltar, entretanto, que esse
poder não necessariamente precisa ser usado para prejudicar o
oponente, no caso, a agência; o cliente tem o poder de conhecer
as necessidades da agência e sabe ponderá-lo para conseguir
melhor acordo para todas as partes.
Outro aspecto importante está relacionado com a reunião
realizada entre cliente e agência. O contato permitiu major
integração entre os negociadores, além de proporcionar
uma busca de informações requisitadas pelo cliente, tanto
a respeito do que seria desenvolvido na campanha, quanto
na confirmação do cumprimento ou não do acordo a ser
firmado pelos interessados. Ambos souberam ouvir, discutir
e armazenar as informações para negociar um acordo
melhor.
265
Unidade IV
O tempo também aparece, no caso, como fator
imprescindível para a solução da negociação. Vê-se que a
agência tem apenas 24 horas para aceitar ou não e fazer
uma contraproposta. De certa forma, o pouco tempo pode
ter influenciado a decisão da agência (de não receber
honorários, por exemplo), sendo que, se dispusesse de um
pouco mais de tempo, analisaria melhor a proposta do
cliente, podendo ter outra solução.
Entretanto, o acordo foi firmado com satisfação das partes
envolvidas: o cliente satisfeito com a recuperação da liderança
do produto no mercado e a agência fortificada com o sucesso
da campanha. Acima de tudo, permaneceu a possibilidade de
futuros contatos para novos negócios, novas negociações, novos
projetos, além da possibilidade de os acordos serem como este,
ou seja, ganha/ganha.
A questão da ética, tão considerada pela empresa, deve-se
principalmente ao fato de ser uma multinacional, tendo seus
padrões de trabalho extremamente rigorosos determinados no
exterior; há cobrança de maximização dos resultados dessas
negociações e de lucro, como consequência. Isto pode ser visto
na empresa, por meio da implementação de cursos voltados para
a solução de situações conflitantes e impasses, baseados em
The Thompson way, sistema de perguntas que busca localizar o
cliente no negócio (planejamento, estratégia e briefing).
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Unidade IV - Ambiente Virtual de Aprendizado