III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES
EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO
11 a 13 de novembro de 2009
UFS – Itabaiana/SE, Brasil
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MALOCA UMA TRAJETÓRIA DE LUTA, REIVINDICAÇÕES E CONQUISTAS
Jorge Alberto Vieira Tavares (UFS) 1
Inácia Maria Rodrigues do Nascimento (UFS) 2
INTRODUÇÃO
Neste artigo trataremos primeiro do conceito de quilombo, citaremos a história dos
africanos, da escravidão no Brasil e em Sergipe para depois falarmos da Maloca, um
quilombo urbano na cidade de Aracaju e da Criliber uma ONG responsável por trabalhos
sociais na Maloca.
A expressão quilombo vem sendo sistematicamente usada desde o período colonial.
Lopes(1987) afirma que “quilombo é um conceito próprio dos africanos bantos que vem
sendo modificado através dos séculos”.
Neste contexto, a questão dos quilombos brasileiros revela-se de grande
complexidade, pois tratava-se de se considerar não apenas os aspectos
referentes à identidade dos negros do Brasil, mas vários atores envolvidos
e os inúmeros interesses conflitantes sobre o patrimônio material e
cultural brasileiro, ou seja, questões de fundo envolvendo identidade
cultural e política das minorias de poder no Brasil (LEITE, 2000, p.342)
Munanga(1995) ao recuperar a relação do quilombo com a África, afirma que o
quilombo brasileiro “é sem dúvida, uma cópia do quilombo africano reconstituído pelos
escravizados, para se opor a uma estrutura escravocrata, pela implantação de uma outra
estrutura política na qual se encontravam todos os oprimidos”.
Na tradição popular no Brasil há muitas variações no significado da palavra
quilombo, ora associado a um lugar (“quilombo era um estabelecimento singular”), ora a
1
Especialista em Didática, licenciado em Geografia e Pedagogia e professor do PROJOVEM URBANO
[email protected]
2
Aluna do Mestrado de Educação da UFS, licenciada em pedagogia, trabalha na Rede Pública Estadual
como pedagoga há 11 anos. [email protected]
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um povo que vive neste lugar (“as várias etnias que o compõem”), ou a manifestações
populares, (“festas de rua”), ou ao local de uma prática condenada pela sociedade (“lugar
público onde se instala uma casa de prostitutas”), ou a um conflito(“uma grande
confusão”), ou a uma relação social(“uma união”).
O quilombo mesmo hoje é vinculado à questão de resistência e seus moradores
como rebeldes que fixam residência a margem da sociedade e ainda hoje enfrentam uma
situação aqui determinada como um não lugar social.
Isto aponta para o fato de que os quilombos deixaram de ser caracterizados apenas
pelas redes de significação histórica e racial, para incorporarem valores econômicos e
socioculturais em seu conceito oficial.
Schmitt, Tauratti e Carvalho (2002), refletindo sobre o conceito
contemporâneo e ampliado de quilombo, enfatizam os elementos
identidade e território como essenciais nesse processo. As autoras
afirmam que o “termo em questão (remanescentes quilombolas) indica a
situação presente dos segmentos negros de diferentes regiões e contextos
e é utilizado para designar um legado, uma herança cultural e material
que lhe confere uma referência presencial no sentido de se pertencer a um
lugar específico” (SCHMITT, TAURATTI e CARVALHO, 2002, p.4).
Assim posto, o conceito de quilombo passa a dar conta, semanticamente, das
especificidades históricas e culturais de comunidades negras que habitam terras com
registros de ex-quilombos, ou que tenham trajetória histórica própria, desde que se autoreconheçam como quilombolas.
Ainda em relação ao conceito expandido de quilombo, criado como estratégia legal
para amparar também as comunidades negras formadas sem um vínculo indissociável com
ações de resistência do período escravista, o historiador MAESTRI (2005) afirma:
aceitamos a definição dos núcleos rurais negros contemporâneos de
origens múltiplas como novos quilombos. Mas não aceitamos a destruição
arbitrária e autoritária da especificidade dos quilombos que se formaram
como forma de resistência ao sistema escravista que vigorou legalmente
até 1888 no seio dos fenômenos múltiplos e diversos ensejados pelo
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escravismo, direta ou indiretamente, antes e após a Abolição.
(MAESTRI, 2005, p.251)
É possível perceber, assim, que nas comunidades de remanescentes de quilombos, a
partir da década de 1990, não se encontram apenas negros que se organizam em terras de
refúgio, compradas ou doadas por seus senhores. A essência quilombola da atualidade não
está apenas nas raízes históricas (que também não podem ser negadas), ela se concebe a
partir de um projeto de autodefinição, de uma articulação cultural de comunidades negras
que, de alguma forma, se aglomeraram e preservam relações identitárias com a cultura
afro-brasileira.
Nesta perspectiva, a cultura, formatada a partir de ações e relações cotidianas, é a
instância primeira para a conceituação do que sejam comunidades de remanescentes de
quilombos e o assujeitamento ideológico passa a ser fator primordial para que esses grupos
se identifiquem como quilombolas, a partir de representações sociais construídas, de
práticas cotidianas e de relações que mantêm entre si e seu entorno.
Nos últimos vinte anos, os descendentes de africanos, em todo o território nacional,
organizados em associações quilombolas, reivindicam o direito a permanência e ao
reconhecimento legal de posse das terras ocupadas e cultivadas para moradia e sustento,
bem como o livre exercício de suas práticas , crenças e valores considerados em sua
especificidade.
A ESCRAVIDÃO, TRÁFICO DE ESCRAVOS, SOCIEDADE E RELIGIÃO AFROBRASILEIRA
A África foi berço da humanidade e representa cerca de 10% da população mundial
e um quatro das terras do globo. Os conquistadores brancos sempre afirmaram que aqueles
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povos “primitivos” não tinham história, nenhum registro, que eles só foram introduzidos na
história da humanidade quando os colonizadores os tangeram para a escravidão. Esse
raciocínio atingia dois grandes objetivos econômicos e teria profundas conseqüências na
evolução dos povos africanos e nas culturas das sociedades americanas.
O primeiro desses objetivos era considerar a África uniforme, sem distinções de um
povo para outro, isto é, todos seriam igualmente africanos e nada mais. O segundo grande
objetivo alcançado foi o de, através de falsidades científicas sobre a superioridade de raças
e de culturas, criar justificativas ideológicas para a escravidão em larga escala que foi
praticada na América e na África. Na medida em que as sociedades escravocratas foram
elaborando suas culturas, elas também ficavam escravas das próprias ideologias.
Os primeiros povos a serem escravizados no Brasil são os indígenas, cujo trabalho
compulsório é usado em diferentes regiões até o século XVIII. Seu aprisionamento é uma
atividade interna, e o ganho obtido com sua venda permanece na colônia, sem lucro para
Portugal. Os índios cativos são eficientes na extração do pau-brasil, mas não na atividade
relacionada à agricultura.
Trazidos para o Brasil a partir de 1550, os negros pertenciam principalmente a dois
grandes grupos: o oeste- africanos (antigamente chamados de sudaneses), nativos da Costa
do Marfim e de influência Muçulmana foram mandados em grande número para a Bahia;
já os bantos, nativos de Angola, Congo, e Moçambique foram mandados em larga escala
para a zona da mata nordestina.
Escravocrata, a sociedade portuguesa não admitia o trabalho senão à custa de
negros, que são capturados na África, trazidos em grandes embarcações, os navios
negreiros, e vendidos no Brasil. As viagens duravam entre três e quatro meses e muitos
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negros não sobreviviam a elas devido as péssimas condições de viagem. Muitos contraíram
a doença do banzo (conhecida como a doença do sono).
Quando chegaram ao Brasil, os escravos eram acomodados em senzalas,
trabalhavam cerca de quatorze horas por dia e, muitas vezes, tinham direito a apenas uma
refeição diária composta de feijão, milho e farinha de mandioca. Além disso, tinha que
produzir o seu próprio alimento trabalhando durante o final de semana, geralmente durante
os domingos.
Os negros são vendidos em grande escala para mercados portugueses, esse tipo de
comércio torna-se lucrativo para os traficantes e vantajosos para os proprietários. O alto
preço do escravo africano é amortizado pelo tempo de cinco a dez anos de trabalho
forçado. Por isso desde o século XVII até o século XIX, os negros cativos formam a
grande massa trabalhadora da agricultura, da mineração e outras atividades econômicas.
No meados do século XVIII, com o aumento da população e conseqüentemente da
economia, os escravos são utilizados em outras funções nas cidades, empregados ou
alugados por seus senhores para produzir, vender ou prestar serviços a terceiros. São os
escravos de ganho, transformados em pedreiros, sapateiros, alfaiates, marceneiros,
barqueiros, barbeiros, vendedores ambulantes, ajudantes de lojas e armazém, carregadores,
etc.
TRÁFICO DE ESCRAVOS
O comércio de escravos negros entre a África e o Brasil é totalmente dominado por
portugueses, espanhóis, ingleses, holandeses, ocorrendo durante o período colonial (15501850). Para se ter uma idéia aproximadamente 4 milhões de negros vieram para o Brasil,
segundo cálculo do IBGE. À mão-de-obra escrava aumenta com a expansão da cultura
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cafeeira, a partir de 1830; sendo que ao mesmo tempo crescem as pressões contra o tráfico
negreiro, liderado pela Inglaterra, essa pressão é motivada pela preocupação com a
concorrência do que com razões humanitárias.
Em 1831, cumprido acordos firmados com a Inglaterra, o governo regencial declara
o tráfico ilegal no território brasileiro. Mas a entrada de negros africanos no país continua
em grande escala. Diante disso, o Parlamento britânico aprova em 1845, a Bill Aberdeen,
lei que dá a Marinha de Guerra inglesa o direito de perseguir e aprisionar tumbeiros, ou
seja, os navios negreiros em qualquer ponto do Atlântico.
Assim, o tráfico torna-se muito mais arriscado e menos lucrativo. Em 1850, o
governo de Dom Pedro II extingue definitivamente o comércio de escravos, com a lei do
ministro da justiça Eusébio de Queirós.
SOCIEDADE E RELIGIÃO
A inserção da população negra na sociedade se dá pelo trabalho, base da
organização econômica e da convivência familiar, social e cultural. A miscigenação
aumenta, com o número cada vez maior de mulatos. Nasce uma religiosidade popular em
torno das irmandades católicas e dos terreiros de Umbanda e Candomblé. A escravidão é
extinta em 13 de maio de 1888, o governo imperial rende-se às pressões, e a Princesa
Isabel assina a lei Áurea.
Mas não foi tomada nenhuma medida que permitisse a inclusão dos negros
africanos na sociedade, em condições de igualdade com os brancos. “Os negros foram
lançados numa sociedade preconceituosa, de forma desarticulada, sem dinheiro, sem casa,
sem comida, sem nenhuma condição de se estabelecer”, segundo relato do IBGE. A
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decisão de libertar os negros desagrada de imediato aos fazendeiros, que exigem
indenizações pela perda de seus “bens”.
O fim da escravatura, porém não melhora a condição social e econômica dos exescravos, visto que não tinha formação escolar nem profissão definida, para a maioria deles
a simples emancipação jurídica não muda sua condição subalterna, muito menos ajuda a
promover sua cidadania ou ascensão social.
Dessa forma, segundo Hélio Santos (2001, p.85), o racismo parte do pressuposto da
“superioridade de um grupo racial sobre outro” assim como da “crença de que determinado
grupo possui defeitos de ordem moral e intelectual que lhe são próprios”.
As conseqüências da escravidão se fazem presentes até hoje na sociedade brasileira.
Elas não só se limitam as desigualdades sociais, mas também permeiam muitas idéias
falsas e preconceituosas, os quais muitas vezes, passam despercebidos por nós. Como
herança social existe no Brasil inúmeras áreas carentes que são abrigadas por descendentes
dos antigos escravos, índios e negros.
São favelas ou áreas alagadiças, que não oferecem nenhuma condição adequada
para a habitação.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 1996, mostraram
que a taxa de mortalidade entre as crianças negras e pardas no Brasil é dois terços
superiores à da população branca da mesma idade. Em outras palavras, até os 5 anos, têm
67% mais chances de morrer do que uma criança branca.
O índice de mortalidade de criança brasileira pardas e negras de até 5 anos de idade
é de 76 para cada mil nascida vivas. Entre as brancas, a taxa cai para 46 mortes em cada
mil. Também entre os adultos, os homens e mulheres negros estão em condições de maior
desigualdade em nosso país.
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A inserção no mercado de trabalho é precoce: as crianças brancas de 10 a 14 anos
somam 14,9% e as negras 20,5%. Na área educacional, segundo o IBGE, 1997 18% da
população brasileira são analfabetas, sendo que entre os negros este percentual sobe para
35,5%, enquanto na população branca é de 15%.
Para exemplificar melhor esse fato, os dados do IBGE, 1997 a média salarial da
população branca no país foi de 600 reais por mês, já a média de população negra foi de
300 reais. O conhecimento sobre as desigualdades reais, que nos leva à constatação de que
um trabalhador negro com formação universitária recebe o equivalente à metade do salário
de um trabalhador branco com igual qualificação, comprova a teoria de que a discussão
sobre a problemática racial não pode estar dissociada da luta pela igualdade de classes,
visto que muitos trabalhadores são negros. Segundo Dulce Maria Pereira, presidente da
Fundação Cultural Palmares, do Ministério da Cultura “Temos uma cultura que nos une e
uma economia que nos separa”.
Apesar de o Brasil obter 65 milhões de negros há muitas injustiças contra eles como
estamos vendo, onde os negros são a maioria dos analfabetos, dos menores salários, nas
prisões, nas favelas e nos subempregos e são minoria nas faculdades, entre os empresários,
os heróis reconhecidos, os governantes, etc.
No Brasil a questão racial ainda é vista pela ampla maioria dos brasileiros como
algo inexistente. O brasileiro tem preconceito de ter preconceito, mas grande parte dos
negros brasileiros não se assume enquanto tal.
Ainda é grande o desconhecimento dos heróis negros do Brasil, como a história de
Zumbi dos Palmares, líder maior da resistência quilombola no Brasil. Zumbi tombou em
combate em 20 de novembro de 1695, após praticamente 100 anos de resistência do
Quilombo dos Palmares e por isso esse dia é celebrado como Dia da Consciência Negra.
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OS NEGROS EM SERGIPE
Muito embora a capitania de Sergipe já produzisse açúcar em alguns engenhos no
decorrer dos séculos XVII e XVIII, foi somente na última década do século XVIII, que
atividade açucareira tornou-se a base econômica da província. A priori ocorreu o
desenvolvimento da pecuária, posteriormente ocorreu o desenvolvimento da cultura
açucareira a partir do século XVIII.
Os escravos sergipanos concentravam-se principalmente na zona açucareira, na
região da Cotinguiba, embora estivessem em áreas produtoras da pecuária. Dedicavam-se
as mais diversas atividades, onde plantavam, colhiam, carregavam os produtos e
produziam os torrões de açúcar. Muitos ainda desenvolviam lavouras de subsistência.
Aqueles que trabalhavam na residência tinham vida mais suave. Eram cozinheiras,
mucamas, amas, cocheiros, etc.
A ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA EM SERGIPE
As leis abolicionistas refletiram na organização do trabalho em nossa província. A
lei do Ventre Livre, segundo depoimento do presidente da Província, trouxe um surto de
inquietação entre os escravos e criou um fundo de Emancipação para a libertação dos
escravos. A princípio houve uma lentidão e até 1880, somente 131 escravos tinham sido
libertos, num universo de 26.381.
REVOLTAS DE ESCRAVOS EM SERGIPE
Assim como em todo o Brasil, os escravos em Sergipe também reagiram de formas
diversas à escravidão. A fuga foi a mais constante, mas também ocorreram suicídios,
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assassinatos, abortos e incêndios de propriedades. Nem todos os negros que fugiam iam
para os quilombos, visto que o termo não era comum na fala dos escravos sergipanos.
As expressões mais comuns eram “rancho”, “coito” e “mocambo”. Geralmente
esses lugares compunham-se de 10 a 15 indivíduos e não se desenvolvia uma economia
própria em seus redutos. Lideres negros que mais se destacaram nas revoltas foram: o
pardo, Antonio Pereira Rebouças, em Laranjeiras; o preto liberto Sebastião Soares e o
Crioulo Fuão, em Rosário do Catete; e o Alferes dos Henrique, Sebastião Paiva Noronha,
Santo Amaro das Brotas.
Ainda no século XIX, existiram quilombos nas seguintes províncias: Japaratuba,
Rosário do Catete, Siriri, Divina Pastora, Aracaju, Itaporanga, Maroim, Laranjeiras e
Capela. Dentre os lideres de quilombos, evidenciaram-se dentre outros pela audácia,
esperteza e trabalho que deram para serem capturados: José da Silva, José Maroim,
Joaquim, Ilário, João Mulungu, Manoel Hora, Izidoro, Frutuoso, Malaquias, Laureano e
Saturnino.
A MALOCA
Os primeiros moradores escolheram essa localização, por ter um terreno de morros,
o que reforça sua descendência com os escravos, já que os negros costumavam se
estabelecer em regiões montanhosas e de difícil acesso para se refugiarem de seus
exploradores, nesse contexto foi criado o quilombo
A “Maloca”, que significa na
linguagem indígena casa construída com folhas de palhas, com a finalidade de habitar
várias famílias. Não existia água encanada, sistema de esgoto, nem ruas asfaltadas. Antes
dessa denominação a comunidade remanescente de quilombola era conhecida como aldeia,
em virtude da forma que a comunidade se organizava. A comunidade localizada no Largo
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Pedro Alves Braz, bairro Getúlio Vargas existe
a 79 anos, sendo considerada a 2ª
comunidade negra urbana do país e a 1ª do Estado de Sergipe. Muitos desses moradores
que ali residem chegaram há mais de 70 anos, mais ou menos em1930. No entanto, foi a
partir de 1931 que a comunidade passou a ser conhecida como “Maloca”.
Segundo relato de Maria das Virgens dos Santos, 87 anos, mais conhecida como
Dona Caçula oriunda do município de Santa Rosa de Lima, o primeiro morador da
comunidade foi o senhor Andrelino Santana, em seguida Dona Elvira, sua mãe, que
vieram juntos para Aracaju porque a sua mãe não queria que a mesma trabalhasse nos
engenhos, mas tivesse uma vida bem melhor. À proporção que as pessoas iam chegando
traziam os seus familiares que ocupavam uma parte do terreno para construir as suas casas
e conseqüentemente ocorria o povoamento do local.
Relatos como esses escutamos de inúmeros moradores que evidenciavam a
dificuldade inicial de habitar o local, segundo os mesmos o local parecia desabitado,
tinham que entrar em uma ruazinha de terra, em época de chuvas pisavam em dejetos de
todo tipo, o local era insalubre. Sem falar nos jovens que iam para caixa d’água, se
esconder da polícia ou para utilizar drogas e,
acabavam sendo confundidos com os
moradores da maloca, reforçando o preconceito com os moradores do local.
Mesmo sendo remanescentes de quilombos, morando na comunidade há mais de 70
anos, apareceu um pretenso proprietário do terreno que ingressou na justiça para reaver a
posse de cerca de 90m². A comunidade foi por diversas vezes notificadas para deixar as
suas residências no prazo de 48 horas, mas como algumas pessoas já tinham documentos
que garantiam a posse da terra. Esse despejo nunca ocorreu.
As dificuldades eram visíveis dentro da comunidade Maloca, em que as pessoas por
não ter conhecimentos não buscavam os seus direitos de cidadãos. Para se ter uma idéia
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dessas dificuldades foi a partir dos anos 70 que começaram os melhoramentos de infraestrutura, inicialmente com a instalação da rede de energia, logo após com a água
encanada, que anteriormente era oriunda de bombas, os moradores tinham que se deslocar
para buscar essa água. Em seguida houve a pavimentação das ruas na administração do
Prefeito Jackson Barreto, que segundo os moradores foi o primeiro a dar visibilidade e
reconhecer os moradores do local como sujeitos de direitos, antes não entrava nenhum tipo
de transporte no local.
Hoje os moradores da comunidade Maloca vivem de forma mais organizada e
conseqüentemente mais estruturada, mas ainda percebemos claramente ao analisarmos o
nível escolar das pessoas, os moradores com menos de 30 anos, muitos concluíram o
ensino médio e alguns o ensino universitário, mas acima de 40 anos não conseguiram
concluir o primário.
Como forma de suprir esse baixo nível de escolaridade a comunidade através da
figura da ONG Criliber (Criança e Liberdade), destina a toda a comunidade vários cursos,
dentre os quais: informática básica e avançada, cabeleireiro, manicure, pedicure, agente de
limpeza, embalagens para presentes e pintura em seda. Infelizmente, algumas pessoas
dentro da comunidade acabam desistindo do curso em decorrência do trabalho ou até
mesmo a falta de interesse.
Muitos moradores afirmam que não mencionam ao procurar um emprego que
moram na Maloca, por temerem serem preteridos, o que sabemos fazer parte do
preconceito latente vivido pelos negros que mesmo tendo o mesmo nível de escolaridade
de um branco recebe um salário menor.
Em decorrência dessa educação discriminatória e, conseqüentemente, desigual, o
baixo nível de escolaridade da população negra contribui para manter a sua exclusão do
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mercado de trabalho, agravada pelas constantes e intensas reatualizações do mundo
contemporâneo. Acrescente-se a isso o fato de que os processos de seleção operam, por
vezes, com intervenção da mentalidade racista. Valores negativos, como a inadequação,
são atribuídos a pessoas negras, desqualificando-as para obter os postos de trabalhos mais
elevados. Essa seleção pautada pela orientação fenotípica tem
preponderado sobre
quaisquer outros critérios para a escolha de candidatos para uma vaga ou uma promoção
profissional.
Através de um trabalho antropológico foi possível descobrir que as famílias
residentes na comunidade migraram de engenhos localizados no Vale do Cotinguiba, mais
precisamente das seguintes cidades: Riachuelo, Laranjeiras, e Santa Rosa de Lima. Ao
chegar a Aracaju muitos foram trabalhar em casa de famílias como domésticas e
cozinheiras, os homens desenvolviam atividades relacionadas à jardinagem e engraxate,
para poder se manter, visto que era a única alternativa existente na época, principalmente
para as pessoas que não tinham estudos.
Todos eram filhos de escravos ou escravos alforriados, e a comunidade Maloca
hoje é caracterizada por traços africanos vivos no seu dia-a-dia, como por exemplo, a
religião, costumes culturais e comemorações como o São João e o caruru de Cosme e
Damião. Mesmo sendo habitada há anos a comunidade encaminhou o pedido de
reconhecimento no final de 2006, por iniciativa de uma Organização não Governamental
(ONG), criada pela própria comunidade, batizada de Criliber- Criança e Liberdade.
No ano subseqüente a comunidade Maloca, passou a ser reconhecida como
remanescente de quilombo através de uma certidão, emitido pela Fundação Cultural
Palmares, foi realizada pelo Superintendente Regional do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em Sergipe. Com esse reconhecimento a
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comunidade será beneficiada com ações de promoção do desenvolvimento socioeconômico
e cultura empreendidas pelo Governo Federal.
A CRILIBER
Essa entidade não governamental nasceu do desejo de uma das moradoras da
comunidade, mãe Madalena, que reunia em sua casa vários grupos de crianças para que
suas mães pudessem trabalhar , ensinava dança negra, seu sonho era ter um local especifico
em que pude-se atender mais crianças, mas infelizmente mãe Madalena faleceu antes do
seu sonho ser concretizado, através de aulas de dança afro que buscava alternativas para o
desenvolvimento da mesma.
O sonho da mãe Madalena foi realizado através do seu neto Luiz Augusto Bomfim,
que iniciou ensinando as danças que aprendeu com sua avó para as crianças e aos poucos
foi desenvolvendo outros trabalhos em uma sede alugada. Após a sua criação, em 18 de
julho 1982, vem realizando trabalhos em defesa e promoção dos direitos humanos da
criança e do adolescente que sofrem preconceito e discriminação de cor, raça e etnia,
oferecendo a todos um espaço de cultura e educação, através de projetos sociais.
Enquanto pessoa jurídica a entidade atua na comunidade quilombola Maloca e em
áreas vicinais, trabalhando com crianças, adolescentes e idosos, tendo como propósito
inicial fomentar a quebra das barreiras da discriminação racial. Foi com esse pensamento
que a instituição Criliber, abriu as portas para as crianças de cor brancas por entender que
as mesmas são filhos de Deus e não deveria excluí-las. O responsável por todo o trabalho
árduo fica a cargo do seu representante maior Luiz Augusto Bomfim, diretor-fundador da
instituição e um dos líderes da comunidade Maloca.
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A Criliber não bate as portas pedindo nada; ela atua na sua área porque tem
qualificação para fazer. Para a instituição esse tipo de trabalho é viável, visto que, a
seriedade do trabalho existe, principalmente pela reconstrução de políticas públicas, em
especial na área de discriminação racial.
A Criliber começou a sua trajetória em Julho de 1982 estimulado pela senhora
Maria Madalena com o Projeto intitulado” Criança da Periferia também Dança” com o
objetivo de possibilitar o acesso a todas as crianças da sociedade de Aracaju – Se, a
pesquisar e estudar dança e divulgar a cultura Afro – Brasileira, mostrar que as crianças e
os Jovens das periferias são capazes de interpretar; conquistar espaço e fugir da
prostituição, drogas e da criminalidade.
Como resultado, em 18 de Julho de 1988, á Criliber institucionalizou – se,
transformando – se no Balé Afro de Aracaju, que até hoje preserva um dos melhores Balés
Afro de Sergipe e se apresenta em toda parte de Sergipe com o seu maravilhoso espetáculo
“Em Busca da Liberdade”.
Concluiremos esse trabalho com a frase da Mãe Madalena que resume o espírito da
comunidade Maloca “ Mesmo morando em casas separadas fazemos parte da mesma
família”. E esse sentimento de união, que ficou evidenciado o tempo todo nessa pesquisa,
reforçado nos relatos como o de D. Maria Aparecida Conceição dos Santos, 59 anos
residente na comunidade a mais de 50 anos, “não existe outro lugar melhor de se morar. As
pessoas são amigas, se ajudam quando estão doentes, isto acaba sendo fundamental para
fortalecer a união dentro da comunidade”.
ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES
GEPIADDE/UFS/ITABAIANA
ISSN 2176-7033
III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES
EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO
11 a 13 de novembro de 2009
UFS – Itabaiana/SE, Brasil
16
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ISSN 2176-7033
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