Escrever, uma questão subjetiva
Uma das questões que se colocaram em nosso grupo, da Comissão de
Publicações, foi por que tanta resistência e dificuldades em escrever e mais
ainda quando a escrita deve ser publicada? O que é escrever? Por que é tão
difícil produzir um texto?
O registro da escrita, ao mesmo tempo que nos compromete naquilo que
escrevemos, também nos coloca na situação de nos supormos expostos para
um outro , do qual podemos inúmeras coisas imaginar, será que vai entender,
será que vai gostar, será que me criticará.
Para escrever precisamos nos autorizar, o que está ligado diretamente ao
lugar da alteridade. A dificuldade no escrever aponta dois lados, por um lado
estamos numa posição de transição, não somos clínicos, somos estudantes, por
outro lado escrever passa por autorizar-se a ocupar esse lugar do suposto saber
frente às questões que nos aparecem.
No decorrer do caminho acadêmico fomos atravessados pelo discurso
da psicanálise, a partir daí, estamos sempre remetidos não somente a nossa
fala como a nossa escrita. A apropriação do discurso psicanalítico não se
reduz a uma apropriação conceitual, mas à apropriação de nossas formações
inconscientes, ou seja, daquilo que se escreve. Por que tanta resistência para
escrever?
Para trabalhar esta questão nos reportamos ao trabalho de Simone
Rickes, “Escrever o que não se sabe”, texto publicado na revista APPOA.
Certamente, escrever um trabalho que parta da nossa experiência do estágio de
clínica, é diferente de um tema conceitual que estamos pesquisando. A
diferença é que, um texto que surja da clínica, tematiza uma experiência na
qual estamos implicados e somos testemunhas. Assim a resistência a escrever,
podemos pensá-la, a partir do que a autora citada coloca: como um efeito de
transferência com a própria psicanálise, ou seja, não podemos associar
livremente as idéias que nos surgem, oferecendo espaço para o inconsciente,
isto porque temos que pôr coerência na escrita, não quer dizer que devemos
seguir um esquema, mas que a resistência se coloca no momento em que
escrevemos para um outro sujeito, que não seja o próprio eu.
No ato de implicar-se na produção de um texto, essa implicação não
aparece como um processo de chegada, mas como algo que poderia ser
antecipado, ou mesmo revelar aquele que ali escreve como um ser total,
aparecendo então, como uma inibição da escrita. Ainda, a autora nos fala que
quando escolhemos o título da nossa escrita estamos falando um pouco de nós,
e que todo trabalho não deixa de ser uma biografia. Pode-se pensar, que um
texto que escrevemos pode nos revelar por completo, como se o texto pudesse
mostrar a nossa identidade. “Um ‘eu’ que pode dizer muito mais de um
indivíduo, indivisível, total.”
Escrevemos para o outro, mas sempre com uma implicação subjetiva,
esto é, a partir de questões particulares, que dizem algo de cada um, e, mesmo
que haja uma certa identificação do leitor com a escrita, não quer dizer que as
questões deste que lê, sejam as mesmas do escritor, mas que ocorre uma
apropriação da escrita, através das questões.
COMISSÃO DE PUBLICAÇÕES - 1º sem/2000:
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