PAINEL ILUSTRAÇÃO DO LIVRO INFANTIL: REFLEXÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO DESENVOLVIMENTO ESTÉTICO PERCEPTIVO DA CRIANÇA Brisa Caroline Gonçalves Nunes, licenciada em Artes Visuais UFPA Resumo O presente artigo propõe uma investigação a respeito das ilustrações de livros infantis e seus atravessamentos pedagógicos, levantando os aspectos com que este tipo de imagem pode favorecer o desenvolvimento cognitivo e estético perceptivo das crianças. Inicialmente fornece-se um panorama teórico da imagem ilustrativa, os elementos que diferenciam a ilustração no universo das manifestações visuais, situando-a enquanto imagem literária e narrativa. Partindo do tema da ilustração, buscou-se em seguida investigar a importância da imagem para o desenvolvimento dos indivíduos, enquanto favorecedora de mecanismos como a imaginação, criatividade e de habilidade gráfica, tendo como base os ensaios psicológicos de Vygotsky. A pesquisa classifica-se como exploratória e descritiva, os dados obtidos com a prática desenvolvida em campo são avaliados dentro de uma abordagem qualitativa. Assim é possível constatar o alcance das ilustrações na fase da infância, no sentido de ultrapassarem a função de acompanhar textos, manifestando reflexos também na produção gráfica da criança, revelando a importância da experiência estética na infância. PALAVRAS CHAVE: Ilustração; Infância; Desenho. 1. Considerações iniciais Os livros de narrativa infantil são muito reconhecidos pela maneira pela qual conquistam o interesse das crianças, despertando-lhes inicialmente o gosto pela leitura, através do contexto lúdico e prazeroso que envolvem. Imaginação, fantasia, faz-de-conta e brincadeiras são elementos com que as crianças mantêm uma relação intensa, podendo ser estimulados por fatores diversos, e são de fundamental importância para que cresçam com qualidade de vida e tornem-se indivíduos criativos na maturidade. De maneira geral, os livros são objetos de valor literário e muitas vezes fazem uso da ilustração como elemento decorativo ou de reforço, havendo aí uma relação de subordinação. Em verdade, no caso dos livros infantis, essa relação passou por uma ressignificação, estudos reconhecem que texto e ilustração possuem valor em potencial, e é indispensável que atuem juntos para transmitir as mensagens pretendidas pelas narrativas. Logo, reconhecer o potencial da ilustração é importante para a compreensão da totalidade de sentidos que uma obra literária de cunho infantil tem a oferecer, e que podem passar despercebidos pela falta de um olhar mais direcionado. Como resultado de uma monografia de conclusão de curso, esse ensaio parte de reflexões sobre a ilustração de livro infantil, para buscar em seguida compreender mais profundamente a importância pedagógica destas enquanto imagem para as crianças, sabendo que nos livros para adultos essa importância não se mostra com a mesma intensidade. Buscase compreender a maneira como a criança utiliza imagem em sua mente, na relação como o mundo, considerando esta imagem como instrumento simbólico – ou signo, e seu papel no desenvolvimento dos chamados “processos mentais superiores”, conforme as teorias psicológicas do autor L. S. Vygotsky. 2. O livro infantil na atualidade O sentido de complemento, elucidação ou reforço da imagem em relação ao texto literário acompanha as ilustrações desde as épocas mais remotas, e ainda se mantém na contemporaneidade. Contudo, levando em conta a produção das últimas décadas, observa-se certa ampliação deste sentido. O campo da ilustração infantil se mostra como multidisciplinar, abrange todo o universo da iconografia, dos símbolos e também suscita um estudo aprofundado sobre o desenvolvimento cognitivo. É preciso também, ressaltar a grande mudança ocorrida no campo da literatura infantil, onde as narrativas deixaram de contemplar apenas fábulas e histórias européias, em que existia um forte compromisso com um desfecho moralizante, relacionado a uma pedagogia de adestramento das crianças através do castigo. Além de abordarem características do tempo presente, do cotidiano, os livros atuais tornam visível a originalidade do autor, pois fogem da tradição oral e popular, sem perder de vista as fantasias do universo infantil. Trazem temas sociais, éticos, políticos, religiosos, emocionais, existenciais, tratam das múltiplas realidades, de maneira dirigida à compreensão da criança. Complementando com as palavras de Cunha, surgem livros “(...) para fazer teatro, para criar estórias, para bordar e livros apenas com imagens – um outro tipo de leitura é instituído, diferente daquela em que predominava o texto escrito a qual remetia o leitor ao mundo das imagens”(Cunha, 1999, p.160). Os livros, assim, tornaram-se proporcionadores de diversas experiências, sua proposta passou de apenas contemplativa para lúdica e interativa, convoca a criança a interagir, não apenas através da leitura do texto, mas pelo contato com imagens - processo de enorme importância que dialoga com a imaginação e propicia a vivência da narrativa. 3. A associação texto/imagem A ilustração infantil possui condições próprias, visto que expressa uma narrativa e a primeira, que parece mais relevante, é sua associação ao texto. À exceção dos livros que são apenas de imagens, é impossível desassociar a ilustração do texto que lhe inspirou, esta é uma de suas condições básicas, a palavra associada à imagem. No entanto esta associação é apenas parcial, há uma parcela do processo criativo que transcende o texto, sendo um espaço interpretativo em que o ilustrador tem liberdade para explorar os recursos visuais que considerar válidos. Portanto a imagem literária não se origina diretamente da leitura absoluta do texto, mas do universo interpretativo oferecido por este, na qual o artista assume a postura de “intérprete”, ao invés de “codificador” de textos em imagens, deve buscar o equilíbrio entre suas intenções e a do texto (OLIVEIRA, 2008). A autora Maria Alice Faria, no livro “Como usar a literatura infantil em sala de aula”, aborda as questões da imagem literária, explicando que nos livros ilustrados ocorre um processo denominado de “dupla narração”, em que as ilustrações acabam por constituir um segundo texto, como se o ilustrador fosse outro narrador, responsável por transmitir o conteúdo visual. A dupla narração também é reafirmada pelas autoras Walty, Fonseca e Cury, que complementam: “Na verdade, trata-se de dois textos autônomos que se interpenetram, enriquecendo o jogo de significações da leitura. Como se vê, tanto o escritor como leitor podem se apropriar de imagens para ler o mundo. Palavra ou imagem, verbo ou cor, o signo codifica o mundo em suas linguagens. Importa articulá-las. ” (WALTY; FONSECA; CURY, 2000, p.68) Assim, pode se entender a relação texto-imagem como de articulação, interação, demonstrada pela busca pelo uso ideal das funções que cada linguagem tem a oferecer, discriminadas de acordo com os objetivos da obra literária. 4. Vygotsky: mediação simbólica e processo de internalização Existem diferenças de complexidade nas ilustrações dedicadas às crianças pequenas, aos pré-adolescentes e aos adultos, a saber, que tais públicos se encontram em níveis diferentes de desenvolvimento cognitivo. Que relação existe entre a imagem e o público ao qual se destina? Por que as imagens são tão recorridas nos livros infantis, enquanto nos livros dedicados aos adultos essa importância não se percebe da mesma maneira? Para responder a essas questões, recorreu-se às teorias pedagógicas do autor L. S. Vygotsky, que realizou estudos sobre a criança na área de psicologia, na Rússia por volta da década de vinte. No livro intitulado “Vygotsky, Aprendizado e Desenvolvimento, um Processo Sócio-Histórico”, a autora Martha Khol de Oliveira descreve a obra do autor, que se dedica ao estudo dos denominados “processos mentais superiores”, responsáveis pelas ações mais sofisticadas do pensamento. A obra de Vygotsky se diferencia por compreender o desenvolvimento psicológico como produto do contexto histórico-cultural em que o indivíduo se encontra inserido, ou seja, denota uma relevância do papel social na formação psíquica, compreendendo o sujeito também como ser social. Esses direcionamentos o enquadram na direção epistemológica do construtivismo 1, pois reconhece a aprendizagem como um processo interativo entre o indivíduo, seus semelhantes, e o meio natural e sócio-cultural em que está inserido. Entre os postulados básicos, norteadores das pesquisas do autor, Oliveira afirma: “A relação homem/mundo é uma relação mediada por sistemas simbólicos.” (OLIVEIRA, 1993, p.23). Tendo o significado de mediação como “(...) o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a relação deixa, então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento.” (Idem, 1993, p. 26, grifos da autora). Segundo o autor, há dois tipos de mediadores, os “instrumentos” e os “signos”. Os instrumentos estão relacionados à idéia de trabalho 2, mediam a relação homem/mundo, possuindo funções específicas para suas ações a cumprir. Os signos, por outro lado, são como instrumentos, porém atuantes no campo psicológico, orientados “para dentro do indivíduo”, ou seja, direcionam-se ao pensamento. Assim, conforme a autora, “Na sua forma mais elementar o signo é uma marca externa, que auxilia o homem em tarefas que exigem memória ou atenção.”(Ibidem, p.30). Ela aponta como exemplo a prática das sociedades antigas, que para fazer a contagem de seus rebanhos usavam varetas, representando a quantidade de animais. Com isso eles 1 Na teoria epistemológica do construtivismo, reconhece-se que o conhecimento não se encontra encerrado, mas passa por constantes transformações, decorridas da interação do sujeito com todas as instâncias de sua vida no mundo. 2 Esse aspecto demonstra correntes filosóficas de outros autores, como Karl Marx, cuja obra teve grande influência nas pesquisas de Vygotsky. poderiam armazenar a informação e recorrer à ela sempre que necessário, não mais dependendo exclusivamente da memória, insuficiente para tantas informações. Para comprovar suas teorias, o autor realizou experimentos observacionais com crianças, investigando o papel dos signos na ação psicológica, através de um jogos associativos e de perguntas e respostas, usando símbolos icônicos e cartões coloridos. Assim, ele chega a algumas conclusões: “Esse processo de mediação possibilitou um comportamento mais controlado, uma ação motora dominada por uma escolha prévia. A ação psicológica tornou-se mais sofisticada, menos impulsiva. [...] o uso de mediadores aumentou a capacidade de atenção e de memória e, sobretudo, permitiu maior controle voluntário do sujeito sobre sua atividade.” (OLIVEIRA, Martha Khol de. 1993, p.32-33) Outra conclusão importante diz respeito à maneira gradativa com a qual as crianças vão fazendo uso do instrumento mediador, sendo em média a partir dos oito anos que começa a manifestar esta capacidade. Constatou-se que abaixo desta idade, não há o controle voluntário da criança em se apropriar dos signos mediadores para solucionar as atividades, a maneira como interagem com as situações ainda é predominantemente “direta” e apenas seu desenvolvimento, ao longo do tempo é que permitirá uma interação “mediada”. Para compreender como a criança se apropria dos signos, Vygotsky apresenta um segundo mecanismo muito importante, posterior à função mediadora, denominado “processo de internalização”. Este se forma a medida que o indivíduo se desenvolve, e tem como causa uma mudança psíquica no uso dos signos: se antes eram tidos como “marcas externas”, passam a ser “processos internos de mediação”. Eis então o “processo de internalização”, quando o acúmulo de experiências no mundo, torna o indivíduo capaz de realizar operações sem recorrer aos signos externos, pois estes já se encontram “internalizados” no próprio indivíduo. Assim, segundo Oliveira: “Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo deixa de necessitar de marcas externas e passa a utilizar signos internos, isto é, representações mentais que substituem os objetos do mundo real. Os signos internalizados são, como as marcas exteriores, elementos que representam objetos, eventos, situações.” (OLIVEIRA, Martha Khol de. 1993, p. 35, grifo da autora) O processo de internalização é, pois, responsável pela capacidade que o ser humano tem de operar com a representação mental, esta lhe permite realizar uma série de ações, lidando com conteúdos fisicamente ausentes, ou seja, conforme as palavras da autora “[...] possibilita ao homem libertar-se do espaço e do tempo presentes, fazer relações mentais na ausência das próprias coisas, imaginar, fazer planos e ter intenções” (OLIVEIRA, 1993, p.35). Retomando a reflexão a cerca dos livros infantis, pode-se dizer que nestes, os signos manifestam-se de duas maneiras, uma através das ilustrações, e outra, através da linguagem verbal, que segundo o autor, também se configura como um sistema simbólico. As imagens literárias contém todo um conjunto de representações do mundo, a interação texto/imagem compõe discursos repletos de significação. O mecanismo da imaginação presente durante a leitura dos livros ilustrados, é algo que exige a mobilização de sentidos para que a narrativa seja compreendida. Assim, uma criança em processo de alfabetização, ao ler a palavra “bola” e identificá-la em uma ilustração, não apenas associa os significados entre uma linguagem e outra (verbal e visual) reforçando o alfabetismo, como também está compondo um repertório visual, um conjunto de signos imagéticos que utilizará para executar a função mediadora, conformizando de fato um processo de aprendizagem. É neste sentido que se percebe a relevância do papel das ilustrações em livros. As crianças de idade inferior aos oito anos se encontram na etapa de compor um repertório visual básico, no qual as imagens atuam como signos mediadores no processo de compreensão das mensagens veiculadas pela leitura. Sabendo do processo de internalização, entende-se o motivo dos livros dedicados a adultos não conferirem a mesma ênfase às imagens. O adulto já apresenta os signos internalizados, ele ainda executa a função mediadora, porém não necessita do objeto real ou, no exemplo da leitura de um livro, não depende de imagens reais para compor seu entendimento, pois já realiza o pensamento através de imagens ou signos internos, como representações mentais. Oliveira afirma: “Quando trabalhamos com os processos superiores que caracterizam o funcionamento psicológico tipicamente humano, as representações mentais da realidade exterior são, na verdade, os principais mediadores a serem considerados na relação homem com o mundo.” (OLIVEIRA, Martha Khol de. 1993, p. 35, grifo da autora) Assim, considera-se a representação mental como mecanismo chave para a compreensão dos processos superiores, desenvolvida através de internalizações, precedidos pela atividade da mediação simbólica, que tem o signo como instrumento principal. 5. “Leitura e desenho”, um relato de experiências No capítulo final da monografia, são apresentados os resultados de uma atividade realizada com dois grupos diferentes de crianças. Este paralelo é importante, pois estabelece um contato mais próximo com o universo de ensino e aprendizagem de crianças do ensino fundamental, em espaços de educação formal/ não formal, realizado na Escola SIEC e no Projeto Ponte Arte. A primeira é uma escola de ensino infantil, de rede particular, enquanto o segundo se volta para crianças da comunidade carente da Passagem do Carmo, em Belém. A atividade tem como primeiro objetivo proporcionar às crianças o contato com todos os processos descritos no ensaio teórico, através de um ambiente lúdico de leitura de narrativas infantis. Após esse contato, foi pedido que elas desenhassem suas próprias histórias, para que fosse possível observar de que maneira os livros ilustrados se relacionam com a produção gráfica da criança. Para isso foi realizado um estudo da significação dos desenhos de cinco crianças, fundamentado no relatos das mesmas, obtidos a partir de entrevistas gravadas. A significação do desenho foi o primeiro aspecto a ser observado, percebeu-se que as crianças relacionam o conteúdo dos seus desenhos com elementos de seu universo íntimo e do universo infantil geral. Costumam transparecer elementos das fontes de histórias (livros, filmes, músicas, desenhos animados), que a criança entra em contato, absorve dialogando com sua subjetividade e os devolve à realidade através de desenhos, brincadeiras e outras criações. O outro aspecto foi o comportamental, as crianças dos dois grupos demonstraram interesse pelos livros, algumas revelaram ter muitos destes em casa e quando souberam no que consistia a atividade, ficaram ansiosas para desenhar e criar suas próprias histórias. Tal postura predisposta para com os livros indica o contexto lúdico que estes envolvem. No universo escolar, é comum que os professores utilizem os livros, especialmente os de língua portuguesa, em oficinas de leitura e interpretação de texto. Porém essas atividades são esporádicas, dependem muitas vezes da importância que o professor confere ao assunto, e das condições do acesso aos livros. O livro infantil não se trata, portanto, de um objeto a ser utilizado em sala de aula, enquanto conteúdo contínuo e obrigatório. Seu uso na escola está relacionado a uma prática fora da sala de aula cotidiana, realiza-se em ambientes separados, como nas salas de leitura, ou como atividade diferenciada, pois necessita de um envolvimento voluntário dos alunos para cumprir seus objetivos. O terceiro e último aspecto é a análise do nível de desenvolvimento motor, segundo as considerações de Vygotsky, no ensaio “El dibujo em la edad infantil”. O critério que determinou a escolha dos desenhos a serem analisados foi o nível de desenvolvimento demonstrado: um de pouco desenvolvimento, outro mediano e um de habilidade elevada. Esta análise permite observar como se manifestam os diferentes níveis descritos por Vygotsky, verificando a mudança do eixo perceptível “dinâmico-táctil” para “puramente visual” da representação gráfica, que acompanha a todo e qualquer indivíduo em seu processo de desenvolvimento. Em suas primeiras etapas, o desenho infantil não representa aquilo que as crianças vêem na realidade, mas sim aquilo que compreendem ou imaginam sobre o objeto, aquilo que trazem na memória ou julgam mais importante, pois a representação real do objeto será alcançada apenas com o tempo, através da representação mental, pautada na apreensão perceptiva da realidade. Pode-se dizer então, que a representação mental que a criança traz é mais determinante no momento de produzir os desenhos, conforme o autor afirma: “Ao desenhar, a criança leva ao desenho tudo o que sabe do objeto que representa e não apenas o que vê. Por isso, com freqüência pinta coisas que não vê e, pelo contrário, faltam em seu desenho muitas coisas que vê sem dúvida alguma, mas que não lhe parecem substanciais no objeto que está desenhando.” (VYGOTSKY, L. S. 1990, p.96) A criança enfatiza no desenho os traços essenciais, os elementos que a ela parecem mais significativos, não se importando em estudar a forma real, nem mesmo chegando a observar o objeto. Vygotsky reconhece que não há, nas primeiras etapas do desenho, uma finalidade artística e que certamente estes estão submetidos a uma falta de apuros técnicos, que é própria desta fase. Através dos desenhos obtidos com a atividade, foi possível observar as quatro etapas do desenvolvimento, descritas pelo autor: “esquemática”, “esquemático-formalista”, de “representação” e de “imagem plástica”. A característica mais evidente que essas quatro etapas pode mostrar é a transição do desenho de origem mental, ou “desenho de memória” (aquele que não se fundamenta com as formas reais do objeto), para o desenho de observação, em que a criança passa a se apropriar das formas dos objetos e representá-las com mais perícia. É um reflexo da percepção da criança, inicialmente revelada como “dinâmico-tátil”, depois passando a ser “puramente visual”, a partir da qual passa a comandar a relação com o mundo. (VYGOTSKY, 1990, p.101). O desenho das crianças pode revelar muitas informações a cerca de seu desenvolvimento, em especial a escala de importância que a percepção visual ocupa no percurso natural de aperfeiçoamento dos indivíduos. O contato com imagens de livros ou de outras fontes pode contribuir, a medida que funciona como experiência visual a ser assomada em seu repertório, passando a constar um maior número de referências, que a criança certamente fará uso em atividades gráficas ou de criatividade. 6. Conclusão A julgar pelas últimas décadas, autores como Cunha (1990) consideram certa mudança no modo de conceber o uso da ilustração nos livros, estas deixaram a função de simples decoração, para que juntamente com o texto, tivessem condições de contribuir para a narrativa, dentro da linguagem visual. Tal fato se deve também a vários estudos relacionados à infância, destacando a importância de experiências que favoreçam a imaginação e o pensamento criativo, elementos presentes entre o “processos mentais superiores”, de acordo com Vygotsky e Oliveira. O autor defende os sistemas simbólicos – signos imagéticos e linguísticos, mediando a relação do homem com o mundo. A existência da “função mediadora” do pensamento confere ao homem uma habilidade inexistente nos outros seres e para tal, é fundamental que o indivíduo acumule experiências, conhecimentos e também imagens, em suas primeiras idades, para desenvolver as potencialidades básicas a qualquer sujeito. É importante destacar o papel da família e da escola, em proporcionar experiências enriquecedores que incentivem o contato da criança com imagens e atividades artísticas, em especial o desenho. Este configura-se como um espaço de liberdade expressiva, revela o universo íntimo da criança e é fundamental para o desenvolvimento da criatividade, tanto para os indivíduos que se interessem por este, quanto para os que não pretendem desenvolvê-lo. Conclui-se que o valor imagético da ilustração infantil, sendo parte da produção dentro das artes visuais, tem uma importância singular na infância, auxiliando no desenvolvimento de processos cognitivos básicos, necessários para uma melhor qualidade da vida adulta. Espera-se que a pesquisa possa contribuir para a atuação profissional do educador, em despertando o olhar deste para a importância da experiência estética na infância, seja através dos livros infantis, seja através de outros meios. Referências bibliográficas AUMONT, Jacques. A imagem. Campinas, São Paulo: Papirus, 1993. CASTRO, Eline Fernandes de. A importância da leitura infantil para o desenvolvimento da criança. Monografia (Graduação em Licenciatua Específica em Português) Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, 2009. COELHO, Nelly Novaes. Panorama histórico da literatura infantil/juvenil, das origens indoeuropéias ao Brasil contemporâneo. São Paulo: Quíron, 1985. CUNHA, Susana Rangel Vieira da. 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