FATO TÍPICO
PROFESSOR: LEONARDO DE MORAES
Fato típico é o primeiro substrato do crime (Giuseppe Bettiol – italiano) – conceito
analítico (fato típico dentro da estrutura do crime).
Qual o conceito material de fato típico? R – vejamos a construção a seguir.
Inúmeros são os fatos que ocorrem no mundo. São fatos humanos e fatos da natureza.
O direito penal é seletivo, de modo que interessam apenas os fatos humanos.
Esses fatos humanos podem ser desejados (sociais) e indesejados (antissociais). O
direito penal é seletivo (peneira), não interessam os fatos humanos desejados. Só interessam para
o direito penal os fatos humanos indesejados.
Todos os fatos humanos indesejados interessam para o direito penal? Não. Andar na
contramão é um fato indesejado que não interessa para o direito penal porque o direito penal é
anunciado pelo princípio da intervenção mínima, é dizer, o direito penal é subsidiário e
fragmentário.
Fato típico é a prática de um fato humano indesejado, orientado pelo princípio da
intervenção mínima, que consisti em uma conduta produtora de um resultado, com nexo causal
entre eles (conduta e o resultado) e que se ajusta formal e materialmente a um tipo penal (ajuste
a uma lei penal incriminadora). É o conceito material de fato típico. A partir daí eu não tenho só
um fato, eu tenho um fato típico, pois o fato é tipificado em lei. O oposto é o fato atípico.
O Crime, no entanto, para ser praticado depende dos seguintes elementos:
a) Fato típico – primeiro substrato do crime;
b) Ilicitude – segundo substrato do crime;
c) Culpabilidade – terceiro substrato do crime.
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Se o fato for típico + lícito + culpável, nasce à punibilidade. Vejam que a punibilidade
não é substrato do crime, mas sua consequência jurídica.
1 – ELEMENTOS DO FATO TÍPICO
Para os crimes materiais:
a) CONDUTA
b) RESULTADO
c) NEXO CAUSAL
d) TIPICIDADE FORMAL E MATERIAL.
Para os crimes formais e de mera conduta:
CONDUTA + TIPICIDADE FORMAL E MATERIAL
Tipicidade não se confunde com tipo penal:
Tipicidade é uma operação de ajuste entre o fato e o tipo penal. Ex: Art. 121 (matar
alguém) e ocorreu o fato de “A” matar “B” – o fato se ajusta ao tipo penal (tipicidade).
Tipo penal é o modelo criado pela lei de conduta proibida. Os tipos penais são
construídos com os seguintes elementos:
a) Subjetivos: indicam a finalidade especial buscada pelo agente. Normalmente vem
acompanhada com a expressão “...com o fim de ...”.
b) Objetivos: referem-se ao fato em si mesmo. Podem ser:
b.1) Descritivos: são elementos facilmente percebidos pelos sentidos (elementos
sensíveis).
b.2) Normativos: necessitam juízo de valor do juiz.
Obs: Nem todos os tipos penais são dotados de elementos subjetivos e nem de
elementos objetivos normativos. Mas todos os tipos penais são compostos de elementos
objetivos descritivos.
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Ex1: art. 121 só tem elementos objetivos descritivos, pois não precisa de finalidade
especial e não demanda juízo de valor.
Ex2: Art. 154, CP: necessita de juízo de valor, para ver se a causa é justa ou não.
Ex3: Art. 299, CP: tem finalidade especial (“com o fim de”).
a) CONDUTA
É o movimento (ação ou omissão) humano, consciente e voluntário, psicologicamente
dirigido a uma finalidade.
O conceito de conduta varia conforme a teoria adotada:
1ª) Conduta para a Teoria CAUSALISTA, NATURALISTA OU MECANICISTA
Adotam Von Liszt e Beling.
Inicialmente, para a teoria causalista, crime é constituído por:
- Fato típico (ação, resultado, nexo causal e tipicidade);
- Ilicitude;
- Culpabilidade.
Necessariamente, para a teoria causalista o conceito analítico de crime é tripartido,
pois o dolo e a culpa estão na culpabilidade.
A culpabilidade é formada por imputabilidade + exigibilidade de conduta diversa + dolo
e culpa (estes dois passam a ser elementos da culpabilidade, e não mais espécies de
culpabilidade). Dolo e a culpa estão na culpabilidade (teoria psicológica da culpabilidade).
Conceito: conduta (ação) é um movimento humano voluntário (apenas ação) que
causa modificação no mundo exterior (mundo físico). Assim, a conduta não é dirigida a nada
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(aquilo que eu quis com minha conduta é analisada apenas na culpabilidade), pois tal finalidade é
estudada apenas na culpabilidade.
É objetiva, sendo desprovida de dolo e de culpa.
Observações:
1 – Dolo e culpa pertencem a culpabilidade (espécies);
2 – Os tipos penais devem ser meramente descritivos, sem elementos normativos e
subjetivos), pois o dolo e culpa só serão estudados na culpabilidade os elementos subjetivos não
serão analisados na conduta.
Isto se dá pois, para a teoria clássica, os tipos penais são objetivos, ou seja, não
admitem valoração (elementos normativos) e não tem que perquirir finalidade de ninguém
(elementos subjetivos). Um tipo penal objetivo. “Matar alguém, ponto.”
Tipo normal e tipo anormal: essa classificação tem interesse para o causalismo:
- Tipo normal é composto apenas por elementos objetivos descritivos.
- Tipo anormal é composto de elementos objetivos descritivos, normativos e/ou
subjetivos. O nome é anormal, pois os seus elementos são incompatíveis com os ditames da teoria
causalista.
Críticas:
- Diz que conduta é apenas ação, esquecendo-se da omissão (não abrange os crimes
omissivos);
- Dolo e culpa, que deveriam estar na base da conduta, mas estão da culpabilidade;
- Não reconhece elementos subjetivos e normativos no tipo;
- Não resolvem o problema da coação moral irresistível;
- Não resolvem o problema do delito tentado (ver no livro do André Stefan)
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2º) Conduta para a Teoria NEOKANTISTA OU NEOCLÁSSICA
Tem base causalista. Tem adeptos, como Rickert e Lisk.
Para a teoria neokantista crime também tem três substratos:
- Fato típico (conduta, resultado, nexo e tipicidade);
- Ilicitude;
- Culpabilidade.
O fato típico é formado de conduta (ao invés de ação), incluindo também a omissão.
Assim, os neokantistas preferiam falar em comportamento, para incluir a ação e a omissão
(primeira diferença para a teoria clássica).
Necessariamente, para a teoria Neokantista o conceito analítico de crime é tripartido,
pois o dolo e a culpa estão na culpabilidade.
Conceito: conduta é o comportamento humano voluntário que causa modificação no
mundo exterior (mundo físico). (igual a teoria clássica)
Observações:
1 – Abrange ação e omissão (“comportamento”);
2 – Dolo e culpa permanecem na culpabilidade (elementos, e não espécies);
3 – Admite elementos não descritivos no tipo (subjetivos e normativos), o que é uma
contradição, pois o dolo e a culpa estão na culpabilidade e a base é causalista.
Adota a teoria normativa da culpabilidade (culpabilidade com elemento normativo,
que é a exigibilidade de conduta diversa).
Admite elementos objetivos e subjetivos do tipo (teoria dos elementos subjetivos do
injusto), mas mantém o dolo e a culpa na culpabilidade. (2ª diferença para a teoria clássica).
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Importante: a teoria neokantista adota os conceitos principais do causalismo, com
algumas evoluções.
Críticas à Teoria Neokantista:
- Partindo de conceitos naturalistas, ficou contraditória quando reconhece elementos
normativos e subjetivos do tipo, porém, mantém o dolo e a culpa na culpabilidade – comete o
mesmo erro do causalismo;
- Dolo e culpa na culpabilidade.
c) Conduta para a Teoria FINALISTA DA AÇÃO
Hans Welzel.
Crime é formado por:
- Fato típico (conduta, resultado, nexo e tipicidade);
- Ilicitude;
- Culpabilidade.
Essa teoria também é tripartite.
A culpabilidade é formada por imputabilidade + potencial consciência da ilicitude +
exigibilidade de conduta diversa. Dolo e culpa não estão mais na culpabilidade, mas sim no fato
típico.
Conceito: conduta é o comportamento humano voluntário psiquicamente dirigido a
um fim.
O dolo e a culpa migraram da culpabilidade para o fato típico, uma vez que a finalidade
está na base.
Admite que o tipo tenha elementos objetivos, subjetivos e normativos.
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Com tudo isto fica clara a diferença com as teorias clássica e neokantista, pois estas
são cegas, já que analisam a conduta sem saber o que o agente queria (finalidade). O finalismo é
vidente, pois exerga na conduta aquilo que se quer com ela.
É chamada de teoria finalista tradicional.
Críticas:
- A finalidade não explica os crimes culposos, sendo frágil também nos crimes
omissivos.
- Só se preocupa com conduta, ignorando o resultado.
d) Conduta para a Teoria FINALISTA DISSIDENTE
René Ariel Dotti.
É aquela que diz que crime é constituído apenas de dois substratos:
- Fato típico;
- Ilicitude.
A culpabilidade não é elemento do crime, é um juízo de censura, um mero pressuposto
de aplicação da pena.
No mais, é idêntica à finalista tradicional. A única diferença da finalista dissidente para
a outra, é a natureza jurídica da culpabilidade. No mais, o conceito de conduta é o mesmo. O fato
típico também é constituído de: conduta, resultado, nexo e tipicidade.
Conceito de conduta é igual ao finalismo tradicional.
Crítica: retirando a culpabilidade do crime admite a hipótese de crime sem censura,
quando ausente a culpabilidade.
e) Conduta para a Teoria SOCIAL DA AÇÃO
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Wessels.
É tripartite.
Crime é formado por:
- Fato típico (conduta, resultado, nexo e tipicidade);
- Ilicitude;
- Culpabilidade.
A culpabilidade é formada por imputabilidade + potencial consciência da ilicitude +
exigibilidade de conduta diversa.
Adota a mesma estrutura do finalismo tradicional ou clássico, mas com uma diferença
no final.
Conceito: Conduta é comportamento humano voluntário dirigido psiquicamente
dirigido a um fim socialmente relevante.
Observações:
- Dolo e culpa no fato típico;
- Dolo e culpa são analisados mais uma vez (além do fato típico) no juízo de censura.
Crítica: não há clareza no que significa “socialmente relevante.” Dependerá da análise
do caso concreto, de acordo com o princípio da adequação social, o que pode modificar de acordo
com a interpretação de cada juiz.
Todas as teorias até agora analisam o crime com base em estruturas jurídicas.
Entretanto, a partir de 1970 nasce na Alemanha as teorias funcionalistas, que analisam a
finalidade do direito penal com base em estruturas sociológicas.
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O funcionalismo penal surgiu na Alemanha a partir de 1970, com forma de submeter a
dogmática penal aos fins específicos do direito penal. A teoria deve ser atrelado aos fins do
direito penal. Tudo depende da função, finalidade, missão do direito penal.
f) Conduta para a Teoria FUNCIONALISTA TELEOLÓGICA (OU MODERADA)
Claus Roxin.
O crime é constituído por:
- Fato típico (conduta, resultado, nexo e tipicidade);
- Ilicitude;
- Reprovabilidade.
A reprovabilidade é composta de: imputabilidade + potencial consciência da ilicitude +
exigibilidade de conduta diversa + necessidade da pena. Se a pena é desnecessária o fato deixa de
ser reprovável e, consequentemente, deixa de ser crime.
Para o funcionalismo teleológico, a reprovabilidade entrou no lugar da culpabilidade.
Ex: marido bate na esposa – esposa presta BO e instaura IP por LC (APPI) – MP
denuncia e antes da audiência a esposa procura o MP e quer encerrar o processo, pois estavam
juntos e ela aduz que ela deu causa a agressão, e que o ama e está grávida do marido – o marido,
na audiência, confessou e se mostrou arrependido pelo que fez – para Roxin a pena não seria
necessária, de modo que falta reprovabilidade e crime.
O que eles fizeram com a culpabilidade? Aqui, a culpabilidade passa a ser limite da
pena, não sendo elemento integrante do crime. É a culpabilidade funcional.
A missão (fim) do direito penal para Roxin é a proteção de bens jurídicos
indispensáveis ao homem.
Conceito: conduta é o comportamento humano voluntário causador de relevante
lesão ou perigo de lesão a bens jurídicos tutelados.
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Dolo e culpa estão no fato típico.
O funcionalismo teleológico trabalha com o princípio da insignificância, pois só haverá
conduta se o comportamento humano causar relevante lesão a bens jurídicos tutelados. Se a lesão
for irrelevante (insignificante) não haverá conduta e, por conseguinte, fato típico.
Críticas: a única crítica que se faz a essa teoria é colocar a reprovabilidade como
elemento do crime, ao invés da culpabilidade.
g) Conduta para a Teoria FUNCIONALISTA RADICAL ou SISTÊMICA
Gunter Jakobs.
Elementos do crime:
- Fato típico (conduta, resultado, nexo e tipicidade);
- Ilicitude;
- Volta para a culpabilidade.
A culpabilidade é formada por: IMPUTABILIDADE + POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA
ILICITUDE + EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA.
A missão do Direito Penal é resguardar o sistema (o império da norma).
Conceito: conduta é o movimento humano voluntário que viola o sistema, frustrando
as expectativas da norma.
Para Jakobs, quando a pena é aplicada ela faz um exercício de fidelidade ao direito, e
comprova que o direito é mais forte que a sua violação. Ele se preocupa com a não violação ao
sistema, apenas isto.
Foi nessa teoria que nasceu o Direito Penal do Inimigo: aquele que violou o sistema
deve ser tratado como inimigo, devendo ser reduzido o rol de direitos e garantias.
Direito Penal do Inimigo tem as seguintes características:
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- Antecipação da punibilidade com a tipificação de atos preparatórios: o legislador
quer antecipar a punição. Impaciência do legislador, que não aguarda o início da execução. O
Brasil tem um pouco disso no delito de quadrilha ou bando, pois busca punir os atos meramente
preparatórios.
- Criação de tipo de mera conduta: o Brasil tem crimes de mera conduta, como
violação de domicílio, etc.
- Criação de tipo de perigo abstrato: o Brasil tem os crimes previsto na lei de drogas
(Lei 11.343/06), de modo que tem um pouco de DP do Inimigo.
- Flexibilização do princípio da legalidade (em relação à taxatividade): descrição vagas
dos crimes e das penas, visando englobar maior número de comportamentos. Ex: Crime: causar
tumulto, em que pode englobar uma série de comportamentos.
- Inobservância do princípio da ofensividade: pois, como dito acima, o DP Inimigo
trabalha muito com os crimes de perigo abstrato.
- Inobservância do princípio da exteriorização do fato, predominando o direito penal
do autor: quer punir o inimigo do Estado, e não aquele que praticou um fato delituoso.
- Desproporcionalidade das penas: penas excessivas para punir o inimigo do Estado.
- Surgimento das “Leis de luta e de combate”: a lei de crimes hediondos é exemplo,
pois busca combater os comportamentos mais graves.
- Endurecimento da execução penal: maior tempo de regime cumprimento de pena. O
RDD é exemplo disso.
- Restrição de garantias penais e processuais.
Dolo e a culpa continuam no fato típico.
O funcionalista radical admite princípio da insignificância? Não. Ele está preocupado
com o sistema. O furto de um sabonete, apesar de insignificante, merece ser punido, pois violou o
sistema. Quem viola o sistema deve ser tratado como inimigo.
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Crítica: as características da teoria funcionalista radical serve apenas aos Estados
Totalitários, e não aos países Democráticos, como é o caso do Brasil.
- HIPÓTESES DE AUSÊNCIA DE CONDUTA:
Antes de falar das hipóteses, é importante falar que do causalismo até o
funcionalismo, a conduta tem em comum o fato de ser “o movimento humano voluntário”
(voluntário é o movimento dominável pela vontade). Assim, se o movimento humano não for
dominável pela vontade não existirá conduta para qualquer das teorias.
- Caso Fortuito ou força maior;
- Coação física irresistível: obrigar alguém a fazer algo por meio de força física
irresistível.
Obs: a coação moral irresistível é obrigar alguém a fazer algo por meio de grave
ameaça. Neste caso, há vontade (apesar de viciada), pois o coagido tem opção de agir ou não agir.
Mas como não é exigível a prática de comportamento diverso do efetivamente realizado, excluirá
a culpabilidade, e não a conduta;
- Movimentos reflexos.
Obs: os movimentos reflexos previsíveis, que não excluem a conduta. Ex: limpa arma
ao alcance de crianças e na sua casa ouve-se muito trovão – toma susto e morre – haverá conduta.
- Estados de inconsciência. Ex: sonambulismos, não há conduta pois o seu movimento
não é dominável pela vontade.
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11 - Fato típico formatado e finalizado