ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL Medicina I Doutora Isabel Soares Catarina Gonçalves Ivo Airosa DEFINIÇÃO OMS – Acidente Vascular Cerebral define-se como : “sintomas e/ou sinais de perda de função cerebral focal e, por vezes, global, instalando-se rapidamente, com duração superior a 24 horas ou levando à morte, e sem outra causa aparente que a de origem vascular”. EPIDEMIOLOGIA Incidência anual: ~2% população (países industrializados) Custos económicos e sociais • Mortalidade 2ª causa de morte em Portugal 1/6 doentes morre no 1º mês após AVC • Dependência 1/2 dos sobreviventes - dependência permanente 10 a 20% dos doentes com AIT vão ter um AVC incapacitante nos 90 dias subsequentes CLASSIFICAÇÃO PATOLÓGICA ARTERIAL ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL (AVC) ISQUÉMICO ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL ISQUÉMICO (AVC I) ACIDENTE ISQUÉMICO TRANSITÓRIO (AIT) HEMORRÁGICO ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL HEMORRÁGICO (AVC H) (HEMORRAGIA PARENQUIMATOSA) HEMORRAGIA SUBARACNOIDEIA (HSA) ACIDENTE VASCULAR MEDULAR (AVM) VENOSO TROMBOSE VENOSA CEREBRAL (TVC) AVC ISQUÉMICO - FISIOPATOLOGIA Oclusão de vaso intracraneano provoca diminuição do fluxo sanguíneo para a região cerebral que este vasculariza Diminuição do aporte de glicose aos neurónios (células com elevado metabolismo e baixa reserva de glicogénio) radicais livres de O2 por diminuição produção de ATP mitocondrial A magnitude desta diminuição depende da existência ou não de circulação colateral Febre Glicémia > 200 mg/dl ISQUÉMIA AVC ISQUÉMICO VS AIT Ambos são: Episódios de disfunção neurológica focal de presumível etiologia vascular isquémica Início súbito (abrupto) de sinais neurológicos com défice máximo após segundos ou minutos AIT: Duração dos sintomas < 24 horas (geralmente < 1 hora); Sem evidência de enfarte isquémico agudo (exames imagem) AVC isquémico: Défice neurológico persistente (duração dos sintomas > 24 horas ou provocando a morte) Evidência de enfarte isquémico agudo AVC isquémico minor: Défice neurológico persistente não incapacitante AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA Classificação TOAST (Trial of ORG 10172 in Acute Stroke Treatment) - início anos 90 AVCs isquémicos de acordo com os mecanismos fisiopatológicos que são reconhecidos como a causa da maioria dos mesmos Baseada nos aspectos clínicos e resultados de exames auxiliares: neuroimagem, avaliações neurovasculares, testes cardíacos e avaliações laboratoriais do estado prótrombótico AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA 5 subtipos do Toast de AVC isquémico Aterosclerose de grandes artérias Cardioembolismo Oclusão de pequenos vasos AVC de outra etiologia determinada AVC de etiologia indeterminada 2 ou mais potenciais causas identificadas avaliação negativa avaliação incompleta AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA SSS-TOAST (Stop Stroke Study Trial of Org 10172 in Acute Stroke Treament) Divide cada um dos subtipos originais do TOAST em 3 subcategorias Evidente Provável Possível Baseada no peso das diferentes evidências diagnósticas AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA Sintomas e sinais território cerebral envolvido Oxfordshire Community Stroke Project (OCSP) define os vários síndromes clínicos que correspondem a cada um dos principais territórios de irrigação arterial cerebral. para esta classificação deve ser usado o padrão clínico na altura do défice máximo do primeiro AVC isquémico. AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA Enfarte lacunar (LACI) Défice hemi-sensitivo ou motor (envolvendo pelo menos 2 de 3 entre face, braço e perna) com ou sem sinais cerebelosos ipsilaterais, isto é, quaisquer dos síndromes seguintes: AVC motor puro AVC sensitivo puro Hemiparésia atáxica AVC sensoriomotor AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA De notar que qualquer do seguinte exclui enfarte lacunar: Disfasia de novo Perturbação visuoespacial de novo Perda sensitiva proprioceptiva predominante Manifestações que claramente localizam a lesão na distribuição vertebrobasilar (paralisias oculares ou défices cruzados) Alteração do nivel de consciência AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA Enfarte total da circulação anterior (TACI) Combinação de todas as seguintes manifestações: Disfunção cerebral superior de novo (disfasia, discalculia ou problema visuoespacial) Defeito de campo visual homónimo Défice motor e/ou sensitivo ipsilateral envolvendo pelo menos 2 de 3 entre face, braço e perna. De notar que se o nível de consciência está prejudicado e não é possível testar formalmente as funções cerebrais superiores e/ou os campos visuais, é assumida a presença de um défice. AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA Enfarte parcial da circulação anterior (PACI) Doentes com uma das seguintes manifestações: 2 dos 3 componentes do síndrome TACI Disfunção cerebral superior de novo isolada Défice motor/sensitivo mais restrito do que aqueles que são classificados como LACI AVC ISQUÉMICO CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA Enfarte da circulação posterior (POCI) Qualquer dos seguintes: Paralisia de nervo craneano ipsilateral e défice motor e/ou sensitivo contralateral Défice motor e/ou sensitivo bilateral Desordem do movimento conjugado dos olhos Disfunção cerebelosa sem défice de vias longas ipsilateral (que seria classificado como hemiparésia atáxica) Defeito de campo visual homónimo isolado Oclusão do topo da artéria basilar e da artéria cerebral posterior Trombose da artéria basilar (múltiplas lesões isquémicas do território posterior) AVC HEMORRÁGICO Localização: Difusa – Intraventricular e Subaracnoideia Focal – Hemorragia intraparenquimatosa Hemorragia no espaço epidural e subdural surge por trauma. Hemorragia profunda (GG base, subcortical) Causa mais frequente: HTA (hematoma hipertensivo) Hemorragia lobar (cortical) Causa mais frequente: Jovem – Malformação Arterio-Venosa (MAV) cerebral Idoso – Angiopatia amilóide cerebral AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA SUBARACNOIDEIA Causas Traumatismo Craneano Ruptura do Aneurisma Sacular Hemorragia de uma Anomalia Vascular Extensão para o espaço subaracnoideu de uma Hemorragia Intracerebral Primária. Idiopática. Fisiopatologia Aneurismas saculares – bifurcações das artérias intracraneanas de médio e grande calibre 85% circulação anterior (polígono de Willis) 20% múltiplos aneurismas (bilateralmente e simetricamente em espelho) AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA SUBARACNOIDEIA Clínica Cefaleia súbita de grande intensidade Náuseas e vómitos Afundamento estado de consciência Convulsões Sinais meníngeos F.O.: Edema papilar, h. subhialoideia HTA “reactiva” AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA SUBARACNOIDEIA Clínica/ Diagnóstico 1º TAC CE HSA Angiografia NEGATIVA PL 2º PL HSA Angiografia NEGATIVA EXCLUI HSA AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA INTRACEREBRAL Causas mais comuns: hipertensão, trauma e angiopatia amilóide cerebral. aumentam o risco: idade avançada, consumo de álcool e cocaína Inclui: 1. Hemorragia Intraparenquimatosa Hipertensiva 2. Hemorragia Lobar 3. Outras causas AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA INTRACEREBRAL HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA HIPERTENSIVA ruptura espontânea de uma pequena artéria que penetra o cérebro. desenvolve-se entre 30 a 90min Locais mais comuns: tálamo protuberância putame cerebelo. Pode ser pequena, ou um grande coágulo pode comprimir os tecidos adjacentes herniação e morte. HEMORRAGIA MODERADA vs HEMORRAGIA GRAVE AVC HEMORRÁGICO HEMORRAGIA INTRACEREBRAL HEMORRAGIA LOBAR Sintomas surgem em alguns minutos. Clínica Hemianopsia (Hem. Occipital), afasia e delirium (Hem. Temporal esquerda), perda hemisensorial (Hem. Parietal), fraqueza do braço (Hem. Frontal) Geralmente os doentes têm cefaleias focais e vómitos. Outras Angiopatia Amilóide Cerebral Cocaína Traumatismo craneano Terapia Anticoagulante Tumores Encefalopatia Hipertensiva ABORDAGEM INICIAL Objectivos na fase inicial incluem: Assegurar a estabilidade do doente Reverter rapidamente quaisquer condições que estejam a contribuir para o mau estado do doente Tomar medidas para definir a base fisiopatológica dos sintomas neurológicos do doente Pesquisar potenciais contra-indicações para a trombólise em doentes com AVC isquémico agudo ABORDAGEM INICIAL ASSEGURAR A ESTABILIDADE DO DOENTE Sinais vitais pressão arterial, respiração e temperatura Pressão arterial Pressão arterial média (PAM) – normalmente elevada em doentes com AVC agudo Geralmente um mecanismo de manutenção da perfusão cerebral decisão de tratar: balanço entre o potencial risco de elevações sucessivas na pressão arterial vs possível declínio na função neurológica quando a pressão arterial é reduzida ABORDAGEM INICIAL ASSEGURAR A ESTABILIDADE DO DOENTE Respiração Doentes com PIC elevada devido a hemorragia ou isquémia – podem apresentar drive respiratório diminuído ou obstrução muscular das vias aéreas Doentes com ventilação adequada – monitorizar Sat. O2 Intubação – restaurar ventilação, proteger via aérea, importante na presença de vómitos ABORDAGEM INICIAL ASSEGURAR A ESTABILIDADE DO DOENTE Temperatura Febre pode piorar isquémia cerebral Diagnóstico diferencial: meningite, empiema subdural, abcessos, endocardite infecciosa, pneumonia por aspiração e infecção urinária Manter normotermia pelo menos nos 1os dias – antipiréticos DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Convulsões Síncope Enxaqueca Hipoglicémia (perguntar se o doente toma insulina ou um hipoglicemiante oral) Overdose ou abuso de drogas Medicação no momento da admissão Acidentes recentes Histeria AVC ISQUÉMICO OU HEMORRÁGICO Classificação OCSP Início em actividade Cefaleia Afundamento do estado de consciência Deterioração progressiva TA muito elevada na admissão Exames: Tomografia Computorizada (TC) Imagiologia por Ressonância Magnética (IRM) altamente sensível no diagnóstico de hemorragia no AVC agudo mais sensível que a TC no diagnóstico precoce de enfarte cerebral Em doentes com isquémia que ainda não têm enfarte cerebral, tanto a TC como a RM podem estar normais CURSO CLÍNICO AVCs embólicos geralmente ocorrem repentinamente os défices neurológicos indicam perda focal de função cerebral, que é máxima no início recuperação rápida favorece este diagnóstico Trombose sintomas frequentemente flutuam, variando entre um estado normal e anormal, ou progredindo gradualmente com alguns períodos de melhoria CURSO CLÍNICO Oclusão das artérias perfurantes sintomas geralmente desenvolvem-se durante um período de horas ou no máximo alguns dias ao passo que a isquémia cerebral relacionada com grandes artérias pode evoluir durante um período de tempo mais longo Hemorragia intracerebral não melhora durante o período inicial progride gradualmente durante minutos ou poucas horas Hemorragia subaracnoideia por aneurisma desenvolve-se rapidamente disfunção cerebral focal é menos comum FACTORES DE RISCO Variáveis demográficas Idade Sexo Raça Diabetes HTA Anfetaminas Cocaína Doença cardíaca (patologia valvular, anterior enfarte agudo do miocárdio, fibrilhação auricular, endocardite) Período pós-parto Desordem da coagulação, prescrição de varfarina ou outro anti-coagulante EXAMES Neuroimagem Tomografia computorizada (TC) craniana sem contraste Tipicamente o 1º exame diagnóstico realizado em doentes com suspeita de AVC AVC isquémico, hemorragia intracerebral e HSA Mais sensível no diagnóstico de hemorragias focais agudas Deve ser realizada em todos os doentes com suspeita de AVC antes do início do tratamento específico Muito acessível, aquisição rápida de resultados Ressonância magnética (RM), técnicas de difusão e perfusão RM mais sensível no diagnóstico de enfarte Úteis na identificação da quantidade de área enfartada e tecido cerebral em risco EXAMES RM, Angiografia TC e Angiografia por Raio-X Utilizados quando a causa da Hemorragia Intracraneana é indeterminada, particularmente se: doente é jovem ou não hipertensivo hematoma não se encontra nos locais habituais de hemorragia hipertensiva Uma vez que os doentes têm sinais de défices neurológicos e de aumento da Pressão Intra-Craneana, deve evitar-se uma punção lombar - pode induzir uma herniação cerebral. Punção lombar Pequenas hemorragias subaracnoideias podem não ser detectadas por TC ou RM EXAMES Avaliação cardíaca Electrocardiograma e Holter Indispensável pela alta incidência de doenças cardíacas e arritmias em doentes com AVC. Fibrilhação auricular, enfarte do miocárdio recente – fontes embólicas importantes. Ultrassonografia Eco-Doppler das artérias extra e intra-craneanas - identifica oclusões e estenoses extra e intra-craneanas, avaliação do estado das colaterais ou de recanalização Ecocardiografia transtorácica – rastreio de fontes cardioembólicas; útil a sua disponibilidade nas primeiras 24 h após instalação do AVC Ecocardiograma transesofágico EXAMES Testes Laboratoriais Testes de rotina – hemograma completo com plaquetas; INR, aPTT, electrólitos, glicemia, Proteina C reactiva, VS, análises de função hepática e renal Testes laboratoriais específicos – Proteína C, S, resistência à activação da proteína C, anticorpos anticardiolipina, homocisteína, rastreio de vasculite (ANA, anticoagulante lúpico), LCR Bibliografia Artigos UptoDate: • “Initial assessment and management of acute stroke” Author Jamary Oliveira-Filho, MD, PhD Walter J Koroshetz, MD Section Editor Scott E Kasner, MD Deputy Editor John F Dashe, MD, PhD • “Overview of the evaluation of stroke Author” ; “Clinical diagnosis of stroke subtypes” ; “Etiology and classification of stroke” Author Louis R Caplan, MD Section Editor Scott E Kasner, MD Deputy Editor John F Dashe, MD, PhD • www.netterimages.com • Neurologia – Aulas Teóricas 5ºano