A incidência sobre o preço máximo de venda de medicamentos
* Paula Maranhão de Aguiar Bove
A substituição tributária é o regime tributário pelo qual a responsabilidade pelo recolhimento
do ICMS devido é atribuída à um único contribuinte, com o intuito de facilitar a fiscalização e
proporcionar o recebimento antecipado destes valores.
O substituto é obrigado, no momento da venda de seu produto, a pagar o imposto próprio e
ainda reter o imposto referente às operações seguintes, recolhendo-o em separado daquele
referente a suas próprias operações. Essa responsabilidade é atribuída, regra geral, ao
fabricante/importador no que se refere de mercadorias e ao tomador no que se refere aos
serviços.
Para reter os valores que supostamente serão devidos nas operações posteriores é necessário
que se atribua um valor presumido ou que o Fisco arbitre um valor a ser utilizado para o
cálculo destas operações que ainda estão para acontecer.
No caso das indústrias de medicamentos, assim como outros segmentos, a Lei Complementar
nº 87/96, que regula a matéria de substituição tributária para recolhimento de ICMS determina
em seu art. 8º, § 2º1, que o valor a ser usado como base de cálculo destas operações futuras é o
valor indicado pelo fabricante como o valor máximo a ser vendido ao consumidor final.
No caso específico das indústrias de medicamentos este valor é determinado pela Câmara de
Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), nos termos da Lei 10.742/03, que
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§ 2.º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por
órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço
por ele estabelecido.
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determina em seu artigo 4º, parágrafo 1º2 que dispõe acerca da obrigatoriedade de
observância pelas empresas produtoras de medicamentos dos preços definidos pela CMED,
podendo ser denunciadas caso pratiquem preços acima do teto máximo fixado por este
órgão.
Ocorre, que na prática o valor de venda para o consumidor final pode ser bem inferior ao
presumido no momento da antecipação do tributo, acarretando o recolhimento de valores
indevidos ao Fisco estadual.
De acordo com a decisão do Tribunal gaúcho o critério estabelecido pela legislação estadual
daquele Estado, prevendo a utilização do preço máximo ao consumidor sugerido pelo
fabricante para efeito de determinação da base de cálculo do ICMS de responsabilidade por
substituição tributária é incompatível com a hipótese de incidência do imposto prevista na
Constituição Federal de 1988, tendo em vista que este valor é muito superior ao valor
efetivamente auferido pelos estabelecimentos varejistas (substituídos tributários). Deste modo
o referido tribunal sugere que o Fisco adote como critério o valor da operação praticado pelo
atacadista (substituto tributário) acrescido de seguro, frete, despesas transferíveis ao
substituído, adicionado das respectivas margens de valor agregado.
Para afastar a obrigação de reter o valor calculado pelo preço máximo de venda ao
consumidor, o TJ/RS decidiu recentemente que o valor a ser utilizado como base de cálculo
deve ser o da nota fiscal. Tal decisão abre um precedente significativo para a discussão desta
matéria perante outros tribunais. Tanto, que muitas empresas já estão buscando junto ao Poder
Judiciário discutir a base de cálculo prevista em lei, para conseguir liminares que possibilitem
a utilização de um valor médio de venda ao consumidor final.
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Art. 4o As empresas produtoras de medicamentos deverão observar, para o ajuste e determinação de
seus preços, as regras definidas nesta Lei, a partir de sua publicação, ficando vedado qualquer ajuste
em desacordo com esta Lei.
§ 1o O ajuste de preços de medicamentos será baseado em modelo de teto de preços calculado com base
em um índice, em um fator de produtividade e em um fator de ajuste de preços relativos intra-setor e
entre setores.
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A jurisprudência3 atual dos superiores tribunais tem sido favorável a aplicação da base de
cálculo sobre valores máximos de venda de medicamentos, entendendo que o valor arbitrado
não é provisório, mas definitivo. No entender destes tribunais, o direito do contribuinte de ser
restituído destas quantias somente deve ocorrer nos casos em que não se verificar a ocorrência
do fato gerador.
Contudo, esta posição deve modificar, pois há doutrinadores de elevado gabarito defendendo
a inconstitucionalidade da aplicação desta base de cálculo para a incidência do ICMS4. A
decisão do Tribunal gaúcho já espelha esta tendência, inovando a jurisprudência pátria e
abrindo caminho para que outros tribunais se posicionem da mesma forma.
Entre as várias alegações aptas a afastar a exigência de ICMS sobre o preço máximo de venda
ao consumidor (PMC), podemos citar:
(i) o art. 148 do CTN5 que só permite a imposição de pautas fiscais em
casos excepcionais, quando não é possível verificar a idoneidade dos
valores apontados pelo contribuinte,
(ii) a Constituição Federal prevê de forma expressa em seu art. 150,
parágrafo 7º6 a possibilidade de restituição dos valores recolhidos a mais
pelo contribuinte nos casos de substituição tributária.
3
ADI 1851/Al, RMS 21844/SE e RMS20381/SE
4
Neste sentido citamos José Eduardo Soares de Melo e Hugo de Brito Machado.
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“Art. 148 - Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens,
direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor
ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os
documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de
contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.”
6
§ 7º - A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo
pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e
preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.”
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(iii)
a impossibilidade de restituir os valores recolhidos a mais possui
feição e confisco, vedado pela Constituição Federal em seu art. 150, IV.
Diante disto, a melhor estratégia é ingressar com ação judicial, questionando os valores
arbitrados como preço máximo de venda ao consumidor e requerendo a restituição dos valores
recolhidos a mais.
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