WALLACE DE SOUZA OLIVEIRA REGULAMENTAÇÃO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS E INSEGURANÇA JURÍDICA. Projeto de pesquisa apresentado ao Programa de Pós-Graduação do Cefor como parte das exigências do curso de Especialização em Processo Legislativo. Brasília 2009 1. IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO Título: Regulamentação de dispositivos constitucionais e insegurança jurídica. Autor: Wallace de Souza Oliveira. Instituição: Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados – Cefor. Data: Brasília, abril/2009. Orientador: Resumo: A Constituição brasileira acaba de completar 20 anos de sua promulgação e 40% dos seus dispositivos ainda necessitam de Lei Complementar que os regule, causando dificuldade para sua plena eficácia. Na ausência da autoaplicabilidade e de uma não regulamentação posterior, entra em cena o Mandado de Injunção, cujos resultados serão aqui estudados com o objetivo de demonstrar que os dispositivos constitucionais não regulamentados causam insegurança CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO jurídica. Para tanto, utilizar-se-á de pesquisa bibliográfica e documental. 2. APRESENTAÇÃO A Constituição de 1988, não por acaso chamada “Constituição Cidadã” pelo saudoso Ulysses Guimarães, trata, no seu Capítulo I, dos direitos e garantias fundamentais, aí incluídos os direitos e deveres individuais e coletivos. Se mais nada houvesse sido escrito, tão-somente esse capítulo, especificamente o artigo 5º e seus 78 incisos, já seria suficiente para balizar a conduta de governantes e governados. O fundamento está justamente na igualdade de todos perante a lei e na inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade e à livre associação. Entretanto, se os direitos fundamentais representam o alicerce nuclear, a verdadeira base de sustentação da disciplina jurídica constitucional, criando não apenas para os poderes do estado, mas para toda a sociedade o dever de proteger e tutelar as finalidades precípuas desses próprios princípios fundamentais, há que se entender ou estudar a efetividade destes, isto é, a sua relação intrínseca com o conceito de (in) segurança jurídica. Por outro lado, considerando que a Constituição brasileira acaba de complementar 20 anos de sua promulgação, chama a atenção de todos quantos dela necessitem, quer cidadãos em geral, quer estudiosos, quer CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO operadores do direito, que ainda hoje haja 40% dos dispositivos não regulamentados. O interesse e curiosidade sobre esse fato cresceu com o estudo da disciplina de Direito Constitucional no curso de Ciências Jurídicas e dentro das funções desenvolvidas na área profissional, já que ambas as atividades exigem freqüentes pesquisas na Constituição Federal onde tantas vezes se pode deparar, ao final dos dispositivos, com as frases: “nos termos e nos limites definidos em lei específica” ou “lei posterior que a defina”. Assim, da constatação da ausência da norma, da quantidade de vezes de consulta ao Supremo Tribunal Federal sobre o fato e considerando ainda esse marco histórico que a data enseja, foi que nasceu a inspiração para o tema do presente projeto. Esse, portanto, o somatório dos aspectos preponderantes e relevantes que pesaram na escolha do tema, além, é claro, da intenção de estudar um assunto que tivesse relação direta tanto com o lado profissional como com o acadêmico, com óbvios benefícios para ambos. 3. PROBLEMA Considerando tratar-se a Constituição brasileira de uma codificação do direito material, com característica rígida, e não cabendo analogia, deveriam as suas normas, desde sua promulgação, estarem descritas para que CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO pudessem ser autoaplicáveis ou os direitos que elas ensejam exercidos na plenitude, não dependendo de outras normas para sua garantia, reivindicação e/ou normatização. Talvez, devido à complexidade de determinados assuntos, pudesse existir um interstício, pré-estabelecido, necessário para um maior aprofundamento para a regulamentação, mas não uma omissão legislativa, ficando para ad aeternum. Na ausência dela, portanto, caberia perguntar o que fazer diante dessa situação. O próprio constituinte originário, preocupado com essa lacuna, dotou o ordenamento jurídico do instrumento necessário para o enfrentamento da falta de regulamentação pelo legislador ordinário, que é o Mandado de Injunção. O tema proposto, portanto, leva às seguintes indagações: Por que ainda há tantos dispositivos não regulamentados? Qual a razão que leva o Congresso a se omitir ou a deixar de desempenhar o seu papel precípuo de legislador? Deixar de legislar, por outro lado, seria também uma forma, ainda que enviesada, de o fazer? Quais as conseqüências para o mundo jurídico e para o cidadão acarretados pela falta de regulamentação desses dispositivos? A falta da normatização e a recepcionalidade de outra norma causa insegurança jurídica e que consequências adviriam disso? Buscar as respostas para essas e outras questões relativas ao tema é, por fim, o desafio da pesquisa. CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO 4. OBJETIVOS 4.1. Objetivo geral: geral demonstrar, por meio da análise de mandados de injunção, que a falta de regulamentação de dispositivos constitucionais acarreta insegurança jurídica. 4.2. Objetivos específicos: 4.2.1. Analisar a relação da falta de regulamentação de dispositivos com demandas concernentes a proteção de situações constitucionais; 4.2.2. Identificar se a falta de regulamentação por parte do legislador constitui de certo modo um meio de legislar; 4.2.3. Analisar os objetos: MI 712/PA, direito a greve dos Servidores Públicos Federais, e em especial, a Ação de Inconstitucionalidade n° 3682, sugerindo ao Congresso Nacional a determinação de prazo para a regularização dos Municípios criados pós-Constituição de 1988. CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO 5. JUSTIFICATIVA Partindo do pressuposto de que a Constituição é a carta suprema de uma nação para determinar as normas para o convívio social, e o princípio para a codificação de outros dispositivos, a partir do momento que não vem atendendo, abrangendo, abarcando as soluções para os conflitos, por não estar regulamentada na sua integralidade, pode ocasionar situações de total negação dos direitos que deveria garantir ou proteger, com conseqüências irreparáveis. Ora, a Constituição de 1988 assegurou através de um dos “remédios” constitucionais - o mandado de injunção -, o meio para o questionamento para a falta de norma regulamentada, meio esse que vem sendo largamente utilizado, haja vista a quantidade apresentada ao Supremo Tribunal Federal. O quantitativo de impetrações requerendo a normatização de dispositivos leva a refletir sobre o “contrato” cidadão/Estado que não está descrito de forma a determinar, regularizar, harmonizar o convívio das relações. Dada esta situação, surgiu o interesse de estudar os resultados decorrentes e deixados para a sociedade, destacando uma possível insegurança jurídica. 6. REVISÃO DA LITERATURA CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO Para a abordagem do assunto será dedicada atenção especial a fatores que condicionam a efetividade da norma constitucional, o mandado de injunção - a existência, validade e eficácia, bem como a conceituação de efetividade e segurança jurídica. Assim é que os seguintes autores servirão de base para a construção do referencial teórico da pesquisa: Luís Roberto Barroso – “O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas”; de 2006; Carlos Alberto Aurélio de Souza – “Segurança Jurídica e Jurisprudência: um enfoque filosófico-jurídico”, de 1996; e Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco – “Curso de Direito Constitucional”, de 2008. O art. 4º da Lei de Introdução do Código Civil dispõe que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Entretanto, não estaria o grau de discricionariedade dos juízes aumentado de tal forma a ponto de causar uma verdadeira insegurança jurídica, porquanto suas decisões deixam de decorrer de premissas existentes no ordenamento jurídico, passando a ser politizadas? Segundo Aurélio de Souza (1996), dois fatores devem ser considerados indissociáveis: segurança e justiça. Para ele: “Segurança e Justiça à sua vez, são valores que se completam e se fundamentam reciprocamente: não há Justiça materialmente eficaz se não for ‘assegurado’ aos cidadãos, concretamente, o direito de ser reconhecido ‘a cada um o que é seu’, aquilo que, por ser justo, lhe compete”. Ora, por meio da segurança jurídica, princípio implícito na Constituição Federal, cria-se confiança no ordenamento do País, pois ela expressa CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO expectativas como a ordem, certeza e previsibilidade. Se os juízes passam a exercer sua atividade de forma discricionária, essas expectativas tornam-se mais difíceis de serem concretizadas. É nesse contexto que se pretende considerar a falta de regulamentação de dispositivos constitucionais, uma vez que a omissão do poder legiferante pode acarretar insegurança jurídica, com o aumento da discricionariedade do juiz. A salvaguarda constitucional, nesse caso, é o mandado de injunção, instrumento previsto para quando a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (CF, art. 5º, LXXI). Para Mendes, Coelho e Branco (2008, p. 1207), o mandado de injunção se destina, fundamentalmente, à defesa de direitos individuais contra a omissão do ente legiferante, sendo considerado como parte integrante do sistema de controle abstrato da omissão. O mandado de injunção, portanto, um dos “remédios constitucionais” para a falta da regulamentação, é o instrumento que será apresentado à alta Corte do Judiciário, que sobre ele decidirá. Quando aceita a reclamação, as decisões poderão ensejar: 1) a confirmação da não existência da regulamentação da norma; CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO 2) a confirmação da não existência da regulamentação da norma com envio de mensagem ao Poder Legislativo informando da omissão; 3) a confirmação da não existência da regulamentação e a recepcionalidade de outra norma, na tentativa de amenizar o impedimento do exercício dos direitos. Todos os autores citados concordam em que a adoção desse instrumento não é pacífica na doutrina, uma vez que o conteúdo, o significado e a amplitude das decisões proferidas em processos vêm sendo analisados de forma diferenciada pela doutrina e jurisprudência. Também concordam que sua aplicação foi em alguma medida prejudicada pelo fato de o próprio instrumento carecer de regras processuais regulamentadoras. Os autores aqui relacionados entendem que o objeto do mandado de injunção tem sido a questão crucial a dividir os doutrinadores. - “Destina-se ele a obter o suprimento judicial da norma faltante ou estimular a produção da norma pelo órgão competente?”, pergunta Barroso (2006, p. 247). Para ele, embora o órgão julgador possa adotar uma de duas possibilidades: 1) determinar à autoridade ou órgão competente que expeça a norma regulamentadora; ou 2) julgar o caso concreto, decidindo sobre o direito postulado e suprindo a lacuna legal, somente a segunda proposição lhe parece acertada diante do caso concreto. Entretanto, é o próprio Barroso (p. 264) quem nos dá conta de que a posição do STF “é a de não assumir uma competência de cunho normativo, mesmo que transitória ou limitada ao caso concreto”, ao contrário do que CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO professa o entendimento da doutrina majoritária. Para ele, ainda, o mandado de injunção teve um papel histórico, mas constitui hoje instrumento do qual se poderia facilmente prescindir. Enfim, o que parece claro desse levantamento preliminar é que, embora a questão não esteja pacificada, merece um estudo mais cuidadoso e aprofundado, e a despeito da posição divergente de alguns doutrinadores, o mandado de injunção teve e ainda tem um papel relevante na lacuna jurídica decorrente da não regulamentação de dispositivos constitucionais. A pesquisa que se pretende realizar, portanto, voltada ainda para análise dos casos concretos já referidos, poderá comprovar ou não essa tese e dirimir as dúvidas que subsistem em relação a se a inexistência ou a recepcionalidade da norma é que devem ser questionadas, pois quando a Lei é criada o seu intuito é regularizar, normatizar e definir critérios, observadas as peculiaridades dos fatos. 7. METODOLOGIA Por se tratar de um assunto extremamente teórico, a metodologia terá como base levantamento bibliográfico e levantamento documental na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Trazendo para o contexto a problemática existente, os objetos de análise serão os Mandados de Injunção impetrados no STF questionando a CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO falta de regulamentação da norma no âmbito constitucional. Especificamente: O direito a greve dos Servidores Públicos Federais, MI 712 / PA, impetrado pelo sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará e em especial, a Ação de Inconstitucionalidade n° 3682 que resultou na Mensagem n° 73/2008, encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal ao Presidente da Câmara dos Deputados com o objetivo “não se trata de impor um prazo para a atuação legislativa do Congresso Nacional, mas apenas da fixação de um parâmetro temporal razoável, tendo em vista o prazo de 24 meses determinado pelo Tribunal nas ADI nºs. 2.240, 3.316, 3.489 e 3.689 para que as leis estaduais que criam municípios ou alteram seus limites territoriais continuem vigendo” (Despacho da ADIN 3682). Tais objetos foram escolhidos devido à grande repercussão na sociedade e no campo jurídico. 8. CRONOGRAMA jun./09 jul./09 ago./09 set./09 Seleção e leitura X X X CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO out./09 bibliográfica. Estudo de ações no STF que resultaram na declaração de X X mora do Poder Legislativo Escolha e restrição de tópicos de abordagem. Revisão da X X X X X monografia. 9. BIBLIOGRAFIA BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.345 p. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, COELHO, Inocêncio Mártires, MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 14334 p. BRAGA, Jorge Luiz. Insegurança jurídica em face das sumulas dos tribunais superiores. Consulex: revista jurídica. Distrito Federal: Consulex, v.21, n. 10, mar., 2007. p. 13 – 12. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 1998. 293 p. CENTRO DE FORMAÇÃO, TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao Código Civil brasileiro interpretado. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 525. ETCHEVERRY, Carlos Alberto. Judiciário e insegurança jurídica por trás da cortina de fumaça. Consulex: revista jurídica. Distrito Federal: Consulex, v. 9, n. 200, maio, 2005. p. 37. FALCÃO, Joaquim. O Congresso e os juizes especiais. ADV Advocacia dinâmica: boletim informativo semanal. São Paulo: COAD, v. 25, n. 25, n. 46, 20 nov., 2005. p. 925-924. FERREIRA, Manoel Gonçalves Filho. As medidas provisórias como fonte de insegurança jurídica. São Paulo: Mackenzie, 2001. p. 214-219. KUNTZ, Rolf. A insegurança atrapalha o crescimento. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, v.2, n10, jul./ago., 2008. p. 11-13. LUCHEZI, Roberto. A insegurança jurídica da sumula nº 84 do STJ. Consulex: revista jurídica. 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