XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
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A FORMAÇÃO COM PESQUISA: UMA POSSÍVEL DIDÁTICA EM QUESTÃO
Sônia Regina de Souza Fernandes
IFC/Campus Camboriú
Idorlene da Silva Hoepers
IFC/Campus Camboriú
Resumo
Neste artigo pretendemos socializar e problematizar os estudos que o grupo de pesquisa
vem desenvolvendo em torno da questão da formação de professores, em especial, a do
Pedagogo. O foco do estudo centra-se nas discussões de um possível paradigma
emergente – que procura romper com a tradição positivista no campo da educação, nos
processos de ensino-aprendizagem e nos seus modos de organização curricular. Para
tanto, buscamos nas contribuições dos estudos que apontam como uma possível ruptura
– o ensino com pesquisa em diálogo com um exame empírico do curso de Pedagogia
que tem no seu Projeto Pedagógico a pesquisa como princípio formativo – que pretende
em sua prática pedagógica contribuir efetivamente com a qualidade do processo de
ensino e da aprendizagem –, proposta que transversaliza o curso do primeiro ao oitavo
semestres e que oportuniza a todos os estudantes a vivência da pesquisa,
independentemente de estar envolvido em grupos e ou projetos de pesquisa (experiência
comum no processo de formação, porém, para poucos). Entre os autores que subsidiam
o estudo estão Cunha, Sousa Santos, Paoli, Anastasiou, Fernandes e Fernandes entre
outros. De acordo com Cunha (1998, p. 197) “É de extrema atualidade a discussão que
gira em torno da relação entre os paradigmas científicos e as formas de organização de
currículo, apesar de, concretamente, ver-se pouca mobilização para esta reflexão, no
ensino universitário. [...], são quase inexistentes as experiências concretas que rompem
com o paradigma tradicional de conhecimento na organização curricular”. As análises
(ainda provisórias) vêm apontando que a formação com pesquisa desde o processo
inicial de formação potencializa a capacidade investigativa e problematizadora do e no
campo profissional/prática social possibilitando aos estudantes uma experiência singular
da pesquisa, do método e metodologia.
Palavras-chave: Ensino com Pesquisa; Formação de Professores/Pedagogo;
Paradigmas Curriculares; Projeto Pedagógico; Didática.
CONTEXTUALIZANDO A PROBLEMÁTICA
A tradição da formação de professores no Brasil esteve e ainda está centrada em
formas de organização curricular com forte relação/base nos modos de explicação dos
paradigmas científicos - racionalidade técnico-instrumental. Da mesma forma tem-se
nas últimas décadas do século XX e no início do século XXI produção teórica densa em
torno da temática, bem como políticas educacionais que apontam outras formas de
organização do currículo sob o olhar de outras racionalidades.
A formação inicial de professores no contexto brasileiro nos últimos anos tem
sido objeto de estudos e exige análises constantes em torno da sua configuração e das
suas práticas, situadas historicamente no panorama das políticas públicas e nos seus
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processos de operacionalização.
De acordo com Fernandes e Fernandes (2005) a formação e suas implicações de
identidade não se constituem em um constructo arbitrário, mas sim, decorrem de uma
concepção de educação e de mundo, que mediados pelo trabalho com o conhecimento,
como categoria fundante das relações pedagógicas, humanas e sócio-culturais,
possibilitam o ato educativo. Neste quadro, a educação e a concepção de formação não
são neutras, tornando-se necessário, percebê-las na sua multidimensionalidade e
perspectivas, a partir de um olhar rigoroso no sentido dado por Freire e Shor (1987).
As autoras (2005) em estudo realizado sobre a implantação e compreensão da
Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de 2002 em cursos de Licenciatura na região
sul do Brasil, examinaram em especial os aspectos relacionados a prática como
componente curricular, perceberam que ocorria nas IEs estudadas uma ambigüidade da
resolução, polarizações e tensionamentos conceituais de prática e de teoria, de conteúdo
e de forma, bem como uma dificuldade de os interlocutores compreenderem, na
discussão da prática, a dimensão do trabalho como mediação, tanto no plano intelectual,
quanto no plano da profissionalização docente, assim como o significado da inserção
dos estudantes no campo profissional desde o início do curso .
Entretanto, dizem as autoras, como a vida e a história não são lineares, os
espaços de contradição são ocupados por sujeitos que ousam promover situações de
diálogo humano e epistemológico, potencializando mudanças.
Entendemos que a problemática em questão ainda não se esgotou e conforme
nos aponta Cunha (1996;1998) é de extrema atualidade a discussão que gira em torno da
relação entre os paradigmas científicos e as formas de organização de currículo, apesar
de, concretamente, ver-se pouca mobilização para esta reflexão, no ensino universitário.
E como diz ainda a autora, são quase inexistentes as experiências concretas que rompem
com o paradigma tradicional de conhecimento na organização curricular. Vasconcellos
(1999, p. 17) nos diz também que “[...] apesar de no discurso haver rejeição a essa
postura, no cotidiano da escola verifica-se que é a mais presente, talvez nem tanto pela
vontade dos educadores, mas por não saber como efetivar uma prática diferente”.
Foi tendo por base a produção no campo da educação em relação ao tema em
discussão é que a forma como se organizou o currículo do curso em questão, procurou
romper naquilo que foi possível, com essa perspectiva, mobilizando processos que
promovessem aos estudantes a inserção desde o início da formação no campo
profissional, não só pelas orientações das diretrizes para os cursos de Pedagogia e das
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Resoluções para os cursos de Licenciatura, mas em especial, como um princípio e ou
paradigma “emergente” (no sentido de SOUSA SANTOS, 1997 e CUNHA, 1998) que
possibilitasse a formação com pesquisa.
As pesquisas pedagógicas demonstram cientificamente, como nos diz
Vasconcelos (1999, p. 17)
“[...] que aquilo que percebemos pela nossa observação atenta no cotidiano
da escola: a situação atual em sala de aula, em grandes linhas, pode ser
caracterizada como baseada na metodologia tradicional, de cunho
academicista, uma vez que a pedagogia liberal tradicional é viva e atuante em
nossas escolas [...] sendo que esta se aproxima mais do modelo dominante de
escola predominantemente em nossa história educacional”.
Da mesma forma é tradição nos cursos de formação inicial de professores os
estudantes terem acesso à pesquisa por meio da iniciação científica e ou disciplinas que
num ou noutro momento as coloquem diante de alguns processos educativos que os
familiarizem com tal prática. Contudo, àqueles que não podem participar nos grupos de
pesquisa, experienciam a mesma de forma “passageira” nas disciplinas oferecidas –
como metodologia científica e da pesquisa (nomes mais genéricos).
Essa passagem rápida não vem permitindo que os estudantes se apropriem e
compreendam o ato de educar em sua totalidade, reificando a ideia de que pesquisar
“[...] é uma atividade para iniciados, fora do alcance de alunos da graduação, onde o
aparato metodológico e os instrumentos de certezas se sobrepõem à capacidade
intelectual de trabalhar com a dúvida” (CUNHA, 1998, p. 12).
Outro aspecto que pode contribuir para compreender os porquês dessa forma de
ensinar é o que Cunha (2008, p. 7) traz sobre o discurso da indissociabilidade que
envolve o trabalho docente entre o ensino, a pesquisa e extensão, ainda compreendidos
como dimensões separadas, ou como diz a autora,
[...] para alguns, ele centra-se no professor e quando realiza tarefa de três
naturezas se afirma haver indissociabilidade. Para outros, [...] localizam na
instituição, entendendo estar respondendo a este desafio se a universidade
abriga experiências nas três esferas, mesmo que em espaços, locais e áreas
diferentes (CUNHA, 1998, p. 198).
De acordo com a autora, estas compreensões promovem o distanciamento da
indissociabilidade. As implicações do que Cunha aponta, a nosso ver, reproduzem no
contexto da formação de professores a cultura da aula como lugar de transmissão do
conhecimento historicamente acumulado por meio do habitus da metodologia
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tradicional de ensino que acha-se alicerçada na concepção de conhecimento decorrente
de um paradigma de ciência – o moderno e de mundo – como algo dado.
Cunha (1998, p. 199) nos ajuda mais uma vez a compreender a problemática em
questão, para a autora “[...] esta racionalidade presidiu e ainda preside a concepção
epistemológica do pensamento convergente e a pedagogia da resposta única, que não
desafia os alunos com questões significativas [...]”.
É no contexto dessas problematizações que a importância de estudos em
condições “concretas de trabalho” que rompam ou superem com a lógica da tradição em
questão e que vivenciem movimentos de transição entre paradigmas e suas
racionalidades são bem vindos. É na esteira dessa discussão que se insere esse
texto/trabalho.
ALGUMAS REFLEXÕES COM AUTORES QUE PROBLEMATIZAM O ENSINO
COM PESQUISA
Estudos de autores como Paoli (1991), Vasconcellos (1999), Cunha (1996,
1998), Anastasiou (2003), Ribeiro (2011) entre outros, vêm especialmente contribuindo
nas últimas três décadas em torno das questões do ensino com pesquisa, ou das relações
do ensino com pesquisa.
Na concepção de Paoli (1991), a metodologia do trabalho docente na graduação
deve tratar sobre a importância do ensino com pesquisa relacionado a uma concepção de
ensino, ressalta a necessidade de inovar conteúdos e disciplinas, sendo possível, na sua
perspectiva, desenvolver um trabalho intelectualmente mais rico junto aos alunos. Para
isso, propõe a superação do conhecimento formal, colocando a dúvida e a crítica como
elementos fundamentais de sua proposta, bem como a necessária apropriação do
conhecimento como algo não acabado, da provisoriedade e relatividade dos conteúdos e
das verdades, quebrando, desse modo, a hierarquia do saber. Salienta ainda que o
trabalho com criatividade, como forma de tornar a “[...] situação construtiva e
significativa pode contribuir para [...] quebrar as formas lineares da programação,
através de novas formas de seleção e articulação de conteúdos a partir de temas,
questões e problemas”. Da mesma forma a introdução da análise como forma de ensino
– onde o aluno seja capaz de organizar suas ideias sob formas diferentes, poderia
contribuir na construção do conhecimento, superando a reprodução. Nesse constexto,
diz o autor, o ensino com pesquisa, a superação do conhecimento formal e a análise
como forma de ensino explicitariam “[...] uma forma de pensar a relação
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ensino/pesquisa ligada com a proposição: ensino com pesquisa” ( PAOLI, 1991, p.1213).
Para Vasconcellos (1991, p. 21-22) sem a superação do “obstáculo
epistemológico” e do “peso histórico” da concepção tradicional de educação, que tem
suas origens na concepção clássica (Antigüidade) ou na escolástica (Idade Média) num
processo que não leva em conta as contribuições das ciências pedagógicas
contemporâneas, corre-se o “[...] alto risco da não aprendizagem, em função do baixo
nível de interação sujeito-objeto de conhecimento-realidade [...]”, isso do ponto de vista
pedagógico. Outro aspecto é o ponto de vista político, que funciona como um
mecanismo de seleção social, formando um homem passivo, acrítico, uma vez que
reforça a classe social dominante como a mais capaz de realizar operações e
pensamentos mais abstratos. Tais dimensões poderiam na análise do autor, constituir-se
num obstáculo para o educador construir o novo.
Uma proposta de trabalho docente, visando superação da anteriormente referida,
é defendida por esse autor como “metodologia dialética de conhecimento em sala de
aula” que se baseia em outra concepção de homem e de conhecimento. O homem, nesta
concepção, é visto como um ser ativo e de relações, e o conhecimento como algo
construído pelo sujeito na sua relação com os outros e com o mundo.
Conseqüentemente, o conteúdo deve ser refletido e reelaborado pelo aluno, para que
possa construir o seu. Desta forma, busca como fonte a teoria dialética que compreende
o conhecimento em três grandes momentos: o da síncrese, o da análise e o da síntese,
que presentes no fazer pedagógico buscam organizar o trabalho docente nos três eixos
metodológicos.
A “síncrese” consiste em “mobilizar para o conhecimento”, fato que supõe o
interesse e a motivação em aprender e em conhecer. Já a “análise” envolve a
“construção do conhecimento”. É o momento do confronto de conhecimento entre o
sujeito e objeto, o penetrar no objeto, de compreendê-lo em suas relações internas e
externas, de estabelecer o segundo vínculo de interação (relações mais totalizantes, mais
complexas) e chegar ao nível da representação mental.
Na construção do conhecimento, conforme Vasconcellos (1991), sete categorias
ou critérios se colocam: significação; práxis; problematização; continuidade-ruptura;
criticidade; historicidade e totalidade. O terceiro eixo, por sua vez, constitui-se na
síntese onde se dá elaboração do conhecimento, dimensão relativa à síntese do
conhecimento, bem como a sua expressão e compreensão concreta do objeto.
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Para elaborar a síntese do conhecimento é fundamental a presença de todas as
categorias, bem como a compreensão de que toda a síntese é provisória. Segundo
Vasconcellos (1991, p. 50), “[...] trata-se da materialização e objetivação do
conhecimento” o momento em que educando e educador conseguem estabelecer
relações com o objeto do conhecimento, quando o educando “[...] deverá expor os
vários níveis de relações que conseguiu estabelecer com o objeto do conhecimento, seu
significado, bem como a generalização, a aplicação em outras situações que não as
estudadas” (id ibid). Estas questões permitem refletir sobre o objeto de investigação,
uma vez que se torna possível a defesa de que o cotidiano das práticas pedagógicas pode
e deve ser transformado em situações de estudo, como momento de mobilização, ponto
de partida, de confronto teórico, de análise, ou seja, de pesquisa em sala de aula.
Cunha (1998, p. 197) ao refletir sobre a relação entre os paradigmas científicos e
as formas de organização do currículo, nos diz que
[...] a forte presença do paradigma da ciência moderna na sociedade ocidental
acabou por cristalizar a forma tradicional de currículo, vendo-a como uma
única possibilidade de organização. Esta, resume-se na lógica presente no
nosso cotidiano acadêmico: dos fundamentos da ciência para sua aplicação;
da teoria para a prática; do básico para o profissionalizante.
A compreensão dos processos de aprendizagem já visto em Paoli e
Vasconcellos, “[...] parte do pressuposto de que primeiro o sujeito deve ‘adquirir’
conhecimentos para depois poder aplicá-los na prática e em situações específicas [...]”
também nos diz Cunha (1998).
As mudanças para alterar essa cultura, se limitam na alteração dos currículos dos
cursos (em geral concebidos como grade curricular) em adicionar novas disciplinas,
fracionando ainda mais o conhecimento, na tentativa de acompanhar o aumento de
informações produzidas pela sociedade, diz Cunha. Outra questão observada pela
autora, diz respeito ao entendimento dos conceitos de indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão no trabalho docente.
As dimensões do ensino, pesquisa extensão ainda estão desafiando o processo de
indissociabilidade. A perspectiva epistemológica da modernidade pouco contribuiu para
diminuir as fronteiras que dificultam a compreensão do ato de educar na perspectiva da
totalidade, em que o processo de construção da cidadania se coloca como principal. Os
docentes são pesquisadores qualificados e capazes de gerar conhecimentos na sua
especificidade. No entanto, não necessariamente foram formados para o exercício da
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docência e, dessa maneira, exercem de forma amadora a sua condição de professores,
sem reconhecer os saberes profissionais que esta atividade exige. (CUNHA, 2008, p.7)
Temos ainda, contribuição importante para essa reflexão que vem dos estudos de
Ribeiro (2011, p. 1-2) sobre ensinar pesquisa e suas implicações para a formação de
professores. A autora diz que “[...] nos últimos 40 anos, a pesquisa passou a ocupar um
espaço de grande visibilidade na universidade brasileira, especialmente em decorrência
da expansão contínua, com qualidade, dos cursos de pós-graduação stricto sensu,
particularmente o doutorado que se constitui um lugar privilegiado de produção do
conhecimento”.
Entretanto, observa a autora,
Na universidade brasileira, caracterizada pelo princípio da indissociabilidade
entre ensino, pesquisa e extensão, de modo geral, há uma tendência forte em
apartar a atividade de ensino da atividade de pesquisa, mediante sistemas de
recompensas diferenciados. Com efeito, no Brasil, a CAPES (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) estimula a atividade de
pesquisa, ao exigir que os docentes dos programas de pós-graduação
produzam um determinado número de trabalhos científicos a cada ano, o que
se constitui parâmetro para credenciar ou descredenciar os referidos
programas. A atividade de ensino, no entanto, parece não participar desse
mesmo “ethos elitista”, na medida em que o currículo lattes do professor
universitário não é pontuado significativamente pela qualidade da sua prática
docente, fazendo com que esse profissional iniba-se no investimento
substancial em práticas inovadoras (RIBEIRO, 2011, p 1-2) – grifos da
autora.
Como síntese das contribuições dos autores na perspectiva de superação “[...] o
ensino tem de incorporar os processos metodológicos investigativos. Nesse particular é
importante ressaltar que não há pesquisa sem dúvida, sem questão, sem problema e,
estas, só nascem da leitura de como o campo científico se instala na prática, na
realidade” (CUNHA, 1998, p.199).
OS DESAFIOS DA RUPTURA: O MOVIMENTO DE MATERIALIDADE DE UMA
FORMAÇÃO MENOS FRONTEIRIÇA
A experiência de formação em xeque se insere no contexto de expansão e
interiorização da Educação Superior no Brasil, notadamente a partir do governo “Lula”,
mais especificamente com a criação dos Institutos Federais de Educação – Ifs.
De acordo com os documentos institucionais a Rede Federal de Educação
Profissional,
Científica
e
Tecnológica
cobre
todos
os
estados
brasileiros,
oferecendo cursos técnicos, superiores de tecnologia, licenciaturas, mestrado e
doutorado. Embora os documentos demonstrem prioridade para os cursos de
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licenciatura nas áreas das Ciências Exatas e Biológicas (Química, Física, Matemática e
Biologia) – áreas em que o denominado “apagão” vem ocorrendo no contexto
educacional brasileiro, o Instituto Federal Catarinense – IFC, em dois de seus câmpus,
por demanda dos “arranjos produtivos locais”, ou seja, pelos pedidos de algumas
secretarias municipais de educação, passou a partir de 2011 a oferecer o Curso de
Pedagogia. O desafio se impôs - como organizar um curso, sem repetir os “erros” que os
estudos e pesquisas apontam? Como superar uma organização curricular linear e
desarticulada e promover a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão? Como
formar/ensinar com pesquisa para todos?
No ano de 2010 foram desencadeados movimentos para a elaboração do Projeto
de Criação do Curso - PCC e posteriormente o Projeto Pedagógico – PPC instituindo
uma comissão. A mesma – tendo por base os questionamentos apontados no parágrafo
anterior - procurou levar em conta o que a produção do campo e as pesquisas já
apontaram sobre o tema e a problemática em questão. Dessa forma observou
rigorosamente estes estudos, e para esse texto, destaca o que Ribeiro (2011, p. 16)
apreendeu de sua investigação:
[...] Se é verdade que a pesquisa constitui-se instrumento para
questionamento e transformação da realidade, necessário se faz que o ensino,
desde as séries iniciais, esteja centrado nos alunos, isto é, organizado no
sentido de formar indivíduos críticos, que pensem de modo reflexivo,
construam os conhecimentos de forma autônoma, sejam capazes de tomar
decisões, de cooperar, de comunicar o que sabem, de colocar-se no lugar do
outro, o que é possível mediante o ensino com pesquisa.
Contudo, ressalta a autora (op cit.) “[...] a pesquisa mostra-se ainda apartada da
prática pedagógica de parte dos docentes das licenciaturas, o que nos leva a crer que
parecem não compreender a necessidade premente de ministrar um ensino que
privilegie não a reprodução, mas a produção de conhecimento”.
A pesquisa da autora revelou que grande parte dos sujeitos que participaram da
pesquisa, informaram que tinham interesse na realização de atividades de pesquisa.
“Mesmo que alguns tenham revelado o pouco empenho de seus professores pela
pesquisa, a maioria dos estudantes revelou disposição para assumir uma proposta de
ensino com pesquisa”. Destacamos alguns depoimentos coletados pela autora em sua
pesquisa como indicadores de possíveis revisões das formas tradicionais de formação
centradas no professor e na aula expositiva.
O participante (69) assim respondeu: “Gostaria de poder dedicar-me à pesquisa,
ampliar meu repertório, conhecer mais. O que mais me interessa é analisar fatos, refletir
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a partir de ações, dialogar com autores, ir além do que a aparência nos mostra”. Outros
depoimentos mostram que os estudantes se queixam de que essa atividade ainda se
encontra restrita a grupos de pesquisa com a participação de uma parcela limitada de
bolsistas, como se pode perceber neste depoimento: “A pesquisa não está aberta a todos,
nem todos têm acesso já que os grupos são formados com aqueles mais próximos do
professor” (Participante 108) (RIBEIRO, 2011, p. 14).
Diante de tantas contribuições a comissão propôs um curso que, embora
disciplinar, pudesse concretamente desenvolver alguns processos formativos que
oportunizassem aos estudantes (todos) espaços de aprendizagem por meio do ensino
com pesquisa, diminuindo as fronteiras entre as disciplinas e os campos de
conhecimento. Para isso, garantiu por meio da matriz curricular uma disciplina
denominada de Pesquisa e Processos Educativos – que transversaliza o curso do
primeiro ao oitavo semestre, inserindo os estudantes nos contextos da prática social, no
caso da Pedagogia, em quatro campos de atuação profissional, - Educação Infantil,
Anos Iniciais, Gestão e Modalidades da Educação – eixos de formação do curso.
No primeiro semestre a inserção se dá por meio da Metodologia da História de
Vida e das Narrativas. A disciplina articulada a outra – Pedagogia e Profissão Docente –
promovem a introdução à Pedagogia como Ciência, utilizando-se além da própria
história de vida dos estudantes (autobiografias), a experiência de ouvir por meio de
entrevistas e ou questionários de pesquisa sujeitos/professores em exercício, tendo como
critério de escolha três profissionais que estejam em tempos de profissão diferentes, a
saber, no início, no meio e no processo final da profissão. Este movimento tem a
intenção de aproximar os estudantes com a realidade da profissão e ao mesmo tempo
possibilita a aprendizagem dos processos de pesquisa, como dos objetivos, dos
instrumentos de coleta de dados, enfim, das facilidades e dificuldades da prática da
pesquisa.
O depoimento da estudante (E1) ajuda a compreender tal processo, Classifico
como determinante os efeitos da realização das entrevistas com professoras em
diferentes níveis de suas carreiras no primeiro semestre do Curso de Pedagogia. É
como se este contato propiciasse uma profunda reflexão sobre minha própria escolha.
Tendo respostas e posicionamentos bem distintos não apenas sobre suas carreiras, mas
toda a significação da profissão em suas posturas sociais, políticas e em suas vidas
particulares.
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Ressalta ainda que: Perceber que há professoras que atuam porque não
conseguiram realizar-se em outra profissão é muito fácil: é como se a palavra
frustração estivesse tatuada em suas testas (E1).
Esta experiência, porém, tem valor considerável já que deixa uma mensagem
marcante do quanto é importante trabalhar com o que se gosta, com o que lhe dá
prazer. Felizmente das pessoas que entrevistei percebi em apenas uma profissional este
descontentamento. Tanto a professora iniciante quanto a de maior experiência tinham
verdadeira paixão pelo que faziam. Seus olhos brilhavam ao descrever seus alunos,
suas atividades, suas experiências e, o mais marcante, o quanto enfatizavam o quanto
tinham aprendido e não apenas ensinado. (E1)
No segundo e terceiro semestres, a disciplina contempla no ementário estudos
sobre a trajetória e tendências da pesquisa em educação no Brasil, as abordagens
qualitativas e quantitativas, a prática de pesquisa e a realidade educacional/escolar. Tem
como objetivo a identificação de temas e problemas de pesquisa na área
educacional/escolar, por meio da inserção na realidade educacional formal e não-formal
e em paralelo os princípios para o planejamento da pesquisa em educação (PROJETO
PEDAGÓGICO DO CURSO, 2011). Nestes semestres os estudantes além de se
inserirem nos campos de atuação profissional para se situarem na e com as realidades
concretas que envolvem a profissão, deverão escolher um dos campos para realizar a
pesquisa de aprofundamento – processo esse que desencadeará no Trabalho de Curso
previsto para o sétimo e oitavo semestres do curso – para que possam viver a
experiência do ensino com pesquisa, escolhendo um tema, um problema ou
problemática.
Sobre essa experiência a E1 relata: As observações nos ambientes de atuação do
profissional de Pedagogia, realizada no segundo semestre do curso, mostrou-se uma
estratégia eficaz para a abrangência de visão do aluno. Possibilitou o conhecimento e
análise dos diversos campos de atuação, realizações, expectativas e limitações de cada
papel nos diferentes ambientes da escola. As possibilidades mostram-se muito vastas na
observação direta e mais ainda no compartilhamento das experiências em sala de aula.
Nos semestres quarto, quinto e sexto, o processo de pesquisa é desenvolvido em
todo o seu processo e natureza, ou seja, aprendem a dúvida, a elaborar questão de
pesquisa, a terem e compreenderem um problema, estes nascidos como nos diz Cunha
(1998) da leitura de como o campo científico se instala na prática, na realidade.
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O depoimento da E1 reforça que tanto as entrevistas com os profissionais como
as observações destes ambientes permitiram um grande amadurecimento do que e do
quanto representa para cada um a escolha desta profissão.
Ressalta que: O melhor destas propostas é a vivência do aluno em uma
realidade muito clara sem que haja pílulas douradas, tão pouco peneiras à mão – é
inserir-se na verdade, é ter a memória vívida de um depoimento de alguém que lhe
expõe seus sentimentos mais verdadeiros sobre sua própria vida, de um ambiente que
lhe abre as portas para o que está próximo de ser seu futuro.(E1)
QUEM ESPERA NÃO ALCANÇA... “QUEM SABE FAZ A HORA”...
A proposta pedagógica em questão vem buscando sistematizar e vivenciar um
processo curricular que permita o que Sousa Santos (1987) denomina de “Ruptura
Paradigmática”, tal processo requer a devida compreensão da relação entre os
paradigmas científicos e as formas de organização do currículo, onde tradicionalmente o
conhecimento tornou-se produto e expressão da Ciência Moderna, conhecimento este,
especializado, explicativo e dicotômico (teoria/prática). No sentido de (re)significar esta
compreensão curricular, está-se fazendo este movimento de compreender os modos de
produção do conhecimento por meio do ensino com pesquisa, daí nossa provocação no
título desse trabalho - A formação com pesquisa: uma possível didática em questão –
como forma de tensionar a visão simplista e reducionista da compreensão da Didática,
vendo-a como campo de estudo da Educação – que tem como objeto o processo ensinoaprendizagem nas relações conteúdo-forma, teoria-prática, escola-sociedade, professoraluno e as técnicas e métodos de ensino em contextos históricos situados, constituindo
assim, numa teoria do ensino, não para criar regras, como nos diz Pimenta (2004), mas
para contribuir na ampliação de nossa compreensão em torno da atividade e do trabalho
docente.
Compreender os processos de formação de professores por meio do ensino com
pesquisa como uma possível Didática, implicaria na percepção de que “[...] a sala de
aula, entendida aqui na sua dimensão simbólica como espaço e o território onde se
materializam os processos de aprendizagem, requer esforços intencionais de ruptura
paradigmática, favorecendo a construção de racionalidades ampliadas. E ainda,
implicaria em entender que “[...] nossos alunos não são apenas cérebro e memória. São
pessoas culturalmente situadas, com aspirações e representações da realidade que
definem suas expectativas e possibilidades. São portadores de saberes que precisam ser
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levados em conta e, se necessário, ressignificados” (CUNHA, 2008, p.8), a
ressignificação a nosso ver, dar-se-ia através da formação com pesquisa, como
materialidade de práticas pedagógicas comprometidas com a melhoria da qualidade
social do ensino e da aprendizagem, assim como das “possibilidades concretas de
construção de uma escola pública de qualidade” – objetivo do eixo temático.
REFERÊNCIAS
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Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.001220
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a formação com pesquisa: uma possível didática em