CORREIO BRAZILIENSE – DF
14/10/2013
ECONOMIA
Assefaz na mira do Ministério Público
Favorecimentos políticos e gestão temerária podem ser responsáveis pelo
rombo na entidade assistencial dos servidores do Ministério da Fazenda, que
acumula prejuízo de R$ 37,2 milhões
Um suposto esquema de favorecimento político, nepotismo e gestão temerária coloca
a Fundação Assistencial dos Servidores do Ministério da Fazenda (Assefaz) no centro
de uma investigação que, em último caso, poderá levar à extinção do plano de
saúde que atende cerca de 94 mil pessoas em todo o país. A polêmica gira em torno
da prestação de contas referente a 2012, cujo resultado foi um deficit de R$ 37,2
milhões.
O rombo é atribuído a sucessivos problemas nas gestões de Hélio Bernades, que
renunciou ao cargo de presidente em meados de setembro, após sofrer forte pressão
interna para justificar os maus resultados. Hélio é um sindicalista militante do PTB de
Goiás e ocupa a diretoria de Assuntos Parlamentares do Sindicato Nacional dos
Analistas-Tributários da Receita Federal (SindiReceita). Sob a administração dele,
a Assefaz saiu de um resultado positivo de R$ 87 milhões, em 2011, para o maior
prejuízo
registrado
em
quase
30
anos
de
existência.
Diante das suspeitas, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT)
anunciou uma espécie de pré-intervenção na fundação. Nos próximos dias, uma
equipe de especialistas em gestão de planos de saúde vai promover uma devassa nas
prestações de contas dos últimos cinco anos da entidade, que até hoje não foram
aprovadas pelo MP. O objetivo é identificar e corrigir os problemas que levaram
a Assefaz a registrar o pesado rombo de 2012 e avaliar se houve fraudes, além de má
gestão nas administrações anteriores. “Se for identificada situação nesse sentido, nós
podemos afastar dirigentes, responsabilizar e cobrar ressarcimento deles e, em último
caso, pedir a extinção da fundação”, diz a promotora de fundações do MPDFT, Catia
Gisele Vergara.
O MP poderá entrar também com ações de cunho criminal contra dirigentes e exdirigentes. “Se (a situação) não fosse preocupante, não estaríamos montando essa
equipe para investigar os problemas na entidade. Entretanto, é preciso dizer que, no
momento, trabalhamos com a possibilidade de licitude, e não de fraude, pois os
problemas que a Assefaz enfrenta atingem todo o segmento de autogestão, que está
passando por grandes dificuldades financeiras”, pondera a promotora. O ministro da
Fazenda, Guido Mantega, foi informado sobre a situação, mas ainda não tomou
atitude.
Irregularidades
O Correio ouviu de várias fontes denúncias que enunciam diversas irregularidades
na Assefaz, entre as quais o favorecimento de apadrinhados políticos. Um exemplo foi
a nomeação do atual superintendente da fundação, Rodrigo de Andrade Vasconcelos.
Ele é genro de Jether Abrantes de Lacerda, que ocupa o cargo de secretário-geral do
Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários (SindiReceita), e amigo do ex-presidente
da Assefaz Hélio Bernades.
Apesar de ter se formado em direito há apenas quatro anos, Rodrigo teve uma
meteórica ascensão dentro da fundação. Contratado como advogado júnior, em 2010,
ele hoje ocupa também as três mais importantes gerências da entidade: de
Administração, de Finanças e de Programas Sociais. Parece muito? Não pare ele, que
diz dar “conta do recado”. “Ainda sou novo, tenho muito fôlego para trabalhar”,
justifica.
Chama a atenção também a indicação, pelo próprio Rodrigo, de pessoas próximas a
ele para ocupar outros cargos de destaque na Assefaz. São os casos da Gerência
Nacional de Saúde e da Gerência Executiva de Regulação e Controle, ocupadas
interinamente, por Raquel Barbosa Carvalho de Aguiar e por Raphael Luiz Lima,
respectivamente. Raquel trabalhava na área de faturamento da fundação até assumir
a responsabilidade de gerir 94 mil vidas.
Já Raphael está em uma função até recentemente exercida pelo médico e advogado
Paulo Montenegro, também membro do Ministério Público.
Sistema falho
O Ministério Público também investiga a compra, ainda na administração de Hélio, de
um programa de gestão que custou aos cofres da Assefaz o equivalente a R$ 3
milhões. O software, tão logo foi posto em funcionamento entrou em pane. Com isso,
o plano de saúdepassou a atrasar os pagamentos dos fornecedores e a emitir
cobranças até duas vezes acima do valor realmente gasto pelos beneficiários, que
contribuem com parte do tratamento.
“É verdade que o Proteus não está funcionando em sua totalidade”, diz Rodrigo, que
condiciona o atraso no pagamento a fornecedores à falha do programa. Por conta das
sucessivas panes, a fundação se viu obrigada a reutilizar o programa antigo,
construído, de graça, pelos programadores da própria Assefaz. “Decidimos voltar para
o sistema antigo para colocar as contas em dia”, garante o superintendente da
fundação. Não é o que pensa o MP, que diz ter constatado o não pagamento a vários
convênios. “Nós ainda não sabemos se eles não pagaram os prestadores por causa
desse problema no sistema ou porque não têm dinheiro para fazer frente a essas
obrigações”, conta Vergara.
“Estou tranquilo”
O ex-presidente da Assefaz Hélio Bernades refuta as acusações: “Estou tranquilo, o
fato de ter uma investigação (pelo MP) ou deficit não quer dizer que existe algo de
anormal na administração”, pondera. “Não houve, ao que eu saiba, qualquer desvio de
conduta durante a minha administração. E, se tiver havido, tem mesmo que ser
investigado e os responsáveis, punidos”, afirma. Ele nega também ter usado a
estrutura da Assefaz para favorecer aliados. Ele atribui as denúncias a opositores
políticos.
Perfil
» Fundação: 1981
» Beneficiários: 94 mil
» Resultado em 2011: saldo de R$ 87 milhões
» Resultado em 2012: deficit de R$ 37,2 milhões
» Principais problemas: indícios de fraudes nas prestações de contas, de
favorecimento de apadrinhados políticos, de nepotismo e de gestão temerária.
Viriato vê administração equivocada
O presidente interino da Assefaz, auditor fiscal Carlos Viriato de Sousa Lima, que
assumiu o cargo há pouco mais de um mês em substituição a Hélio Bernades, já
avisou que só permanece no posto até dezembro, depois de sacramentado o
resultado das eleições que vão eleger o seu sucessor. “Não tenho a menor intenção
de permanecer aqui. Meu objetivo é colocar a casa em ordem e resgatar os valores de
uma gestão que seja pautada pela ética e pela honestidade”, ressalta.
Viriato avalia como “equivocado” o modelo de gestão, Bernades, e assegura que a
direção e o caminho tomados anteriormente não são o que ele “preconiza” como o
melhor a se fazer.
“Uma gestão se mede por resultados”, observa, ao pontuar que uma administração
que gerou deficit de R$ 37 milhões “certamente” não foi eficiente. “Em algum
momento, o modelo foi equivocado”, enfatiza. Ele garante que não pretende fazer uma
caça às bruxas enquanto estiver como presidente, mas já avisou que, se forem
identificadas situações como desvios de conduta, tomará providências para punir os
responsáveis. (DB)
Download

Assefaz na mira do MP 14 de outubro