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O PLURALISMO JURÍDICO COMO OPÇÃO À INACESSIBILIDADE DA
JUSTIÇA.
Bruno Andre Souza Colodel1
RESUMO
O presente artigo tem como objeto demonstrar a possibilidade das práticas extraoficias
para resolução de conflitos quando o Estado é omisso nas suas ações. O judiciário é o
órgão competente para dizer o direito e resolver os conflitos legalmente, porém
restritivo quanto no seu acesso. Como os indivíduos não podem ficar sem respostas e
sem resolução de seus conflitos as responsabilidades para soluções das adversidades
ficam nas mãos da sociedade, convalidando, neste sentido, o Pluralismo Jurídico:
sistema que trata de uma multiplicidade de manifestações ou práticas normativas,
dentro de uma mesma localidade, formal ou informal, a fim de dar garantia às
necessidades individuais, portanto, concorrente ao ordenamento jurídico imposto pelo
Estado.
PALAVRAS-CHAVE: pluralismo jurídico; acesso à justiça.
INTRODUÇÃO
O estudo pretende demonstrar a possibilidade da utilização de práticas
extralegais para resolver conflitos que deveriam ser de responsabilidade do Estado,
mas que não o são em vista que o Poder Judiciário não tem um acesso pleno e eficaz à
justiça, o que precisa ainda muito evoluir. Desta forma, o pluralismo jurídico apresenta
viabilidade para a resolução dos conflitos, busca da paz, tranqüilidade e harmonia
entre os indivíduos de um determinado local.
O foco para o qual converge o pluralismo jurídico é a afirmação de que o
Estado não é o centro único detentor do poder e também não é fonte exclusiva para
produção do direito.
Acadêmico do curso de Direito das Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil orientado
pelo professor Ms. Flavio Bortolozzi Junior.
1
2
Na ânsia da sociedade buscar um direito mais justo e acessível é que surge o
desejo de utilizar, de diferentes formas, as leis instituídas pelo Estado a fim de resolver
os conflitos, como uma alternativa válida.
Eugen EHRLICH bem coloca que diante de uma sociedade formada por
diversas organizações e associações humanas que se interrelacionam, estas interagem
entre si e conservam uma autonomia diante do Estado. Cada entidade cria
internamente a sua própria norma, independente e sem interferências de outras
organizações, revelando-se a primeira e a mais fundamental forma de direito,
objetivando ir alem do convencional e buscar valores emergentes e criativos,
priorizando não mais a segurança e a certeza, mas os riscos e os desafios.2
Assim, atualmente, o pluralismo é um modelo válido na busca alternativa para
dirimir os conflitos, quando se depara com as inacessibilidades da justiça formal, uma
vez que esta é precária e apresenta diversas restrições.
1 PLURALISMO JURIDICO
Os grupos sociais apresentam formas diversificadas de vida. Novos padrões vão
se criando para atender as necessidades básicas dos indivíduos que a cada dia buscam
incansavelmente a dignidade da pessoa humana. A convivência social torna-se
complicada demais, pois cada pessoa busca a satisfação própria, e em virtude dessa
busca incessante pela melhor qualidade de vida, surge à necessidade de uma
regulamentação para esta convivência.
A diversificação de grupos sociais faz com que haja necessidade de uma
multiplicidade de direitos para atender os mais diversos interesses locais de cada
entidade.
Com o fim da Idade Média e com o surgimento dos estados modernos a
discussão do pluralismo jurídico abre espaço para uma nova proposta, fundamentada
na ideologia liberal. A consolidação de uma nova sociedade capitalista impõe uma
2
286.
EHRLICH, Eugen. Fundamentos da sociologia do direito. Brasília: UnB, 1986. p.27-29,
3
nova concepção do político e do jurídico e uma crescente autonomia das ciências,
livres do domínio religioso.3
Denota-se que o poder estatal não possui mais um sistema fechado e também
não é o único ator para a criação de leis e aplicação do Direito. O multiculturalismo
social é totalmente pluralista. As demandas da sociedade são carentes de atendimento,
e ao conferir esta carência, é imprescindível a resolução de conflitos e interesses
através de meios alternativos.
Ao final do século XIX e meados do século XX, constata-se uma forte reação
de doutrinas pluralistas, diante das manifestações de uma sociedade burguesa em seu
apogeu, da clara expressão do capitalismo industrial e do amplo domínio do
individualismo filosófico, do liberalismo político-econômico e do dogma do
positivismo jurídico estatal.
Eugen EHRLICH aduz que “a função primordial do direito em todos os lugares
não é a resolução dos conflitos, mas sim a instituição de uma ordem pacifica interna
das relações sociais de qualquer associação humana”.4
O autor ainda afirma que o direito não pode ser unicamente aquele proveniente
do Estado, positivado. Este direito estatal é fechado e não consegue abranger a
sociedade como um todo, mas sim composta por organizações diversificadas ou
associações humanas que se interrelacionam, concluindo que cada associação cria seu
próprio ordenamento jurídico, autônomo do Estado e à qualquer outra forma de
organização.5
No pluralismo é fundamental a participação da sociedade nas relações que as
envolvem, a fim de incessantemente buscarem a ordem mais satisfatória do bem-estar
e pacificação. Seja em qualquer sociedade o direito está intrinsecamente inserido para
promover a solução dos conflitos.
Quando a sociedade está insatisfeita com a aplicação do direito estatal e a fim
de proporcionar meios para a satisfação dos conflitos é que surgem os direitos
3
MALISKA, Carlos Augusto. Pluralismo Jurídico e Direito Moderno: notas para pensar a
racionalidade jurídica da modernidade. Curitiba: Juruá, 2000. p.23.
4
EHRLICH, Eugen. Op.cit. p.25.
5
Ibidem, p.110.
4
paralelos, de aplicação social, eficácia imediata, restritiva, criados pela própria
sociedade, configurando-se assim o pluralismo jurídico.
Este fenômeno é uma realidade social concreta, encontrada em diversos
Estados, e percebida especificamente em países marginalizados economicamente
(como exemplo o Brasil).
Boaventura Sousa SANTOS explicita que: “o pluralismo jurídico surge para
preencher a lacuna promovida pela ausência do Estado em determinadas localidades”.6
Neste sentido, Antonio Carlos WOLKMER designa pluralismo jurídico: “como
a multiplicidade de práticas jurídicas existentes num mesmo espaço sócio-político,
interagidas por conflitos ou consensos, podendo ser ou não oficiais e tendo sua razão
de ser nas necessidades existenciais e culturais”.7
Os conceitos de pluralismo jurídico são amplos e não definem essencialmente o
sistema em si, mas deixam claro que o modelo refere-se a múltiplos ordenamentos
para satisfação das necessidades de associações de indivíduos, em contrariedade a
unicidade do direito positivista, para o qual o direito é único e exclusivo e advém do
Estado.
Ademais, ressalta-se que: “nem toda prática que se apresente como extraoficial
e não abrangida pelos códigos deve ser entendida como pluralismo jurídico. O simples
fato de uma prática ser não oficial não é suficiente para sua legitimidade; deve
fundamentar-se em preceitos de democracia e justiça.8
A sociedade é formada através da soma das vontades individuais e coletivas, e
destas surgem demandas que precisam ser resolvidas. Quando impossível a resolução
desses conflitos através do ordenamento jurídico formal, os indivíduos por si só
buscam alternativas para verem seus anseios atendidos.
Desta maneira, o pluralismo busca resolver os conflitos, privações, necessidades
fundamentais e reivindicações, focado objetivamente nas denuncias, contestações,
6
SANTOS, Boaventura Sousa. O discurso e o poder. Ensaios sobre a sociologia retórica
jurídica. Porto Alegre: SAFE, 1988. p.7-99.
7
WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo Jurídico: fundamentos de uma nova cultura no
direito. 3.ed. São Paulo: Alfa Omega, 2001. p.219.
8
BORTOLOZZI JUNIOR, Flavio. Pluralismo jurídico e a crise da modernidade. Curitiba,
2005. 66 f. Monografia (curso de direito). Pontifícia Universidade Católica do Paraná. p. 38.
5
rupturas e a adoção desses novos direitos, de acordo com a vontade de uma sociedade
marginalizada na iminente busca por melhores condições de vida. Quando os
segmentos passam por privações, carências e exclusões são motivadas a criarem seus
próprios direitos.
Portanto, reconhecer e valorizar as ações das associações na busca pela
resolução dos conflitos é uma realidade e realmente funcionam como modelos
alternativos de justiça, totalmente adequados principalmente nas comunidades
periféricas marginalizadas, inseridas em determinados modelos culturais e referindo-se
à criação de modelos mais democráticos de justiça.
O pluralismo é um projeto diferenciado para superar as tradicionais formas de
democracia e construir um sistema jurídico que resulte em práticas sociais insurgentes,
motivadas para a satisfação das necessidades que são essenciais aos indivíduos.
Muitas comunidades adotaram o pluralismo jurídico como forma influente em
suas comunidades, pois a desigualdade social, característica inerente ao forte
capitalismo, transforma os indivíduos em seres alienados, espoliados e desiguais, sem
valores, sem animo para a busca do direito positivado. A vida precária, de exclusão,
abandono, descaso e falta de atenção do Estado, configura a razão da adoção nas
comunidades do ordenamento mais favorável e que possa atender as necessidades
básicas de cada individuo.
Assim sendo, o Estado deve evitar condutas desviantes das funções de ajuda às
associações em constantes conflitos, tal que esta apatia estatal é tão verdadeira, não
propiciando subsídios para os indivíduos resolverem seus conflitos, que se torna
válido, na busca da dignidade da pessoa humana, a prática de medidas alternativas,
como fonte de satisfação das necessidades básicas. Incontestável, portanto, a presença
do pluralismo jurídico na realidade, trazendo consigo uma democratização e
socialização do direito, não podendo ser ignorado pelo Estado mas visto como meio de
evolução jurídica.
6
2 O ACESSO À JUSTICA E O PLURALISMO JURIDICO
Os costumes, com o tempo, moldam a sociedade. Os anseios da população são
os mais diversos, acarretando certas frustrações quando estes não são satisfeitos.
Muitas ações legitimas são desviadas da direção do Estado, a fim de poder valorizar a
vida de comunidades que não possuem condições de buscá-las através dos meios
oficiais. Os costumes culturais de cada localidade vão se estabelecendo na sociedade
conforme desejos de cada indivíduo que estão inseridos nestas comunidades.
O sistema do pluralismo jurídico é uma tentativa de sistematizar os primeiros
indícios e os sintomas de uma realidade que já existe informal, subjacente e
subterraneamente, enquanto referencial de validade. Não é uma imposição dogmática,
mas uma postura estimuladora em constante redefinição, – “não tem a pretensão de
buscar e oferecer uma resposta estanque e pronta pra tudo”, pois trata de um modelo
aberto e contextualizado que se vai completando na medida em que se efetiva através
da cotidianidade dos consensos nas diferenças.9
O papel para a resolução desses conflitos, através da atuação efetiva do Poder
Judiciário frente aos problemas que residem numa sociedade diversificada e em busca
da pacificação, deveria ser do Estado. Ocorre que o judiciário carece de urgentes
reformas para atender as novas demandas de multidões cada vez mais exigentes e
diferentes.
Mauro CAPPELLETTI e Bryant GARTH lembram que no capitalismo a
pobreza inerente ao sistema, fruto da questão social, impede vários segmentos da
população, a buscarem seus direitos, fazendo as seguintes colocações:
Afastar a pobreza no sentido legal – a incapacidade que muitas pessoas têm de utilizar
plenamente a justiça e suas instituições – não era preocupação do Estado. A justiça, como
outros bens, no sistema do laissez-faire, só podia ser obtida por aqueles que pudessem
enfrentar seus custos; aqueles que não pudessem fazê-lo eram considerados os únicos
responsáveis por sua sorte. O acesso formal, mas não efetivo à justiça, correspondia à
igualdade, apenas formal, mas não efetiva.10
9
MELO, Raissa de Lima e. Pluralismo jurídico: para alem da visão monista. Campina
Grande: EDUEP, 2002. p.355.
10
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988. p.
09.
7
As desigualdades sociais são agravadas em virtude da globalização econômica,
acrescendo as marcas da pobreza e da exclusão social. Flavia PIOVESAN em sua obra
afirma que a “pobreza é ameaça sistêmica fundamental em um mundo que se
globaliza”. É preciso uma redefinição do papel do estado no tocante à implementação
dos direitos econômicos, sociais e culturais.11
O acesso à justiça “é ir alem do acesso aos fóruns, tribunais, processos, a fim de
assegurar direitos e exigir deveres; o acesso à tutela jurisdicional da função estatal
compete ao Poder Judiciário, mas o acesso à justiça não somente restringe-se aos
meandros da função deste órgão”12, mas conduz Horacio Wanderlei RODRIGUES “a
uma ordem de valores e direitos fundamentais para o ser humano, e não restritos ao
ordenamento jurídico processual”.13
O pluralismo jurídico é fator determinante para atender os anseios dos grupos
vulneráveis de assistência judiciária. O meio que viabiliza a resolução de conflitos
interpessoais é amplo e não consegue atender todas as demandas necessárias como
contribuição de uma sociedade pacífica.
Os problemas que assolam o efetivo acesso à justiça são trazidos como
obstáculos que precisam ser transpostos. Mesmo não existindo um conceito sobre
efetividade, a sua ausência é significado de inacessibilidade à justiça.
Dentre os obstáculos encontrados, Mauro CAPPELLETTI e Bryant GARTH
citam: custas judiciais, possibilidade das partes e problemas especiais dos interesses
difusos.14
Outros problemas encontrados são: burocracia, lentidão e elevados custos para
intentar uma ação. O caráter limitado, formalista, rebuscado e ineficiente do Poder
Judiciário. O elevado valor das custas judiciais e honorários advocatícios, alem das
altas taxas para interpor recursos e, mais importante, a pobreza, como maior causa de
11
PIOVESAN, Flavia. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo comparativo
dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 23.
12
CESAR, Alexandre. Acesso à justiça e cidadania. Cuiabá: UFTM, 2002. p.49.
13
RODRIGUES, Horacio Wanderlei. Acesso à justiça no direito processual brasileiro. São
Paulo: Acadêmica, 1994. p.28.
14
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Op.cit. p.15.
8
desigualdade e afastamento dos indivíduos das práticas formais de acesso à justiça. A
falta de cultura, informação e educação, deixam os indivíduos na ignorância para se
aproximarem das práticas judiciais.
As desigualdades e injustiças sociais estão claramente visíveis em toda
sociedade e, com isso, gera certo grau de insegurança e inconformismo na população,
alem da falta de informação que acarreta uma evasão dos indivíduos da procura de
meios viáveis para propor demandas formais.
Paulo Cesar Santos BEZERRA confirma que: “o ordenamento nacional carece
de uma abertura maior e de flexibilidade de suas normas. Mostra-se extremamente
rígido e fechado”.15
De fato, é preciso que o Estado abra as portas do judiciário e abasteça o povo de
informações, para que estes possam ser conhecedores que o órgão é acessível a todos e
busca uma sociedade mais justa e democrática. O judiciário precisa ser revestido de
credibilidade para alcançar seus objetivos, pautando-se na concepção de que o direito é
criação da própria sociedade como o dever de estar sempre a serviço desta, a fim de
buscar a democracia e realizar a justiça, conforme dizeres de João Batista
HERKENHOFF.16
A falta de efetividade no cumprimento das leis bem como o distanciamento do
judiciário das classes sociais pobres acarreta visivelmente a possibilidade da inserção
do discurso pluralista em determinadas localizações geográficas, como muito bem
coloca Paulo Cesar Santos BEZERRA:
Quando o ordenamento é por demais rígido e distante das realidades e necessidades sociais as
comunidades criam seus próprios mecanismos e ignoram as leis os remédios estatais. Quando
o acesso à justiça é negado a determinados segmentos da sociedade, obviamente aos mais
pobres, a comunidade como que cria mecanismos de sobrevivência e acaba por instituir regras
próprias que lhes possibilite sobreviver.17
15
BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da
realização do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p.101.
16
HERKNHOFF, João Batista. O papel progressista do direito, dos juristas e dos juízes.
In:_____ (Org.). Direito e utopia. São Paulo: Acadêmica, 1993. p. 31-38.
17
BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Op.cit. p.104.
9
Já que as ações estatais são omissas, os indivíduos devem superar a inércia das
decisões dando garantia para os direitos inerentes aos cidadãos. São imprescindíveis
iniciativas destes para introduzir uma melhor participação nas decisões estatais e não
aceitar apenas imposições, garantindo a efetividade dos direitos.
A justiça deveria ser perfeitamente alcançada por todas as camadas sociais, mas
para isso são necessárias amplas reformas para atingir os pertinentes objetivos. É
preciso viabilizar uma justiça rápida e menos custosa que atenda os anseios da
população sem discriminação. Por outro lado, a sociedade precisa estar consciente e
exercer sua cidadania coerentemente, conhecendo as formalidades do sistema estatal a
fim de que possa também ser contribuinte para uma justiça eficaz.
São precisas soluções eficazes para a busca de uma justiça mais efetiva e
democrática, bem como reavaliar os obstáculos já colocados, tais como: a melhoria
dos instrumentos e condições de trabalho, aprimoramento dos procedimentos judiciais,
preparação dos operadores do direito, primar por medidas processuais céleres, adotar
postura de garantias efetivas dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana,
entre tantas outras possibilidades de melhorias.
O parâmetro de democratização do Poder Judiciário também é proposta viável
de reforma, concernente a questão da abertura de suas portas para os setores mais
carentes da população. Salienta-se ainda a desburocratização das exigências legais,
através da simplificação dos procedimentos, pautado pela economia de tempo e custos,
sem colocar em risco as garantias do devido processo legal e dos direitos individuais.18
Incumbe, portanto, ao Estado a organização de meios alternativos para dirimir
os conflitos da sociedade, alem daqueles tradicionais já existentes. Quando o Estado
não se organiza, essas práticas alternativas passam para as mãos dos indivíduos que
visam satisfazer suas necessidades básicas.
Enquanto não se consolidam leis, emendas, instituições de órgãos aptos para
atenderem as demandas que surgem, estes grupos buscam a forma alternativa para
consolidar seus litígios.
18
SADECK, Maria Tereza Aina. Poder judiciário: perspectiva de reforma. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-62762004000100002&lang=pt>
Acesso em: 16 abr 2009.
10
A sociedade contemporânea, carente de valores, informações, regrada no
individualismo e distante das decisões estatais procura, cada vez mais, o
contentamento de suas incoerências jurídicas através de praticas extralegais. Tem-se a
plena convicção que estas práticas informais e necessárias empregadas por grupos
sociais são legítimas e válidas no seio social em que estão inseridos.
Convenientemente, Antonio Carlos WOLKMER dispõe que: “por mais ampla,
forte e totalizadora que possa ser esta regulamentação jurídica da sociedade moderna
por parte do Estado, este não consegue erradicar e inviabilizar todo fenômeno de
regulação informal proveniente de outros grupos sociais não-estatais”.19
E estas modalidades de práticas descentralizadas e mecanismos de auto-regulamentação
espontâneas provenientes fundamentalmente dos setores majoritários, marginalizados,
reprimidos e injustiçados compreendem aquilo que se passará a designar como o alternativo.
Ainda que se possa reconhecer uma multivocidade de sentidos e toda uma gama de
deslocamentos diversos, a dimensão do alternativo na inserção do fenômeno jurídico traduz
uma variante de juridicidade distinta da que foi instituída como obrigatória e burocratizada, ou
seja, outro procedimento normativo espontâneo distinguindo-se do introjetado e formalmente
imposto pelo poder oficial dominante.20
O pluralismo jurídico está consignado na sociedade quando o Estado distanciase da sua função de proporcionar a segurança jurídica de todos os sujeitos coletivos,
indistintamente, propicia a manifestação de ordens jurídicas paralelas que, de certo
modo, são valoradas como normas próprias.
O judiciário deve ser visto como garantidor de justiça não somente com a
legalidade da aplicação do direito, mas também com a legitimidade de atos inerentes
ao órgão.
Resta claro que o pluralismo jurídico tem presença incontestável na sociedade,
que diante das dificuldades de acessibilidade à justiça, almeja a todo momento a
resolução de seus conflitos.
O canal encontrado pelos sujeitos que necessitam litigar é a prática de condutas
alternativas que levam a resolução de suas demandas. O meio prospectivo de criação
de leis ainda é do Estado, entretanto, como este é falho em suas ações, as práticas
19
20
WOLKMER, Antonio Carlos. Op.cit., p.286.
Ibidem, p.287.
11
pluralistas ganham forças, construindo formas de satisfação das necessidades
fundamentais.
Objetiva-se, contudo, restar demonstrada a possibilidade das associações,
grupos e indivíduos, por si só, buscarem a extinção dos litígios existentes na sociedade
em que vivem, através das práticas pluralistas. A justiça necessita abrir as portas de
sua atuação e intervir nos litígios existentes a fim de poder dar crédito para o Estado, o
qual precisa ser mais atuante e preocupado com os problemas sociais, até porque, o
ente público deve preservar e garantir a dignidade da pessoa humana e proporcionar as
garantias dos direitos humanos de toda sociedade, propondo uma sociedade mais justa
e pacífica.
Acreditar na justiça é preciso. O Estado tem o dever de propor práticas para
melhorar a acessibilidade da justiça, porém, enquanto as restrições estiverem
presentes, os indivíduos manifestam-se através das práticas pluralistas, aceitando-as
como legitimas, válidas e justas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim sendo, cabe considerar a viabilidade das práticas alternativas para
obtenção de uma sociedade mais digna e humana e também na necessidade de um
melhor atendimento das classes através do respaldado órgão que é o Poder Judiciário.
A democracia plena e integral não pode ser alcançada sem a garantia de uma
ordem jurídica justa, onde os direitos possam ser reivindicados e atendidos de forma
célere e eficaz, através do Estado ou não. O reconhecimento da existência e
imprescindibilidade de mecanismos alternativos de produção e aplicação de direitos
fora do âmbito estatal faz-se necessário.
Em razão da falta de análise do Poder Judiciário e sua impossibilidade de
solucionar questões, o ideal é encontrar soluções extrajudiciais para resolver conflitos,
dando causa para a prática do pluralismo jurídico.
O pluralismo jurídico se torna necessário para resolver as demandas que não se
aproximam do Poder Judiciário. Imprescindível a busca pela paz e a dignidade. O
12
Estado é parcialmente subsidiário do bem-estar social, portanto, cabe aos indivíduos
buscarem, através de seus próprios meios a pacificação restante, e assim, mesmo
diante das desigualdades, sintam-se satisfeitos com um mínimo necessário de
dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano
da realização do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
BORTOLOZZI JUNIOR, Flavio. Pluralismo jurídico e a crise da modernidade.
Curitiba, 2005. 66 f. Monografia (curso de direito). Pontifícia Universidade Católica
do Paraná.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE,
1988.
CESAR, Alexandre. Acesso à justiça e cidadania. Cuiabá: UFTM, 2002.
EHRLICH, Eugen. Fundamentos da sociologia do direito. Brasília: UnB, 1986.
HERKNHOFF, João Batista. O papel progressista do direito, dos juristas e dos juízes.
In:_____ (Org.). Direito e utopia. São Paulo: Acadêmica, 1993. p. 31-38.
MALISKA, Carlos Augusto. Pluralismo Jurídico e Direito Moderno: notas para
pensar a racionalidade jurídica da modernidade. Curitiba: Juruá, 2000.
MELO, Raissa de Lima e. Pluralismo jurídico: para alem da visão monista. Campina
Grande: EDUEP, 2002.
PIOVESAN, Flavia. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo
comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. São Paulo:
Saraiva, 2006.
RODRIGUES, Horacio Wanderlei. Acesso à justiça no direito processual brasileiro.
São Paulo: Acadêmica, 1994.
SADECK, Maria Tereza Aina. Poder judiciário: perspectiva de reforma. Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010462762004000100002&lang=pt> Acesso em: 16 abr 2009.
13
SANTOS, Boaventura Sousa. O discurso e o poder. Ensaios sobre a sociologia
retórica jurídica. Porto Alegre: SAFE, 1988.
WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo Jurídico: fundamentos de uma nova
cultura no direito. 3.ed. São Paulo: Alfa Omega, 2001.
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