CURSO DE DIREITO TEORIA DA CONSTITUIÇÃO Prof. MsC. UBIRATAN RODRIGUES DA SILVA (PLANO DE ENSINO: Unidade III. A CONSTITUIÇÃO E A FORMAÇÃO DOS PROCESSOS DE MUDANÇAS) Plano da Aula nº 8 OBJETO: O Poder Constituinte. OBJETIVO: Analisar e interpretar o Poder Constituinte. A teoria do poder constituinte poder constituinte - é a capacidade de criar ou de alterar a ordem jurídica do Estado. - é a vontade jurídica cuja força ou autoridade é capaz de adotar a concreta decisão de conjunto sobre o modo e a formas da própria existência política, determinando assim, a existência da unidade política como um todo (Carl Schmitt). A teoria do poder constituinte é basicamente uma teoria da legitimidade do poder. Surge quando uma nova forma de poder, contida nos conceitos de soberania nacional e soberania popular, faz sua aparição histórica e revolucionária em fins do século XVIII. OBSERVAÇÃO: Cumpre, todavia não confundir o poder constituinte com a sua teoria. Poder constituinte sempre houve em toda sociedade política. Uma teorização desse poder para legitimá-lo, numa de suas formas ou variantes, só veio a existir desde o século XVIII, por obra da sua reflexão iluminista, da filosofia do contrato social, do pensamento mecanicista anti-historicista e antiautoritário do racionalismo francês, com sua concepção de sociedade. Numa fórmula feliz, estabeleceu Egon Zweig a síntese dessa teoria: um conceito novo para instituir a suprema potestas nationis et rationis. Convicção na democracia é recorde Fonte: Pesquisa Datafolha realizada em 19 e 20 de fevereiro de 2014 entrevistas em 161 municípios. Margem de erro: 2 pontos percentuais para mais ou para menos. PROTESTOS DE RUA DERRUBAM TARIFAS Fonte: Marcelo Justo/Folhapress (FOLHA DE SÃO PAULO, Ano 93, n º 30.759 Quinta-feira, 20 de junho de 2013) OBS: Leitura do texto Com a palavra... Uma verdade (de José Massulo) Diário do Amapá O desemprego, a doentia saúde, a desqualificação do trabalhador e o amargurante descaso com a educação pública, sempre com fortes doses de negligência e, fundamentalmente a insegurança quando predomina a liberalidade da circulação das drogas de forma aberta e simplesmente não se tem uma política rigorosa por parte do Estado brasileiro, e o amargar maior é que nem perspectivas se ascendem para uma solução dessas mazelas. [...] Pensemos então! Vai ser assim sem fiscalização em uma abusividade descontrolada? E nós ficaremos então de braços cruzados a espera das decisões políticas? Se todos pensassem em praticar um bloqueio para tudo isso por certo haveria mudanças. Mas toda reivindicação a princípio é utópica e criticada pelos desânimos dos sem coragem! Eleitorado de Dilma é o mais pobre e o menos escolarizado ANDRÉ UZÊDA Enviado especial a Madalena (CE) “Se não fosse o Bolsa Família, passaria fome” MARIANA HAUBERT De Brasília “Ele tem postura que inspira mais confiança” Com efeito, a distinção fundamental entre poder constituinte e poderes constituídos consentiu o advento das Constituições rígidas, bem como, desde aí, o dogma de uma soberania que se exercitava mediante instrumentos constitucionais de limitação do poder. Poder essencialmente soberano, o poder constituinte, ao teorizar-se, marca com toda a expressão e força a metamorfose do poder, que por ele alcança a máxima institucionalização ou despersonalização. Sem o poder constituinte, essas duas categorias modernas do pensamento político não teriam vingado: o povo e a nação. Ambas nascem atadas a uma versão nova de soberania contida no esquema do poder constituinte. A teoria do poder constituinte só se faz inteligível à luz de considerações sobre o problema da legitimidade, cujo debate ela necessariamente provoca, porquanto emergiu de uma distinta concepção de autoridade governativa; uma concepção em que a titularidade do poder era deferida exclusivamente e por inteiro à Nação, única legítima para postular obediência ou estabelecer comando na sociedade. Do ponto de vista formal, isto é, considerado apenas de modo instrumental, o poder constituinte sempre existiu e sempre existirá, sendo assim um instrumento ou meio com que estabelecer a Constituição, a forma de Estado, a organização e a estrutura da sociedade política. Do ponto de vista material ou de conteúdo, considerado, porém como espécie e não como gênero, individualizado e não generalizado, formulado já em termos históricos no âmbito de uma teoria, que dele toma consciência, conforme aconteceu durante o século XVIII, o poder constituinte é conceito realmente novo, com o objetivo de exprimir uma determinada filosofia do poder, incompreensível fora de suas respectivas conotações ideológicas. Assinala o historiador do poder constituinte que, ao elaborar a Constituição, faz o poder constituinte ato mediante o qual a personalidade do Estado se autodetermina, ou segundo expressão já empregada por Lorenz von Stein “toma inteira consciência de seu próprio ser”. Mas onde Zweig diz o Estado – preso a um preconceito semântico em voga nas letras jurídicas da Alemanha – nós diremos o povo e a nação, órgãos de vontade que exprimem a soberania e fazem legítimo o exercício do poder. Engenhosamente, trata, pois Sieyes de inserir o poder constituinte na moldura do regime representativo, de modo que se atenuem assim as consequências extremas oriundas do sistema de soberania popular conforme o modelo de Rousseau. A fórmula é sabida: o poder constituinte, distinto dos poderes constituídos, é do povo, mas se exerce por representantes especiais (a Convenção). Não se faz necessário, acrescentava Sieyés, que a sociedade o exerça de modo direto, por seus membros individuais, podendo fazê-lo mediante representantes, entregues especificamente à tarefa constituinte, sendo-lhe vedado o exercício de toda a atribuição que caiba aos poderes constituídos. O conceito "político" de poder constituinte: o poder constituinte originário E O constituído Costuma-se distinguir o poder constituinte originário do poder constituinte constituído ou derivado. O primeiro faz a Constituição e não se prende a limites formais: é essencialmente político ou, se quiserem extrajurídico. O segundo se insere na Constituição, é órgão constitucional, conhece limitações tácitas e expressas, e se define como poder primacialmente jurídico, que tem por objeto a reforma do texto constitucional. Deriva da necessidade de conciliar o sistema representativo com as manifestações diretas de uma vontade soberana, competente para alterar os fundamentos institucionais da ordem estabelecida. Paulo Bonavides: “O Poder de reforma constitucional exercitado pelo poder constituinte derivado é por sua natureza jurídica mesma um poder limitado, contido num quadro de limitações explícitas e implícitas, decorrentes da Constituição, a cujos princípios se sujeita, em seu exercício, o órgão revisor.” O poder constituinte derivado (também denominado reformador, secundário, instituído, constituído, de segundo grau, de reforma) é um tipo de poder constituinte que se ramifica em três espécies: 1ª) O poder constituinte derivado reformador, que abrange as prerrogativas de modificar, implementar ou retirar dispositivos da Constituição (Emendas Constitucionais: CF, art. 60 e incisos); 2ª) O poder constituinte derivado decorrente, que consagra o princípio federativo de suas unidades é a alma da autonomia das federações na forma de sua constituição, assim, a todos os Estados, o Distrito Federal e até os Municípios este na forma de lei orgânica poderão ter suas constituições específicas em decorrência do Poder Constituinte Originário (CF, arts. 25 E §§, 32 e §§, 11, Parágrafo único, ADCT); 3ª) O poder constituinte derivado revisor, que, como exemplo retirado de nossa própria Constituição Federal, possibilita a revisão de dispositivos constitucionais que necessitem de reformas. Tais reformas não se confundem com a reforma stricto sensu, pois esta perpassa por procedimentos mais dificultosos e quorum mais específico (CF, art. 3º). A teoria do poder constituinte segundo a doutrina da soberania nacional Assenta a doutrina francesa da soberania nacional sobre o princípio básico de que o poder constituinte deve recair num órgão distinto dos órgãos constituídos. A esse poder cabe, por conseguinte, a tarefa precisa de formar os poderes constituídos, ou seja, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. O sistema ou concepção da soberania nacional faz assim da Constituinte um poder à parte, distinto dos poderes constituídos provido de competência, tanto para a revisão total como parcial da Constituição. Fará, sim, a lei constitucional, mas não fará a lei ordinária: o raio de competência se circunscreve à revisão para a qual foi convocado. Não poderá alargar, portanto seu quadro de ação, de modo a desempenhar as atribuições e competências mesmas de que irá dotar os poderes constituídos. Exerce por esse aspecto poderes limitados, desconhecendo, porém, limites quando se entrega ao exercício do poder de revisão total ou indeterminada da Constituição. As Constituintes, Convenções ou Assembleias de revisão, convocadas e eleitas especificamente para o desempenho da tarefa constituinte são, por conseguinte, segundo a doutrina da soberania nacional, assembleias especiais. Dissolvem-se de imediato uma vez elaborada a Constituição. Tudo naturalmente no espírito daquelas máximas segundo as quais "o povo tem sempre direito de rever e reformar a Constituição" (Thouret), ou só a nação é competente para decidir sobre a Constituição, “independente de todas as formas e de todas as condições", ou ainda "todos os poderes aos quais uma nação se sujeita emanam de si mesma”. A teoria do poder constituinte, do ponto de vista ideológico, se prende à concepção do Estado liberal; este, por sua vez, guarda íntima e estreita conexão com a doutrina da soberania nacional. Separar o poder constituinte dos poderes constituídos veio a significar do mesmo passo uma garantia de natureza formal, que se cuidava eficaz à proteção e resguardo dos direitos individuais postos na Constituição. Obstaculizava-se por meio da rigidez constitucional toda a interferência restritiva ou modificadora daqueles direitos, colocados, portanto fora do alcance do legislador ordinário (Cláusulas pétreas: CF, art. 60, § 4º). A teoria do poder constituinte segundo a doutrina da soberania popular A doutrina da soberania popular abrange contudo duas versões diferentes de poder constituinte: a versão francesa (revolucionária) e a versão americana; ambas, igualmente, de inspiração rousseauniana, mas de consequências distintas, senão até certo ponto opostas, conforme intentaremos demonstrar. A versão francesa, parte da distinção entre o poder constituinte e os poderes constituídos, entre as leis fundamentais e as leis ordinárias e, portanto, entre a função de fazer a Constituição e as funções meramente legislativas. Cumprida a tarefa a que se propunha a Constituinte (e foi o caso da Assembleia Nacional Francesa de 1791), cuidando-se soberana, dispensava a sanção constituinte do povo, por afigurar-se-lhe que a vontade que exprimira era já a vontade mesma do povo. Dessa acepção de poder constituinte se apartaram, porém os americanos. Jamais abdicaram eles numa assembleia de poderes ilimitados das faculdades constituintes do povo, titular da soberania e base de todos os poderes constituídos. Em nome da soberania popular instituíram as chamadas Convenções, verdadeiras assembleias de poderes limitados, consagradas à tarefa especial de preparar e redigir o projeto de Constituição, que a seguir submetiam ao voto popular. Em suma, de acordo com a doutrina da soberania popular, há duas alternativas teóricas, seguidas historicamente: a francesa, segundo a qual a Constituinte é o povo (concepção falsa, visto que a soberania é de natureza indelegável), e a americana, que vê na Constituinte ou Convenção apenas uma assembleia limitada cujo trabalho se legitima unicamente com a aprovação do povo. A titularidade do poder constituinte A concepção política da Idade Média e da Reforma girava, segundo Schmitt, preponderantemente ao redor do poder constituinte de Deus, conforme o princípio omnis potestas a Deo. Com as monarquias absolutas a titularidade veio a recair no monarca, que a justificava mediante a invocação de um suposto direito. Durante a Revolução Francesa o mesmo poder coube nominalmente à Nação ou ao Povo, mas de modo efetivo, no seu exercício, a uma Classe – a burguesia – ou seja, aquela parte do Povo que toma "consciência política autônoma" e entra a decidir acerca da forma de existência estatal, exercendo, por consequência, o poder constituinte. Durante a Restauração (1815-1830), o poder constituinte volveu na França às mãos de um príncipe de linhagem hereditária e assim prossegue a manifestar-se depois noutros países em distintos corpos ou entidades, numa casuística de titularidade que tem levado alguns a concordar com Sanches Viamonte quando assevera que "o titular do poder constituinte é produto das circunstâncias históricas e aparece sempre condicionado por elas". Poder-se-ia argumentar, em meio a abundantes exemplos colhidos no costume ou na jurisprudência, com o caso da Suprema Corte dos Estados Unidos, vista por Wilson como uma “convenção constituinte em sessão permanente”, ou seja, um tribunal que, à margem do poder constituinte formal, exercita materialmente atos configurativos de verdadeira atividade constituinte. Esses titulares ocasionais do poder constituinte foram excelentemente retratados por Bidart Campos, ao asseverar que, sem embargo de o povo ser o titular válido do poder constituinte, “haverá sempre atos constituintes emitidos por outros órgãos sem investidura legítima e formal”. Teoria e legitimidade do poder constituinte Quando se indaga quem é o titular desse poder absoluto, através de cuja vontade nascem, se organizam e funcionam os poderes constituídos – poderes relativos e limitados, órgãos daquela vontade soberana – a inquirição pode ter caráter estritamente científico, com o propósito de demonstrar e identificar no decurso da história que vontades políticas supremas foram potentes para ditar as regras básicas de comportamento e de organização institucional a que se submetem os governados. A legitimidade de um poder constituinte assentado sobre a vontade dos governados e tendo por base o princípio democrático da participação apresenta uma extensão tanto horizontal como vertical, que permite estabelecer a força e intensidade com que ele escora e ampara o exercício da autoridade. A extensão horizontal se mede pela maior ou menor amplitude do colégio de cidadãos que decide sobre matéria constituinte ou elege representantes a uma assembleia constituinte. O sufrágio serve de critério e referência com que caracterizar e definir o grau de legitimidade democrática; quanto menores as restrições à participação, maior a legitimidade que se logra na decisão constituinte. A extensão vertical da legitimidade é a que permite mensurar os distintos graus de participação dos governados: primeiro, o poder decisório sobre a Constituição, mediante referendum ou distintos meios plebiscitários; segundo, a incumbência de escolher os membros da Assembleia Constituinte e, terceiro, a faculdade de eleger um Congresso ordinário, dotado de competência constituinte latente, que é a forma mais branda, menos política e mais jurídica, indireta e arredada de participação do elemento popular. DICAS DE ESTUDO BOBBIO, Norberto; MATTEUCI Nicola; PASQUINO Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora da UnB, 1995. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 25ª edição. São Paulo: Malheiros Editora, 2009, p. 141-161. MASSULO, José (Articulista). Uma verdade. Diário do Amapá. Sextafeira, 21 de fevereiro de 2014, p. 3.