V Escola Brasileira de Supercondutividade Recife, 10 a 14 de dezembro de 2001 Teorias Microscópicas para a Supercondutividade Raimundo Rocha dos Santos [email protected] Apoio: Este mini-curso pode ser obtido do site http://www.if.ufrj.br/~rrds/rrds.html seguindo o link em “Seminários, Mini-cursos, etc.” Esquema do mini-curso I. Supercondutividade convencional: vínculos experimentais II. Condução em Metais III. Interação elétron-elétron IV. Teoria BCS V. Supercondutores de alta temperatura VI. Conclusões I. Supercondutividade convencional: vínculos experimentais 1. Resistência nula Metal normal 2. Efeito Meissner Campo magnético não entra na amostra: B = 0 no interior de um supercondutor [SUC não é condutor perfeito, dentro do qual B/t = 0] correntes superficiais aparecem de modo a gerar um campo que se oponha ao campo aplicado Aplicações tecnológicas no dia-a-dia Levitação magnética Outras aplicações: • geração de campos uniformes intensos (ressonância); • deteção de campos fracos (SQUID); etc. $ 4He N2 gelo -269 -250 -200 -150 SUC’s convencionais 0 SUC’s de alta temperatura T (°C) 3. Existência de um campo crítico T [K] Tipo II Hc2 [kG] Hc [G] Tipo I T [K] para uma dada T, a amostra só é SUC abaixo de um campo crítico Existe também uma densidade crítica de corrente: Jc log10 Tc 4. Efeito isotópico = 0.504 Hg Tc M [M é a massa média dos isótopos utilizados como íons da rede; Reynolds et al., (1951)] log10 M ions participam ativamente fônons desempenham papel importante no mecanismo da supercondutividade CS/T C/T [mJ/(mol K)] C/T [mJ/(mol K)] 5. Calor Específico CS/T exp[-1.39Tc/T] T 2 [K2] Tc/T Cs exponencial a baixas temperaturas gap no espectro II. Condução em Metais • Elétrons são férmions Pauli: dois férmions não podem ter conjuntos idênticos de números quânticos • Gás de férmions [livres e independentes (k,) definem estados]: E k2 Ex: Preenchendo os “níveis de energia de uma partícula” com 10 férmions F -4/L -2/L 2/L 4/L Considere cargas negativas em um potencial periódico E energia energia momento k i momento 0 j0 k i i 0 j0 i dens. de corrente Elétron só é espalhado ( resistência) pq há estados finais disponíveis Como evitar dissipação: Suprimir, através de algum mecanismo, estados acessíveis na faixa de energia próxima ao nível de Fermi III. Interação elétron-elétron elétron íon A interação Coulombiana entre um par qualquer de elétrons é blindada pelos demais elétrons e pelos íons constante dielétrica 4e 2 q2 4e 2 (q)2 2 2 1 2 2 2 q q k0 (q) 4e 2 Interação elétron-elétron efetiva: Vkk’ k-q k q k’+ q k’ k k' Dependência de Vkk’ com retardamento devido ao fato de que velast << vF Frölich (1951) - Teoria de Perturbação: Vkk' 4e 2 g 2(q) 2 1 2 2 2 q k0 (q) cte. de acoplamento e-f • (q) D e k F 102-103 hD interação via fônons só afeta elétrons com energias muito próximas • Se D interação via fônons é maior em módulo: Vkk’ < 0 interação efetiva é atrativa Então, se a interação entre elétrons pode, sob certas circunstâncias, ser atrativa, deve-se esperar que o espectro perto de F sofra mudanças cruciais. • O problema de Cooper • O estado fundamental BCS • Teoria BCS a temperatura finita IV. A Teoria de Bardeen, Cooper e Schrieffer 1. O problema de Cooper (1956) Dois elétrons interagindo atrativamente em presença de um mar de Fermi preenchido podem formar um estado ligado? (detalhes na 2a. e 3a. aulas) Sim, com energia de ligação dada por F E 2D exp 1 vD( F ) intensidade da interação e-e Densidade de estados no nível de Fermi (|k|) parte orbital simétrica parte de spin anti-simétrica par num estado singlete: S = 0 2. O estado fundamental BCS (1957) Elétrons, com energias próximas, interagindo atrativamente aos pares: Vkk' k-q k q v se k D e k ' D 0 em outroscasos k’+ q k’ Momento do CM do par se conserva: K = k + k’ = (k – q) + (k’+ q) Aproximação: superfície de Fermi esférica Para que dois elétrons interajam, eles devem ter energia dentro de uma casca com a energia de Debye; que valor de K otimiza os efeitos da interação? K kF Para superfícies de Fermi esféricas, o maior número de estados envolvidos ocorre quando K = 0 A Hamiltoniana BCS: H k (k ) ckck Vkk' bk bk' k ,k ' bk ckck termo livre (banda) Solução variacional: k 1 gk bk 1 gk2 0 Interlúdio: Densidade de estados quânticos dN D( E)dE # de estados no intervalo dE D densidade de estados com energia E d 1 D( E ) E 2 N.B.: gás de eletrons! d=3 d=2 d=1 E Densidades de estados (eletrons quase-livres ou tight-binding) Isolante ou Semicondutor Metal As somas em k podem ser expressas em integrais sobre energias: k Ld 2 d d d k d D( ) (k ) A equação do gap (detalhes na 2a. e 3a. aulas): 1 k V0 V kk' k' k' , com Ek (k )2 2k 2 Ek ' k (k)(T ) 1 onda- s (k ) cos k x cos k y onda- d x 2 y 2 sen k x sen k y onda- d xy SUC’s convencionais A equação do gap fornece, então, D D exp 1 vD(F ) 2senh1 vD(F ) onde supusemos acoplamento fraco: vD(F) << 1 Ek / F é o gap de energia para as excitações elementares, e Ek é a energia das quase-partículas k/kF Noção elementar de quase-partículas (c.f. superfluidez em 4He): A modificação no espectro pode ser esquematizada da seguinte forma: Estados desocupados F 2 Estados ocupados Gás de e `s + interação atrativa Condução por pares (cada par tem KCM=k1+k2): todos têm KCM = 0 energia energia E momento momento Para um par “sentir” a impureza teria que ser quebrado: KCM KCM dos demais pares alto custo energético (gap!) Ao formarem pares, os elétrons “se vacinam” contra as fontes de resistência 3. Teoria BCS a temperatura finita H (k ) ck ck k 1 V0 Vkk' bk bk ' k ,k ' Aproximação de Campo Médio: bk bk ' bk bk ' bk bk ' bk Definição do gap: 1 k (T ) V0 (k) V kk' k' bk ' =1 em BCS (s ) bk ' Interlúdio: Ordem de longo alcance não-diagonal, função de onda macroscópica, e classe de Universalidade • Em geral, são nulos os valores esperados de operadores de criação e de destruição, mas não em SUC ou SUF ordem de longo alcance não-diagonal • Analogia das super-correntes com movimento nãodissipativo de elétrons em átomos função de onda macroscópica: (r) = 0 ei(r) transf de Fourier: (k) = k/2Ek (parâmetro de ordem) • Função de onda complexa: 2 números classe de universalidade do modelo-XY Solução auto-consistente + Transf de Bogoliubov (detalhes nas aulas da tarde): bk k Ek tanh , com Ek (k )2 2k 2Ek 2 que fornece a equação do gap a T finita: 1 k (T ) V0 V kk' k' k' Ek ' tanh 2 Ek' 2 ( T)(0) A equação do gap é resolvida para (T ), e, para 0, obtémse Tc T/Tc kBTc 0.567D exp1 vD(F ) 2(0) 3.52 kBTc usada para comparar com obtido em exp’s de tunelamento Discrepâncias nesta razão e no efeito isotópico atribuídas à simplicidade da interação elétron-fonon utilizada (p.ex., troca de um fônon apenas) deve-se ir além; p.ex., a teoria de acoplamento forte de Eliashberg (os graus de liberdade fonônicos são mantidos, ao invés de eliminados para construir interação efetiva entre os elétrons) A teoria BCS era “a teoria” microscópica da SUC até 1986, quando o primeiro supercondutor de alta Tc (30 K) foi descoberto por Bednorz e Müller. Ainda OK para carbetos de Boro (coexistência SUC+MAG) e para MgB2 (acoplamento forte: Eliashberg) V. Supercondutores de Alta Temperatura O diagrama de fases: Diferenças fundamentais entre os SUC’s: alta Tc (fonons: Tc < 30 K) estado normal metálico ou isolante (dep de x) proximidade de uma fase magnética • tempo de vida das quase-partículas depende fortemente da temperatura • estado dos pares é predominantemente do tipo onda-d • pequenos comprimentos de coerência [ 12 Å], quando comparados com os convencionais [ 500 Å] • gap para excitações de spin abre-se acima de Tc Taxa de relaxação spin-rede, 1/TT1, mede resp. mag. local qa << 1; Knight shift mede qa ~ 1. Decréscimo de ambas quando T ligado à abertura de um gap no espectro de excitações de spin • Resistividade linear com T em intervalo apreciável não-líquido de Fermi?? T* Ť Tc Esta dependência, T, com 2 e dependendo da dopagem foi observada em outras amostras eR=0 0 Tc T R=0 0 conv Tc HTCS T* T Todas estas diferenças apontam para um mecanismo não-fonônico: magnético Estrutura cristalina: Cálculos de bandas: caso não-dopado (x = 0): Metal ???? Incluindo correlação, o comportamento isolante (correto!) é obtido Ordenamento antiferromagnético: planos de CuO2 O Cu Descrição simplificada do isolante antiferromagnético dopado transfere buraco do sitio j para i H t ci c j i , j , sítios de Cu Favorece o salto do buraco entre sítios (Modelo de Hubbard) n H.c. U i ni i Repulsão Coulombiana: a energia total aumenta se 2 e’s ocuparem o mesmo orbital termo de correlação S/ dopagem: energia é minimizada se colocarmos 1 buraco por sítio os buracos tendem a ficar localizados nos sítios sistema é um isolante (Mott) (para qq valor da repulsão Coulombiana) C/ dopagem: buracos adicionais são “compartilhados”, diminuindo o momento local a tendência à ordem é enfraquecida O que o modelo simplificado prevê (2 dimensões)? Teoria de Campo Médio (teoria de 1 partícula) Simulações de Monte Carlo Este exemplo ilustra que a dimensão, d, do sistema desempenha um papel crucial: d desvios do comportamento médio (flutuações) Teorias de Campo Médio podem prever comportamentos pouco realistas em d = 1 ou 2 Comportamento magnético razoavelmente bem explicado pelo modelo simplificado: dopagem tende a destruir ordem AFM E como explicar a fase AFM se estender a uma dopagem não-nula? multi-orbitais, 3a. dimensão, etc Vejamos agora a fase “SG”: Inicialmente pensou-se tratar de uma fase de vidro de spin [spinglass], mas estudos experimentais e teóricos recentes sugerem tratar-se de uma fase listrada Fase listrada melhor observada num “primo” dos supercondutores Formação de CDW [onda de densidade de carga] novo ingrediente: ordenamento direcional dos orbitais d do Mn Acredita-se que nos HTCS haja um equilíbrio entre o ordenamento de spin (AFM, nao SDW) e o ordenamento de cargas (tipo CDW) ao longo de uma direção ( na Fig.): As cargas tendem a se agrupar em regiões de menor ordem AFM Ainda não se sabe como modificar o modelo de Hubbard –2D de modo a produzir “stripes”, mas podemos tentar ver se ele pode descrever um estado supercondutor Simulações de MC para n =0.87, e U = 4: suscetibilidade dependente de q 1 (q ) Ns d miz ( ) miz (0) e iq 0 Pico em q = (,) não diverge, mas fica mais pronunciado à medida em que T flutuações antiferromagnéticas de curto alcance Várias teorias/modelos se baseiam na presença destas flutuações AFM: os elétrons trocariam estas flutuações, de modo análogo à troca de fônons nos SUC’s convencionais. Partindo do modelo de Hubbard, uma T de Pert para estes processos [Scalapino (1995)] fornece, para q = |k-k’| grandes 3 2 Vkk' U (k k' ) 2 pico em (, ) Eq do gap: k 1 V0 Vkk' k' k' , com Ek (k )2 2k 2 Ek ' Se V > 0, tem que apresentar nós onda d Tomando a transf de Fourier, a interação efetiva no espaço real fica interação on-site repulsiva Veff 1 0 2 r interação entre 1os. vizinhos atrativa Modelo de Hubbard estendido H t c i c j i , j , n H.c. U i ni i V (n i ni )(n j n j ) i, j (ver resultados em 1D nas transparências) Isto nos remete ao modelo de Hubbard atrativo (on-site): {a origem do U < 0 também pode ser atribuída a uma flutuação de valência [Wilson (2001)] } H t c i c j i , j , T n H.c. U i ni i T* (região de pares pré-formados; gap de spin) Tc |U| VI. Conclusões • Teoria BCS OK para SUC’s convencionais • Recentemente: Tc de 40 K em MgB2 e de 55 K em C60 dopados; só e-f é suficiente? • SUC’s de alta Tc ainda sem teoria microscópica bem estabelecida • Mecanismo magnético ainda é o mais forte candidato. 1986 + 46 = 2032. Será?