ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível 0010164-78.2008.8.19.0021 Apte.: EDGAR DA SILVA ARAÚJO Apda.: JOSÉ NATALINO DE CARVALHO Relator: Des. Fernando Foch Processo originário: 0010164-78.2008.8.19.0021 (2008.021.010142-2) Juízo de Direito da 6.ª Vara Cível da Comarca de Duque de Caxias CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. Ação de responsabilidade civil proposta por vítima de atropelamento em face do proprietário e do condutor do veículo atropelador. Expertise médica a apontar sequelas neurológicas, motoras e funcionais e a indicar que ao periciando, desorientado, substituiu-se a companheira, que foi quem respondeu às indagações da perita. Sentença de procedência. Apelo do condutor. 1. No caso de perícia médica constatar sequelas neurológicas e psíquicas, noticiando desorientação do autor periciado, a ponto de não conseguir ele responder a perguntas que lhe foram dirigidas, impõese ao juízo verificar se o demandante é capaz de praticar atos da vida civil e, em caso negativo, nomear-lhe curador especial se não houver curatela deferida em interdição. 2. Apelo prejudicado. Processo cuja nulidade parcial se declara de ofício. Unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível 0010164-78.2008.8.19.0021, em que é apelante EDGAR DA SILVA ARAÚJO e apelado JOSÉ NATALINO DE CARVALHO, ACORDAM os Desembargadores da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro por unanimidade em anular o processo a partir de fl. 129, inclusive, julgando prejudicado o apelo, nos termos do voto do Desembargador Relator. Rio de Janeiro, 27 de abril de 2010 Des. Fernando Foch Relator 2 RELATÓRIO Trata-se de ação cognitiva sob procedimento comum sumário, proposta por JOSÉ NATALINO DE CARVALHO em face de EDGAR DA SILVA ARAÚJO e JOÃO CARLOS PEREIRA, com a qual pretende o autor a condenação de os réus lhe indenizarem dano estético e moral. Alega para tanto que, ao trafegar certa feita de bicicleta, foi colhido pela motocicleta do segundo réu, pilotada pelo primeiro, inabilitado para tal. Em consequência, sofreu traumatismo crânio-encefálico e outras lesões corporais gravíssimas, causadoras de invalidez total e permanente, além de várias cicatrizes. Na contestação, o primeiro réu alegou necessidade de comprovação de culpa, e que o fato de não possuir habilitação para dirigir configura mera infração administrativa (fls. 33/78). Afirmou não ser o segundo réu proprietário do veículo atropelador, mas seu padrasto e ter o demandante manifestado o desejo de não processá-lo. Aduziu que sua família vem auxiliando financeiramente o autor. Sustentou, ainda, as teses de culpa exclusiva da vítima e impossibilidade de cumulação de dano moral e estético. O segundo arguiu preliminar de ilegitimidade passiva (fls. 79/108). Na questão de fundo, alegou não haver praticado qualquer conduta culposa e inexistir prova do fato constitutivo do direito alegado. Sustentou ainda não haver dano material ou moral a indenizar. Laudo pericial concluiu por dano estético em grau mínimo, incapacidade total e permanente, e existência de sequelas neurológicas, motoras e funcionais (fls. 114/28). Os demandados requereram que a perita fosse instada a esclarecer acerca da capacidade do autor para a prática de atos da vida civil. Regulamente intimada para tanto, não se manifestou (fls. 136v.º; 137 e 144v.º). A sentença, reconheceu a ilegitimidade passiva ad causam do segundo demandado e, em relação a ele, extinguiu o processo sem resolução do mérito (fls. 162/4). Quanto ao primeiro, deu pela procedência do pedido, para condená-lo a pagar ao autor R$ 27.900,00 (vinte e sete mil e novecentos reais), atualizada desde a data da prolação da sentença e acrescida dos juros de mora de 1% ao mês, estes contados da citação. Apela o primeiro tempestivamente às fls. 166/81, enfatizando ter-se sentenciado sem pronunciamento da perita sobre a capacidade do autor. No mais, pugna pela reversão do julgado, reprisando os argumentos expendidos na contestação. Em contrarrazões o demandante prestigia o ato judicial objurgado (fls. 185/7). É o relatório. Apelação Cível 0010164-78.2008.8.19.0021 B 3 VOTO Estão presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso. O laudo pericial de fls. 114/28 traz à baila dúvida no que tange à capacidade de o autor praticar pessoalmente os atos da vida civil. A perita do juízo assinala que ele “compareceu ao exame no dia, hora e local previamente estabelecidos, deambulando com marcha irregular, mostrando-se confuso, desorientado, adequadamente trajado”. Diz ainda que “as informações foram prestadas por sua companheira”. Mais adiante, afirma serem permanentes as lesões de ordem neurológica e aponta a presença de danos psíquicos e mentais. Silencia, porém, quanto a possível e ― há de se convir ― provável comprometimento da capacidade de discernimento. Tendo-se em conta que o demandante sofreu traumatismo crânio-encefálico, que sem sombra de dúvida, até mesmo aos olhos do leigo, traz em si a possibilidade de sequelas graves, é imprescindível a verificação, por profissional habilitado, da extensão dos danos neurológicos sofridos pelo demandante para que, em consequência, haja certeza quanto à sua capacidade de por si estar em juízo e manifestar sua vontade livre e conscientemente. Não poderia ter o douto magistrado sentenciado antes de verificar se o autor se subsume no art. 3.º, caput e inciso II, do Código Civil. O art. 8.º do CPC é claro ao determinar que, em juízo, os incapazes serão representados ou assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma da lei civil. A capacidade das partes é pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo; sua ausência, a teor do disposto no art. 267, IV, implica impossibilidade de apreciação do meritum causae. Apenas porque aponta o vício, sem pretender a declaração d enulidade, o apelo está prejudicado. O Processo é nulo a partir de fl. 129, quando se impôs aferir a sanidade mental do autor. As providências que faltaram devem ser agora tomadas; após, com a verificação da saúde psíquica do demandante e regularização de sua representação processual, se necessário, o feito há de prosseguir. À conta de tais fundamentos, voto no sentido de que a Câmara conheça do apelo e o julgue prejudicado, ao tempo em que de ofício declare nulo o processo a partir de fl. 129, inclusive, o que implica cassar a sentença, a fim de que, verificado o estado mental do autor e sanada possível irregularidade da representação processual (seja com a vinda aos autos de curador regulamente constituído, seja com a nomeação de curador especial na forma do art. 13, I, do CPC), o processo tenha regulares andamento e desfecho. Rio de Janeiro, 27 de abril de 2010 Des. Fernando Foch Relator Apelação Cível 0010164-78.2008.8.19.0021 B Certificado por DES. FERNANDO FOCH LEMOS A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br. Data: 11/05/2010 14:22:56Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0010164-78.2008.8.19.0021 - Tot. Pag.: 3