Caso Clínico: Artrite e Osteomielite Thiago Alves Martins Coordenação: Luciana Sugai Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS)/SES/DF www.paulomargotto.com.br Brasília, 12 de maio de 2014 Identificação: JMOS, sexo masculino, 4 semanas de vida, natural de Santa Maria, residente e procedente de Valparaíso de Goiás. QP: “ Irritabilidade e choro estridente ao toque da perna, além de diminuição da movimentação da mesma”. HDA: Mãe relata que após alta da UCIN do HRPL percebeu irritabilidade e choro ao mobilizar MIE do RN. Refere ainda edema em pé E e redução da mobilidade do mesmo membro. Nega febre e outros sinais flogísticos. Antecedentes pessoais: patológicos e fisiológicos Gestação interrompida por Sd. HELLP, parto cesariano. Apgar 6/8. RNPT 33sem/ PN 1710/ PC 30 cm/ E 43 cm. Ficou internado por 3 sem por DMH leve e sepse tardia. Feito D4 de Cefepime e Vancomicina. Após hemocultura com crescimento de S. aureus Oxacilina sensível, foi feito mais 14 dias de Oxa. Alta hospitalar há 1 semana (peso de 2255g); Em uso de Aptamil. Não conseguiu aleitamento materno; Nega cirurgias, alergias e outras comorbidades. • • • • • • História familiar: Mãe, 37 anos, hipertensa. Pai, 31 anos, sem comorbidades. 3 irmãos hígidos. Hábitos familiares: Casa de alvenaria, com uso de fossa, tem eletricidade. Rua não pavimentada. Animal doméstico, sem contato com a criança. Nega tabagismo passivo. Exame físico: FC=140bpm FR=43irpm BEG, corado, nutrido, hidratado, ativo, reativo, acianótico, afebril, irritado, chorando bastante. AR: MVF sem RA. ACV: RCR em 2T. ABD: Semi-globoso, flácido, indolor, sem VMG Pele: ausência de manchas e petéquias Ext: bem perfundidas (TEC<2s) e sem edema. Edema + calor discreto de face medial de coxa E, sem outros sinais flogísticos evidentes Neurológico: Ativo e reativo, FA normotensa. • • • • • • Quais exames pedidos? complementares podem ser Quais as principais hipóteses diagnósticas? Qual a conduta frente ao principal diagnóstico? Quais os fatores de risco para o caso? Quais as possíveis complicações? Diagnósticos • Artrite séptica? • Osteomielite aguda/crônica? • Fratura? • Pseudoparalisia de Parrot? Evolução: • Iniciado Oxa + Ceftriaxone no primeiro dia de internação. • Transferida para HbDF no quarto dia de internação. Modificado Ceftriaxone por Gentamicina. Submetida à drenagem sem intercorrências. • Permaneceu em UTI- HbDF por 7 dias. Ao sair, foi mandada de volta para o HMIB. • Trocado novamente Gentamicina (suspenso em D5) por Ceftriaxone. • Alta hospitalar após completar D11 de Oxa e D2 de Ceftriaxone. Em uso de Sulfametoxazol + Trimetropin por 60 dias. ARTRITE INFECCIOSA Conceito: Inflamação articular resultante da invasão direta por microorganismos. • Epidemiologia: Predomínio na faixa etária infanto juvenil. Metade antes dos 20 anos, principalmente, antes dos 3 anos). • 5,5 – 12 por 100.000; • Homens 2:1 mulheres; • 90% dos casos são monoarticulares; • 75-80% de grandes articulações de mmii; • No RN e no lactente, o quadril é o mais acometido. Patogênese: • Via hematogênica (principal); • Inoculação direta; • Contiguidade; - - - A passagem de bactérias do sangue para o espaço articular é facilitada pelo fato dos capilares sinoviais não possuirem membrana basal; Inflamação articular com destruição sinovial e cartilagem. Particularidade no RN e Lactente jovem*. Fatores de Risco: • Próteses articulares; • DM; • Uso de drogas EV; • Doença falciforme; • Cateteres profundos; • Imunodeficiências; • Infecções cutâneas; • Lesão articular prévia; • Menstruação e gravidez (gonocócica); Etiologia: 1. RN: S. aureus, S. agalactiae, Gram Negativos entéricos; 2. 1mês – 5 anos: Vacinadas anti-hemófilo (S. aureus). Não vacinados ( H. influenzae, S. aureus). Outros: S. pyogenes, Kingela kingae e S. pneumoniae; 3. > 5 anos: S. aureus, S. pyogenes. 4. Adolescentes e adultos jovens, sexualmente ativos: Neisseria gonorrhoeae e S. aureus. 5. Restante dos adultos: S. aureus. Outros: S. pyogenes. • • Situações especiais: Imunodeprimidos entéricos; e uso de drogas IV: G- Contiguidade a abscesso abdominal ou úlcera de decúbito infectada: Anaeróbios; • Próteses articulares: Staphylococcus epidermidis; • Doença falciforme: Salmonella, Pneumococo; • Mordedura humana: Eikenella corodens; • Mordedura animal: Pasteurella multocida; Quadro clínico: • Geralmente mais agudo que na osteomielite. • • • Acompanhado de sinais sistêmicos: febre, mal-estar, toxemia, astenia, inapetência e irritabilidade. RN: pode ser assintomático, associado à celulite e osteomielite; Criança maior: flogose, posição de conforto, recusa à mobilização ativa e passiva. • • Imunossuprimido: pode ser ausente de sinais. ARTRITE GONOCÓCICA Adultos jovens e sadios; Poliartralgia/poliartrite migratória comum no início; Tenossinovite na maioria; Hemocultura + monoarticular); em menos de 10% (fase Cultura do líquido articular sinovial + em 30% (fase monoarticular). Lesões cutâneas características (pústulas indolores em extremidades). ARTRITE NÃO GONOCÓCICA Mais frequente imunodeficientes; em crianças, idosos Monoartrite purulenta; Tenossinovite rara; Hemocultura + em mais de 50%; Cultura do líquido sinovial + em mais de 90%; Ausência de lesões cutâneas características; e Diagnóstico diferencial: • Neonato: fraturas, celulite e sífilis congênita; • • Trauma, sinovite transitória, osteomielite, artrite reativa, hemartrose, febre reumática, doença de Lyme, tumores, celulite, colagenoses. Adulto: lembrar das artropatias por cristais; Diagnóstico: Monoartrite = punção articular!! Bacterioscopia + cultura aeróbica + contagem diferencial de leucócitos + análise em microscópio de luz polarizada. • Hemocultura 50-100.000 leuco/mm³, predomínio aumento de Ptn e redução de glicose; • • Leucograma + VHS + PCR de PMN, Avaliação radiológica • Rx: Alterações tardias; • US; • RNM e TC; • Cintilografia; Tratamento Antibioticoterapia empírica: Duração – 3 sem; • • Terapia cirúrgica: Aspirações repetidas; Drenagem aberta – Artrite Séptica de quadril em crianças; evolução desfavorável e loculações no derrame intra-articular. RN : oxacilina + gentamicina/cefalosporina de terceira 1 mês – 5 anos : oxacilia + ceftriaxone >5 anos : oxacilina Risco de pneumococo : oxacilia + ceftriaxone Sugestivo de gonococo: cetriaxone Risco de genta/cipro Pseudomonas: ceftazidima + • • Prognóstico: Sequelas em 40% das Artrites Sépticas de quadril e 10% das de joelho; Osteomielite crônica, lesão da placa de crescimento, instabilidade, anquilose e perda da função articular. OSTEOMIELITE Conceito: Processo infeccioso do osso que evolui com destruição tecidual progressiva e formação de sequestros ósseos. Epidemiologia: ½ dos casos na faixa pediátrica em < 5 anos; Homens 2:1 mulher; Trauma fechado em 1/3; Fisiopatologia: • Hematogênica • Contiguidade • Inoculação direta - Inicio na metáfise; -Inflamação isquemia necrose; Sistema de estadiamento (Cierny e Mader) 1. 2. 3. 4. Classificação anatômica Infecção medular; Infecção superficial; Infecção localizada (abscesso); Infecção difusa; Classificação fisiológica A) hospedeiro normal; B) hospedeiro comprometido; - Local (Bi) - Sistêmico (Bs) - Local e sistêmico (Bis) C) Tratamento pior que a doença; FATORES QUE FAVORECEM A INECÇÃO Fatores locais (Bi) Fatores sistêmicos (Bs) • Linfedema crônico; • Desnutrição; • Obstrução de pequenos/grandes vasos; • Falência hepática/renal; • DM; • CA; • Deficiência imune; • Extremos de idade; • Hipoxemia; • • • • • Estase venosa; Excesso de tec. Cicatricial; Lesão actínica; Neuropatia periférica; Tabagismo; Classificação quanto ao tempo • Aguda < 2 sem • Subaguda 2-4 sem • Crônica > 4 sem Etiologia • S. Aureus – 61 a 89% Estrepto grupo A – 10% Haemophilus – diminui participação após vacina Outros: • • • • • • Salmonela, Pneumococo e Kingela D. Falciforme. Pseudomonas e Anaeróbios DM. Lesão puntiforme em planta do pé Pseudomonas S. aureus + Estrepto grupo B + G- entéricos RNs • • • • • • Osteomielite crônica Etiologia: S. epidermidis, Pseudomonas, Serratia e E.coli S. aureus, Presença de sequestro ósseo; Fístulas; Deformidades; Sinais locais de insuficiência vascular; Limitação local do movimento e das condições neurológias; Recidiva após atb; • • • Quadro clínico: RN: irritabilidade, recusa alimentar. Pode ser afebril !! Infecção prévia em 1/3 dos casos. Pode ter múltiplos sítios. Pré-escolar – adolescente: dor óssea, claudicação, pseudoparalisia. Presença de flogose. Na doença vasooclusão. falfiforme, confunde-se com Diagnóstico Diferencial: Celulite, artrite séptica, trauma, fraturas, leucemia, doença reumatológica, crise álgica. Diagnóstico: Laboratório -Leucograma, VHS e PCR; -Cultura com aspirado de material local (+em 70%); -Hemocultura (+ em 35-55%); Radiologia RX: Pouco sensível( evidencia lesões líticas apenas com perda maior de ½ de densidade óssea). Início: edema de partes moles; 7-10d: rarefação óssea iregular; 15-21d: levantamento do periósteo e alterações líticas; OBS.: Abscesso de Brodie Imagem lítica circundada por bordos escleróticos (coleção de pus em uma cápsula fibrótica). Cintilografia: Exame muito sensível, porém, caro e pouco específico. Aumento da captação já nas primeiras 48 horas de infecção. TC: Sensível e específica. Informações detalhadas sobre osso e tecidos moles adjacentes. RNM Método de escolha. Mais sensível e com alto VPN. Ideal para diagnóstico de osteomielite por contiguidade. Tratamento O tratamento empírico só deve começar após coleta de sangue e osso para cultura!! (exceto em casos de sepse ou infecção de partes moles concomitantes). Antibioticoterapia empírica; 6 sem (2/3 venosa) 6 -12 sem (crônica). • • Cirurgia; RN: Oxacilina ou Vancomicina (dependendo do risco de MRSA) + drogas com ação anti-pseudomonas e contra gran negativo (ceftazidima ou cefepime). Pode-se usar no lugar da cefalosporina um aminoglicosídeo( lembrar da menor atividade em Ph ácido). Criança maior e adulto Baixo risco de MRSA: Oxacilina ou Cefazolina Alto risco de MRSA: Vancomicina Pós-fixação de fratura exposta Vancomicina + droga contra G- e anti-pseudomonas (ex.: ceftazidime/cefepime). Associar Rifampicina se houver materiais exógenos de fixação interna. Cirurgia -Pus franco após aspiração de material; -Lesão penetrante com risco de corpo estranho; -Osteomielite crônica; -Sem resposta ao tto clínico. Obs.: em crianças, geralmente, o tto clínico é suficiente. Intervir quando da não resposta ao atb ou AS associada. Complicações: Sepse; Artrite séptica; Destruição da fise de crescimento; Osteomielite crônica; BIBLIOGRAFIA Longo DL, Fauci AS, Kasper DL, Hauser SL, Jameson JL, Loscalzo J: Harrison’s Principles of Internal Medicine, 18th edition. USA, McGraw-Hill, 2012. Mandell: Mandell, Douglas and Bennett’s Principles and Practice of Infectious Diseases, 7th edition, Philadelphia, Churchill Livingston, 2010. Shvarstman C., Reis AG, Farhat SCL, Pronto socorro, Pediatria, Instituto da Criança do Hospital das Clínicas, 2th edition, Manole. Nelson, tratado de pediatria, 18th edition. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. Ortopedia e Traumatologia: princípios e prática, Sizínio Hebert, 4th edition. Porto Alegre: Artmed, 2009. OBRIGADO!! Nota do Editor do site, Dr. Paulo R. Margotto Consultem também Osteomielite, artrite séptica e discite Cláudia Janaína Osteomielite e artrite séptica Débora Cristiny Gomes Osteomielite e artrite séptica Camila Vitória Osteomielite e artrite séptica Marcela Costa Manuseio da criança com artrite séptica aguda Markus Pääkkönen, Heikki Peltola. Apresentação: Bruno Oliveira Monografia HRAS/HMIB-2013: Artrite séptica-proposta de um protocolo clínico Naima Moura Hamidah Manuseio da criança Markus Pääkkönen, com artrite séptica Heikki Peltola. aguda Apresentação: Bruno Oliveira Infecções bacterianas Paulo R. Margotto, Martha Gonçalves Vieira, Marta David Rocha DURAÇÃO DO TRATAMENTO Osteomielite/ Artrite séptica - mínimo de 21 dias S. aureus – Oxacilina*/Vancomicina (MRSA). A oxacilina tem boa penetração articular. Agente desconhecido: oxacilina + cefotaxima A avaliação ortopédica mandatória, fazer controle do tratamento com VHS Monografia HRAS/HMIB2013: Artrite séptica-proposta de um protocolo clínico Naima Moura Hamidah Fluxograma Ddo Tiago Alves Martins