UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES
A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA
GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ
Biguaçu
2009
2
LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES
A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA
GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ
Monografia apresentada à Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito
parcial a obtenção do grau em Bacharel em
Direito.
Orientador: Prof. MSc. Helena Nastassya
Paschoal Pítsica
Biguaçu
2009
3
LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES
A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA
GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ
Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e
aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de
Ciências Sociais e Jurídicas.
Área de Concentração: Direito de Família
Biguaçu, 17 de junho de 2009.
Prof. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica
UNIVALI – Campus de Biguaçu
Orientador
Prof. MSc. Geyson José Gonçalves da Silva
UNIVALI – Campus de Biguaçu
Membro
Prof. MSc. Maria Letícia Iconomos Baixo
UNIVALI – Campus de Biguaçu
Membro
4
Dedico este trabalho aos meus pais, Adão e Osnira,
pelo amor e atenção e por terem oportunizado mais
um sonho.
Aos meus irmãos, Wilmar, Mª de Lourdes, Gilmar in
memóriam, Salete, Luiz Carlos in memóriam, pela
alegria e companhia em todos esses anos.
Ao meu esposo, pessoa iluminada, pelo amor e
paciência, em nossos momentos juntos.
À minha filha, anjo da minha vida, pelos momentos
de compreensão e pela ausência em determinadas
situações.
À minha sogra, por acreditar no meu potencial e pelo
auxílio para concluir este sonho.
5
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus, por conceder-me a vida e tudo que tem me
proporcionado.
Aos meus pais, pela dedicação na minha educação e formação, e por
estarem sempre ao meu lado dedicando amor e carinho.
Aos meus irmãos, por estarem presentes e sempre me apoiarem.
A professora Helena Nastassya Paschoal Pítsica, por dedicar atenção,
tempo e principalmente paciência nos momentos difíceis, e por sempre proporcionar
informações seguras e pertinentes ao tema.
Ao meu esposo e minha filha, pessoas estimadas e importantes em minha
vida, agradeço ao amor e atenção destinados a minha pessoa.
6
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade
pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Biguaçu, 17 de junho de 2009.
Lenir Rodrigues dos Santos Bernardes
7
RESUMO
O direito nacional sempre voltou-se para questões que envolvem a família. Nos dias
atuais, em especial, há uma notória preocupação com o interesse do menor. Desde
as bases conceituais e legais do poder familiar até a guarda e suas implicações,
tem-se como parâmetro maior o melhor interesse da criança e do adolescente. É
com esse filtro que se analisa e interpreta, frente a casos concretos, a possibilidade
de reversão da guarda à genitora em casos em que o menor é abandonado por
quem deveria lhes resguardar, auferindo-os todos os seus direitos fundamentais
assegurados por lei. A guarda representa uma convivência dos filhos com os pais,
dentro do mesmo lar. Não sendo possível essa permanência, o Estatuto da Criança
e do Adolescente estabelece princípios através dos quais à criança e o adolescente
são colocados em família substituta. O câmbio de perspectiva da proteção do direito
dos filhos, que se opera, é de tal ordem que a lei garante à criança a tutela do
Estado. No campo do planejamento familiar, o princípio do melhor interesse da
criança ganha destaque, diante da priorização dos seus interesses e direitos em
detrimento dos interesses de seus pais. No contexto do mundo contemporâneo, com
a inserção da mulher no mercado de trabalho, os avanços da engenharia genética,
os métodos contraceptivos e a ruptura da concepção patriarcal da família, foram
rompidos os paradigmas a que a família estava submissa. Diante dessa pluralidade
do conceito de família, emprestou-se juridicidade ao vínculo de afeto que enlaça as
pessoas, esse amálgama dos laços familiares é representado pela afetividade.
Destaque-se ao final que, desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do
poder família, onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a
possibilidade dessa guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o
pedido da possível reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em
detrimento dos interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o
adolescente e não menos importante de considerar o vínculo criado entre o menor e
seu guardião.
Palavra-chave: Poder Familiar; Guarda; Vínculo; Reversão.
8
ABSTRACT
The national law always turned to issues involving the family. Nowadays, in
particular, a remarkable concern for the interests of the child. Since the conceptual
and legal foundations of the family until the custody and its implications, it has as
parameter the greater the best interest of children and adolescents. It is this filter that
analyzes and interprets, face to concrete situations, the possibility of reversion of
custody to the mother in cases where the child is abandoned by those who should
protect them, earning them all their fundamental rights guaranteed by law. The guard
is one of the children living with parents in the same household. When is not possible
to stay the Statute of the Child and Adolescent down principles by which the children
and adolescents are placed in substitute families. The exchange of view of protecting
the rights of children, which operates, is such that the law guarantees the child the
authority of the state. In the field of family planning, the principle of best interests of
the child gained prominence in front of the prioritization of their rights and interests to
the detriment of the interests of their parents. In the context of the contemporary
world, with the inclusion of women in the labor market, advances in genetic
engineering, the breakdown of contraceptive methods and design of the patriarchal
family, the paradigms that the family was submissive have been broken. Since this
multiplicity of the concept of family, lent itself to the legal bond of affection that links
people, this amalgam of the family is represented by affection. Highlight to the end
that disappearing the reasons for the suspension of the home power, where the
parents had lost the custody of the child, there is the possibility that custody be
restored, so that the judge's request to examine possible reversal not stop give
priority to the interests of the child to the detriment of the interests of parents, if
possible to hear the child or adolescent and no less important to consider the bond
created between the minor and his guardian.
Keyword: Power Family; Guard; Vínculo; Reversal.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 01
1 PODER FAMILIAR ........................................................................................ 03
2
1.1
ASPECTOS GERAIS ...................................................................................................... 03
1.2
PODER FAMILIAR QUANTO À PESSOA E BENS DOS FILHOS ....................................... 09
1.3
SUSPENSÃO E DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR ..................................................... 15
1.4
PROCEDIMENTOS DE SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR .......... 16
DA GUARDA DOS FILHOS ....................................................................... 26
2.1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................... 26
2.2
GUARDA NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE LEI 8.069/90 ................... 30
2.3
GUARDA PREVIDENCIÁRIA .......................................................................................... 33
2.4
GUARDA NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL ............................................... 34
2.4.1
Guarda na separação judicial consensual ........................................................... 36
2.4.2
Guarda na separação litigiosa ............................................................................. 37
2.4.3
Guarda na dissolução de união estável ............................................................... 38
2.5
GUARDA COMPARTILHADA......................................................................................... 40
2.5.1
2.6
RESPONSABILIDADE JURÍDICA DO GUARDIÃO ............................................................ 45
2.6.1
2.7
Guarda compartilhada: esboço histórico e conceito .......................................... 40
Responsabilidade civil ......................................................................................... 46
PERDA/REVOGAÇÃO DA GUARDA .............................................................................. 48
3 A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA
NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ ....................................................... 51
3.1
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA ............................................................................. 51
3.2
VÍNCULOS COM AS FIGURAS MATERNA E PATERNA .................................................. 55
3.3
FAMÍLIA SUBSTITUTA .................................................................................................. 58
3.3.1
Critérios .............................................................................................................. 61
3.3.2
Responsabilidade ................................................................................................ 66
3.3.3
Vínculo sócio-afetivo ........................................................................................... 68
3.4
REVERSÃO DA GUARDA............................................................................................... 69
3.5
REVERSÃO DA GUARDA: POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL DO TJ/SC ................ 72
10
CONCLUSÃO................................................................................................... 78
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 82
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo analisar o poder familiar e a
responsabilidade dos pais dele decorrente, sob o olhar da Constituição da República
Federativa do Brasil, Código Civil de 1916, Código Civil de 2002 e Estatuto da
Criança e do Adolescente Lei 8.069/90.
Diz o dito popular: “Amor, só o de mãe”. Quem ainda não o ouviu como uma
verdade absoluta? É justamente esta ‘verdade’ que a prática profissional tem
demonstrado ser precária, haja vista o número crescente de pais requerendo a
guarda judicial dos filhos, questionando os cuidados maternos e até denunciando a
inadequabilidade da mãe para o exercício do poder familiar. O afeto ajuda no
desenvolvimento psíquico, é importante a criança sentir-se amada, ela fica mais
ativa, mais apoiada e feliz. Assim ela terá uma saúde psicosocial equilibrada.
A reunião da família em um lar é, efetivamente, o centro mais perfeito de
aprendizado dos filhos, tanto o pai quanto a mãe concorre para que se organize
convenientemente o desenvolvimento estrutural, psíquico, moral e ético do filho,
cabendo à mãe um papel que mais se relaciona com a flexibilidade, com o afeto e
com o conforto, enquanto ao pai cabe um papel que mais se relaciona com a fixação
do caráter e da personalidade.
Serão analisadas as hipóteses em que a genitora perderá a guarda do
menor, seja esta perda provisória definitiva ou permanente, decorrentes de
abandono, maus tratos ou por deixar de assegurar-lhe todos os seus direitos
constitucionais previstos na lei, inerentes ao seu sustento e bem estar. A
possibilidade de um retorno do menor ao convívio da família natural, priorizando
sempre o melhor interesse desse, em relação ao seus pais, conjuntamente com
analise comportamentais da família natural, bem como o vínculo constituído com a
família substituta.
O método utilizado na presente pesquisa foi o dedutivo, com a utilização das
técnicas de levantamento bibliográfico, legal e jurisprudencial.
Para tanto, a monografia terá como primeiro capítulo denominado “Poder
familiar” no qual será tratada a breve evolução histórica do poder familiar, que
conduz à atual conceituação do instituto como direito-dever dos pais em relação aos
2
filhos. O trabalho analisa os sujeitos do poder familiar, os procedimentos pelos quais
o referido poder pode ser modificado, suspenso ou extinto.
O segundo capítulo denominado, “Da guarda dos filhos”, abordará a guarda,
o seu histórico e a sua conceituação nas diferentes formas de ruptura da sociedade
conjugal. Bem como a responsabilidade jurídica do guardião, responsabilidade civil
dos pais pelos atos ilícitos cometidos pelos filhos menores e as medidas de
perda/revogação da guarda.
Por fim, o último capítulo como título “A possibilidade de reversão da guarda
em favor da genitora no caso de abandono de incapaz”, destinar-se-á a tratar da
possibilidade de reversão da guarda em favor da genitora no caso de abandono de
incapaz, observando sempre o superior interesse da criança ou adolescente, o
vinculo pré-existente com as figuras materna e paterna, as condições e o vínculo
criado com a família substituta, critérios utilizados para a modificação da guarda,
responsabilidade do guardião para com o menor a ele tutelado, vinculo sócio-afetivo
com os guardiões, a possibilidade jurídica da reversão da guarda, procedimentos e
posicionamento jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
em relação à possibilidade da reversão da guarda.
3
1 PODER FAMILIAR
Inicialmente neste capítulo abordar-se-á o poder familiar, sua evolução e
conceito, quanto à pessoa e bens dos filhos, suspensão e destituição,
procedimentos da perda, suspensão e extinção, sob a ótica da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB/88, Código Civil de 1916 e 2002 –
CC/16 – CC/02 e Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 8.069 de 1990.
1.1 ASPECTOS GERAIS
A denominação ‘poder familiar’ trata do instituto que, no Código Civil de
1916, vinha com o nome de ‘pátrio poder’, e encontrava-se no Capítulo VI, Título V,
do Livro I, da Parte Especial, e atualmente encontra-se no Capítulo V do Subtítulo II,
Título I do Livro IV da parte Especial do Código Civil de 2002.1
O direito Civil pátrio manteve, em alguns princípios do trazido pelo direito
romano acerca do que o poder familiar denominava-se patria potestas e visava tão
somente ao exclusivo interesse do chefe de família. Este tinha o jus vitae et necis,
ou seja, o direito sobre a vida e a morte do filho. Segundo Silvio Rodrigues, “é o
conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens
dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes”.2
Explica Washington de Barros Monteiro que nos primeiros tempos, os
poderes que se enfeixavam na autoridade do pai, tanto os de ordem pessoais como
os de ordem patrimonial, se caracterizavam pela sua larga extensão, define assim o
que é ordem pessoal e patrimonial respectivamente:
No terreno pessoal, o pai dispunha originariamente do enérgico jus
vitae et necis, o direito de expor o filho ou matá-lo, o de transferi-lo a
outrem in causa mancipi e o de entregá-lo como indenização noxae
deditio.
1
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 599
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 358
2
4
No terreno patrimonial, o filho, como o escravo, nada possuía de
próprio. Tudo quanto adquiria, adquiria para o pai, princípio que só
não era verdadeiro em relação às dívidas.3
Outrora, a estrutura autocrática da família, alicerçada no princípio da
autoridade, constitui a noção de pátrio poder em termos rígidos e severos. Não lhe
faltou à influência religiosa tendo-se em vista que o chefe de família – pater – era ao
mesmo tempo o sacerdote do culto doméstico.4
No direito germânico antigo explica Arnaldo Rizzardo, que embora
preponderasse o patriarcalismo, havia um abrandamento dos poderes do chefe,
tanto que os filhos, ao ingressarem no exército, libertavam-se do então ‘pátrio poder
paterno’. Com a Revolução Francesa e mais aprofundadamente com o Código
Napoleônico, adotou-se o direito costumeiro sobre a matéria, passando a
temporariedade do cargo do poder familiar, o seu exercício pela mãe na falta do pai
e a possibilidade de o filho ter bens.5
Para Silvio Rodrigues no direito romano o pátrio poder é representado por
um conjunto de prerrogativas conferidas ao pater, na qualidade de chefe da
organização familiar, e sobre a pessoa de seus filhos. Trata-se de um direito
absoluto a fim de consolidar a família romana, célula-base da sociedade, que dela
extrai-se o seu principal alicerce. O pater não é só o sacerdote do culto familial, e
sim uma autoridade onde se estabelece a disciplina e assim se consolida a vida
dentro do lar, daí ser conveniente assegurar essa ampla autoridade paternal.6
Gonçalves destaca que o instituto do poder familiar sempre esteve presente
na história da humanidade e vem sofrendo importantes modificações principalmente
no seu conteúdo. Conteúdo este que, diz-se, que, aos pais caberá o exercício do
poder familiar sobre a pessoa e os bens dos seus filhos menores. O Código Civil de
1916 – CC/16 atribuía ao marido à pátria potestas, que significava “pai de família”,
referindo-se no Direito Romano, a posição do homem no seio familiar, que era de
autoridade para com a sua família e seus escravos. Predominava, no regime por ele
instituído, o conceito de chefia da família.7
3
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 277
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito família. 16. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. p. 417
5
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 601
6
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. Direito de família. 28. ed. rev. e atual. Por Francisco José
Cahali; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 354
7
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 361
4
5
Silvio Rodrigues ensina que, só na falta ou impedimento do chefe da
sociedade conjugal passava o pátrio poder a ser exercido pela mulher. Entendiam os
intérpretes que, embora ambos os pais fossem titulares do direito, seu exercício não
era simultâneo, mas sucessivo, de modo que a mulher só era chamada a exercê-lo
na falta ou impedimento do varão. Assim sendo em caso de divergência entre os
cônjuges, prevalecia a opinião do marido, exceto em caso de manifestação de abuso
de direito.8
Para Josiane Veronese, o poder familiar nasce como instituto de direito
privado e evolui, adquirindo, com o passar dos tempos, características de um direito
com conotação social, pois embora regule relação de ordem privada, tem o Estado
como interventor e protetor dessas relações. Para o Estado Romano, marcado por
grandes conquistas, o filho era um cidadão romano e representava um possível
soldado ou político.9
Segundo o ensinamento de Gonçalves:
A igualdade completa no tocante à titularidade e exercício do poder
familiar pelos cônjuges só se concretizou com o advento da
Constituição Federal de 1988, cujo art. 226§ 5º, dispôs: “Os direitos e
deveres referente à sociedade conjugal são exercidos igualmente
pelo homem e pela mulher”. Em harmonia com o aludido
mandamento, estabeleceu o Estatuto da Criança e do Adolescente,
no art. 21: “O pátrio poder deve ser exercido, em igualdade de
condições, pelo pai e pela mãe, na forma que dispuser a legislação
civil, assegurando a qualquer deles o direito de, em caso de
discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a
solução da divergência”.10
Conforme o entendimento de Caio Mário da Silva Pereira:
A idéia predominante é a potestas deixou de ser uma prerrogativa do
pai, para se firmar como a fixação jurídica dos interesses do filho.
Não se visa beneficiar quem o exerce, mas proteger o menor. E tal
preponderância do interesse do filho sobre os direitos do pai
aconselha a mudar a designação de pátrio poder para pátrio dever.
Por outro lado, não mais predomina a sua atribuição ao marido. Ao
revés, é confiado aos pais, como expressão de igualdade jurídica dos
cônjuges.11
8
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. Direito de família. 28. ed. rev. e atual. Por Francisco José
Cahali; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo. Saraiva, 2004. p. 356
9
VERONESE, Josiane Rose Petry. Poder familiar e tutela: à luz do novo código civil e do
estatuto da criança e do adolescente. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p. 19
10
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 361
11
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito Civil: direito de família. 15 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p. 240
6
Portanto, este poder visa o cumprimento das obrigações pelos pais,
protegendo, assim, o filho. O pátrio poder perde assim, a inspiração do direito
romano, conferindo aos pais muito mais deveres do que direito sobre o filho.12
Sintetiza ainda Washington de Barros Monteiro que:
O pátrio poder é encarado como complexo de deveres, ou melhor,
como direito concedido aos pais para cumprirem um dever. Deixou
de ser assim direito estabelecido em favor dos genitores e no
interesse de quem o exerce, para transformar-se num simples dever
de proteção e direção, um meio que tem o pai para satisfazer seus
deveres. Por outras palavras, o pátrio poder é instituído no interesse
dos filhos e da família, não em proveito dos genitores.13
Preleciona Gonçalves:
[...] os filhos adquirem direitos e bens, sem ser por via de sucessão
dos pais. Há, pois, que defender e administrar esses direitos e bens;
e para este fim, representá-los em juízo ou fora dele. Por isso, aos
pais foi concedida ou atribuída uma função semi-pública, designada
por poder paternal ou pátrio poder, que principia desde o nascimento
do primeiro filho, e se traduz por uma série de direitos-deveres, isto
é, direitos em face de terceiros e que são, em face dos filhos,
deveres legais e morais.14
No regime do CC/16, em que predominava o conceito de “chefia da família”,
atribuído ao marido, à pátria potestas era conferida a este. O CC/02 seguindo os
princípios constitucionais se desvencilhou daquela idéia, e agora o poder familiar é
exercido
pelos
pais
conjuntamente.
Entre
um
e
outro
são
distribuídas,
harmonicamente, as atribuições concernentes à guarda, educação, orientação,
assistência aos filhos, bem como a administração de seus bens.15
Maria Helena Diniz ensina que, o poder familiar está englobado entre direitos
e obrigações, conferidos aos pais, na mesma igualdade, em relação à pessoa e os
bens do filho menor que não seja emancipado, para juntos propiciar a este a
proteção estabelecida em lei.16
Completa Sílvio Rodrigues em relação ao poder familiar:
12
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito Civil: direito de família. 15 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p. 240
13
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 278
14
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 359
15
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito. 21 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.
432
16
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 447
7
[...] é um instituto de caráter eminentemente protetivo em que, a par
de uns poucos direitos, se encontram sérios e pesados deveres a
cargo de seu titular. [...] É de interesse do Estado assegurar a
proteção das gerações novas, pois elas constituem matéria-prima da
sociedade futura.17
Neste mesmo sentido define Washington de Barros Monteiro:
Ambos os pais têm o pátrio poder sobre o filho menor. Não se pense
que o exercício do pátrio poder pelo pai exclui a mãe desse direito. O
pátrio poder cabe em comum aos dois genitores, a ambos deve o
filho obediência e respeito. Debaixo do seu manto protetor, colocamse todos os filhos menores, sem exceção, seja qual for a sua
categoria: legítimos, legitimados, legalmente reconhecidos e
adotivos. Assim dispõe o artigo 379 do CC/16.18
Hodiernamente, graças à influência do Cristianismo, o poder familiar
constitui um conjunto de deveres, transformando-se em instituto de caráter
eminentemente protetivo, transcendendo a órbita do direito privado para ingressar
no âmbito do direito público. Sob está ótica, o poder é limitado, os pais não tem mais
a soberania absoluta sobre o filho, sendo que se os pais ou os responsáveis legais
extrapolarem seus direitos, poderá ser punido, podendo em alguns casos, o filho ser
retirado dos pais. Havendo abuso, ocorre a intervenção do Estado juntamente com o
Ministério Público, que irá proceder à fiscalização.19
Desapareceu assim o caráter de poder ou disposição que imperava
primitivamente, vige o princípio de um múnus ou encargo na vida ou nos bens dos
filhos, como deixa entrever San Tiago Dantas:
[...] pode-se dizer que trazer o conceito de dever paternal para o
primeiro plano e deixar o direito, num segundo, foi uma das
transformações a que o cristianismo submeteu a humanidade.
Depois de realizar-se esta transformação, o conceito que se possui
do pátrio poder é outro; não o julga mais um auctoritas, mas um
múnus, encargo, dever, função; é esse o modo pelo qual a
consciência moderna conceitua o pátrio poder. Nesta ordem de
colocação do instituto, pode-se ir além e dizer que se trata de uma
conduta dos pais relativamente aos filhos, de um acompanhamento
para conseguir a abertura dos mesmos, que se processará
progressivamente, à medida que evoluem na idade e no
desenvolvimento físico e mental, de modo a dirigi-los a alcançarem
sua própria capacidade para se dirigirem e administrarem seus bens.
Não haveria tão-somente um encargo, ou um múnus, mas um
encaminhamento, com poder para impor um certa conduta, em
17
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. v. 6. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 448
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 279
19
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 359
18
8
especial entes da capacidade relativa. Não mais há de se falar
praticamente em poder dos pais, mas em conduta de proteção, de
orientação e acompanhamento dos pais.20
Segundo os ensinamentos de Bittar, o poder familiar é inalienável,
imprescritível e irrenunciável. Inalienável porque os pais não podem transferir o
poder familiar a outrem, a título gratuito ou oneroso, com a única exceção de
incumbência do poder familiar, desejada pelos pais ou responsável, para prevenir o
menor de qualquer situação irregular. Imprescritível porque mesmo o poder familiar
não sendo exercido, ele não decai, somente nos casos permitidos por lei. E
irrenunciável, porque os pais não podem renunciar ao poder familiar, visto que este
não é um favor que eles irão prestar ao filho, e sim, um direito que eles possuem
para beneficiar sua prole, sendo nulo o acordo de renúncia ou de promessa de
renúncia. Mas os respectivos atributos podem ser confiados à outra pessoa, em
casos expressamente contemplados na lei, como na adoção e na suspensão do
poder dos pais.21
Deste norte, pode-se dizer que os pais têm deveres em relação aos filhos, e
que,
para
tanto,
o Estado
lhes outorga
direitos
que
lhes
permitem
a
operacionalização de suas obrigações. Este poder é concedido pelo Estado, e por
ele fiscalizado. Tanto o é, que, em casos de abuso destas prerrogativas, o Estado
pode e deve interferir, suspendendo, ou mesmo retirando, o poder familiar dos
transgressores.22
Leciona Gonçalves que, os pais são os defensores legais e os protetores
naturais dos filhos, os titulares e depositários dessa específica autoridade, delegada
pela Sociedade e pelo Estado. Não é um poder discricionário, pois o Estado reservase o controle sobre ele:
O ente humano necessita, “durante sua infância, de quem o crie e
eduque, ampare e defenda, guarde e cuide dos seus interesses, em
suma, tenha a regência de sua pessoa e seus bens. As pessoas
naturalmente indicadas para o exercício dessa missão são os pais. A
eles confere a lei, em princípio, esse ministério”, organizando-o no
instituto do poder familiar.23
20
DANTAS, San Tiago. apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
p. 602
21
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 223
22
VERONESE, Josiane Rose Petry. Poder familiar e tutela: à luz do novo código civil e do
estatuto da criança e do adolescente. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p. 19
23
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 358
9
1.2 PODER FAMILIAR QUANTO À PESSOA E BENS DOS FILHOS
De
forma
concisa,
resulta,
pois,
o
poder
familiar
em
constituir
responsabilidade comum dos genitores, o dever de prestar aos filhos, enquanto
civilmente menores, o necessário ao seu sustento, proporcionar-lhes, alimentação,
vestuário, educação, moradia, lazer, assistência à saúde, medicamentos, etc. Pois
compete aos pais tornar seus filhos úteis à sociedade. A atitude dos pais é
fundamental para uma boa formação da criança, visto que, faltando-se com esse
dever, o progenitor faltoso submete-se a reprimendas de ordem civil e criminal,
respondendo pelos crimes de abandono material, moral e intelectual.24
Sendo um conjunto de direitos e deveres, estatui a vigente CRFB/88, em seu
artigo 227:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito a vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, a
dignidade ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e
comunitária, ale de colocá-los a salvo de todo forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.25
Deste mesmo norte dispõe o artigo 229 da referida lei, que: “os pais têm o
dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e filhos maiores têm o devem de
ajudar e amparar os pais na velhice, na carência ou na enfermidade”,
estabelecendo, assim, de forma recíproca, o dever de sustento dos pais em relação
aos filhos, e destes em relação aos pais.26
Desta forma verifica-se que o poder familiar consiste num conjunto de
direitos e deveres dos pais em relação aos filhos menores e a seus bens, com
finalidade de protegê-los enquanto durar a menoridade, cessando-se com o
implemento da idade ou a emancipação.27
A situação normal da família no direito brasileiro seja por enlace matrimonial
ou por união estável, sendo ambos plenamente capazes, admite que o poder familiar
seja amplamente exercido por ambos os pais, havendo qualquer divergência entre
24
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 374
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95
26
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 96
27
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro. Forense Universitária. 2006. p. 222
25
10
estes, poderá qualquer deles recorrer à jurisdição para requerer a solução da lide,
evitando que a decisão seja implacável.28
Ensina Bittar:
Com relação à pessoa dos filhos menores, compete aos pais: dirigirlhes a criação e a educação; tê-los em sua companhia e guarda;
conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casamento;
nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o
outro genitor não lhe sobreviver, ou não puder exercer o poder
familiar; representá-los, nos atos da vida civil, até os 16 anos, e
assisti-los após essa idade, suprido-lhes o consentimento; reclamálos de quem os detenha; exigir obediência, respeito e os serviços
próprios de sua idade e condição (art. 1.634 do CC/02). Os pais
devem, pois, cuidar dos filhos, e exercer a representação legal da
prole em negócio de seu interesse, cabendo-lhes dirigir,
espiritualmente e materialmente, a vida deles, fazendo-os úteis para
a sociedade, por meio de orientação segura sob os aspectos, físico,
moral, intelectual e social.29
Disciplina o CC/02 em seu artigo 1631 que:
Durante o casamento ou união estável, compete o poder familiar aos
pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá com
exclusividade. Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao
exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer
ao juiz para solução do desacordo.30
Para Gonçalves, o poder familiar não está necessariamente vinculado ao
casamento e na união estável, enquanto não houver previsão legislativa, não vigora
a presunção pater is est, dependendo a filiação jurídica do reconhecimento feito pelo
genitor. O poder familiar decorre do reconhecimento dos filhos por seus genitores,
independentemente do seu nascimento. Na realidade, independentemente do
vínculo entre os pais, desfeito ou jamais ocorrido, ambos os genitores exercem em
conjunto o poder familiar.31
O CC/02 em seu artigo 1.634 enumera os direitos e deveres que incumbem
aos pais, no tocante à pessoa dos filhos menores e está em sintonia com os
princípios jurídicos modernos que regem o atual Direito de família: o princípio da
dignidade da pessoa humana, existindo a garantia de pleno desenvolvimento dos
membros da comunidade familiar e o princípio da igualdade entre homem e mulher
28
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 362
29
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 224
30
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. 4. ed. São Paulo. 2007. p. 279
31
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 361
11
em que o poder-dever de dirigir a família é exercido conjuntamente por ambos os
genitores, desaparecendo o poder marital e paterno.32
Porém, existem situações anormais ou extraordinárias, em que o poder
familiar poderá ser exercido de forma diversa a tratada no artigo citado. Maria
Helena Diniz utiliza o termo “situações anormais”, e seguem as três hipóteses por
ela citadas:
1) Na família matrimonial quando: a – os cônjuges tiverem vivos e
bem casados, o poder será exercido só pela mãe se o pai estiver
impedido de exercê-lo por ter sido suspenso, destituído ou por não
poder, devido à força maior ou manifestar sua vontade; b – os
consortes estivem separados judicialmente ou divorciados, ou os
conviventes tiverem rompido a união estável, pois embora a
dissolução da sociedade conjugal não altere as relações entre pais e
filhos, o exercício do poder familiar pode ser alterado pela atribuição
do direito a guarda a um deles, ficando o outro com direito de visitar
a prole (CC, art. 1632); c – o vínculo conjugal se dissolve pela morte
de um dos cônjuges, caso em que o poder familiar será exercido
unicamente pelo consorte sobrevivente, ainda que venha contrair
novas núpcias ou formar união estável (CC, art. 1636).
2) Na família não matrimonial quando: a – o filho for reconhecido
pelos dois genitores, simultânea ou sucessivamente, estabelecendo,
assim, o parentesco. O filho ficará sujeito ao exercício do poder
familiar de um deles, se não viverem em união estável, terá o outro o
direito de visita, a não ser que haja decisão contrária por parte do juiz
a fim de preservar qualquer direito do menor; b – o filho ser
reconhecido por apenas um dos pais, sujeitar-se-á ao poder familiar
de quem o reconheceu.
3) Na família civil quando: a – o filho adotivo for adotado pelo casal,
ambos serão responsáveis pelo exercício do poder familiar; b – o
menor ser adotado apenas por um dos cônjuges, caberá
exclusivamente ao consorte que o adotou legitimamente, a
competência do poder familiar.33
Existe ainda a hipótese da guarda compartilhada, considerada uma espécie
de custódia em que os filhos têm uma residência principal, mas os pais têm
responsabilidade conjunta na tomada de decisões e igual responsabilidade sobre
eles. Nesse sistema de guarda, o poder deve ser exercido por ambos, ficando a
critério dos genitores planejarem a convivência em suas rotinas diárias.34
Com base nos ensinamentos de Maria Helena Diniz, pode-se examinar que
a titularidade do poder familiar no direito brasileiro, em hipótese padrão, cabe à
32
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 361
33
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 517
34
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 366
12
família na qual, ambos os consortes estão vivos, unidos pelo enlace matrimonial ou
pela união estável, e plenamente capazes; podendo haver também situações
patológicas que tratam de famílias matrimoniais distintas, não matrimoniais e civis.35
Dentro da esfera patrimonial o primeiro dever imposto aos pais no exercício
do poder familiar, é o de administrar os bens dos filhos, e assim estabelece o artigo
1689, incisos I e II do CC/02:
1) O usufruto sobre os bens dos filhos menores que se acham sob o
seu poder (CC/02, artigo 1.689, I). O usufruto é inerente ao exercício
do poder familiar, cessando com a exibição do poder paternal ou
maternal, maioridade, emancipação ou morte do filho. [...] constitui
razão de imposição legal, dependendo de registro se recair sobre
imóvel (CC/02, artigo 1.391), sendo um direito irrenunciável.
2) A administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade
ou não emancipados (CC/02, artigo 1.689, II), ou seja, a prática de
atos idôneos à conservação e incremento desse patrimônio, podendo
celebrar contratos, [...], pagar impostos, defender judicialmente,
receber juros ou rendas, adquirir bens, aliená-los, se móveis.36
No entanto os pais não podem alienar, hipotecar ou gravar de ônus real os
imóveis dos filhos menores, nem contrair obrigações em nome deles que
ultrapassem os valores da simples administração, exceto por necessidade ou
evidente interesse da prole, havendo a necessidade de prévia autorização judicial
(CC, art. 1.691), pelo fato de que esses atos importam em diminuição patrimonial.37
Contudo percebe-se que criar um filho é muito mais que tê-lo em sua
companhia. Significa não só dar-lhe o sustendo, como também assistência médica,
escolaridade, carinho e proteção e ainda, administrar seus bens, não tendo o poder
de disposição, salvo autorização judicial, devendo prestar contas de sua gerência
quando o filho for emancipado ou atingir a maioridade. E por essa administração os
genitores que exercem o poder familiar não têm qualquer direito à remuneração.38
Conforme dispõe o CC/02, artigo 1.692; e Lei nº 8.069/90, artigo 142,
parágrafo único, e 148, parágrafo único, “f”, sempre que, no exercício do poder
familiar, colidir os interesses do progenitor com o do filho menor, este deverá ser
representado ou assistido por curador especial, a requerimento do filho ou do
35
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 518
36
RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 364
37
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 523
38
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 21 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
p. 432
13
Ministério Público, para fiscalizar a solução do conflito, zelando sempre pelos
interesses do menor. Trata-se, portanto, de medida preventiva, como diz Carlos
Santos, “fundada no justo receio de que os pais, cujos interesses colidem com os do
filho, possam causar-lhe dano, por serem suspeitos para tomar qualquer decisão
sobre negócios relativos ao filho”.39
Caso o progenitor demonstrar necessidade ou utilidade para alienar ou
hipotecar algum imóvel do filho menor, ao ser concedido à autorização judicial, é de
responsabilidade do juiz a nomeação do curador. Washington de Barros Monteiro
lembra que é necessária a nomeação de curador:
a) para receber em nome do menor doação que lhe vai fazer o pai; b)
para concordar com a venda que o genitor efetuará a outro
descendente; c) para intervir na permuta entre o filho menor e os
pais; d) para levantamento da inalienabilidade que pesa sobre o bem
de família.40
Enfatiza Silvio Rodrigues:
[...] é verdade que aos pais incumbem as despesas com a criação
dos filhos quando estes não as possam atender, justo é também que,
tendo os filhos bens para criarem-se e educarem-se, usem as rendas
dos mesmos bens para esse fim.41
Na administração legal, não há necessidade de caução ou garantia, visto
que ninguém melhor que os pais para zelarem pela preservação do patrimônio que
administram em nome dos filhos.42
Para Silvio Rodrigues, dispondo a lei que o usufruto dos bens dos filhos é
inerente ao exercício do poder familiar, aos pais pertencem às rendas produzidas
pelo patrimônio dos filhos. Assim, a sua administração dispensa a prestação de
contas relativamente aos rendimentos produzidos, porque o administrador, por
mandamento legal, faz seus, desde logo, esses rendimentos.43
Sobre o usufruto, Venosa diz ser ele inerente ao poder familiar e procura
justificar este instituto sob duas faces:
39
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 524
40
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 377 e 378
41
RODRIGUES, Silvio apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de
família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 370
42
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378
43
RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 364
14
[...] esse usufruto compensaria o pai pelos encargos do múnus do
poder familiar e, sob o prisma de entidade familiar, entendemos que
todos os seus membros devem compartilhar dos bens. A estrutura
desse usufruto aproxima-se do direito real de usufruto, disciplinado
no direito das coisas, mas, como na maioria dos institutos de direito
de família, tem compreensão própria. Desse modo, difere do usufruto
de direito real porque não deriva de negócio jurídico, mas da lei; não
necessita de inscrição imobiliária; abrange todos os bens dos filhos
menores, salvo exceções previstas no Código; é irrenunciável e
intransferível. Assim, os frutos e rendimentos produzidos pelos bens
dos filhos menores pertencem aos pais que exercerem a
administração, podendo consumi-los, sem necessidade de prestação
de contas.44
O direito de usufruto, em regra, está associado ao de administração, embora
seja possível existir um sem o outro. Há também bens excluídos tanto do usufruto
como da administração paternal ou maternal, neste caso, o juiz nomeará um curador
especial para a regência desses bens excluídos que são:
a) os bens adquiridos pelo filho havido fora do matrimônio, antes do
reconhecimento, para evitar que o pai ou a mãe o reconheça com o
único propósito de se beneficiar com a administração e usufruto de
seus bens;
b) os valores auferidos pelo filho maior de 16 anos, no exercício de
atividade profissional e os bens adquiridos com tais recursos;
c) os deixados ou doados ao filho, sob a condição de não serem
usufruídos ou administrados pelos pais, como é o caso de pais
separados que testam bens aos filhos, com cláusula de que não
serão administrados pelo genitor sobrevivente (CC/02, artigo 1.848; e
d) os bens que ao filho couberem na herança, quando os pais forem
excluídos da sucessão, pois se o indigno, ou o deserdado, pudesse
administrar ou usufruir os bens havidos por seu filho, em sucessão
de que foi excluído, a pena a ele imposta não teria sentido, perderia
sua eficácia parcialmente.45
Ainda leciona Venosa que “uma vez alcançada a maioridade, os bens são
entregues aos filhos, com seus acréscimos, sem que os pais tenham direito a
qualquer remuneração”.46
O poder familiar não é invariável. Esse poder está sujeito à perda,
suspensão e extinção, dependendo de variáveis expressas em lei.
44
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 525
46
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378
45
15
1.3 SUSPENSÃO E DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR
Em princípio, o poder familiar deveria perdurar por todo o tempo de
menoridade dos filhos, ininterruptamente, pois este é um múnus que deve ser
exercido fundamentalmente no interesse do filho menor, o Estado pode interferir
nessa relação, que, em síntese, afeta a célula familiar. Mas pode-se afirmar que
existem situações em que essa duração pode ser antecipada, cabendo o propósito
de distinguir a sua cessação por meio natural, e a suspensão ou extinção do poder
familiar, por ato jurisdicional.47
Bittar ensina que:
Várias vicissitudes podem afetar o poder familiar, acarretando os
fenômenos da suspensão e destituição, [...] respectiva. Suspensão é
a cessação temporária do exercício do poder, por ordem judicial, em
processo próprio, e sob causa definida em lei. Destituição é o
afastamento definitivo do genitor do poder, em virtude de motivo
previsto, por expresso, em lei. [...]. Verifica-se, pois, que pode haver
privação do direito e do exercício do direito, e em caráter temporário
ou definitivo, conforme as circunstâncias, interrompendo-se, assim,
os direitos e deveres respectivos. Por fatos voluntários ou naturais
podem, ademais, advir às privações mencionadas.48
O poder familiar não tem duração vitalícia, sendo extinto quando o filho
alcançar a maioridade ou se este se emancipar, ou ainda pela adoção, pois os
direitos e deveres relativos ao poder familiar são transferidos para o pai adotivo,
assim, extinguindo o poder familiar do pai consangüíneo. O menor vira órfão com o
falecimento do pai adotivo, pois o poder familiar não se restabelece ao pai de
sangue.49
A morte de um dos pais não faz cessar o poder familiar do cônjuge
sobrevivente. A morte de um deles importa na subsistência do poder familiar na
pessoa do outro. Por outro lado, a morte de ambos os pais, o extingui.50
Nos casos em que ocorrer a morte de ambos os pais haverá a necessidade
de nomeação de tutor, para que se possa dar seqüência à proteção dos interesses
pessoais e patrimoniais do órfão. E, dispõe ainda Gonçalves que com, “a morte do
47
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 379
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 227
49
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo, Saraiva, 2006. p. 1339
50
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 380
48
16
filho, a emancipação e a maioridade fazem desaparecer razão de ser do instituto,
que é a proteção do menor”.51
Ao ser estabelecida nova união estável ou novo casamento, não haverá
perda do poder familiar, em relação ao filho menor do antigo casamento (CC/02, art.
1636), havendo ainda, a administração e usufruto dos bens do filho, juntamente com
os encargos relativos à criação e educação.52
O novo companheiro ou cônjuge não poderá interferir na educação, criação
e bens do filho menor, uma vez que este não é seu filho e não possui direito de
exercer o poder familiar (CC/02, art. 1636).53
1.4 PROCEDIMENTOS DE SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER
FAMILIAR
Além dos deveres inerentes aos pais expressos na CRFB/88, em seu artigo
227, também se encontram previstos no CC/02 e especialmente no Estatuto da
Criança e do Adolescente no artigo 7º, que respectivamente dispõe-se:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão. 54
Art. 7 – A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à
saúde, mediante a efetivação de políticas sociais e públicas que
permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em
condições dignas de existência.55
E caso o juiz depois de ouvido as partes interessadas, poderá decretar a
suspensão do poder familiar, liminarmente, e até o julgamento definitivo da causa,
fica a criança ou o adolescente confiado à pessoa idônea, mediante termo de
51
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 373
52
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1339
53
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1339
54
CRFB/88 p. 95
55
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 13
17
responsabilidade. Após findada a lide, quando procedente a sentença será averbada
à margem do registro de nascimento da prole.56
E tem também sua previsão legal no artigo 1637 do CC/02, a saber:
Art. 1637 – Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando
aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe
ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a
medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus
haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder
familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em
virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.57
O artigo supra citado afirma ainda que, os pais podem ser suspensos do
poder familiar, no caso de agirem com abusos, faltarem com os deveres inerentes
ou arruinarem os bens dos filhos. Podem também ser suspensos do poder familiar o
pai ou a mãe, desde que sejam condenados por crime cuja pena exceda dois anos
de prisão. Cada caso deverá ser analisado em separado, pois até mesmo uma
condenação por tempo menor que este estabelecido pode provocar a suspensão ou
até mesmo a perda do poder familiar dependendo da gravidade do fato ocorrido com
relação ao filho.58
Explana Maria Helena Diniz:
A suspensão do poder familiar é uma sanção [...] que visa preservar
os interesses do filho menor, privando o genitor, temporariamente, do
seu exercício, por prejudicar um dos filhos ou alguns deles [...]. Nada
obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder
familiar, uma vez desaparecida a causa que originou sua
suspensão.59
A suspensão do poder familiar se dá por má conduta dos pais ou por fato
involuntário destes e somente ocorrerá por decreto judicial, sendo necessário à
propositura de uma ação competente junto ao Ministério Público.60
Os procedimentos para a perda ou suspensão do poder familiar estão
disciplinados no artigo 155 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que assim o
descreve:
56
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 381
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1340
58
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo. Atlas. 2004. p. 381
59
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1340
60
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1341
57
18
Art. 155 – O procedimento para a perda ou suspensão do pátrio
poder terá início por provocação do Ministério Público ou de quem
tenha legítimo interesse.61
Quando noticiado o comportamento ruinoso dos pais aos haveres de seus
filhos, não se deve esperar a perda para impor a medida de suspensão do poder
familiar. O que predomina é a idéia de proteção aos interesses do menor. Portanto,
deve-se aplicá-la imediatamente, principalmente nos casos em que a demora pode
tornar a medida infrutífera. A imposição da pena de suspensão do poder familiar é
deixado ao juiz, que tem a liberdade de aplicá-lo ou não. A lei não estipula por
quanto tempo deve ocorrer a suspensão do poder familiar. O juiz pode, também, a
seu critério, revogar a medida, se assim achar conveniente.62
O poder familiar pode ser perdido pelas causas descritas nos seguintes
artigos destacados do Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente
respectivamente:
Art. 1638 – perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe
que: I – castigar imoderadamente o filho; II – deixar o filho em
abandono; III – praticar atos à moral e aos bons costumes; IV –
incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. 63
Art. 24 – A perda e suspensão do pátrio poder serão decretadas
judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na
legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento
injustificados dos deveres e obrigações a que alude o art. 22, ou
seja, “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos
filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação
de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. 64
Com referência ao inciso II do artigo 1638 do CC/02, a CRFB/88 em seu
artigo 227 mencionado doravante, prevê que toda criança e adolescente deve ter
direito à convivência familiar e comunitária, portanto, quando se trata de ‘infante
exposto’, termo este que deve ser interpretado como ‘criança abandonada’, é
dispensado o consentimento dos pais, embora seja necessário o processo de
destituição do poder familiar.65
61
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 260
62
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo. Atlas. 2004. p. 380
63
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. São Paulo: Rideel, 2007. p. 280
64
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8 ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 32
65
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 530
19
A perda e a suspensão do poder familiar referida no artigo 24 do Estatuto da
Criança e do Adolescente onde faz menção ao artigo 22 da mesma lei, se reporta ao
descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos
filhos.66
Pode se dizer que essa lei deixa claro que sua filosofia é a manutenção da
criança ou adolescente na sua família de origem, da qual somente devem ser
afastados havendo motivos ponderáveis.67
A lei pune o exagero. Castigar um filho, sem excesso, é lícito. Corrigir erros
de conduta é lícito, sendo vedado o abuso. As circunstâncias devem ser analisadas
pelo juiz, o qual pode aplicar a pena de perda do poder familiar se tal convier aos
interesses do filho, pois a prática reiterada de atos vergonhosos ou reprováveis
citado no inciso IV do artigo supra citado, possibilita ao juiz um elastério maior para
poder aplicar a reprimenda mais gravosa do que a do artigo 1.637 do CC/02, devido
ao mau comportamento dos genitores em relação à prole.68
Segundo os ensinamentos de Gonçalves:
A perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que
seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento
judicial, de caráter contencioso, desde que comprovem a cessação
das causas que a determinaram. É imperativa, e não facultativa.
Abrange toda a prole, por representar um reconhecimento judicial de
que o titular do poder familiar não está capacitado para o seu
exercício.69
Cáio Mario destaca que a falta de assistência à criança e ao jovem de quem
se tenha a guarda e a responsabilidade em decorrência de representação legal ou
judicial, pode ser identificada como crime.70
Podendo ser citados como exemplo os seguintes artigos todos do Código
Penal Brasileiro:
Art. 133 – Abandono de incapaz – Abandonar pessoa que está sob
seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo,
66
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 32
67
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 379
68
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 529
69
GONÇALVES, Carlos Roberto. direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 380
70
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito família. 14. ed. v. 5. Rio de
Janeiro: Forense, 2004. p. 234
20
incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena –
detenção, de seis meses a três anos. [...]
Art. 134 – Exposição ou abandono de recém-nascido – Expor ou
abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena –
detenção, de seis meses a dois anos. [...]
Art. 244 - Abandono material - Deixar, sem justa causa, de prover a
subsistência do cônjuge, ou de filho menor de dezoito anos ou inapto
para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de sessenta
anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando
ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada
ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou
ascendente, gravemente enfermo: pena – detenção, de um a quatro
anos, e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no
País. [...]
Art. 245 - abandono intelectual – Entregar filho menor de dezoito
anos a pessoa em cuja companhia saiba ou deva saber que o menor
fica moral ou materialmente em perigo: pena – detenção, de um a
dois anos. [...]
Art. 247 - abandono moral – Permitir que alguém menor de dezoito
anos, sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou vigilância: I –
freqüente casa de jogo ou mal-afamada, ou conviva com pessoa
viciosa ou de má vida; II – freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo
ou de ofender-lhe o pudor, ou participe de representação de igual
natureza; IV – mendigue ou sirva para excitar a comiseração pública:
Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.71
A perda do poder familiar pode atingir um ou ambos os pais. Cada caso
deve ser analisado em separado pelo Magistrado. Fatos como, por exemplo,
entregar a filha à prostituição ou o filho à delinqüência, injúrias graves, abandono,
dever ser avaliados pelo juiz.72
Uma vez ingressada uma ação de perda e de suspensão do pátrio poder, o
pai ou a mãe evolvido têm o amplo direito à defesa, devendo ser nomeado um
defensor dativo para defendê-los, caso não possam fazer às suas expensas. E é de
suma importância ressaltar que conforme prevê o artigo 23 do Estatuto da Criança e
do Adolescente, a falta ou a carência de recursos matérias não constituem motivos
suficientes para a perda ou suspensão de poder familiar, pois sendo essa a
situação, cabe ao Estado suprir as condições mínimas de sobrevivência, incluindo a
família em programas oficiais de auxílio.73
Essa regra visa à proteção dos pais pobres, porém diligentes no cuidado
com o filho. Procura amparar aqueles que lutam com dificuldades, muitas vezes
extremas, mas que não desistem dos filhos. Esse dispositivo tutela o interesse das
71
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Penal. São Paulo: Rideel, 2007. p. 449 e 459
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 378
73
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 227
72
21
pessoas pobres, mas que não se acomodam, não se omitem nas tentativas de
propiciar aos filhos uma vida digna. A condição de miserabilidade, por si só, não
pode privar os pais de exercerem o poder familiar com relação a seus filhos.74
Com relação às medidas descritas sobre suspensão, perda ou extinção, a
suspensão do poder familiar é a menos grave, pois uma vez extinta a causa que
gerou essa suspensão, o mesmo pode ser restabelecido. Por outro lado, a perda ou
a extinção do poder familiar é a mais grave sanção imposta aos pais que não
cumprem os deveres com relação a seus filhos.75
Nessa relação entre filhos e pais, os limites de convivência e da educação,
entre outras, estão fixadas na CRFB/88, no CC/02, no Código Penal e no Estatuto
da Criança e do Adolescente, e não podendo deixar de ser citado o Conselho
Tutelar que tem um importante papel nos casos em que alguma irregularidade seja
noticiada.76
O Conselho Tutelar é um órgão público municipal de caráter autônomo e
permanente, cuja função é zelar pelos direitos da infância e juventude, conforme os
princípios estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. São pessoas
que têm o papel de porta-voz das suas respectivas comunidades, atuando junto a
órgãos e entidades para assegurar os direitos das crianças e adolescentes. São
eleitos 5 membros através do voto direto da comunidade, para mandato de 3 anos.
Tem como prioridade, atender às crianças e adolescentes que tiverem seus direitos
ameaçados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta; omissão ou
abuso dos pais ou responsáveis; ou em razão de sua conduta.77
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, em seu artigo 136, as
atribuições do Conselho Tutelar, das quais se pode destacar o atendimento às
crianças e adolescentes; atender e aconselhar os pais ou responsáveis; requisitar
serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência,
trabalho e segurança; fiscalizar entidades de atendimento; requisitar certidões de
nascimento ou de óbitos, bem como iniciar por meio de representação os
procedimentos judiciais de apuração de irregularidades em entidade de atendimento
e de infração administrativa às normas de proteção, entre outras que visam sempre
74
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 228
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 382
76
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 380
77
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. ver.
amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 139
75
22
defender, proteger, corrigir e acompanhar as famílias com tais problemas inerentes
aos interesses dos menores.78
Caso as medidas de proteção destacadas no Estatuto da Criança e do
Adolescente sejam violadas o Conselho Tutelar poderá aplicar medidas projetivas,
tais como as elencadas no artigo 101 da referida lei, que dentre elas a de se
destacar as do inciso VII e VIII consideradas mais graves, que são respectivamente:
abrigo em entidade; colocação em família substituta. Mas tais medidas devem ser
tomadas quando se tratar de criança ou adolescente abandonado, por ação ou
omissão da Sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou
responsável, em razão de sua conduta, devendo, nesses casos, ser comunicada
imediatamente a autoridade judiciária.79
Para Gonçalves, “a perda ou destituição constitui espécie de extinção do
poder familiar decretada por decisão judicial [...]”.80
Dispõe Mª Helena Diniz em relação à extinção do poder familiar o momento
em que ocorre tal ato, artigo 1635 do CC/02:
1) Morte dos pais ou do filho, pois morte de um deles não extingue o
poder familiar, visto que o outro o exercerá sozinho; cessando
apenas quando ambos os genitores falecerem, colocando-se os
filhos menores não emancipados sob tutela. Se houver morte do
filho, elimina-se a relação jurídica, por não haver mais razão de ser
do poder familiar;
2) Emancipação do filho, ou seja, aquisição da capacidade civil antes
da idade legal nos casos do Código Civil, art. 5º, parágrafo único,
equiparando-se a pessoa maior, deixa, então, de submeter-se ao
poder familiar;
3) Maioridade do filho, conferindo-lhe a plenitude dos direitos civis,
fazendo cessar a dependência paterna, uma vez que há presunção
legal de que o indivíduo, atingindo 18 anos, não mais necessita de
proteção.
4) Adoção, que extingue o poder familiar do pai ou da mãe,
transferindo-o ao adotante; se falecer o pai adotivo, não se restaura o
poder familiar do pai ou mãe natural, nomeando-se tutor ao menor;
5) Decisão judicial decretando a perda do poder familiar pela
ocorrência das hipóteses arroladas no art. 1.638 do Código Civil.81
Preleciona Silvio Rodrigues que tais sanções:
78
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. rev.
amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 143
79
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. rev.
amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 143
80
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 372
81
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 531
23
[...] têm menos um intuito punitivo aos pais do que o de preservar o
interesse dos filhos, afastando-os da nociva influência daqueles.
Tanto assim é que, cessadas as causas que conduziram à
destituição do poder familiar e transcorrido um período mais ou
menos longo de consolidação, pode o poder paternal ser devolvido
aos antigos titulares.82
A extinção do poder familiar é a forma pela qual cessa em definitivo o poderdever dos pais sobre os filhos menores, de forma natural ou por decisão judicial.
Do confronto entre os dois textos (o antigo e o novo Código), chega-se à
conclusão de que a estrutura legal do antigo pátrio poder foi mantida intacta, com
modificações tópicas de redação. Houve, apenas, duas inclusões ao texto de 1916:
a) outro tipo de extinção do poder familiar (por decisão judicial); b) outro tipo de
perda do poder familiar, por ato judicial (incidir, reiteradamente, em falta aos deveres
inerentes aos pais).
Manteve-se o que já estava previsto com relação aos titulares do poder
familiar, ao exercício e à suspensão e extinção.
O novo Código mantém o usufruto legal dos bens dos filhos em favor dos
pais. A inclusão de artigo prevendo a representação dos filhos menores de 16 anos
e a assistência aos filhos entre 16 e 18 anos é de natureza pessoal, não se atendo
apenas às questões de cunho patrimonial.
Quanto ao Pátrio Poder mudou para Poder Familiar no novo Código Civil. Na
época do antigo Código Civil (1916) quem exercia o poder sobre os filhos era o pai e
não se falava no poder do pai e da mãe (pais). Mas esta situação mudou e hoje a
responsabilidade sobre os filhos é de ambos.
A separação judicial ou divórcio dos pais não altera nada a questão do poder
familiar, o que se estabelece neste caso é a guarda da criança e o valor da pensão
alimentícia a ser paga, mas ambos continuam responsáveis.
O poder familiar se extingue com a morte dos pais ou do próprio filho,
quando os filhos completam 18 anos ou são emancipados após os 16 anos. Outro
caso de término do poder familiar é a adoção.
O poder familiar é um instituto importante e que deve ser levado a sério. A
vida de uma criança depende dos pais em todos os sentidos enquanto ela está em
formação e justamente nesta fase a criança estará sendo moldada para crescer e se
tornar um bom adulto.
82
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 372
24
Assim, como visto, guarda também foi tratada na Lei do Divórcio, mas não
vigoram os artigos ali contidos.
Para a determinação da guarda, seja essa guarda pela ruptura da sociedade
conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas normas estipuladas
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre observar o melhor
interesse da criança ou adolescente.
A guarda previdenciária é muito utilizada por avós paternos ou maternos
para a inclusão de netos como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes
indeferida, continua a ser exercitada com freqüência.
Na dissolução da sociedade conjugal através de separação consensual, ou
seja, aquela em que as partes, através de um acordo, decidem por fim na relação
conjugal, a guarda será definida por acordo entre os cônjuges separados.
A guarda na separação litigiosa pode ser através da homologação do acordo
entre os genitores ou caberá ao magistrado aplicar o princípio do melhor interesse
da criança e do adolescente. A guarda será defenda para o genitor que demonstra
proporcionar as melhores condições à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária da criança ou do adolescente.
Na dissolução de união estável, quando os pais não entrarem em um
acordo, caberá ao juiz analisar aquele que possui melhores condições em exercê-la.
A guarda compartilhada é aquela em que a criança possui uma residência
principal, porém, as responsabilidades sobre a criança e/ou adolescente, serão
decididas conjuntamente entre os genitores. E para concessão da referida guarda, o
juiz observará à harmonia entre o casal separado, a vontade dos filhos, a moradia
dos pais, o diálogo e o respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, visando
sempre o melhor interesse dos filhos.
O exame da referida guarda, para que sua utilização se torne aceitável e de
correta aplicação, deve conter uma análise de seus prós e contras, pois, a princípio,
nada é perfeito ou de total inutilidade, com raras exceções, principalmente quando
se encontra em jogo o desenvolvimento da personalidade de um ser em constante
desenvolvimento.
Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos,
poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los,
pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na
25
função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento
de reparação civil.
Ocorrerá a perda da guarda quando os pais não cumprem seu papel,
desproporcionando ao filho os direitos fundamentais assegurados pela lei.
26
2 DA GUARDA DOS FILHOS
Neste Capítulo abordar-se-á a Guarda, o seu histórico e a sua conceituação,
nas diversas formas de ruptura da sociedade conjugal.
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A palavra guarda originou-se do antigo alemão onde “warten (significa
guarda, esperar), também se pode dizer que se originou do inglês warden (significa
guarda), que formou o francês garde (guarda), assim, entende - se pelo termo
guarda, proteção, vigilância, observação”, de acordo com a definição de Plácido e
Silva.83
Em tempos remotos, a guarda judicial, era sempre concedida à figura da
mãe, por ter gerado o filho, e ainda, dispor de tempo para se dedicar às atividades
da casa e do bem estar da criança. Enquanto, o pai, trabalhava em atividades
externas, buscando o sustento e alimentação de sua família, não dispondo de tempo
para cuidar e participar da vida dos filhos.84
A matéria sobre guarda teve sua origem no CC/16, estabelecida em seus
artigos 325 a 328. Entretanto com o surgimento da Lei do Divórcio nº 6.515 de 1977
6515/77
85
, a matéria passou a ser tratada nos artigos 9° a 1 6, desta lei, sob o título
“Da Proteção do Filho”.86
A Lei do Divórcio 6515/77 regulava que nos casos da ruptura da sociedade
conjugal, seja essa ruptura por qualquer motivo, os pais poderiam acordar sobre a
guarda dos filhos.87
83
De Plácido e Silva apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de
responsabilidade parental. 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 53
84
WELTER, Belmiro Pedro e Rolf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de família.
Porto Alegre: Livraria dos advogados, 2004. p. 344
85
BRASIL, Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977.
86
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 166
87
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 166
27
O CC/02 ao invés de delinear regras específicas para cada caso de
separação define que, na falta de acordo entre os cônjuges, a guarda será atribuída
a quem obter as melhores condições para exercê-la.88
Conforme o estabelecido no artigo 1.584, caput, do CC/02:
Art. 1.584 - Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que
haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela
atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.89
Corroborando com o entendimento de se conceder a guarda a quem
apresentar melhores condições em exercê-la, diz Rosana Fachin:
Preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
relativamente à guarda, é o princípio informador para que o juiz
confira a guarda àquele dos pais que efetivamente tenha melhores
condições de realizar, dentro dos padrões mínimos, esses
interesses.90
Consagrado no artigo 1.586 do CC/02, o qual também estava previsto no
artigo 327 do CC/16, que foi revogado, e no artigo 13 da Lei do Divórcio nº 6.515/77,
o princípio favor filli91, ou seja, em qualquer caso, havendo motivos graves, poderá o
juiz, tendo em vista o bem estar dos filhos, regular a situação destes com os pais,
diferentemente do estabelecido nos artigos concernentes à matéria.92
Conforme o estabelecido no artigo 1.586 do CC/02:
Art. 1.586 - Havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer
caso, a bem dos filhos, regular de maneira diferente da estabelecida
nos artigos antecedentes a situação deles para com os pais.93
No direito, o tema guarda teve importância especial em dois momentos
distintos, como se pode perceber, de acordo com Waldyr Grisard Filho:
Em nosso direito, como vimos o tema guarda mereceu relevância em
duas hipóteses distintas e sujeitas, cada qual, a um ordenamento
88
CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá
Editora, 2006. p. 357
89
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 277
90
Rosana Fachin apud DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo código civil. 4. ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 2006. p. 122.
91
Princípio favor filIi significa: fazer prevalecer, em todos os casos, o bem da criança; valorizar e
perseguir o que melhor atender aos interesses do menor. (Zeno Veloso)
92
CARVALHO NETO. lnácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá
Editora, 2006. p. 358
93
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 277
28
jurídico peculiar: na dissolução da sociedade conjugal, ou de
qualquer forma de união: e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Em linhas gerais, percorreu esse caminha legislativo.94
Nesse mesmo entendimento diz Válter Kenji lshida:
Embora o termo técnico seja o mesmo, duas modalidades de guarda
existem. A primeira tratada é a guarda insenda dentro da família e
normalmente atribuída a um dos genitores que igualmente exercem o
poder familiar, Esta é “de competência da Vara da Família: Sendo a
outra a guarda originária do Estatuto da Criança e do Adolescente e
tratada como forma de colocação de família substituta”.95
É notório que para estes dois momentos distintos da determinação da
guarda, cada modalidade tem a sua competência para ser julgada, conforme leciona
Inácio de Carvalho Neto:
É de se observar também que a competência para conhecer de
questões relativas à guarda de filho, ainda que não insertas em
processo de separação e divórcio, é da Vara de Família e não da
Vara da Infância e da Juventude.96
Confirmando este ensinamento diz Giovane Serra Azul Guimarães que: “A
guarda pode ser exercida naturalmente em virtude do pleno exercício do poder
familiar ou fixada judicialmente, pelo juízo da Família ou da Infância e da
Juventude”.97
Faz-se necessário observar, que a guarda também foi tratada na Lei do
Divórcio, mas não vigoram os artigos ali contidos. Nas diversas maneiras de rupturas
da sociedade conjugal, de que trata esta lei, tem-se o seguinte: numa separação
consensual, verifica-se que caberia aos genitores acordarem sobre a guarda dos
filhos; porém, numa separação litigiosa, teriam que ser analisados algumas
questões, como a dos filhos permanecerem sob a guarda do cônjuge que não deu
causa a separação, ou de os mesmos permanecerem sob a guarda daquele que já
estavam em companhia durante a ruptura da sociedade conjugal, e ainda, de
permanecerem com o genitor que apresentar melhores condições de exercer a
guarda. No caso de uma separação litigiosa, onde ambos os genitores foram
responsáveis pela ruptura, à guarda caberia a mãe.
94
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 55
95
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 165
96
CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba:
Juruá Editora, 2006. p. 359
97
GUIMARÂES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 2. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 15
29
A guarda é um componente do poder familiar, podendo ainda ser
determinada a um terceiro em alguns casos extraordinários, ou ainda ser
determinada para um só dos genitores, sendo que este terá a incumbência de
prestar assistência educacional, moral e material.98
Guilherme Gonçalves Strenger, conceitua a guarda como um poder dever,
dizendo:
Guarda de filhos é o poder-dever submetido a um regime jurídico
legal, de modo a facilitar a que de direito, prerrogativas para o
exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa
condição. Leva-nos à crença de que a guarda não é só um poder
pela similitude que contém com a autoridade parental, com todas as
vertentes jurídicas, como é um dever, visto que decorre de
impositivos legais, inclusive com natureza de ordem pública, razão
pela qual se pode conceber esse exercício como um poder- dever.99
A guarda representa uma convivência dos filhos com os pais, dentro do
mesmo lar. Cabe aos pais assistir os filhos materialmente, moralmente e
psicologicamente. E ainda tem os pais o dever de vigiar os filhos nos seus atos
praticados, pois devem estar atentos no desenvolvimento dos filhos tanto no
psíquico, quanto no social.100
Assim aos pais, a guarda dos filhos representa um tempo de direito e
deveres, como se pode observar com o que diz Valter lshida:
A guarda do filho representa, para os pais, a um tempo direito e
dever; direito de manter o filho junto a si, disciplinando-lhe as
relações com estranhos, e, por extensão, de interceptar-lhe a
correspondência; e dever de guarda, a que não podem subtrair- lhe,
incumbindo-lhes resguarda a vida do filho, com os desvelos próprios
à sua idade ou formação.101
Para Mário Moura Aguiar entende-se por guarda, um controle objetivo do
desenvolvimento do menor, ou seja, em sentido jurídico, os pais ou responsável,
devem morar no mesmo lar do menor, devendo estes conceder a assistência
98
GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 2 ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003.p. 15.
99
STRENGER, Guilherme Gonçalves apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São
Paulo: Ed. de Direito, 2005. p. 43
100
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.67.
101
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p.163.
30
material (vestuário, alimentação), para a sobrevivência física moral, desenvolvendo
no menor a sua formação psicológica.102
Válter Kenji lshida divide a guarda em duas modalidades distintas, ou seja, a
guarda provisória e a guarda definitiva, conceituando cada uma dessas, como se
observa:
Guarda Provisória — na fixação pelo juiz, pode ocorrer nas
separações de casais com filhos menores ou filhos maiores e
inválidos até que seja solucionada a situação, com a decisão final,
sendo que nesses casos o julgamento estará afeto aos juízes de
família, e não de menores. Nesta hipótese, o magistrado fixa
liminarmente a guarda a um dos genitores e, em relação ao outro,
fixa os dias de visita, até que a causa seja definitivamente decidida.
Guarda Definitiva — é resultante de uma decisão que põe fim ao
processo, determinando com quem deverá ficar o menor.103
A partir destes conceitos norteados pelo ordenamento jurídico foi
estabelecida a guarda no ECA especialmente para crianças e adolescentes.
2.2 GUARDA NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE LEI 8.069/90
A guarda está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei
8.069/90 - ECA, nos artigos 33 ao 35, pois a criança e o adolescente devem ser
criados no seio de sua família natural, isto é, aquela formada pelo pai e pela mãe, ou
ainda, entre um deles e seus descendentes. Não sendo possível essa permanência,
o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece princípios através dos quais à
criança e o adolescente são colocados em família substituta.
A guarda que é estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, é a
decorrente do abandono e da orfandade, como observa Waldyr Grisard Filho:
A guarda prevista no Estatuto decorre do abandono e da orfandade
Porém, a só orfandade não determina a guarda sob os auspícios
dessa lei. É preciso circunscrevê-la nas hipóteses de seu artigo 98
(direitos ameaçados ou violados), quando então emerge a
102
AGUIAR, Mário Moura apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo
modelo de responsabilidade parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 55.
103
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p.163.
31
competência da Justiça, especializada, através do artigo 48,
parágrafo único, letra a: conhecer dos pedidos de guarda e tutela”.104
Marcial Barreto Casabona discorre sobre o que está previsto no artigo 28 do
Estatuto da Criança e do Adolescente, onde a guarda pode ser deferida à uma
família substituta:
O artigo 28 da lei 8.069/90 estabelece a guarda como um meio de
colocar o menor em família substituta ou em associação,
independentemente de sua situação jurídica, até que se resolva,
definitivamente, o destino do menor.105
Giovane Serra Azul Guimarães comenta sobre o que dispõe o artigo 32 do
Estatuto da Criança e do Adolescente que:
Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará
compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante
termo nos autos, devendo ser observado o prazo previsto no artigo
1.187 do Código de Processo Civil.106
O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê em seus dispositivos três
modalidades distintas de guarda: a provisória, a permanente e a peculiar. Ana Maria
Moreira Marchesan define o que vem a ser cada uma dessas modalidades de
guarda:
Guarda Provisória (art. 33, §1°ECA) subdividi-se em duas
subespécies: liminar e incidental, nos processos de tutela e adoção,
salvo nos de adoção por estrangeiros, onde é juridicamente
impossível. A permanente (art. 33, §2°- 1° hipótese ) destina-se a
atender situações peculiares, onde não se logrou uma adoção ou
tutela, que são mais benéficas ao menor. É medida de cunho perene,
estimulada pelo art.34 do ECA. Guarda Peculiar (art.33, §2°2°hipótese) traduz uma novidade introduzida pelo Es tatuto. Visa o
suprimento de uma falta eventual dos pais, permitindo - se que o
guardião represente o guardado em determinada situação.107
Nas modalidades supra citadas encontradas no Estatuto da Criança e do
Adolescente, o órgão competente para julgar estes pedidos é o Juízo da Vara da
104
GRISARO, FILHO Waldyr apud CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo:
Editora Quartier Latin, 2006. p. 144.
105
CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006.
p. 141.
106
GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 2. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 18.
107
MARCHESAN Ana Mana Moreira apud ISHIDA, Válter Kenji. Direito de Família e sua
interpretação doutrinária e jurisprudencial. São Paulo: Saraiva, 2003. p.73
32
Infância e Juventude, pois nos referidos casos a criança encontra-se em situação
irregular.108
No artigo 33, parágrafo 3° do ECA está prevista a g uarda para fins
previdenciários que, como Josiane Petry Veronese destaca: “A guarda confere à
criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de
direito, inclusive previdenciários”.109
Assim que for estabelecida a guarda, de imediato o menor passará a ser
dependente do guardião para todos os efeitos legais, até mesmo os previdenciários,
estes que serão abordados no próximo item que será sobre a guarda
previdenciária.110
O artigo 34 do ECA trata de guarda especial, ou seja, de crianças e
adolescentes órfãos ou abandonados, tendo o Estado obrigação de fornecer
assistência jurídica para facilitar a determinação da guarda. Sobre este artigo leciona
Ishida:
Constitui obrigação do Estado concretizada neste artigo fornecer
assistência jurídica, visando, por exemplo, facilitar os meios de se
pleitear a guarda, fornecer incentivos, como abatimento no imposto
de renda e subsídios, visando ao acolhimento por pessoas e ao
desacolhimento.111
Conforme Cury, Marçura e Garrido a guarda definitiva sempre será por prazo
indeterminado, pois pode ser modificado a qualquer tempo:
A guarda sempre é deferida a título precário, de modo que a
chamada guarda definitiva traduz apenas medida por prazo
indeterminado. Alteradas as condições que serviram de lastro para o
seu deferimento, poderá ser revista mediante pedido de
modificação.112
A referida modificação da guarda será feita através de vias judiciais,
devendo os magistrados decidirem, com cautela, pois para a modificação da guarda,
deverá ser levado em conta o melhor interesse do menor.
108
CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006.
p. 143
109
VERONESE, Josiane Rose Petry. Direito da criança e do adolescente. v. 50. Florianópolis:
Editora OAB/SC, 2006. p. 28
110
PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro. 1999. p. 261
111
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 78
112
CURY, Munir. Jurandir Norberto Marçura e Paulo Afonso Garrido de Paula. Estatuto da
criança e do adolescente anotado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 50
33
Assim, portanto, que para a determinação da guarda, seja essa guarda pela
ruptura da sociedade conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas
normas estipuladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre
observar o melhor interesse da criança ou adolescente. Além das citadas, há outras
espécies de guarda fundadas em legislação especifica que, para melhor
exemplificação do tema, passa-se a expor.
2.3 GUARDA PREVIDENCIÁRIA
A guarda previdenciária, muito utilizada por ascendentes para a inclusão de
descendentes como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes indeferida,
continua a ser exercitada com freqüência. A finalidade desta guarda é colocar a
criança em lar substituto ante a ausência da família original ou a impossibilidade de
ser criada por ela, é um contra-senso deferir-se, por exemplo, a guarda para os
avós, quando a criança esteja morando com os pais biológicos e por estes
mantidas.113
É fato comum os filhos ao se casarem, continuarem morando com os pais, e
com o nascimento dos filhos, enxergando a possibilidade de no futuro, esses
usufruírem de direitos previdenciários dos avós, é que se pleiteia a guarda
previdenciária.114
Esta espécie de guarda é muito criticada e vem ocorrendo inúmeros casos
de indeferimento nos tribunais, pois, as restrições para concessão de tal benefício se
justificam em função do risco de fraudes. Pode ocorrer do menor viver no mesmo
domicílio que uma avó, por exemplo. Porém, não sendo demonstrada a falta de
condições dos pais de provê-lo com os cuidados necessários, ou sendo estes
ausentes, não há motivos que ensejam a alteração de guarda. No entanto, deve ser
analisado caso a caso, pois há situações em que se faz necessária essa medida,
como por exemplo, menor em estado precário de saúde. Com a evidente
precariedade da previdência social, onde muitos exames e cirurgias básicas deixam
113
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 57
114
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 58
34
de ser oferecidos, é que a guarda previdenciária faz sentido, apresentando maiores
garantias para seus beneficiários.115
Além do que, o Estatuto da Criança e do Adolescente não proíbe esse tipo
de guarda, mas, ao contrário, prevê, no artigo 33, § 2°, a excepcionalidade da
guarda fora dos casos da tutela e da adoção.
Art. 33 - A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e
educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o
direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
§ 2º. Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de
tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta
eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de
representação para a prática de atos determinados.116
E em seu artigo 33 parágrafo 3°, estabelece como um dos efeitos da guarda
o de conferir “à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os
fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.117
2.4 GUARDA NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL
No rito católico do casamento mantém-se a frase “até que a morte os
separe”, porém há de se compreender que: se dá a morte física onde o corpo perde
suas funções vitais e a morte subjetiva onde o amor ou qualquer outro sentimento
que tenha unido aquele casal cesse. Em direito este processo de litígio conjugal, de
desencontro amoroso, da morte subjetiva do amor chama-se separação conjugal e
divórcio e neste meio a guarda pelos filhos.
A guarda e proteção dos filhos na dissolução da sociedade conjugal eram
tratadas nos artigos 325 a 329 do CC/16. Esses artigos foram revogados pela Lei do
Divórcio 6515/77, trazendo regras sobre a matéria nos artigos 9 a 16, que
115
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 59
116
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 37
117
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 38
35
mostraram-se injustificáveis, com o vigente CC/02, onde disciplina a referida
proteção em seus artigos 1.583 a 1.590.118
Legalmente a dissolução da sociedade conjugal termina com a morte de um
dos cônjuges, com a nulidade ou anulação do casamento, com a separação
extrajudicial (Lei Federal nº 11.441, de 04/01/2007), judicial ou com o divórcio. No
caso de separação judicial podem ser: a consensual, ou por mútuo consentimento, e
a judicial, ou litigiosa. Onde é necessária a contratação de um representante legal, o
advogado, para representar uma ou ambas as partes no processo. Dependendo de
cada caso irá se disputar ou não os bens materiais e a posse e guarda dos filhos.119
Muitas vezes estas crianças são relegadas em segundo plano ou passam a
ser mais uma arma que o casal usa para se atingirem mutuamente. Às vezes se
esquecem do que seria melhor para os filhos e os colocam em situações as quais
não possuem maturidade e discernimento para enfrentá-las. Os filhos acabam sendo
os mais prejudicados no processo. Dependendo de cada caso podem gerar neles
traumas onde a dificuldade, no futuro, em lidar com as questões afetivas serão
constatadas. Geralmente a criança se sente culpada pela separação dos pais.
Sentimentos de ansiedade, culpa, depressão, tristeza, repetência, dificuldade na
aprendizagem, sentimento de não ser amado ou de abandono entre outros são
comuns em crianças cujos pais se separam.120
Ocorrendo a dissolução, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre
a guarda dos filhos, não ocorrendo acordo a guarda será atribuída a quem revelar
melhores condições para exercê-la. Cabe aos pais disciplinarem sobre o direito de
visitas. Porém o mais importante não é o tipo de guarda mais sim a forma como ela
é passada para a criança e como é a relação dos pais. Os pais devem tentar se
relacionar da melhor forma possível para que os dramas da separação possam ser
minimizados ao máximo para os filhos. Quanto melhor for a relação entre os pais
menor será a dor da separação para os filhos. Evidente que isto é difícil, mas, em
prol dos filhos, devem ser superadas pequenas disputas.121
A seguir será tratada a guarda nas diversas modalidades de dissolução da
sociedade conjugal.
118
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Direito de família. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 204
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1289
120
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Direito de família. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 205
121
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1290
119
36
2.4.1 Guarda na separação judicial consensual
Quando a separação judicial for consensual, ou seja, aquela em que as
partes, através de um acordo, decidem por fim na relação conjugal, a guarda será
definida por acordo entre os cônjuges separados.
Verifica-se que a matéria relativa à guarda na separação consensual está
prevista no Código Civil de 2002, em seu artigo 1.583, onde prevê que a guarda será
deferida pela homologação do acordo realizado entre os genitores, sobre os filhos
em comum do casal, assim está disposto:
Art. 1.583 CC/02 - No caso de dissolução da sociedade ou do vínculo
conjugal pela separação judicial por mútuo consentimento ou pelo
divórcio direto consensual, observar-se-á o que os cônjuges
acordarem sobre a guarda dos filhos.122
Ensina Carlos Roberto Gonçalves que em casos de separação consensual:
“Cabe aos cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos, presumindo-se que são
os maiores interessados no futuro e bem estar da prole”.123
Os cônjuges ao entrarem com a ação de separação consensual, em sua
petição inicial, já devem estabelecer a forma de guarda dos menores, como prevê o
artigo 1.121 em seu inciso II, do Código de Processo Civil.
Art. 1.121. A petição, instruída com a certidão de casamento e o
contrato antenupcial se houver, conterá:
[...]
II - o acordo relativo à guarda dos filhos menores e ao regime de
visitas; (Redação dada pela Lei nº 11.112, de 2005).124
Se na ocasião o acordado entre os genitores não respeitar a prevalência do
melhor interesse dos menores, caberá ao juiz recusar a homologação do acordo, e
assim alterar o regime de guarda, deferindo-a ao outro genitor ou até mesmo a um
terceiro.125
Corroborando com esse mesmo entendimento, leciona Yussef Cahali:
122
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4.ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 277
123
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI. Direito de família. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 256
124
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Processo Civil: Lei 5.869, de 11 de janeiro de
1973. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 401
125
RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. v. 6. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 273.
37
Na separação judicial consensual, a propósito da guarda dos filhos,
deve ser observado o estabelecido pelos cônjuges, salvo ocorrendo
motivos graves que levem o juiz, no interesse dos menores, a regular
diversamente a sua situação.126
Assim, conclui-se que na dissolução da sociedade conjugal através de
separação consensual, cabe aos pais preocuparem-se, além de suas questões
pessoais e patrimoniais, com a guarda dos filhos.
2.4.2 Guarda na separação litigiosa
A regra estabelecida para a guarda dos filhos na separação litigiosa, antes
da vigência do Código Civil de 2002, era que os filhos ficariam com o cônjuge
inocente, ou seja, aquele que se comportou de um modo digno durante a relação
conjugal. O legislador quis punir o cônjuge culpado com a perda da guarda dos
filhos.127
Com o Código Civil de 2002, houve uma modificação sobre a determinação
da guarda, passando a ser desconsiderada a culpa de um dos cônjuges para efeito
da determinação da guarda. A guarda será atribuída para aquele que demonstrar
melhores condições em exercê-la.128
O artigo 1.584 do CC/02 fundamenta sobre a guarda na separação litigiosa
que:
Art. 1.584. Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que
haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela
atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.129
Sílvio Neves Baptista diz que não há como se referir a culpa de um dos
cônjuges pela separação com a definição do exercício da guarda por um dos
genitores, pois um não compromete o exercício do outro. Nem sempre se quer dizer
126
CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 11. ed. São Paulo; Editora Revista dos Tribunais,
2005. p. 23
127
CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba:
Juruá Editora, 2006. p. 362.
128
CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba:
Juruá Editora, 2006. p. 363.
129
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 277
38
que uma péssima mulher, ou péssimo marido, será também uma péssima mãe ou
pai.130
Silvio Venosa aponta também sobre o melhor interesse da criança ou
adolescente, como se observa:
O carinho, o afeto, o amor, o meio social, o local da residência, a
educação, a escola e evidentemente, também as condições
econômicas devem ser levados em consideração pelo magistrado,
que deve valer-se dos profissionais auxiliares para ter diante de si
um quadro claro da situação do lar dos cônjuges, para após decidir
quem será o detentor da guarda do menor.131
Ressalta-se, por fim, que nada impede que os cônjuges disponham
consensualmente sobre a guarda dos filhos também na separação litigiosa, assim
como em qualquer outro caso, o que será extremamente salutar.132
Desta forma, a guarda na separação litigiosa pode dar-se através da
homologação do acordo entre os genitores ou por decisão do magistrado que deve
aplicar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. A guarda será
defenda para o genitor que demonstra proporcionar as melhores condições à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da criança
ou do adolescente.
2.4.3 Guarda na dissolução da união estável
A união estável encontra-se embasada na CRFB/88, em seu artigo 226,
parágrafo 3°, bem como no CC/02 no artigo 1.723, co mo estabelece o
fundamentado, respectivamente:
Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do
Estado.
[...]
130
BAPTISTA, Sílvio Neves apud CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e
prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 363.
131
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 250.
132
CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá
Editora, 2006. p. 365
39
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a
lei facilitar sua conversão em casamento. 133
Art. 1.723 - É reconhecida como entidade familiar a união estável
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição
de família.134
Para o Juiz, não existe diferença de os pais serem casadas ou não, pois
importância maior é relacionada à criança, tendo esta, o direito de ser criada por
ambos.135
O CC/02 não prevê sobre a guarda dos filhos na dissolução de união estável
em seus dispositivos; percebe-se então, que será atribuída a guarda aplicando por
analogia, conforme o disposto nos artigos compreendidos do 1583 a 1.590 do
CC/02.136
Para Waldyr Grisard Filho:
A regulamentação da união estável veio com a lei 9.278/96,
prevendo, no artigo 2°, III, entre os direitos e de veres dos
companheiros, o de guarda, sustento e educação dos filhos comuns,
nos moldes do art. 1566 do CC/02. Porém, não regulamentando
sobre o destino dos filhos nos casos de ruptura, impondo-se
recomendar sejam aplicados por analogia os dispositivos atinentes
do Código Civil (artigos 1583 a 1590).137
Portanto, a decisão da guarda dos filhos na dissolução de união estável,
quando os pais não entrarem em um acordo, caberá ao juiz analisar aquele que
possui melhores condições em exercê-la, assim como nas outras formas de ruptura
de uma sociedade conjugal.
133
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95
134
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 284
135
WAMBIER, Teresa Amida Alvim e Eduardo de Oliveira Leite. Repertório de doutrina sobre
direito de família. Aspectos constitucionais, civis e processuais. v. 4. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999. p.264
136
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
Editora Rideel. São Paulo. 2007. p. 277
137
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. 30. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 97
40
2.5 GUARDA COMPARTILHADA
A guarda compartilhada vem a ser um instituto onde após a ruptura da
sociedade conjugal, os pais, de uma forma madura e sensata, acordam que
compartilham a guarda dos filhos, dividindo em conjunto os deveres e
responsabilidade sobre a criança ou adolescente. Após a ruptura da sociedade
conjugal, verifica-se que seria melhor, tanto para os pais quanto para os filhos, que
os vínculos afetivos maternos e paternos continuassem a ser do mesmo modo,
enquanto os pais estavam vivendo como cônjuges ou companheiros.
2.5.1 Guarda compartilhada: esboço histórico e conceito
A guarda compartilhada surgiu no Direito Inglês, com a Common Law138, na
década de sessenta, tendo como denominação joint custody139, pois o pai sempre foi
o detentor da guarda dos filhos, sendo que no século XIX, a mãe passou a exerce lá, devido a uma alteração que houve no parlamento inglês. Percebendo que a
guarda estava muito concentrada na figura da mãe, não sendo aceitável pelas
famílias, os tribunais começaram a conceder a split order140, sendo uma divisão do
desempenho de ambos os genitores.141
Assim noticia Eduardo de Oliveira Leite:
[...] na Inglaterra o pai sempre foi considerado proprietário de seus
filhos, logo, em caso de conflito, a guarda lhe era necessariamente
concedida. Somente no século XIX, o Parlamento inglês modificou o
princípio e atribuiu à mãe a prerrogativa de obter a guarda de seus
138
Common Iaw é um sistema legal oriundo da Inglaterra, utilizado ali e na maioria dos países que
foram colônias ou territórios britânicos. Sua característica principal é a valorização da jurisprudência
em detrimento das leis estatutárias. Uma tradução ao pé da letra seria “lei comum”, que não
corresponde ao atual sentido do termo, mas leva o leitor a refletir sobre sua origem histórica, ao
passo que “direito comum”. Wikpedia. Disponível em: <http:pt.wikipedia.org/wiki/Common_Iaw>.
Acesso em 18 mar. 2009.
139
joint custody significa o mesmo que guarda conjunta, explica SILVA, Ana Maria Milano. Guarda
compartilhada. Editora de Direito. São Paulo: 2006. p. 66
140
SpIit order significa o mesmo que guarda compartilhada, explica CASABONA, Barreto. Guarda
compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 255
141
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 67
41
filhos e, a partir de então, a prerrogativa exclusiva do pai passou a
ser atenuada pelo poder discricionário dos Tribunais.142
A primeira Lei que surgiu sobre guarda compartilhada foi na França, como
leciona Ana Maria Milano Silva:
Foi na França que surgiu a primeira lei sobre guarda compartilhada,
[...], estabelecendo que a autoridade parental deve ser exercida pelo
casal a quem, divorciado ou não, compete regrar e determinar os
detalhes da vida cotidiana dos filhos.143
Os Estados Unidos da América, por exemplo, absorveram a idéia da guarda
compartilhada na década de 80. As estatísticas comprovam que nesse país, esse
tipo de guarda é a mais adotada, sendo os genitores totalmente a favor, pois este
tipo de guarda só beneficia a criança, ajudando na auto-estima, na atividade, nos
relacionamentos e desenvolvimentos psicológicos da criança.144
Em 1995, foi à vez de Portugal adotar a guarda compartilhada, utilizando a
nomenclatura de “Guarda Conjunta” em seu Código Civil, como leciona Marcial
Barreto Casabona:
Em Portugal, o advento da Lei n. 84, de 31 de agosto de 1995,
alterou parte do art. 1906 do CC, cujo inciso II passou a estabelecer
que os pais podem acordar sobre o exercício em comum do poder
paternal, decidindo as questões relativas à prole em condições
idênticas às que vigoravam na constância do matrimônio.145
Waldyr Grisard Filho sobre a necessidade da guarda compartilhada diz o
seguinte:
A noção da guarda compartilhada surgiu da necessidade de se
equilibrar os papéis parentais, diante da pemiciosa guarda
uniparental concedida sistematicamente à mãe. (na guarda
tradicional, o genitor não guardião tem uma quantidade limitada de
contato com o menor), e de garantir o melhor interesse do menor,
especialmente, as sua necessidades afetivas e emocionais.146
A guarda compartilhada ou conjunta é aquela que, após a dissolução da
ruptura conjugal, possibilita aos genitores conjuntamente, tomar decisões sobre o
142
LEITE, Eduardo de Oliveira apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo:
Editora de Direito, 2006. p. 67
143
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 88
144
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 89
145
CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p.
261
146
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. 30. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 127
42
futuro da prole. Ambos participando da vida dos filhos, em seu crescimento, na
formação moral e educacional.147
Nos dias atuais, a modalidade de guarda compartilhada, seria um modelo
ideal a ser aplicado após a ruptura da sociedade conjugal, pois é um instituto que
permite aos pais, solteiros, ex-casados ou companheiros, uma forma de igualdade
em relação à educação e o desenvolvimento da criança.148
No instituto da guarda compartilhada, os pais, em conjunto, possuem a
autoridade legal, tendo estes responsabilidades e direitos igualitários em relação à
prole, devendo preservar o bem estar do menor. Dr. Henry S. Gombein, americano,
especialista na matéria de guarda compartilhada, refere-se ao termo como:
[...] “joint legal custody”, refere-se a prerrogativa de tomar decisões
em conjunto, o que significa que, mesmo em situações de divórcio,
ambos os pais possuem o direito de tomar decisões sobre o futuro
dos filhos, embora a criança resida unicamente com um dos pais,
que exerce a guarda física.149
Na guarda compartilhada não existe um padrão a ser seguido, pois nessa
modalidade o melhor arranjo é que a criança tenha um maior contato com ambos os
genitores, privilegiando assim, o bem estar, a educação, a saúde e o
desenvolvimento como um todo, do filho.150
Para Sérgio Eduardo Nick, a guarda compartilhada é a possibilidade dos
filhos conviverem com ambos os pais:
O termo guarda compartilhada ou guarda conjunta de menores
refere-se à possibilidade dos filhos de pais separados serem
assistidos por ambos os pais. Nela, os pais têm efetiva e equivalente
autoridade legal, não só para tomar decisões importantes quanto ao
bem estar de seus filhos, como também de conviver com esses filhos
em igualdade de condições.151
147
RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada
sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris,
2005. p. 115.
148
CASABONA, Marcial Barreto. Guarda Compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p.
250.
149
RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada
sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris,
2005. p. 64
150
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p109
151
NICK, Sérgio Eduardo apud RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e
a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de
Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. p. 63.
43
Sintetiza Eduardo de Oliveira Leite, que a guarda compartilhada: “mantém,
apesar da ruptura, o exercício em comum da autoridade parenta e reserva, a cada
um dos pais, o direito de participar das decisões importantes referentes à criança”.152
Para que se possa compreender melhor, a guarda compartilhada é aquela
em que a criança possui uma residência principal, porém, as responsabilidades
sobre a criança e/ou adolescente, serão decididas conjuntamente entre os genitores.
E para concessão da referida guarda, será observado à harmonia entre o casal
separado, além de outros requisitos, visando sempre o melhor interesse daqueles.
A guarda compartilhada será determinada pelo juiz, após serem observados
alguns requisitos como: a vontade dos filhos, a moradia dos pais, o diálogo e o
respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, entre outros.
O primeiro requisito a ser analisado é a consulta à vontade do filho. É um
aspecto a ser observado, pois é natural que a criança não queira escolher com qual
genitor pretende ficar e sim optar em estar com ambos os genitores.153
O melhor interesse da criança persiste como norteador das decisões dos
genitores, alerta Waldir Grisard Filho:
[...] colima-se o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e
social do menor e, com absoluta prioridade, se lhe deve assegurar a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade, como se vê nos artigos 3º e 4º do
ECA, robustece-se de motivos o Direito brasileiro para adotar a
guarda compartilhada.154
A determinação da residência é essencial para a estabilidade da criança,
que terá assim um ponto de referência, mas faz-se necessário que, ambos os pais
possuam acomodações para a criança em suas respectivas residências. Deve ela
ter consciência de que existe um canto seu em cada um dos lares de seus genitores,
onde ela sentirá que é sua casa também. A proximidade dessas residências
facilitaria todo o procedimento.155
152
LEITE, Eduardo de Oliveira apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo
modelo de responsabilidade parental. 30. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p.
126.
153
RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada
sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris,
2005. p. 67
154
GRISARD FILHO, Waldyr apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo:
Editora de Direito, 2006. p117
155
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 114
44
Assim, tem-se que os períodos de deslocamento não poderão interromper a
situação escolar das crianças. Por isso é preferível que os pais residam dentro da
mesma área escolar, ou razoavelmente perto, ou que ambos disponham de meios
para levar e trazer os filhos às respectivas escolas.156
O segundo aspecto a ser considerado na viabilização desse modelo de
guarda, é a educação, compreendendo tanto a instrução, como meio de
desenvolvimento da inteligência ou aquisição de conhecimentos básicos, quanto, em
um sentido mais amplo, o desenvolvimento de todas as atividades físicas e
psíquicas do menor. É a principal missão dos pais dirigirem a formação de seus
filhos.157
Para a guarda compartilhada ser implantada outro ponto relevante a ser
analisado, é se ambos os pais manifestam o interesse por esse instituto de
compartilhar as obrigações e direitos sobre a prole, pois, se um dos genitores não
aceitar essa modalidade de guarda, ela não deverá ser atribuída a esses pais em
conjunto, sendo que correrá o risco de não atingir o principal objetivo, que será o
bem estar do menor.158
Para Rolf Hanssen Madaleno, um dos requisitos essenciais para a
determinação da guarda compartilhada, é o juízo de ponderação entre os genitores,
como se verifica:
A guarda compartilhada exige dos genitores um juízo de ponderação,
imbuídos da tarefa de priorizarem apenas os interesses de seus
filhos comuns, e não o interesse egoísta dos pais. Deve ser tido
como indissociável pré-requisito uma harmônica convivência dos
genitores; como a de um casal que, embora tenha consolidado a
perda de sua sintonia afetiva pelo desencanto da separação, não se
desconectou da sua tarefa de inteira realização parental,
empenhados em priorizarem a fundamental felicidade da prole.159
Quando os pais, após a dissolução conjugal, continuam vivendo em
conflitos, possuem uma relação amarga entre si, à guarda compartilhada não deve
ser deferida, pois o filho acabará sendo um motivo para todas as divergências do ex-
156
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006.. p118
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p 109
158
WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de
família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 354
159
WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de
família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 354
157
45
casal, não sendo possível atingir o resultado principal da guarda compartilhada, que
seria do melhor interesse da criança.160
Maria Antonieta Pisano Motta assevera que é uma característica marcante
para a determinação da guarda o diálogo entre os pais da criança, ou seja, o excasal, como se observa:
[...] o diálogo e o respeito mútuo são características indispensáveis
àqueles que pretendem compartilhar qualquer tipo de guarda de seus
filhos e muito especialmente àqueles que pretendem dividi - lá.161
Observa-se, que para ser deferida a guarda compartilhada, ela precisa
preencher os requisitos essenciais e, sempre abrangendo o melhor interesse para a
criança.
2.6 RESPONSABILIDADE JURÍDICA DO GUARDIÃO
Guarda, como se disse, é o direito de reter o filho junto a si e de fixar-lhe a
residência, levando implícita a convivência cotidiana com o menor. Nesse viés,
compete ao genitor guardião escolher a residência de ambos, velar e proteger ao
filho, educá-lo e sustentá-lo (artigo 1.703 do CC/02), nos limites, porém, que
conhecia antes da ruptura.162
A co-gestão as sociedade conjugal estabelecida pelo artigo 226, §5°, da
Carta Magna impõe releitura do artigo 1689, II do CC/02:
Art. 226 – A Família, base da sociedade, tem especial proteção do
Estado.
[...]
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são
exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. 163
Art. 1.689 – O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar:
[...]
160
WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de
família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 355
161
MOTTA, Maria Antonieta Pisano apud CASABONA, Marcial Barreto. Guarda Compartilhada. São
Paulo: Editora Quartíer Latin, 2006. p. 251.
162
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1394
163
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95
46
II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua
autoridade.164
2.6.1 Responsabilidade civil
Quando se fala em responsabilidade civil, primeiramente é necessário
diferenciar a responsabilidade civil objetiva da subjetiva.
A responsabilidade civil subjetiva pressupõe a culpa. Diz-se, pois, ser
subjetiva a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa
passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável.165
No que tange a responsabilidade objetiva, pode-se dizer que é aquela que
independe de culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Essa
teoria dita objetiva, ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e
deve ser reparado por quem a ele se liga. Nos casos de responsabilidade objetiva,
não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano.166
Dessa forma, o CC/1916 e o CC/2002 adotaram a responsabilidade civil
subjetiva como regra e a objetiva como exceção, como se percebe no artigo 159 do
CC/16 e o artigo 927 do CC/02:
Art. 159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência,
ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica
obrigado a reparar o dano.167
Art. 927 - Aquele que por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano
a outrem, fica obrigado a repará-lo.168
Após essa introdução, nos remetemos à responsabilidade civil dos menores,
englobando tanto o menor impúbere quanto o púbere. Para o menor púbere o CC/16
trazia a sua regra no artigo 156 a saber:
Art. 156 O menor, entre dezesseis e vinte e um anos, equipara-se ao
maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos, em que for
culpado.169
164
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. Lei nº 10.406, de janeiro de 2002. 4. ed. São
Paulo: Rideel, 2007. p. 282
165
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 715
166
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 716
167
MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil.
Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 310
168
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 240
47
O CC/02 não traz artigo semelhante a esse, mas trouxe alterações
significativas, entre elas a que trata da capacidade civil, ao reduzir o tempo em que
cessa a menoridade de 21 para 18 anos (art. 5º, caput):
Art. 5 - A menoridade cessa aos dezoitos anos completos, quando a
pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.170
Com relação ao menor impúbere, o CC/02 adotou posicionamento diferente
do CC/16. Para o CC/16, a responsabilidade civil do menor impúbere é subjetiva, em
que não havendo culpa não há motivo para indenizar como é demonstrado nos
artigos 1521, alínea ‘f’, e 1523, in verbis:
Art. 1521 São também responsáveis pela reparação civil.
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob seu poder e em
sua companhia.
Art. 1523. Excetuadas as do art. 1521, V, só serão responsáveis as
pessoas enumeradas nesse e no art. 1.522, provando — se que elas
concorreram para o dano por culpa, ou negligência de sua parte.171
Já, no CC/2002, conforme transcreve o artigo 932, I, e o artigo 933, modifica
o pensamento do CC/16 e qualifica a responsabilidade dos menores como objetiva,
impondo-se a teoria do risco.
Art. 932 São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e
em sua companhia.
Art. 933 As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo
antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão
pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.172
Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos,
poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los,
pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na
função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento
de reparação civil.173
169
MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil.
Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 310
170
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 19
171
MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil.
Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 443
172
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 240
173
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1337
48
2.7 PERDA/REVOGAÇÃO DA GUARDA
As medidas pertinentes aos pais ou responsáveis tem por escopo funcionar
como estrutura de retaguarda para as medidas de proteção trazidas pela CRFB/88,
pelo CC/02 e pelo ECA uma vez que a criança e o adolescente não podem ser
vistos isoladamente, e, sim, como integrantes de contexto sociofamiliar que,
certamente, exerce grande influência em sua vida.
Quando os pais não cumprem seu papel, desproporcionando ao filho os
direitos fundamentais, dispostos no artigo 227 da CRFB/88, bem como o artigo 15
do ECA, e agindo de maneira negligente ou imprudente, pode, a criança ou o
adolescente, ser colocado em família substituta para fins de adoção, tutela ou
guarda, a fim de que se garanta o ideal do artigo 19 do Estatuto:
Art. 19 - Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família
substituta, assegurada à convivência familiar e comunitária, em
ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias
entorpecentes.174
Dispõe o artigo 1634, inciso II, do CC/02:
Art. 1634 - Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
[...]
II - tê-los em sua companhia e guarda.175
É dever dos pais a guarda de seus filhos menores de 18 anos. O artigo 22
do Estatuto da Criança e do Adolescente salienta:
Art. 22 - Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação
dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a
obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.176
Nos termos do artigo 35 do ECA:
Art. 35 - A guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante
ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público.177
174
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 22, 24
175
ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed.
São Paulo: Rideel, 2007. p. 279
176
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 30
49
Tal revogação poderá ocorrer por vários motivos que nem sempre serão
ligados à inadaptação do guardião ao encargo. Poderá ser em decorrência de falta
superveniente de condições econômicas do guardião, por exemplo, ou mesmo por
desaparecerem os motivos que ensejaram provisoriamente a retirada da guarda dos
pais.178
Quando o juiz for chamado a revisar a guarda dos filhos deverá ficar atento
ao sistema legal, contudo, o que prepondera é o interesse dos filhos e não a
pretensão do pai ou da mãe, uma vez que, a decisão judicial concernente à guarda
de filhos menores não faz coisa julgada.179
Segundo Ishida, a perda da guarda é uma das medidas pertinentes aos pais
ou responsáveis e será determinada pelo juiz quando o guardião descumprir um dos
deveres decorrentes da guarda.
Art. 129 do ECA. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:
[...]
VIII - perda da guarda.180
Guarda, como exposto alhures, é o direito de reter o filho junto a si e de
fixar-lhe a residência, levando implícita a convivência cotidiana com o menor. Nesse
viés, compete ao genitor guardião escolher a residência de ambos, velar e proteger
ao filho, educá-lo e sustentá-lo, nos limites, porém, que conhecia antes da ruptura.
Seus direitos encontram fronteiras nos de visita, companhia e fiscalização do outro.
A guarda também foi tratada na Lei do Divórcio, mas não vigoram os artigos
ali contidos.
Para a determinação da guarda, seja essa guarda pela ruptura da sociedade
conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas normas estipuladas
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre observar o melhor
interesse da criança ou adolescente.
A guarda previdenciária é utilizada por avós paternos ou maternos para a
inclusão de netos como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes indeferida,
continua a ser exercitada com freqüência.
177
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 60
178
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 42
179
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61
180
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 208
50
Na dissolução da sociedade conjugal através de separação consensual, ou
seja, aquela em que as partes, através de um acordo, decidem por fim na relação
conjugal, a guarda será definida por acordo entre os cônjuges separados.
A guarda na separação litigiosa pode ser através da homologação do acordo
entre os genitores ou caberá ao magistrado aplicar o princípio do melhor interesse
da criança e do adolescente. A guarda será defenda para o genitor que demonstra
proporcionar as melhores condições à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária da criança ou do adolescente.
Na dissolução de união estável, quando os pais não entrarem em um
acordo, caberá ao juiz analisar aquele que possui melhores condições em exercê-la.
A guarda compartilhada é aquela em que a criança possui uma residência
principal, porém, as responsabilidades sobre a criança e/ou adolescente, serão
decididas conjuntamente entre os genitores. E para concessão da referida guarda, o
juiz observará à harmonia entre o casal separado, a vontade dos filhos, a moradia
dos pais, o diálogo e o respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, visando
sempre o melhor interesse dos filhos.
O exame da referida guarda, para que sua utilização se torne aceitável e de
correta aplicação, deve conter uma análise de seus prós e contras, pois, a princípio,
nada é perfeito ou de total inutilidade, com raras exceções, principalmente quando
se encontra em jogo o desenvolvimento da personalidade de um ser em constante
desenvolvimento.
Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos,
poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los,
pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na
função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento
de reparação civil.
Ocorrerá a perda da guarda quando os pais não cumprem seu papel,
desproporcionando ao filho os direitos fundamentais assegurados pela lei.
51
3 A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA
GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ
Neste capítulo abordar-se-á a possibilidade de reversão da guarda à
genitora após a ruptura do vínculo afetivo com o filho, analisando o superior
interesse da criança, os vínculos com os genitores e com a família substituta, os
critérios, responsabilidade, procedimentos para tal ato bem como o posicionamento
do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.
3.1 SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
Autores doravante mencionados tem-se que sob a ótica antropológica, a
família continua a ser a célula básica, o grande mediador cultural, a essencial matriz
biológica e afetiva para o desenvolvimento harmonioso da criança e a realização do
adulto. Contudo a mutação da família, a realidade social desta hodiernamente, e
principalmente quando a célula familiar se dissolve, enche de interrogações o
destino da criança, qual o seu lugar e qual o futuro da sua relação com os dois
progenitores. E sabe-se, quão importante é para o desenvolvimento harmonioso da
criança, para o seu normal crescimento afetivo, que esta se possa identificar com os
dois progenitores, nos seus comportamentos e nas relações que mantêm com cada
um deles.
Prevê o artigo 227, caput, da CRFB/88 que:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.181
181
ANGHER, Joyce Anne. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95
52
Na ótica do CC/02 em seu artigo 1.583, no caso de dissolução da sociedade
ou do vínculo conjugal pela separação extrajudicial ou judicial por consentimento
mútuo ou pelo divórcio direto consensual, serão observados o que os cônjuges
acordarem sobre a guarda de filhos. A expressão guarda de filhos constante do
dispositivo deve abarcar tanto a guarda unilateral quanto a compartilhada, sempre
atendido o melhor interesse da criança. Se não houver acordo entre os cônjuges, a
guarda deverá ser atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la (art.
1.584 do CC/02). Certamente a expressão “melhores condições” constitui uma
cláusula geral, uma janela aberta deixada pelo legislador para ser preenchida pelo
aplicador do direito caso a caso.182
A expressão "melhores condições" no exercício da guarda, na hipótese do
art. 1.584 do CC/02, significa ainda atender ao melhor interesse da criança.183
Acerca do tema, Waldyr Grisard Filho ensina que:
O objetivo da lei é proteger interesses de uma forma geral e abstrata,
convindo a um sem número de casos que cabem na hipótese legal.
De outra parte, existem interesses individuais e concretos sobre os
quais se procede a uma avaliação individualizada. É desses
interesses concretos que se cuida na determinação da guarda dos
filhos, sendo o juiz o intérprete dos particulares interesses materiais,
morais, emocionais, mentais e espirituais de filho menor, intervindo
segundo o princípio de que cada caso é um caso, o da máxima
singularidade. O interesse concreto do menor, buscando em seu
futuro, com o fim de protegê-lo e lograr seu desenvolvimento e sua
estabilidade, apto à formação equilibrada de sua personalidade.184
O princípio do melhor interesse da criança considere-se, também, do
adolescente, por força do próprio dispositivo constitucional. Representa importante
mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais em que deixa de ser
considerado objeto para ser alçado com absoluta justiça, ainda que tardiamente a
sujeito de direito, ou seja, à pessoa humana merecedora de tutela do ordenamento
jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da
família que ele participa.185
182
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1289
183
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1290
184
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. São Paulo: RT, 2002, p. 63
185
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 456
53
A aludida proteção é regulamentada pelo ECA, que considera criança a
pessoa com idade entre zero e doze anos incompletos, e adolescente aquele que
tem entre 12 e 18 anos de idade. 186
Em reforço, o artigo 3º do ECA prevê que a criança e o adolescente gozam de
todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, conforme o estabelecido
na carta maior, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-lhes, por lei ou por
outros meios, todas as oportunidades e as facilidades, a fim de facultar-lhes o
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade
e de dignidade. 187
Observa Marcos Alves da Silva:
[...] o ECA se constitui na consolidação legal de um novo
enquadramento jurídico da família, no qual a criança e o adolescente
passam a uma condição de protagonismo. O câmbio de perspectiva
da proteção do direito dos filhos, que se opera, é de tal ordem que a
lei garante à criança a tutela do Estado contra seus próprios pais,
para resguardar ou restabelecer direitos fundamentais.188
A criança e o adolescente são portadores de condição peculiar a merecer
tratamento diferenciado das outras pessoas. Tal tratamento deve ser ministrado não
para diminuí-los sob o prisma jurídico, mas sim para que eles possam ser
integralmente protegidos com objetivo de permitir o desenvolvimento físico, mental,
moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade, como é dever da
família, da Sociedade e do Estado, conforme o artigo 4º, do ECA.189
No exercício de exegese do estatuído no ECA assim dispõe o artigo 6º:
Art. 6 - [...] levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as
exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e
coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como
pessoas em desenvolvimento.190
186
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 2
187
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 6
188
SILVA, Marcos Alves da. apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A Nova Filiação: o
biodireito e as Relações Parentais. Renovar. Rio de Janeiro. 2003. p. 457
189
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 7
190
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 16
54
Sobre os princípios que norteiam a proteção à criança e ao adolescente,
tem-se a lição de João Batista Villela:
Nesse novo quadro de referências, o estalão geral que tudo
determina e orienta é o bem do menor. Portanto, enquanto as
prerrogativas dos pais, tutores, guardiões sofrem todas as limitações
que se revelem necessárias à preservação daquele valor, amplia-se
a liberdade do menor em benefício de seu fundamental direito de
chegar à condição adulta sob as melhores garantias materiais e
morais.191
Da mesma forma como já descrito no item 1.4, o artigo 23, caput, do ECA,
prioriza os interesses e valores existenciais em detrimento de valores patrimoniais,
ao prever que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo
suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar, em perfeita compatibilidade
com os valores e princípios constitucionais na valoração da pessoa em detrimento
do patrimônio.192
Há elementos concretos no bojo do ECA que permitem identificar e qualificar
o princípio do melhor interesse da criança não apenas como princípio geral, mas
também sob o formato de norma específica em determinados setores envolvendo a
criança. Assim, por exemplo, o artigo 45, § 2º, do ECA, prevê, que, em se tratando
de adolescente, há a necessidade do seu consentimento, não o dos pais ou
representantes legal do adotando, para que possa ser concedida sua adoção em
favor da pessoa nele interessada, numa demonstração clara e evidente a respeito
da importância da vontade do adolescente para fins de melhor preservar os seus
interesses no desenvolvimento da sua personalidade.193
No campo do planejamento familiar, logicamente que o princípio do melhor
interesse da criança ganha destaque, diante da priorização dos seus interesses e
direitos em detrimento dos interesses de seus pais, a impedir, assim, que a futura
criança venha a ser explorada economicamente ou fisicamente por estes.194
Como se pode perceber, no caso de dissolução da sociedade conjugal, a
culpa não mais influencia quanto à guarda de filhos, devendo ser aplicado o princípio
191
VILLELA, João Batista. apud TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; SÁ, Maria de Fátima Freire de.
Fundamentos principiológicos do estatuto da criança e do adolescente e do estatuto do idoso.
Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: IBDFAM: Síntese, v. 26. 2004, p. 27
192
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 30
193
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 84
194
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 462
55
que busca a proteção integral ou o melhor interesse do menor, conforme o
resguardo do manto constitucional.
3.2 VÍNCULOS COM AS FIGURAS MATERNA E PATERNA
A conjugação de ambos os papéis e a co-relação de seus efeitos são
capazes de revelar, na maioria das vezes, uma pessoa mais harmoniosa, preparada
para a integração social e o exercício natural e normal de suas potencialidades. 195
No contexto do mundo contemporâneo, com a inserção da mulher no
mercado
de
trabalho,
os
avanços
da
engenharia
genética,
os
métodos
contraceptivos e a ruptura da concepção patriarcal da família, foram rompidos os
paradigmas a que a família estava submissa: reprodução, casamento, sexo.
Atualmente, não há necessidade de haver casamento, ou mesmo dos filhos serem
biológicos, ou ainda, da presença do pai e da mãe para que possa se configurar
uma família. Diante dessa pluralidade do conceito de família, emprestou-se
juridicidade ao vínculo de afeto que enlaça as pessoas.
Gama destaca que juristas costumam dizer que os princípios constitucionais
são expressos ou tácitos. São tácitos quando emergem do sistema de normas e
valores constitucionais. O princípio da afetividade é fato jurídico-constitucional, pois
é espécie do princípio da dignidade humana. O afeto não é fruto da biologia, os
laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não do sangue. A
história do direito à filiação confunde-se com o destino do patrimônio familiar,
visceralmente ligado à consangüinidade legítima.196
Para que um filho verdadeiramente se torne filho, ele deve ser adotado pelos
pais, tendo ou não vínculos de sangue que os vinculem, visto que é insuficiente a
verdade biológica, pois a filiação é uma construção que abrange muito mais do que
uma semelhança entre os DNA. Impõe-se a distinção entre origem biológica e
paternidade/maternidade. Em outros termos, a filiação não é um determinismo
195
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. 2 ed. ver., atual. e ampl. por Carlos Alberto Bittar
Filho, Márcia Sguizzardi Bittar; revisão técnica Carla Bianca Bittar. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2006. p. 47
196
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482
56
biológico, ainda que seja da natureza humana o impulso à procriação. Na maioria
dos casos, a filiação deriva-se da relação biológica, todavia, ela emerge da
construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na
responsabilidade.197
A família recuperou a função que, por certo, esteve nas suas origens mais
remotas, a de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de vida. O
princípio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos biológicos e
adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, além do forte sentimento de
solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo prevalecimento de
interesses patrimoniais. É o salto, à frente, da pessoa humana nas relações
familiares.198
No estágio em que se encontram as relações familiares e o desenvolvimento
científico, tende-se a encontrar a harmonização entre o direito de personalidade ao
conhecimento da origem genética, até como necessidade de concretização do
direito à saúde e prevenção de doenças, e o direito à relação de parentesco,
fundado no princípio jurídico da afetividade. Uma vez que seus reflexos crescentes
vêm permeando todo o Direito, como por exemplo, a valorização dos laços de
afetividade e da convivência familiar oriundas da filiação, em detrimento, por vezes,
dos vínculos de consangüinidade. Alem disso, independente da sua origem e se são
biológicos ou não todos os filhos recebem o mesmo tratamento constitucional.199
A Constituição Federal no âmbito jurídico protege o afeto em três esferas, a
saber: como direito individual, como direito de certas categorias sociais e como
direito de todos contra todos. Ainda que a palavra "afeto" não conste na Lei Maior
como um direito fundamental, pode-se dizer que este decorre da valorização do
princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III CRFB/88) e merece
ser visto como uma realidade digna de tutela.200
Assim comenta Barros sobre o afeto e o direito individual:
197
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família.
Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 183
198
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 499
199
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família.
Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 184
200
DIAS, Maria Berenice. Família, ética e afeto. Maria Berenice. Disponível em:
<http://www.mariaberenice.com.br/site/content.php?cont_id=497&isPopUp=true>. Acesso em: 06 mai.
2009.
57
O direito ao afeto é a liberdade de afeiçoar-se um indivíduo a outro.
O afeto ou afeição constitui, pois, um direito individual: uma
liberdade, que o Estado deve assegurar a cada indivíduo, sem
discriminações, senão as mínimas necessárias ao bem comum de
todos.201
Observa Paulo Luiz Netto Lôbo:
[...] o princípio da afetividade tem fundamento constitucional; [...].
projetou-se, no campo jurídico-constitucional, a afirmação da
natureza da família como grupo social fundado essencialmente nos
laços de afetividade.202
Neste sentido, formando-se uma família que respeite a dignidade de seus
membros, a igualdade nas relações entre eles, a liberdade necessária ao
crescimento individual e a prevalência das relações de afeto entre todos, ao
operador jurídico resta acatar e reconhecer os fatos humanos.203
Dispõe Jacob Dolinger:
[...] não há direito [...] sem a tolerância pelo outro e sem o respeito
pelo que é do outro, não há vida individual em paz com o universo
[...] sem a compreensão pelas necessidades do coletivo e de cada
membro da coletividade.204
Se a organização da sociedade não assegurar à família condições básicas
de existência, o Estado cumprindo o dever de assistir a família na pessoa dos seus
integrantes está obrigado a suprir essa carência, sobretudo para a criança, o
adolescente e o idoso. Todas essas dimensões do afeto devem ser conjugadas por
um valor maior: a dignidade humana, que é o critério pelo qual a Constituição
proporciona a proteção dos interesses individuais em sua interação com os deveres
sociais, categoriais e difusos.205
O direito não tem o poder de criar afetividade. Sentimentos naturais não
decorrem de legislações, mas da vivência cotidiana informada pelo respeito, diálogo
201
BARROS, Sérgio Resende de. O direito ao afeto. Artigo. Publicação: Del Rey Revista Jurídica.
Editora Del Rey, Belo Horizonte - MG, n. 8, ano IV. 2002. p. 35. SR Barros. Disponível em:
<http://www.srbarros.com.br/artigos.php?TextID=36>, Acesso em: 13 mai. 2009.
202
NETTO LÔBO, Paulo Luiz apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O
Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 389
203
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 390
204
DOLINGER, Jacob apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e
as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 390
205
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 135
58
e compreensão. Esse amálgama dos laços familiares é representado pela
afetividade.206
A afetividade é traduzida no respeito de cada um por si e por todos os
membros, a fim de que a família seja respeitada em sua dignidade e honorabilidade
perante o corpo social é, sem dúvida nenhuma, uma das maiores características da
família atual. Seus integrantes não obstante a intensa liberdade com que mantêm
seus relacionamentos, buscam cada dia mais o fortalecimento da reciprocidade dos
seus sentimentos.
3.3 FAMÍLIA SUBSTITUTA
Todo indivíduo possui uma família, independente de ser ela a desejável ou
não. A importância da família na vida do ser humano é indizível, vez que é a partir
dela que o 'homem' adquire os seus primeiros conceitos que formarão, ao longo do
tempo, as pilastras de seu caráter, servindo de orientação para os inúmeros
caminhos que a vida imporá durante sua trajetória.
Reconhece a Carta Magna em seu artigo 226 à importância suprema da
família que é por sua vez base da sociedade, que tem especial proteção do Estado,
uma sociedade natural por excelência, que alimenta, protege e educa o homem,
desde o nascimento e dá origem a todas as demais formas de sociedade integradas
pelos seres humanos.207
Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente que a colocação de menor
em família substituta será feita de forma excepcional, só mesmo quando estiverem
sido esgotadas todas as vias possíveis de permanência com a família natural é que
se coloca em prática as disposições relativas à família substituta a que se refere o
artigo 19 do ECA e o artigo 25 da mesma lei sobre família natural, a saber:
Art. 19 - Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família
206
OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002. p. 233
207
AZAMBUJA, Darcy apud GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme
o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2005. p. 11
59
substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em
ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias
entorpecentes.
Art. 25 Entende-se por família natural a comunidade formada pelos
pais ou qualquer deles e seus descendentes.208
Conforme observam Cury, Garrido E Marçura “a colocação em família
substituta é medida de proteção destinada a crianças e adolescentes cujos direitos
fundamentais forem ameaçados ou violados, prevista no artigo 101, VIII, do ECA”.209
Nesse contexto, não estando à criança e o adolescente em sua família
natural estará ele assim em uma família substituta podendo se constituir mediante
guarda, tutela e adoção.210
Assim defini Guimarães sob a ótica de consagrados doutrinadores o que
vem a ser esses três institutos, guarda, tutela e adoção:
A guarda é instituto destinado á proteção dos menores de 18 anos
(limite de idade em que cessa o poder familiar), pelo qual alguém
assume seus cuidados, na impossibilidade dos próprios pais fazê-lo
[...], conseqüentemente, o encargo de prestar-lhe assistência
material, moral e educacional, será do guardião.
A tutela, [...], é o conjunto de poderes e encargos conferidos pela lei
a um terceiro, para que zele pela pessoa de um menor que se
encontra fora do poder familiar, e lhe administre os bens, tratando-se
de um instituto de nítido caráter assistencial, com objetivo de
substituir o poder familiar.
A adoção [...], é o ato jurídico solene pelo qual, observados os
requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de
qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo
fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho,
pessoa que, geralmente, lhe é estranha.211
Família substituta é aquela que se propõe trazer para dentro dos umbrais da
própria casa, uma criança ou um adolescente que por qualquer circunstância foi
desprovido da família natural, para que faça parte integrante dela, e nela se
desenvolva, dispensando-lhe tudo de que precisa, sobretudo, amor. Em se tratando
de adoção, passará a ter todos os direitos e deveres do filho de sangue. Até porque,
208
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007.. p. 24 e 45
209
CURY, GARRIDO E MARÇURA apud Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o
estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 2005. p. 12
210
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 32
211
GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2005. p. 15, 25 e 31
60
tanto a Guarda como a Tutela podem ser revogadas, mas a Adoção é para
sempre.212
O ECA trata da Família Substituta em seus artigos 28 a 32 e 165 a 170.
Esta, como o nome já a define, consiste em uma célula familiar que substituirá a
família original, ou melhor, os benefícios que uma família deveria estar
proporcionando ao menor, lhe oferecendo educação, lazer, alimentação, segurança,
enfim, todo o bem-estar geral da criança e do adolescente, evitando assim, a
internação do menor.213
O menor é o centro das discussões, desta feita, a sua opinião deve merecer
todo o valor e consideração possível, ressalvado os casos de impossibilidade
mental, de discernimento, ou outro impedimento. Note-se também que o grau de
parentesco e a presença de afetividade junto à criança podem atenuar as
conseqüências decorrentes da medida, conforme o disposto no artigo 28 do ECA:
Art. 28 - A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda,
tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança
ou adolescente, nos termos da lei.
§ 1º Sempre que possível, a criança ou adolescente deverá ser
previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada.
§ 2º Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de
parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, a fim de evitar
ou minorar as conseqüências decorrentes da medida.214
A família substituta deverá estar habilitada a oferecer os requisitos inerentes
de uma célula familiar, isto é, a família acolhedora do menor deve estar
fraternalmente unida e em condições de recepcionar este novo pequeno membro, de
modo que não venha, por falha organizacional e administrativa familiar, ter que
transferir o menor a entidades públicas ou privadas, exceto se por autorização
judicial.215
A família substituta pode ser provisória, em casos como o da Guarda,
temporária como na Tutela, ou definitiva, como na Adoção. É a recomposição de
uma família a um abandonado, a um menor órfão, que passará a ser cuidado por
212
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 533
213
GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2005. p. 12
214
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 49
215
TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36
61
uma família que o queira, inclusive estrangeira, desde que tenha autorização judicial
para isto; ou por um parente do menor.216
A família substituta também pode ser estrangeira, conforme menciona o
artigo 31 do ECA:
Art. 31 - A colocação em família substituta estrangeira constitui
medida excepcional, somente admissível na modalidade de
adoção.217
A família substituta estrangeira, que reside no Brasil, será tratada como se
brasileira fosse, dado ao direito constitucional isonômico do art. 5º da Constituição
Cidadã vigente. Todavia, os residentes fora do país perdem sua preferência perante
a família substituta brasileira, e só podem adotar crianças abandonadas. Os tutores
e guardiões, que devem ser brasileiros, deverão prestar compromisso de bem
executar suas funções, mediante termo nos autos.218
Dar uma família à criança, Prioridade Absoluta, é um ato de grandeza
imensurável, é demonstração de desprendimento, capacidade de repartir e se doar.
3.3.1 Critérios
O que se torna importante mencionar é que crianças e adolescentes devem
sempre ter tratamento prioritário e proteção especial da família, sociedade e do
Estado. Sendo que devem ser observadas todas as suas garantias estando elas no
seio de sua família, em instituição ou até mesmo em família substituta.
Sendo assim, ao assumir a posição de substituta, a família que receber esta
criança ou adolescente em seu lar assumirá todos os deveres e direitos inerentes
àquela família original. Os deveres previstos no artigo 227 da CF expostos no item
1.4 e repetidos no artigo 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente.219
216
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 49 e 51
217
TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36
218
TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 37
219
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 535
62
Salutar ressaltar também aqui, o preceito dos parágrafos do artigo 28 do
ECA ora transcritos na p. 79.
O ECA dispôs critérios para a colocação em família substituta, nesse
sentido, dois critérios são mencionados:
1º o grau de parentesco: os parentes próximos ao menor devem, de
certo modo, possuir prioridade como no caso de irmãos, tios, avós;
2º verificada a impossibilidade destes (por exemplo, em decorrência
de comportamento inadequado, como o alcoolismo etc., seguindo-se
o parâmetro estipulado pelo artigo 29 infra), devem-se buscar
pessoas com afinidade ou afetividade.220
Por afinidade, deve-se entender, por exemplo, as pessoas que possuem
bom relacionamento e facilidade com a criança e o adolescente. Por afetividade,
entende-se o comportamento sentimental e amoroso das pessoas com a criança e o
adolescente. Na hipótese de incompatibilidade dessas pessoas, é necessário então
buscar outras pessoas aptas à responsabilidade legal. No caso de adoção, o
cadastro de inscritos da Vara da Infância e da Juventude.221
A colocação em família substituta far-se-á, como já dito, mediante guarda,
tutela ou adoção. O interessado em receber um menor sob qualquer uma destas três
formas de colocações deverá apresentar como requisitos os estipulados no artigo
165 do ECA, assim descrito:
Art. 165 - São requisitos para a concessão de pedidos de colocação
em família substituta:
I - qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou
companheiro, com expressa anuência deste;
II - indicação de eventual parentesco do requerente e de seu
cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente,
especificando se tem ou não parente vivo;
III - qualificação completa da criança ou adolescente e de seus pais,
se conhecidos;
IV - indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando, se
possível, uma cópia da respectiva certidão;
V - declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos
relativos à criança ou ao adolescente.
Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-ão também
os requisitos específicos.222
220
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 50
221
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 559
222
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 277
63
Por outro lado, em relação aos filhos, além de preencherem os requisitos,
estas famílias também assumem alguns dos direitos e deveres impostos à família
natural, dispostos no CC/02, que são:
Art. 1634 - [...]
I – dirigir-lhes a criação e educação;
II – tê-los em sua companhia e guarda;
III – conceder-lhes ou negar-lhes o consentimento para casar;
IV – nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o
outro dos pais não sobreviver, ou, sobrevivo, não puder exercer o
poder familiar;
V – representá-los, ate os 16 anos, nos atos da vida civil e
assistindo-lhes após esta idade nos atos em que forem partes,
suprindo-lhes o consentimento;
VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os próprios de
sua idade e condição.223
É certo que, estes efeitos sobre a ingerência na vida da criança ou
adolescente, serão maiores ou menores a depender do tipo de colocação em família
substituta (eventual, transitória e permanente). Assim, por exemplo, nos casos de
adoção, que possuem caráter permanente, a família substituta assumirá a totalidade
de direitos desta, conforme artigo 1.634 do CC/02 exposto alhures.224
No entanto, se assume temporariamente a posição de família substituta,
também restrito estarão os direitos que irá exercer. Assim, se posta uma criança ou
adolescente sob a guarda de uma família, poderá esta exercer todos os direitos que
não importarem maior disposição alem da própria assistência material e moral e a
educação dos pupilos.225
É imprescindível que a família candidata a substituta passe por um estudo
social, ou seja, por psicólogos, assistentes sociais e todos os auxiliares de que a
Justiça dispõe, indagando junto à vizinhança da pretensa família guardiã, adotante
ou tutora, sobre suas condições de desempenharem suas funções de substituta de
forma eficaz. Alem de que, deve-se analisar a relação da Criança ou Adolescente
com seus guardiões, conforme o disposto nos artigos do ECA a seguir esposados:
223
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1336
224
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1336 e 1337
225
GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e
do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005.
p. 16
64
Art. 167 - A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das
partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo
social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo
sobre a concessão de guarda provisória, bem como, no caso de
adoção, sobre o estágio de convivência.
Art. 168 - Apresentado o relatório social ou o laudo pericial, e ouvida,
sempre que possível, a criança ou o adolescente, dar-se-á vista dos
autos ao Ministério Público, pelo prazo de cinco dias, decidindo a
autoridade judiciária em igual prazo.
Art. 169 - Nas hipóteses em que a destituição da tutela, a perda ou a
suspensão do pátrio poder constituir pressuposto lógico da medida
principal de colocação em família substituta, será observado o
procedimento contraditório previsto nas Seções II e III deste Capítulo.
Parágrafo único. A perda ou a modificação da guarda poderá ser
decretada nos mesmos autos do procedimento, observado o disposto
no art. 35.226
O art. 30 do ECA diz que as obrigações decorrentes da guarda, da tutela ou
adoção são indelegáveis e irrenunciáveis. Observa-se que embora estas obrigações
sejam irrenunciáveis e indelegáveis, a guarda e a tutela não o são, o que significa
que a qualquer tempo pode o guardião ou tutores renunciar ao exercício da guarda
ou da tutela, desde que renuncie expressamente ou, no caso da tutela, escusar-se
de logo. Do contrário, responderam pelo encargo destes institutos, não podendo
nem mesmo delegar à terceiros ou instituições os cuidados com estas crianças ou
adolescentes, sem autorização judicial.227
Estas medidas servem para impedir que a criança ou adolescente, seja
tratado com displicência, sendo deslocado ou removido a todo tempo por interesse
dos adultos, sem que possa encontrar a estabilidade e os vínculos que já foram
rompidos com sua família natural, e que são os principais objetivos para que seja
posto em família substituta. Estas rupturas são sempre bastante traumáticas e
dolorosas, e sua repetição pode ser deletéria pra o desenvolvimento da pessoa.228
Há
também
requisitos
quanto
à
pessoa
do
adotante,
como
os
regulamentados pelo CC/02, a saber:
Art. 1618/02 - Só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar.
Parágrafo único. A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros
poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado
dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da família.
226
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 282, 283 e 284
227
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev.
ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36
228
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 51
65
Art. 1619/02 - O adotante há de ser pelo menos dezesseis anos mais
velho que o adotado.229
O ECA prevê em seu artigo 42 e §§ os requisitos do adotante onde a idade
mínima para adotar é de 21 anos, mas, por força do artigo 1618 do CC/02 supra
citado, tal limite de idade foi alterado para 18 anos, em coerência com a diminuição
da idade para fins de maioridade civil, admitindo, inclusive, que se se tratar de
adoção conjunta tal limite mínimo de idade somente deve existir em relação a um
dos cônjuges (ou companheiros), não ambos.230
Quanto à pessoa do adotando, apenas se poderá admitir adoção que
constitua um real benefício, seja ele material ou moral (pessoal, afetivo, por
exemplo), para o adotando, visto que não há adoção intuitu personae, pois o
magistrado é quem terá o poder-dever de optar pela família substituta adequada e
não os pais ou representante da criança a ser adotada e muito menos os
adotantes.231
Neste mesmo norte se posiciona o ECA em seu artigo 43, a saber:
Art. 43 - A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens
para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.232
Conforme o disposto no artigo 46 do ECA, in verbis:
Art. 46 - A adoção será precedida de estágio de convivência com a
criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar,
observadas as peculiaridades do caso.
§ 1º O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando
não tiver mais de um ano de idade ou se, qualquer que seja a sua
idade, já estiver na companhia do adotante durante tempo suficiente
para se poder avaliar a convivência da constituição do vínculo.
§ 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado
fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território
nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois
anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de
adotando acima de dois anos.
O Poder Judiciário é quem analisará a conveniência ou não, para o
adotando, e os motivos em que se funda a pretensão dos adotantes, ouvido, sempre
229
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1323 e 1324
230
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 561
231
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1323-1328
232
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 82
66
que possível, o adotando, levando em conta o parecer do Ministério Público. Daí a
importância do estágio de convivência alhures, para melhor avaliação do grau de
afetividade e adaptabilidade do adotando, em relação ao futuro adotante e aos
benefícios que da adoção poderiam advir para sua formação físico-psíquica.233
Estas medidas serão tomadas para tentar proporcionar à criança ou
adolescente uma vida familiar, compatível com suas necessidades e direitos,
sobrepesando os interesses da criança em detrimento ao dos adultos. Algumas
regras devem ser observadas para que se destitua o poder familiar dos pais e que
os seus filhos sejam colocados em família substituta nacional ou internacional.
3.3.2 Responsabilidade
O responsável legal, ao assumir a guarda ou a tutela, deverá prestar
compromisso, visando ter ciência da responsabilidade assumida. Neste talante, insta
aferir que os pais, tutores ou curadores, respondem pelos danos causados por
aqueles que estiverem sob sua guarda, independente de culpa.234
Saliente-se que a responsabilidade do pai, desenvolve-se da mesma
maneira que a do tutor, bem como a do curador, pois derivam das funções por eles
exercidas, haja vista que a responsabilidade está baseada na culpa in vigilando, que
decorre da falta de atenção ou cuidado com o procedimento de outrem que está sob
a Guarda ou responsabilidade do agente.235
Conforme leciona Paulo Antônio Begalli, tem-se:
[...] em primeiro plano, é imposta aos pais a obrigação precípua da
criação e educação dos filhos, prestando-lhes assistência contínua,
não só material como também moral, propiciando-lhes ensinamentos
condizentes com os bons costumes, amoldando-os aos princípios
básicos da boa moral, proporcionando-lhes lições e diretrizes
233
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 89
234
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 59
235
BEGALLI, Paulo Antônio. Responsabilidade Civil dos pais por atos de filhos menores. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p. 88
67
suficientes para se imbuírem da verdadeira noção de
responsabilidade e assumirem postura digna perante a sociedade.236
Verifica-se ainda que, a inadimplência para com os deveres inerentes ao
poder familiar, como visto no primeiro capítulo, pode resultar em conseqüências não
apenas na esfera cível, mas também causar reflexos no âmbito penal, conforme
expressa a tipicidade do artigo 244 do Código Penal:
Art. 244 - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do
cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o
trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos,
não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao
pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou
majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou
ascendente, gravemente enfermo:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, de uma a dez
vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente,
frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono
injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão
alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.237
Dispõe os artigos 1.740 a 1752 do CC/02, sobre os deveres do tutor com
relação ao menor tutelado.238
Concedida à guarda ou tutela, o responsável deve prestar o compromisso de
que trata o artigo 32 do ECA, e, deferida a adoção, expedir-se-á o mandado de
inscrição e cancelamento, previsto no artigo 47 da mesma codificação:
Art. 32 - Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará
compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante
termo nos autos.
Art. 47 - O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que
será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se
fornecerá certidão.
§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem
como o nome de seus ascendentes.239
A inscrição de que se reproduz em tela do dispositivo, constitui o novo
registro de nascimento do adotado, como se fora a primeira vez, cancelando-se a
anterior. Com efeito, para a plena integração do adotado na família do adotante, não
236
BEGALLI, Paulo Antônio. Responsabilidade Civil dos pais por atos de filhos menores. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p. 90
237
ANGHER, Anne Joyce. Código Penal. Vade Mecum. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 459
238
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1425-1432
239
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 53 e 90
68
seria suficiente a atribuição da situação de filho ao primeiro, mas era necessário
também que houvesse mudança na identidade da pessoa adotada, sob pena dos
laços anteriores persistirem, ainda que apenas a título formal no nome do
adotado.240
3.3.3 Vínculo sócio-afetivo
A filiação sócio-afetiva nada mais é que o relacionamento entre adotante e
adotado. Assemelha-se a relação dos pais com seu filho, sob o ponto de vista das
relações sociais e emocionais. Se um homem, mesmo sabendo não ser o genitor de
criança ou adolescente, trata-o como se fosse seu filho, torna-se pai dele. Do
mesmo modo, a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho durante
algum tempo. 241
Segundo Paulo Luiz Netto Lobo:
Pai é o que cria. Genitor é o que gera. Esses conceitos estiveram
reunidos, enquanto houve primazia da função biológica da família.
[...] Hoje, a paternidade é muito mais que o provimento de alimentos
ou a causa de partilha de bens hereditários. Envolve a constituição
de valores e da singularidade da pessoa e de sua dignidade humana,
adquiridos principalmente na convivência familiar durante a infância e
a adolescência. A paternidade é múnus, direito-dever, construída na
relação afetiva e que assume os deveres de realização dos direitos
fundamentais da pessoa em formação [...] (art. 227 da Constituição).
É pai quem assumiu esses deveres, ainda que não seja o genitor.242
A finalidade da família é a concretização, e a fundação do amor e dos
interesses afetivos entre seus membros, pois o afeto, não é fruto somente de origem
biológica, mas sim é fruto também de um processo de adoção.243
240
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 614
241
OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos constitucionais do direito de família. São Paulo:
Revistas dos Tribunais LTDA, 2002. p. 256
242
NETTO LÔBO, Paulo Luiz apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O
Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482
243
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 497
69
No instituto da adoção, o fator afetividade está intimamente ligado a filiação,
pois a intensidade das relações que unem pais e filhos, independente da origem
genética 244
Pais são aqueles que amam e dedicam sua vida aos filhos e dão a eles
afeto, atenção, conforto, carinho, enfim, um porto seguro, cujo vínculo nem a lei e
nem o sangue garantem. É dizer, no fundamento do estado de filho afetivo que é
possível encontrar a genuína paternidade, que reside antes no serviço e no amor do
que na procriação.245
É a chamada filiação sócio-afetiva, cujo interesse é a preservação da
estrutura familiar, independente da origem, pois são as relações familiares, envoltas
por laços afetivos, que merecem e necessitam de proteção especial do Estado (art.
226 da CF).
3.4 REVERSÃO DA GUARDA
A guarda como esposado alhures no 2º Capítulo item 2.2 é o poder de
resguardar, manter em vigilância, no exercício da custódia, a criança ou
adolescente, e ainda, quando criança, de representá-lo, e se for adolescente assistilo; esse é o conceito de guarda em sentido jurídico.246
Em relação à guarda dos filhos, em qualquer momento pode o Juiz ser
chamado a revisar a decisão atento ao sistema legal, contudo, o que prepondera é o
melhor interesse dos filhos e não os dos pais como exposto no Segundo Capítulo
item 2.8 artigo 35 do ECA.247
O objetivo da lei é proteger interesses de uma forma geral e abstrata. De
outra parte, existem interesses individuais e concretos sobre os quais se procede a
uma avaliação individualizada. É desses interesses concretos que se cuida na
determinação da guarda dos filhos, sendo o juiz o intérprete dos particulares
244
FACHIN, Luiz Edson apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito
e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482
245
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 483
246
SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 43
247
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 60
70
interesses materiais, morais, emocionais, mentais e espirituais de filho menor,
intervindo segundo o princípio de que cada caso é um caso, o da máxima
singularidade. O interesse concreto do menor, buscando em seu futuro, com o fim
de protegê-lo e lograr seu desenvolvimento e sua estabilidade, apto à formação
equilibrada de sua personalidade, é critério da decisão do juiz.248
Não é demais relembrar nesta oportunidade o que preleciona Sílvio de Salvo
Venosa acerca do tema, "o juiz deverá procurar a solução prevalente que melhor se
adapte ao menor, sem olvidar-se dos sentimentos e direitos dos pais".249
Arnaldo Rizzardo, a propósito, averba:
Sabe-se que a guarda deve ter em mira o interesse dos filhos, o que
vem repetido diuturnamente pelos pretórios. Mudando-se
determinada situação, torna-se viável a modificação de determinado
quadro. Daí o axioma jurídico de que as disposições sobre a guarda
não transitam em julgado. Alterando-se as circunstâncias vigentes
quando da outorga da guarda, propicia-se a mudança das cláusulas
sobre a guarda.250
A alteração da guarda ou seu cancelamento é medida judicial que deve ser
levada com extrema cautela. São numerosos os casos em que os guardiões estão
com o menor por vários anos e repentinamente os genitores biológicos desejam o
mesmo de volta. Nesse caso, o laudo do Setor Técnico é de extrema valia para
subsidiar o parecer do Promotor, bem como a decisão do Magistrado, o referido
laudo encontra respaldo legal no artigo 167, a sim disposto:
Art. 167 - A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das
partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo
social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo
sobre a concessão da guarda provisória, bem como, no caso de
adoção, sobre o estágio de convivência.251
Ishida ao comentar um julgado (Apelação Cível nº 18.167-0/8-São José dos
Campos-Rel. Dês. Sabino Neto 11-11-93. Ementa Laços entre adotados e família substitutaInviabilidade de rompimento) sobre a manutenção da guarda ao casal que está há
quatro anos com a menor, afirma o seguinte:
248
GRISARD, Waldyr Filho. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental, São Paulo: RT, 2002. p. 63 e 64
249
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito de Família. v. VI. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.
228
250
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n. 10.406, de 10.01.2002. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. p. 266
251
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61 e 282
71
[...], depois de permanecer quatro anos sob a guarda do casal
requerente, é natural o estabelecimento de laços afetivos e a
adaptação do menor à família substituta. A quebra desses laços
afetivos, de um momento para o outro, poderá acarretar sérios
prejuízos ao desenvolvimento biopsíquico da criança, agravada pela
falta de estrutura pessoal e emocional de quem deveria recebê-la.252
Salutar ressaltar o que já foi exposto por sobre a respeito da família
substituta abordado no subitem 3.3 que, em tema de colocação de menores em
família substituta, da qual a guarda é uma das espécies, o bem estar da criança
deve sempre preponderar.253
Dos ensinamentos colhidos do ilustre doutrinador Válter Kenji Ishida tem-se
que, a manutenção do menor no local onde está bem, de regra, deve ser mantido.
Cuja troca do meio ambiente onde está vivendo deve ser evitada o quanto possível,
para não causar prejuízo à criança.254
A possibilidade do retorno do menor ao convívio dos genitores, é da própria
precariedade da guarda permitir ou, ao menos o direito de visita.255
É valido lembrar aqui a teoria de Maria Helena Diniz que foi exposta no item
1.4, onde ela explana que a suspensão temporária do exercício do poder familiar é
uma sanção imposta aos genitores que visa preservar o melhor interesse do filho
menor, que nada obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder
familiar e, por conseguinte a guarda, uma vez cessando os motivos geradores da
suspensão.256
Neste mesmo diapasão segue os ensinamentos de Gonçalves esposados no
mesmo item 1.4: “a perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer
que seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, [...],
desde que comprovem a cessação das causas que a determinaram”, desde norte, o
poder retornando para os genitores, com este retorna o dever de guarda inerente ao
poder familiar.257
252
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61
253
TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005. p. 133
254
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 62
255
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 63
256
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
1340
257
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva,
2007. p. 380
72
Desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do poder familiar,
onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a possibilidade dessa
guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o pedido da possível
reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em detrimento dos
interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o adolescente e não menos
importante de considerar o vínculo criado entre o menor e seu guardião.
3.5 REVERSÃO DA GUARDA: POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL DO TJ/SC
Como já exposto alhures no item 3.4, é da própria natureza precária da
guarda permitir o retorno ao convívio dos genitores ou, a eles dar o direito de visita.
Nesse sentido, expõe-se a jurisprudência colhida:
MENOR. PODER FAMILIAR. DIREITO DE VISITAS. DESTITUIÇÃO
EM DETRIMENTO DA GERATRIZ. CC, ART. 1.638, I E II E
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, ART. 24.
PRESSUPOSTOS INTEGRADOS. SENTENÇA INCENSURÁVEL.
RECLAMO APELATÓRIO DESPROVIDO. Presentes as situações
apontadas no art. 1.638, I e II, do CC/02 e no art. 24 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, revelando os autos não apresentar a mãe
biológica condições de exercer, de forma responsável e adequada,
dada a exposição do filho de tenra idade a riscos reprováveis,
descumprindo reiteradamente os deveres inerentes ao poder familiar,
a sua destituição desse poder é solução que atende, não apenas os
interesses da justiça e da sociedade, mas, principalmente, do próprio
infante.258
Colheu-se do ilustre acórdão o seguinte relato: que a mãe do menor é
atendida pelo Programa de Atendimento Social - PAS, sendo que, estando ela e o
menor habitando um prédio abandonado, sem emprego e condições de sustento,
foram encaminhados a uma Pensão, custeados pelo Município, visando para ambos
uma melhor situação social, inclusive tendo a criança sido matriculada na creche e a
mãe empregada. Todavia, foi constatado em outubro de 2004, haver a demandada
abandonado seu emprego, e deixando o menor em abandono. Diante da gravidade
da situação em que o menor se encontrava, em 31-1-05 houve a intervenção do
258
TJSC. Acórdão: Apelação Cível n. 2006.032368-3, de Jaraguá do Sul-Relator: Des. Trindade dos
Santos-28/01/2008. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 06 mai.
2009.
73
Conselho Tutelar, com o recolhimento do menor ao Abrigo Municipal, restando
evidenciada a negligência da requerida. A Dra. Promotora de Justiça Postulou, com
supedâneo nos artigos 24 e 129, incisos IX e X do ECA e no artigo 1638, incisos I e
II do CC/02, em sede preliminar, a suspensão do poder familiar e do direito de visitas
da mãe para, ao final, ser reconhecida a procedência do pedido, com a destituição
da mesma do poder familiar em relação ao menor R.V.T. da C. O juízo 'a quo'
deferiu a liminar. A respeito averba Wilson Donizeti Liberati:
Assim como a perda da guarda e a destituição da tutela, a
suspensão ou a destituição do poder familiar é medida aplicada aos
pais ou responsável que permitem ou contribuem para a ocorrência
de situação de risco pessoal de seus filhos ou pupilos (ob. cit. p. 131)
Sustentou o órgão ministerial, a respeito, serem flagrantes a negligência e o
abandono da apelante em relação ao menor R.V.T. da C., embasando as
postulações deduzidas e, ao final, acolhidas no artigo 1.638, incisos I e II do CC/02 e
no artigo 24 do ECA. O histórico de vida da ré, todavia, como bem anotado pela
ilustre representante do Ministério Público na comarca, evidencia um ciclo de
abandono e vitimização do menor, pelo qual, o comando sentencial impõe-se
mantido! É que, nos autos restou cabalmente comprovado o abandono da criança
pela mãe, assim como a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes,
incidindo ela nas causas da perda do poder familiar previstas no artigo 1.638, incisos
II e III do CC/02 e no artigo 22 do ECA.
No mesmo sentido, mas diante de um caso concreto específico, tem-se a
seguinte decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVERSÃO DE
GUARDA. INTERESSE E VONTADE DO MENOR. PREVALÊNCIA.
GENITORES COM DISTÚRBIOS EMOCIONAIS E INSTABILIDADE
NO RELACIONAMENTO. DECISÃO PROVISÓRIA MANTIDA ATÉ
DECISÃO DE MÉRITO. RECURSO NÃO PROVIDO. A guarda de
menor pressupõe diligência e responsabilidade no trato com a
criança. Evidenciado nos autos, ainda que perfunctoriamente, que os
pais da menor, por distúrbios emocionais e instabilidade no
relacionamento, não possuem condições, pelo menos momentâneas,
de permanecerem com a guarda da filha, a decisão monocrática que
defere a guarda provisória aos tios mostra-se incensurável.
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação
unânime, negar provimento ao agravo.259
259
TJSC. Acórdão: Agravo de Instrumento processo: 2004.019513-3. Relator: Carlos Prudêncio.
Data: 23/08/2005. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 26 mai.
2009.
74
Assim estão os relatos extraídos da exordial: M.M. da S. e J.P. ajuizaram
agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra a decisão do MM.
Juiz de Direito da comarca de Correia Pinto que, nos autos da ação de reversão de
guarda ajuizada por J.A.P. e L.L.P., deferiu provisoriamente a liminar, determinou a
busca e modificou a guarda da menor L.S.P., destinando-a aos tios, ora agravados.
Constatou-se, por meio de avaliação realizada pela psicóloga, que os agravantes
apresentam distúrbios emocionais, não possuindo, inclusive, estabilidade alguma no
relacionamento, sendo que a agravante, mãe da menor, já esteve internada diversas
vezes com depressão. Além disso, nesse mesmo exame psicológico, foram colhidos
relatos nos quais a infante declarou que: "a mãe me bate com tudo: de chinelo, de
cinta, de mão e de vara [...] eu quero voltar a morar na outra casa com o outro pai e
a outra mãe". Assim sendo, pelos dados apresentados, bem como o laudo médico
em anexo, há fortes indícios de que a mãe, ora agravante, não está apta e não tem
condições de criar, orientar e educar a menor. Há também nos autos registro de
denúncia ao Conselho Tutelar, na cidade de Ponte Alta, feita pelos avós, informando
que sua neta estava sofrendo maus-tratos pela mãe, ora agravante, M.M. da S.,
salientando que estiveram na residência da infante e encontraram-na descalça e
suja, na casa da vizinha, no frio, enquanto a mãe dormia com a casa toda fechada.
A mesma decisão levou em consideração o dever de atentar à regra
insculpida no artigo 17 do ECA:
O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física,
psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a
preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores
idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.260
Em conformidade com a absoluta prioridade dos interesses da criança,
existindo nos autos de ação de modificação de guarda provas sobre a má conduta
dos agravantes M.M. da S. e J.P., durante a convivência com a menor, ainda mais
com o estudo social desfavorável nesse sentido, não se revela aconselhável, no
momento, a modificação da respeitável decisão do juízo a quo, que modificou a
guarda da infante, destinando-as aos tios, ora agravados, J. A. P. e L. L. P.
Ademais, colhe-se dos autos e da decisão do Magistrado de primeiro grau, em
contato direto com a realidade das partes, que a situação da menor estava em risco
260
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed.
atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 37.
75
caso mantida a guarda com os agravantes, sendo de salutar justiça manter-se a
guarda com os agravados até decisão final de mérito.
Apesar de haver um restrito número de jurisprudências catarinenses a esse
respeito, colaciona-se a decisão a seguir, com destaque para o fato de a faixa etária
dos guardiões terem sido analisadas como um dos elementos essenciais à
concessão da guarda tendo em vista, como sempre, o melhor interesse do menor.
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA
PROPOSTA PELA MÃE EM DESFAVOR DOS AVÓS PATERNOS ARGÜIÇÃO DE MELHORIA DE SUA CONDIÇÃO SÓCIOECONÔMICA E A ELEVADA FAIXA ETÁRIA DOS AVÓS PARA
SUPORTAR O ENCARGO - MENOR PORTADOR DE
NECESSIDADES ESPECIAIS - ADAPTAÇÃO À FAMÍLIA
SUBSTITUTA - PROGRESSO DE SEU ESTADO FÍSICO E MENTAL
- ALTERAÇÃO DA GUARDA QUE PODE TRAZER O RISCO DE
FRUSTRAÇÃO DA RECUPERAÇÃO DO ADOLESCENTE MANUTENÇÃO DA GUARDA COM OS AVÓS PATERNOS SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Os estudos
sociais elaborados e as provas testemunhais coligidas são uníssonas
em demonstrar a perfeita adaptação do adolescente com os seus
avós paternos e ao ambiente da unidade da APAE em que se realiza
o seu tratamento. Deste modo, retirar abruptamente o menor da
família substitutiva com quem convive há mais de 10 (dez) anos,
além de transferi-lo para outra unidade de tratamento, seria no
mínimo temerário, diante das particularidades do caso, em que pese
as boas e nobres intenções da genitora com a formulação de seu
pleito.261 ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por
votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Destaca-se o seguinte relatório da jurisprudência por sobre exposta: a
genitora ora apelante, possui dois filhos menores de idade, sendo que um deles,
portador de deficiência mental, encontra-se sob a guarda e responsabilidade dos
avós paternos. A criança foi entregue aos cuidados dos avós em razão de não
possuir condições financeiras suficientes, na época, para conferir-lhe assistências
material e educacional adequadas. Porém, em virtude de estar recebendo benefício
previdenciário pela morte de seu ex-cônjuge e estar vivendo em união estável com
outra pessoa, sua situação financeira melhorou consideravelmente, o que a
possibilita exercer novamente a guarda de seu filho. Consigne-se que os fatos que
desencadearam a presente demanda remontam ao ano de 1996, quando a Autora e
seu esposo, sem condições de prover satisfatoriamente as necessidades de seus
261
TJSC. Acórdão: Apelação cível n. 2004.006720-8, de Coronel Freitas. Relator: Des. Subst. Joel
Dias Figueira Júnior. 10/04/2007. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>.
Acesso em: 26 mai. 2009.
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dois filhos, entregaram seu primogênito, à época com quatro anos de idade, aos
cuidados dos avós paternos que, no ano de 2000 obtiveram legalmente a guarda da
criança. Por volta de 2002, argüindo a Demandante ter consolidado sua situação
financeira como fora exposto, acorreu ao Judiciário pretendendo reaver a guarda do
aludido filho. Imperioso mencionar que o menor conta hoje com 14 anos de idade e
possui sérias limitações em razão da paralisia cerebral, inspirando acompanhamento
especializado que vem sendo prestado através da APAE de Pinhalzinho. Infere-se
da prova produzida que, atualmente, ambas as partes possuem condições
financeiras de manter e assistir o menor. Contudo, tomando por base os interesses
do adolescente, não se pode desprezar o esforço dos avós paternos em
proporcioná-lo o melhor amparo. Nesse passo, alterações na rotina do menino são
arriscadas e de resultado positivo duvidoso, uma vez que não se tem qualquer
garantia, ou mesmo indícios, que as mudanças postuladas virão em benefício do
filho da autora. Deste modo, retirar abruptamente o menor da família com quem
convive há mais de 10 (dez) anos e transferi-lo à outra unidade da APAE, seria, no
mínimo temerário, ainda que a autora tenha postulado a guarda do filho com a mais
nobre e melhor das intenções. Por oportuno, diga-se com relação ao argumento
dispensado pela apelante de que, mais cedo ou mais tarde receberá a guarda de
seu filho em razão de os apelados já se encontrarem com idade avançada, tal
circunstância - apenas provável - não dá respaldo à reversão da guarda neste
momento, pois na atual conjuntura as provas demonstram serem os avós paternos
os mais indicados para continuar com a guarda do menino.
Define-se o abandono, quando o menor, por negligência incapacidade, ou
perversidade dos pais, ficar permanentemente exposto a grave perigo quanto à
saúde, à moral e à educação, de forma comprometedora de sua formação como ser
humano.
O abandono pelos genitores é a hipótese mais freqüente para a destituição
do pátrio poder e conseqüentemente a perda da guarda, tendo em vista a gama de
situações que abrange. O abandono pode assumir feições materiais e psicológicas,
mas não é apenas o ato de deixar o filho sem assistência material, fora do lar, mas o
descaso intencional pela sua criação, educação e moralidade.
Tendo em vista o posicionamento jurisprudencial alhures esposado, o que
fica evidenciado é que sempre o melhor interesse do menor será preservado,
mesmo a genitora adquirindo condições de reverter para si a guarda perdida, seja
77
essa perda por abandono ou por falta de condições de mantê-lo sob sua guarda e
zelo.
O magistrado sempre que se deparar com situações acima expostas de
pedidos de uma possível reversão, deverá sempre preservar o bem estar do menor
sob tutela, uma vez que a reversão poderá gerar danos irreversíveis no caráter da
criança e do adolescente. Por esses e outros motivos é que uma decisão em favor
da reversão deverá sempre ser bem fundamenta e colhida provas de que o menor
ficará melhor retornando ao seu convívio anterior sem prejuízos, a ficar com a família
ou local onde se encontra.
Portando, a possibilidade da reversão da guarda a genitora é mínima, visto
que sendo o melhor para seu filho é ficar onde esta bem sob a guarda e proteção de
seu guardião mantenedor, não há que se falar em reversão. Pois sempre a
prioridade é o melhor interesse do menor em detrimento dos genitores, mesmo estes
obtendo condições ou desaparecendo os motivos desencadeadores da perda da
guarda.
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CONCLUSÃO
Constitucionalmente, os pais devem obedecer ao princípio da paternidade
responsável, com o objetivo de garantir o efetivo desenvolvimento da prole. Essa
paternidade responsável implica o cumprimento das obrigações estabelecidas no
artigo 229 da Constituição Federal, ou seja, o direito de assistir, criar e educar os
filhos.
O anterior Pátrio Poder teve a denominação alterada para Poder Familiar.
Na época do CC/16 quem exercia o poder sobre os filhos era o pai e não se falava
no poder do pai e da mãe (pais). Mas esta situação mudou e hoje a
responsabilidade sobre os filhos é de ambos, assim, não só a denominação foi
modificada, a extensão do entendimento, também.
Os filhos enquanto são menores de 18 anos estão sob o poder dos pais e
não podem praticar atos da vida civil sem a autorização deles. Estar sob o “poder”
significa que os filhos devem obediência e respeito em relação aos pais e estes têm
o dever de sustentá-los e dar assistência moral, emocional e educacional.
A separação judicial ou divórcio dos pais não altera nada a questão do poder
familiar, o que se estabelece neste caso é a guarda da criança (com quem vai ficar),
as visitas (daquele que não tem a guarda) e o valor da pensão alimentícia a ser
paga, mas ambos continuam responsáveis.
É muito comum as pessoas imaginarem que somente aquele que paga a
pensão tem o dever de sustento e aquele que tem a guarda decide sobre a
educação, mas não é isso que a lei estabelece. Os pais têm direito e dever de
educar os filhos ainda que separados, decidindo sobre a vida deles em conjunto.
Por ser um direito do menor muito antes de ser um dever dos pais, o poder
familiar pode ser suspenso, destituído ou extinto em casos expressos e via medida
judicial, sempre visando à segurança do menor.
O poder familiar é um instituto importante e que deve ser levado a sério. A
vida de uma criança depende dos pais em todos os sentidos enquanto ela está em
formação e justamente nesta fase a criança estará sendo moldada para crescer e se
tornar um bom adulto.
Assim, poderá a criança ou o adolescente, que não possua mais sua família
natural, ter uma família. Essa, mesmo substituta, virá preencher a falta de pai ou
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mãe ou familiares, onde a afetividade e o atendimento serão supridos por pessoas
plenas de sentimentos de solidariedade.
Por isso, é essencial idealizar que a guarda pressupõe a colocação da
criança ou do adolescente em “família substituta”, não implicando necessariamente,
na perda do poder familiar, podendo com ele conviver e dele se destacando, quando
for o caso, pela suspensão.
Guarda é o direito de reter o filho junto a si e de, velar e proteger ao filho,
educá-lo e sustentá-lo, nos limites, porém, que conhecia antes da ruptura. Seus
direitos encontram fronteiras nos de visita, companhia e fiscalização do outro.
O superior interesse da criança ultrapassa os direitos dos pais biológicos.
Prevê a CF/88 no artigo 227 “que é dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão". Essa proteção também é regulamentada pelo
ECA, que considera criança a pessoa com idade entre zero e doze anos
incompletos, e adolescente aquele que tem entre 12 e 18 anos de idade.
O maior interesse da criança é de ser sempre interpretado a partir desse
parâmetros norteadores do direito, com o intuito de garantir os direitos consolidados
constitucionalmente, tendo como diretrizes não mais a divina inspiração do "bom
pai", mas a proteção integral e a prioridade absoluta objetivamente definida na
normativa nacional e internacional.
Tanto o papel paterno quanto o materno está no mesmo nível de importância
na vida dos filhos, pois a formação deles inclui o direito e a necessidade de conviver
com cada um em sua particularidade. As crianças saudáveis precisam de ambiente
seguro, de proteção e de disciplina propiciado por pessoas amadas, respeitadas e
que possam dar continência às suas emoções, por mais difíceis que sejam.
Desta forma, educar filhos é uma tarefa que independe do sexo e o amor
materno é tão contingente quanto o amor paterno. O estabelecimento e a
permanência dos vínculos afetivos entre pais e filhos não encontram sua explicação
na questão biológica, pois sua construção é social e determinada por diversos
fatores que influem na história do casal e da família.
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Dar uma família à criança é prioridade absoluta, é um ato de grandeza
imensurável, é demonstração de desprendimento, capacidade de repartir e se doar.
Esta criança (ou adolescente) vai passar a ser membro desta família que
generosamente a acolhe, que livremente a quer entre os seus, dispensando-lhe tudo
de que precisa sobretudo, amor. Em se tratando de adoção, passará a ter todos os
direitos e deveres do filho de sangue. Até porque, tanto a Guarda como a Tutela
podem ser revogadas, mas a Adoção é para sempre.
O afeto é apontado atualmente, como o principal fundamento das relações
familiares. Mesmo não constando à palavra afeto na carta magna como um direito
fundamental, pode-se se dizer que o afeto decorre da valorização constante da
dignidade humana.
Vale salutar que o direito não tem o poder de criar afetividade, sentimentos
naturais não decorrem de legislação, mas da vivência cotidiana informada pelo
respeito, diálogo e compreensão. A afetividade faz com que a vida em família seja
sentida da maneira mais intensa e sincera possível.
A família só tem sentido enquanto unida pelos laços de respeito,
consideração, amor e afetividade. Inexistente estes atributos, o que existe é um
mero elo de direito, sem vinculação fática.
A colocação de menores em família substituta, da qual a guarda é uma das
espécies, o bem estar da criança deve sempre preponderar, doutrinadores afirmam
que a manutenção do menor no local onde está bem, de regra, deve ser mantido.
Cuja troca do meio ambiente onde está vivendo deve ser evitada o quanto possível,
para não causar prejuízo à criança.
A possibilidade do retorno do menor ao convívio dos genitores, é da própria
precariedade da guarda permitir ou, ao menos o direito de visita.
A suspensão temporária do exercício do poder familiar é uma sanção
imposta aos genitores que visa preservar o melhor interesse do filho menor, que
nada obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder familiar e,
por conseguinte a guarda, uma vez cessando os motivos geradores da suspensão.
A perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que seja
definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, desde que
comprovem a cessação das causas que a determinaram, desde norte, o poder
retornando para os genitores, com este retorna o dever de guarda inerente ao poder
familiar.
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Desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do poder familiar,
onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a possibilidade dessa
guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o pedido da possível
reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em detrimento dos
interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o adolescente e não menos
importante de considerar o vínculo criado entre o menor e seu guardião.
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