UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ Biguaçu 2009 2 LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito. Orientador: Prof. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica Biguaçu 2009 3 LENIR RODRIGUES DOS SANTOS BERNARDES A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Área de Concentração: Direito de Família Biguaçu, 17 de junho de 2009. Prof. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica UNIVALI – Campus de Biguaçu Orientador Prof. MSc. Geyson José Gonçalves da Silva UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro Prof. MSc. Maria Letícia Iconomos Baixo UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro 4 Dedico este trabalho aos meus pais, Adão e Osnira, pelo amor e atenção e por terem oportunizado mais um sonho. Aos meus irmãos, Wilmar, Mª de Lourdes, Gilmar in memóriam, Salete, Luiz Carlos in memóriam, pela alegria e companhia em todos esses anos. Ao meu esposo, pessoa iluminada, pelo amor e paciência, em nossos momentos juntos. À minha filha, anjo da minha vida, pelos momentos de compreensão e pela ausência em determinadas situações. À minha sogra, por acreditar no meu potencial e pelo auxílio para concluir este sonho. 5 AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, por conceder-me a vida e tudo que tem me proporcionado. Aos meus pais, pela dedicação na minha educação e formação, e por estarem sempre ao meu lado dedicando amor e carinho. Aos meus irmãos, por estarem presentes e sempre me apoiarem. A professora Helena Nastassya Paschoal Pítsica, por dedicar atenção, tempo e principalmente paciência nos momentos difíceis, e por sempre proporcionar informações seguras e pertinentes ao tema. Ao meu esposo e minha filha, pessoas estimadas e importantes em minha vida, agradeço ao amor e atenção destinados a minha pessoa. 6 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Biguaçu, 17 de junho de 2009. Lenir Rodrigues dos Santos Bernardes 7 RESUMO O direito nacional sempre voltou-se para questões que envolvem a família. Nos dias atuais, em especial, há uma notória preocupação com o interesse do menor. Desde as bases conceituais e legais do poder familiar até a guarda e suas implicações, tem-se como parâmetro maior o melhor interesse da criança e do adolescente. É com esse filtro que se analisa e interpreta, frente a casos concretos, a possibilidade de reversão da guarda à genitora em casos em que o menor é abandonado por quem deveria lhes resguardar, auferindo-os todos os seus direitos fundamentais assegurados por lei. A guarda representa uma convivência dos filhos com os pais, dentro do mesmo lar. Não sendo possível essa permanência, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece princípios através dos quais à criança e o adolescente são colocados em família substituta. O câmbio de perspectiva da proteção do direito dos filhos, que se opera, é de tal ordem que a lei garante à criança a tutela do Estado. No campo do planejamento familiar, o princípio do melhor interesse da criança ganha destaque, diante da priorização dos seus interesses e direitos em detrimento dos interesses de seus pais. No contexto do mundo contemporâneo, com a inserção da mulher no mercado de trabalho, os avanços da engenharia genética, os métodos contraceptivos e a ruptura da concepção patriarcal da família, foram rompidos os paradigmas a que a família estava submissa. Diante dessa pluralidade do conceito de família, emprestou-se juridicidade ao vínculo de afeto que enlaça as pessoas, esse amálgama dos laços familiares é representado pela afetividade. Destaque-se ao final que, desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do poder família, onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a possibilidade dessa guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o pedido da possível reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em detrimento dos interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o adolescente e não menos importante de considerar o vínculo criado entre o menor e seu guardião. Palavra-chave: Poder Familiar; Guarda; Vínculo; Reversão. 8 ABSTRACT The national law always turned to issues involving the family. Nowadays, in particular, a remarkable concern for the interests of the child. Since the conceptual and legal foundations of the family until the custody and its implications, it has as parameter the greater the best interest of children and adolescents. It is this filter that analyzes and interprets, face to concrete situations, the possibility of reversion of custody to the mother in cases where the child is abandoned by those who should protect them, earning them all their fundamental rights guaranteed by law. The guard is one of the children living with parents in the same household. When is not possible to stay the Statute of the Child and Adolescent down principles by which the children and adolescents are placed in substitute families. The exchange of view of protecting the rights of children, which operates, is such that the law guarantees the child the authority of the state. In the field of family planning, the principle of best interests of the child gained prominence in front of the prioritization of their rights and interests to the detriment of the interests of their parents. In the context of the contemporary world, with the inclusion of women in the labor market, advances in genetic engineering, the breakdown of contraceptive methods and design of the patriarchal family, the paradigms that the family was submissive have been broken. Since this multiplicity of the concept of family, lent itself to the legal bond of affection that links people, this amalgam of the family is represented by affection. Highlight to the end that disappearing the reasons for the suspension of the home power, where the parents had lost the custody of the child, there is the possibility that custody be restored, so that the judge's request to examine possible reversal not stop give priority to the interests of the child to the detriment of the interests of parents, if possible to hear the child or adolescent and no less important to consider the bond created between the minor and his guardian. Keyword: Power Family; Guard; Vínculo; Reversal. 9 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 01 1 PODER FAMILIAR ........................................................................................ 03 2 1.1 ASPECTOS GERAIS ...................................................................................................... 03 1.2 PODER FAMILIAR QUANTO À PESSOA E BENS DOS FILHOS ....................................... 09 1.3 SUSPENSÃO E DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR ..................................................... 15 1.4 PROCEDIMENTOS DE SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR .......... 16 DA GUARDA DOS FILHOS ....................................................................... 26 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................... 26 2.2 GUARDA NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE LEI 8.069/90 ................... 30 2.3 GUARDA PREVIDENCIÁRIA .......................................................................................... 33 2.4 GUARDA NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL ............................................... 34 2.4.1 Guarda na separação judicial consensual ........................................................... 36 2.4.2 Guarda na separação litigiosa ............................................................................. 37 2.4.3 Guarda na dissolução de união estável ............................................................... 38 2.5 GUARDA COMPARTILHADA......................................................................................... 40 2.5.1 2.6 RESPONSABILIDADE JURÍDICA DO GUARDIÃO ............................................................ 45 2.6.1 2.7 Guarda compartilhada: esboço histórico e conceito .......................................... 40 Responsabilidade civil ......................................................................................... 46 PERDA/REVOGAÇÃO DA GUARDA .............................................................................. 48 3 A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ ....................................................... 51 3.1 SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA ............................................................................. 51 3.2 VÍNCULOS COM AS FIGURAS MATERNA E PATERNA .................................................. 55 3.3 FAMÍLIA SUBSTITUTA .................................................................................................. 58 3.3.1 Critérios .............................................................................................................. 61 3.3.2 Responsabilidade ................................................................................................ 66 3.3.3 Vínculo sócio-afetivo ........................................................................................... 68 3.4 REVERSÃO DA GUARDA............................................................................................... 69 3.5 REVERSÃO DA GUARDA: POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL DO TJ/SC ................ 72 10 CONCLUSÃO................................................................................................... 78 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 82 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo analisar o poder familiar e a responsabilidade dos pais dele decorrente, sob o olhar da Constituição da República Federativa do Brasil, Código Civil de 1916, Código Civil de 2002 e Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 8.069/90. Diz o dito popular: “Amor, só o de mãe”. Quem ainda não o ouviu como uma verdade absoluta? É justamente esta ‘verdade’ que a prática profissional tem demonstrado ser precária, haja vista o número crescente de pais requerendo a guarda judicial dos filhos, questionando os cuidados maternos e até denunciando a inadequabilidade da mãe para o exercício do poder familiar. O afeto ajuda no desenvolvimento psíquico, é importante a criança sentir-se amada, ela fica mais ativa, mais apoiada e feliz. Assim ela terá uma saúde psicosocial equilibrada. A reunião da família em um lar é, efetivamente, o centro mais perfeito de aprendizado dos filhos, tanto o pai quanto a mãe concorre para que se organize convenientemente o desenvolvimento estrutural, psíquico, moral e ético do filho, cabendo à mãe um papel que mais se relaciona com a flexibilidade, com o afeto e com o conforto, enquanto ao pai cabe um papel que mais se relaciona com a fixação do caráter e da personalidade. Serão analisadas as hipóteses em que a genitora perderá a guarda do menor, seja esta perda provisória definitiva ou permanente, decorrentes de abandono, maus tratos ou por deixar de assegurar-lhe todos os seus direitos constitucionais previstos na lei, inerentes ao seu sustento e bem estar. A possibilidade de um retorno do menor ao convívio da família natural, priorizando sempre o melhor interesse desse, em relação ao seus pais, conjuntamente com analise comportamentais da família natural, bem como o vínculo constituído com a família substituta. O método utilizado na presente pesquisa foi o dedutivo, com a utilização das técnicas de levantamento bibliográfico, legal e jurisprudencial. Para tanto, a monografia terá como primeiro capítulo denominado “Poder familiar” no qual será tratada a breve evolução histórica do poder familiar, que conduz à atual conceituação do instituto como direito-dever dos pais em relação aos 2 filhos. O trabalho analisa os sujeitos do poder familiar, os procedimentos pelos quais o referido poder pode ser modificado, suspenso ou extinto. O segundo capítulo denominado, “Da guarda dos filhos”, abordará a guarda, o seu histórico e a sua conceituação nas diferentes formas de ruptura da sociedade conjugal. Bem como a responsabilidade jurídica do guardião, responsabilidade civil dos pais pelos atos ilícitos cometidos pelos filhos menores e as medidas de perda/revogação da guarda. Por fim, o último capítulo como título “A possibilidade de reversão da guarda em favor da genitora no caso de abandono de incapaz”, destinar-se-á a tratar da possibilidade de reversão da guarda em favor da genitora no caso de abandono de incapaz, observando sempre o superior interesse da criança ou adolescente, o vinculo pré-existente com as figuras materna e paterna, as condições e o vínculo criado com a família substituta, critérios utilizados para a modificação da guarda, responsabilidade do guardião para com o menor a ele tutelado, vinculo sócio-afetivo com os guardiões, a possibilidade jurídica da reversão da guarda, procedimentos e posicionamento jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina em relação à possibilidade da reversão da guarda. 3 1 PODER FAMILIAR Inicialmente neste capítulo abordar-se-á o poder familiar, sua evolução e conceito, quanto à pessoa e bens dos filhos, suspensão e destituição, procedimentos da perda, suspensão e extinção, sob a ótica da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB/88, Código Civil de 1916 e 2002 – CC/16 – CC/02 e Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 8.069 de 1990. 1.1 ASPECTOS GERAIS A denominação ‘poder familiar’ trata do instituto que, no Código Civil de 1916, vinha com o nome de ‘pátrio poder’, e encontrava-se no Capítulo VI, Título V, do Livro I, da Parte Especial, e atualmente encontra-se no Capítulo V do Subtítulo II, Título I do Livro IV da parte Especial do Código Civil de 2002.1 O direito Civil pátrio manteve, em alguns princípios do trazido pelo direito romano acerca do que o poder familiar denominava-se patria potestas e visava tão somente ao exclusivo interesse do chefe de família. Este tinha o jus vitae et necis, ou seja, o direito sobre a vida e a morte do filho. Segundo Silvio Rodrigues, “é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes”.2 Explica Washington de Barros Monteiro que nos primeiros tempos, os poderes que se enfeixavam na autoridade do pai, tanto os de ordem pessoais como os de ordem patrimonial, se caracterizavam pela sua larga extensão, define assim o que é ordem pessoal e patrimonial respectivamente: No terreno pessoal, o pai dispunha originariamente do enérgico jus vitae et necis, o direito de expor o filho ou matá-lo, o de transferi-lo a outrem in causa mancipi e o de entregá-lo como indenização noxae deditio. 1 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 599 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 358 2 4 No terreno patrimonial, o filho, como o escravo, nada possuía de próprio. Tudo quanto adquiria, adquiria para o pai, princípio que só não era verdadeiro em relação às dívidas.3 Outrora, a estrutura autocrática da família, alicerçada no princípio da autoridade, constitui a noção de pátrio poder em termos rígidos e severos. Não lhe faltou à influência religiosa tendo-se em vista que o chefe de família – pater – era ao mesmo tempo o sacerdote do culto doméstico.4 No direito germânico antigo explica Arnaldo Rizzardo, que embora preponderasse o patriarcalismo, havia um abrandamento dos poderes do chefe, tanto que os filhos, ao ingressarem no exército, libertavam-se do então ‘pátrio poder paterno’. Com a Revolução Francesa e mais aprofundadamente com o Código Napoleônico, adotou-se o direito costumeiro sobre a matéria, passando a temporariedade do cargo do poder familiar, o seu exercício pela mãe na falta do pai e a possibilidade de o filho ter bens.5 Para Silvio Rodrigues no direito romano o pátrio poder é representado por um conjunto de prerrogativas conferidas ao pater, na qualidade de chefe da organização familiar, e sobre a pessoa de seus filhos. Trata-se de um direito absoluto a fim de consolidar a família romana, célula-base da sociedade, que dela extrai-se o seu principal alicerce. O pater não é só o sacerdote do culto familial, e sim uma autoridade onde se estabelece a disciplina e assim se consolida a vida dentro do lar, daí ser conveniente assegurar essa ampla autoridade paternal.6 Gonçalves destaca que o instituto do poder familiar sempre esteve presente na história da humanidade e vem sofrendo importantes modificações principalmente no seu conteúdo. Conteúdo este que, diz-se, que, aos pais caberá o exercício do poder familiar sobre a pessoa e os bens dos seus filhos menores. O Código Civil de 1916 – CC/16 atribuía ao marido à pátria potestas, que significava “pai de família”, referindo-se no Direito Romano, a posição do homem no seio familiar, que era de autoridade para com a sua família e seus escravos. Predominava, no regime por ele instituído, o conceito de chefia da família.7 3 MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 277 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito família. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 417 5 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 601 6 RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. Direito de família. 28. ed. rev. e atual. Por Francisco José Cahali; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 354 7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 361 4 5 Silvio Rodrigues ensina que, só na falta ou impedimento do chefe da sociedade conjugal passava o pátrio poder a ser exercido pela mulher. Entendiam os intérpretes que, embora ambos os pais fossem titulares do direito, seu exercício não era simultâneo, mas sucessivo, de modo que a mulher só era chamada a exercê-lo na falta ou impedimento do varão. Assim sendo em caso de divergência entre os cônjuges, prevalecia a opinião do marido, exceto em caso de manifestação de abuso de direito.8 Para Josiane Veronese, o poder familiar nasce como instituto de direito privado e evolui, adquirindo, com o passar dos tempos, características de um direito com conotação social, pois embora regule relação de ordem privada, tem o Estado como interventor e protetor dessas relações. Para o Estado Romano, marcado por grandes conquistas, o filho era um cidadão romano e representava um possível soldado ou político.9 Segundo o ensinamento de Gonçalves: A igualdade completa no tocante à titularidade e exercício do poder familiar pelos cônjuges só se concretizou com o advento da Constituição Federal de 1988, cujo art. 226§ 5º, dispôs: “Os direitos e deveres referente à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. Em harmonia com o aludido mandamento, estabeleceu o Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 21: “O pátrio poder deve ser exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma que dispuser a legislação civil, assegurando a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência”.10 Conforme o entendimento de Caio Mário da Silva Pereira: A idéia predominante é a potestas deixou de ser uma prerrogativa do pai, para se firmar como a fixação jurídica dos interesses do filho. Não se visa beneficiar quem o exerce, mas proteger o menor. E tal preponderância do interesse do filho sobre os direitos do pai aconselha a mudar a designação de pátrio poder para pátrio dever. Por outro lado, não mais predomina a sua atribuição ao marido. Ao revés, é confiado aos pais, como expressão de igualdade jurídica dos cônjuges.11 8 RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. Direito de família. 28. ed. rev. e atual. Por Francisco José Cahali; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo. Saraiva, 2004. p. 356 9 VERONESE, Josiane Rose Petry. Poder familiar e tutela: à luz do novo código civil e do estatuto da criança e do adolescente. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p. 19 10 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 361 11 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito Civil: direito de família. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 240 6 Portanto, este poder visa o cumprimento das obrigações pelos pais, protegendo, assim, o filho. O pátrio poder perde assim, a inspiração do direito romano, conferindo aos pais muito mais deveres do que direito sobre o filho.12 Sintetiza ainda Washington de Barros Monteiro que: O pátrio poder é encarado como complexo de deveres, ou melhor, como direito concedido aos pais para cumprirem um dever. Deixou de ser assim direito estabelecido em favor dos genitores e no interesse de quem o exerce, para transformar-se num simples dever de proteção e direção, um meio que tem o pai para satisfazer seus deveres. Por outras palavras, o pátrio poder é instituído no interesse dos filhos e da família, não em proveito dos genitores.13 Preleciona Gonçalves: [...] os filhos adquirem direitos e bens, sem ser por via de sucessão dos pais. Há, pois, que defender e administrar esses direitos e bens; e para este fim, representá-los em juízo ou fora dele. Por isso, aos pais foi concedida ou atribuída uma função semi-pública, designada por poder paternal ou pátrio poder, que principia desde o nascimento do primeiro filho, e se traduz por uma série de direitos-deveres, isto é, direitos em face de terceiros e que são, em face dos filhos, deveres legais e morais.14 No regime do CC/16, em que predominava o conceito de “chefia da família”, atribuído ao marido, à pátria potestas era conferida a este. O CC/02 seguindo os princípios constitucionais se desvencilhou daquela idéia, e agora o poder familiar é exercido pelos pais conjuntamente. Entre um e outro são distribuídas, harmonicamente, as atribuições concernentes à guarda, educação, orientação, assistência aos filhos, bem como a administração de seus bens.15 Maria Helena Diniz ensina que, o poder familiar está englobado entre direitos e obrigações, conferidos aos pais, na mesma igualdade, em relação à pessoa e os bens do filho menor que não seja emancipado, para juntos propiciar a este a proteção estabelecida em lei.16 Completa Sílvio Rodrigues em relação ao poder familiar: 12 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito Civil: direito de família. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 240 13 MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 278 14 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 359 15 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito. 21 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 432 16 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 447 7 [...] é um instituto de caráter eminentemente protetivo em que, a par de uns poucos direitos, se encontram sérios e pesados deveres a cargo de seu titular. [...] É de interesse do Estado assegurar a proteção das gerações novas, pois elas constituem matéria-prima da sociedade futura.17 Neste mesmo sentido define Washington de Barros Monteiro: Ambos os pais têm o pátrio poder sobre o filho menor. Não se pense que o exercício do pátrio poder pelo pai exclui a mãe desse direito. O pátrio poder cabe em comum aos dois genitores, a ambos deve o filho obediência e respeito. Debaixo do seu manto protetor, colocamse todos os filhos menores, sem exceção, seja qual for a sua categoria: legítimos, legitimados, legalmente reconhecidos e adotivos. Assim dispõe o artigo 379 do CC/16.18 Hodiernamente, graças à influência do Cristianismo, o poder familiar constitui um conjunto de deveres, transformando-se em instituto de caráter eminentemente protetivo, transcendendo a órbita do direito privado para ingressar no âmbito do direito público. Sob está ótica, o poder é limitado, os pais não tem mais a soberania absoluta sobre o filho, sendo que se os pais ou os responsáveis legais extrapolarem seus direitos, poderá ser punido, podendo em alguns casos, o filho ser retirado dos pais. Havendo abuso, ocorre a intervenção do Estado juntamente com o Ministério Público, que irá proceder à fiscalização.19 Desapareceu assim o caráter de poder ou disposição que imperava primitivamente, vige o princípio de um múnus ou encargo na vida ou nos bens dos filhos, como deixa entrever San Tiago Dantas: [...] pode-se dizer que trazer o conceito de dever paternal para o primeiro plano e deixar o direito, num segundo, foi uma das transformações a que o cristianismo submeteu a humanidade. Depois de realizar-se esta transformação, o conceito que se possui do pátrio poder é outro; não o julga mais um auctoritas, mas um múnus, encargo, dever, função; é esse o modo pelo qual a consciência moderna conceitua o pátrio poder. Nesta ordem de colocação do instituto, pode-se ir além e dizer que se trata de uma conduta dos pais relativamente aos filhos, de um acompanhamento para conseguir a abertura dos mesmos, que se processará progressivamente, à medida que evoluem na idade e no desenvolvimento físico e mental, de modo a dirigi-los a alcançarem sua própria capacidade para se dirigirem e administrarem seus bens. Não haveria tão-somente um encargo, ou um múnus, mas um encaminhamento, com poder para impor um certa conduta, em 17 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. v. 6. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 448 MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de família. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 279 19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 359 18 8 especial entes da capacidade relativa. Não mais há de se falar praticamente em poder dos pais, mas em conduta de proteção, de orientação e acompanhamento dos pais.20 Segundo os ensinamentos de Bittar, o poder familiar é inalienável, imprescritível e irrenunciável. Inalienável porque os pais não podem transferir o poder familiar a outrem, a título gratuito ou oneroso, com a única exceção de incumbência do poder familiar, desejada pelos pais ou responsável, para prevenir o menor de qualquer situação irregular. Imprescritível porque mesmo o poder familiar não sendo exercido, ele não decai, somente nos casos permitidos por lei. E irrenunciável, porque os pais não podem renunciar ao poder familiar, visto que este não é um favor que eles irão prestar ao filho, e sim, um direito que eles possuem para beneficiar sua prole, sendo nulo o acordo de renúncia ou de promessa de renúncia. Mas os respectivos atributos podem ser confiados à outra pessoa, em casos expressamente contemplados na lei, como na adoção e na suspensão do poder dos pais.21 Deste norte, pode-se dizer que os pais têm deveres em relação aos filhos, e que, para tanto, o Estado lhes outorga direitos que lhes permitem a operacionalização de suas obrigações. Este poder é concedido pelo Estado, e por ele fiscalizado. Tanto o é, que, em casos de abuso destas prerrogativas, o Estado pode e deve interferir, suspendendo, ou mesmo retirando, o poder familiar dos transgressores.22 Leciona Gonçalves que, os pais são os defensores legais e os protetores naturais dos filhos, os titulares e depositários dessa específica autoridade, delegada pela Sociedade e pelo Estado. Não é um poder discricionário, pois o Estado reservase o controle sobre ele: O ente humano necessita, “durante sua infância, de quem o crie e eduque, ampare e defenda, guarde e cuide dos seus interesses, em suma, tenha a regência de sua pessoa e seus bens. As pessoas naturalmente indicadas para o exercício dessa missão são os pais. A eles confere a lei, em princípio, esse ministério”, organizando-o no instituto do poder familiar.23 20 DANTAS, San Tiago. apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 602 21 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 223 22 VERONESE, Josiane Rose Petry. Poder familiar e tutela: à luz do novo código civil e do estatuto da criança e do adolescente. Florianópolis: OAB/SC, 2005. p. 19 23 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 358 9 1.2 PODER FAMILIAR QUANTO À PESSOA E BENS DOS FILHOS De forma concisa, resulta, pois, o poder familiar em constituir responsabilidade comum dos genitores, o dever de prestar aos filhos, enquanto civilmente menores, o necessário ao seu sustento, proporcionar-lhes, alimentação, vestuário, educação, moradia, lazer, assistência à saúde, medicamentos, etc. Pois compete aos pais tornar seus filhos úteis à sociedade. A atitude dos pais é fundamental para uma boa formação da criança, visto que, faltando-se com esse dever, o progenitor faltoso submete-se a reprimendas de ordem civil e criminal, respondendo pelos crimes de abandono material, moral e intelectual.24 Sendo um conjunto de direitos e deveres, estatui a vigente CRFB/88, em seu artigo 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito a vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, a dignidade ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, ale de colocá-los a salvo de todo forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.25 Deste mesmo norte dispõe o artigo 229 da referida lei, que: “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e filhos maiores têm o devem de ajudar e amparar os pais na velhice, na carência ou na enfermidade”, estabelecendo, assim, de forma recíproca, o dever de sustento dos pais em relação aos filhos, e destes em relação aos pais.26 Desta forma verifica-se que o poder familiar consiste num conjunto de direitos e deveres dos pais em relação aos filhos menores e a seus bens, com finalidade de protegê-los enquanto durar a menoridade, cessando-se com o implemento da idade ou a emancipação.27 A situação normal da família no direito brasileiro seja por enlace matrimonial ou por união estável, sendo ambos plenamente capazes, admite que o poder familiar seja amplamente exercido por ambos os pais, havendo qualquer divergência entre 24 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 374 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95 26 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 96 27 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro. Forense Universitária. 2006. p. 222 25 10 estes, poderá qualquer deles recorrer à jurisdição para requerer a solução da lide, evitando que a decisão seja implacável.28 Ensina Bittar: Com relação à pessoa dos filhos menores, compete aos pais: dirigirlhes a criação e a educação; tê-los em sua companhia e guarda; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casamento; nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro genitor não lhe sobreviver, ou não puder exercer o poder familiar; representá-los, nos atos da vida civil, até os 16 anos, e assisti-los após essa idade, suprido-lhes o consentimento; reclamálos de quem os detenha; exigir obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição (art. 1.634 do CC/02). Os pais devem, pois, cuidar dos filhos, e exercer a representação legal da prole em negócio de seu interesse, cabendo-lhes dirigir, espiritualmente e materialmente, a vida deles, fazendo-os úteis para a sociedade, por meio de orientação segura sob os aspectos, físico, moral, intelectual e social.29 Disciplina o CC/02 em seu artigo 1631 que: Durante o casamento ou união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá com exclusividade. Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.30 Para Gonçalves, o poder familiar não está necessariamente vinculado ao casamento e na união estável, enquanto não houver previsão legislativa, não vigora a presunção pater is est, dependendo a filiação jurídica do reconhecimento feito pelo genitor. O poder familiar decorre do reconhecimento dos filhos por seus genitores, independentemente do seu nascimento. Na realidade, independentemente do vínculo entre os pais, desfeito ou jamais ocorrido, ambos os genitores exercem em conjunto o poder familiar.31 O CC/02 em seu artigo 1.634 enumera os direitos e deveres que incumbem aos pais, no tocante à pessoa dos filhos menores e está em sintonia com os princípios jurídicos modernos que regem o atual Direito de família: o princípio da dignidade da pessoa humana, existindo a garantia de pleno desenvolvimento dos membros da comunidade familiar e o princípio da igualdade entre homem e mulher 28 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 362 29 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 224 30 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. 4. ed. São Paulo. 2007. p. 279 31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 361 11 em que o poder-dever de dirigir a família é exercido conjuntamente por ambos os genitores, desaparecendo o poder marital e paterno.32 Porém, existem situações anormais ou extraordinárias, em que o poder familiar poderá ser exercido de forma diversa a tratada no artigo citado. Maria Helena Diniz utiliza o termo “situações anormais”, e seguem as três hipóteses por ela citadas: 1) Na família matrimonial quando: a – os cônjuges tiverem vivos e bem casados, o poder será exercido só pela mãe se o pai estiver impedido de exercê-lo por ter sido suspenso, destituído ou por não poder, devido à força maior ou manifestar sua vontade; b – os consortes estivem separados judicialmente ou divorciados, ou os conviventes tiverem rompido a união estável, pois embora a dissolução da sociedade conjugal não altere as relações entre pais e filhos, o exercício do poder familiar pode ser alterado pela atribuição do direito a guarda a um deles, ficando o outro com direito de visitar a prole (CC, art. 1632); c – o vínculo conjugal se dissolve pela morte de um dos cônjuges, caso em que o poder familiar será exercido unicamente pelo consorte sobrevivente, ainda que venha contrair novas núpcias ou formar união estável (CC, art. 1636). 2) Na família não matrimonial quando: a – o filho for reconhecido pelos dois genitores, simultânea ou sucessivamente, estabelecendo, assim, o parentesco. O filho ficará sujeito ao exercício do poder familiar de um deles, se não viverem em união estável, terá o outro o direito de visita, a não ser que haja decisão contrária por parte do juiz a fim de preservar qualquer direito do menor; b – o filho ser reconhecido por apenas um dos pais, sujeitar-se-á ao poder familiar de quem o reconheceu. 3) Na família civil quando: a – o filho adotivo for adotado pelo casal, ambos serão responsáveis pelo exercício do poder familiar; b – o menor ser adotado apenas por um dos cônjuges, caberá exclusivamente ao consorte que o adotou legitimamente, a competência do poder familiar.33 Existe ainda a hipótese da guarda compartilhada, considerada uma espécie de custódia em que os filhos têm uma residência principal, mas os pais têm responsabilidade conjunta na tomada de decisões e igual responsabilidade sobre eles. Nesse sistema de guarda, o poder deve ser exercido por ambos, ficando a critério dos genitores planejarem a convivência em suas rotinas diárias.34 Com base nos ensinamentos de Maria Helena Diniz, pode-se examinar que a titularidade do poder familiar no direito brasileiro, em hipótese padrão, cabe à 32 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 361 33 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 517 34 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 366 12 família na qual, ambos os consortes estão vivos, unidos pelo enlace matrimonial ou pela união estável, e plenamente capazes; podendo haver também situações patológicas que tratam de famílias matrimoniais distintas, não matrimoniais e civis.35 Dentro da esfera patrimonial o primeiro dever imposto aos pais no exercício do poder familiar, é o de administrar os bens dos filhos, e assim estabelece o artigo 1689, incisos I e II do CC/02: 1) O usufruto sobre os bens dos filhos menores que se acham sob o seu poder (CC/02, artigo 1.689, I). O usufruto é inerente ao exercício do poder familiar, cessando com a exibição do poder paternal ou maternal, maioridade, emancipação ou morte do filho. [...] constitui razão de imposição legal, dependendo de registro se recair sobre imóvel (CC/02, artigo 1.391), sendo um direito irrenunciável. 2) A administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade ou não emancipados (CC/02, artigo 1.689, II), ou seja, a prática de atos idôneos à conservação e incremento desse patrimônio, podendo celebrar contratos, [...], pagar impostos, defender judicialmente, receber juros ou rendas, adquirir bens, aliená-los, se móveis.36 No entanto os pais não podem alienar, hipotecar ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos menores, nem contrair obrigações em nome deles que ultrapassem os valores da simples administração, exceto por necessidade ou evidente interesse da prole, havendo a necessidade de prévia autorização judicial (CC, art. 1.691), pelo fato de que esses atos importam em diminuição patrimonial.37 Contudo percebe-se que criar um filho é muito mais que tê-lo em sua companhia. Significa não só dar-lhe o sustendo, como também assistência médica, escolaridade, carinho e proteção e ainda, administrar seus bens, não tendo o poder de disposição, salvo autorização judicial, devendo prestar contas de sua gerência quando o filho for emancipado ou atingir a maioridade. E por essa administração os genitores que exercem o poder familiar não têm qualquer direito à remuneração.38 Conforme dispõe o CC/02, artigo 1.692; e Lei nº 8.069/90, artigo 142, parágrafo único, e 148, parágrafo único, “f”, sempre que, no exercício do poder familiar, colidir os interesses do progenitor com o do filho menor, este deverá ser representado ou assistido por curador especial, a requerimento do filho ou do 35 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 518 36 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 364 37 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 523 38 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 21 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 432 13 Ministério Público, para fiscalizar a solução do conflito, zelando sempre pelos interesses do menor. Trata-se, portanto, de medida preventiva, como diz Carlos Santos, “fundada no justo receio de que os pais, cujos interesses colidem com os do filho, possam causar-lhe dano, por serem suspeitos para tomar qualquer decisão sobre negócios relativos ao filho”.39 Caso o progenitor demonstrar necessidade ou utilidade para alienar ou hipotecar algum imóvel do filho menor, ao ser concedido à autorização judicial, é de responsabilidade do juiz a nomeação do curador. Washington de Barros Monteiro lembra que é necessária a nomeação de curador: a) para receber em nome do menor doação que lhe vai fazer o pai; b) para concordar com a venda que o genitor efetuará a outro descendente; c) para intervir na permuta entre o filho menor e os pais; d) para levantamento da inalienabilidade que pesa sobre o bem de família.40 Enfatiza Silvio Rodrigues: [...] é verdade que aos pais incumbem as despesas com a criação dos filhos quando estes não as possam atender, justo é também que, tendo os filhos bens para criarem-se e educarem-se, usem as rendas dos mesmos bens para esse fim.41 Na administração legal, não há necessidade de caução ou garantia, visto que ninguém melhor que os pais para zelarem pela preservação do patrimônio que administram em nome dos filhos.42 Para Silvio Rodrigues, dispondo a lei que o usufruto dos bens dos filhos é inerente ao exercício do poder familiar, aos pais pertencem às rendas produzidas pelo patrimônio dos filhos. Assim, a sua administração dispensa a prestação de contas relativamente aos rendimentos produzidos, porque o administrador, por mandamento legal, faz seus, desde logo, esses rendimentos.43 Sobre o usufruto, Venosa diz ser ele inerente ao poder familiar e procura justificar este instituto sob duas faces: 39 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 524 40 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 377 e 378 41 RODRIGUES, Silvio apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 370 42 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378 43 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 364 14 [...] esse usufruto compensaria o pai pelos encargos do múnus do poder familiar e, sob o prisma de entidade familiar, entendemos que todos os seus membros devem compartilhar dos bens. A estrutura desse usufruto aproxima-se do direito real de usufruto, disciplinado no direito das coisas, mas, como na maioria dos institutos de direito de família, tem compreensão própria. Desse modo, difere do usufruto de direito real porque não deriva de negócio jurídico, mas da lei; não necessita de inscrição imobiliária; abrange todos os bens dos filhos menores, salvo exceções previstas no Código; é irrenunciável e intransferível. Assim, os frutos e rendimentos produzidos pelos bens dos filhos menores pertencem aos pais que exercerem a administração, podendo consumi-los, sem necessidade de prestação de contas.44 O direito de usufruto, em regra, está associado ao de administração, embora seja possível existir um sem o outro. Há também bens excluídos tanto do usufruto como da administração paternal ou maternal, neste caso, o juiz nomeará um curador especial para a regência desses bens excluídos que são: a) os bens adquiridos pelo filho havido fora do matrimônio, antes do reconhecimento, para evitar que o pai ou a mãe o reconheça com o único propósito de se beneficiar com a administração e usufruto de seus bens; b) os valores auferidos pelo filho maior de 16 anos, no exercício de atividade profissional e os bens adquiridos com tais recursos; c) os deixados ou doados ao filho, sob a condição de não serem usufruídos ou administrados pelos pais, como é o caso de pais separados que testam bens aos filhos, com cláusula de que não serão administrados pelo genitor sobrevivente (CC/02, artigo 1.848; e d) os bens que ao filho couberem na herança, quando os pais forem excluídos da sucessão, pois se o indigno, ou o deserdado, pudesse administrar ou usufruir os bens havidos por seu filho, em sucessão de que foi excluído, a pena a ele imposta não teria sentido, perderia sua eficácia parcialmente.45 Ainda leciona Venosa que “uma vez alcançada a maioridade, os bens são entregues aos filhos, com seus acréscimos, sem que os pais tenham direito a qualquer remuneração”.46 O poder familiar não é invariável. Esse poder está sujeito à perda, suspensão e extinção, dependendo de variáveis expressas em lei. 44 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 525 46 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 378 45 15 1.3 SUSPENSÃO E DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR Em princípio, o poder familiar deveria perdurar por todo o tempo de menoridade dos filhos, ininterruptamente, pois este é um múnus que deve ser exercido fundamentalmente no interesse do filho menor, o Estado pode interferir nessa relação, que, em síntese, afeta a célula familiar. Mas pode-se afirmar que existem situações em que essa duração pode ser antecipada, cabendo o propósito de distinguir a sua cessação por meio natural, e a suspensão ou extinção do poder familiar, por ato jurisdicional.47 Bittar ensina que: Várias vicissitudes podem afetar o poder familiar, acarretando os fenômenos da suspensão e destituição, [...] respectiva. Suspensão é a cessação temporária do exercício do poder, por ordem judicial, em processo próprio, e sob causa definida em lei. Destituição é o afastamento definitivo do genitor do poder, em virtude de motivo previsto, por expresso, em lei. [...]. Verifica-se, pois, que pode haver privação do direito e do exercício do direito, e em caráter temporário ou definitivo, conforme as circunstâncias, interrompendo-se, assim, os direitos e deveres respectivos. Por fatos voluntários ou naturais podem, ademais, advir às privações mencionadas.48 O poder familiar não tem duração vitalícia, sendo extinto quando o filho alcançar a maioridade ou se este se emancipar, ou ainda pela adoção, pois os direitos e deveres relativos ao poder familiar são transferidos para o pai adotivo, assim, extinguindo o poder familiar do pai consangüíneo. O menor vira órfão com o falecimento do pai adotivo, pois o poder familiar não se restabelece ao pai de sangue.49 A morte de um dos pais não faz cessar o poder familiar do cônjuge sobrevivente. A morte de um deles importa na subsistência do poder familiar na pessoa do outro. Por outro lado, a morte de ambos os pais, o extingui.50 Nos casos em que ocorrer a morte de ambos os pais haverá a necessidade de nomeação de tutor, para que se possa dar seqüência à proteção dos interesses pessoais e patrimoniais do órfão. E, dispõe ainda Gonçalves que com, “a morte do 47 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 379 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 227 49 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo, Saraiva, 2006. p. 1339 50 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 380 48 16 filho, a emancipação e a maioridade fazem desaparecer razão de ser do instituto, que é a proteção do menor”.51 Ao ser estabelecida nova união estável ou novo casamento, não haverá perda do poder familiar, em relação ao filho menor do antigo casamento (CC/02, art. 1636), havendo ainda, a administração e usufruto dos bens do filho, juntamente com os encargos relativos à criação e educação.52 O novo companheiro ou cônjuge não poderá interferir na educação, criação e bens do filho menor, uma vez que este não é seu filho e não possui direito de exercer o poder familiar (CC/02, art. 1636).53 1.4 PROCEDIMENTOS DE SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR Além dos deveres inerentes aos pais expressos na CRFB/88, em seu artigo 227, também se encontram previstos no CC/02 e especialmente no Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 7º, que respectivamente dispõe-se: Art. 227 – É dever da família, da sociedade do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 54 Art. 7 – A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais e públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.55 E caso o juiz depois de ouvido as partes interessadas, poderá decretar a suspensão do poder familiar, liminarmente, e até o julgamento definitivo da causa, fica a criança ou o adolescente confiado à pessoa idônea, mediante termo de 51 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 373 52 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1339 53 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1339 54 CRFB/88 p. 95 55 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 13 17 responsabilidade. Após findada a lide, quando procedente a sentença será averbada à margem do registro de nascimento da prole.56 E tem também sua previsão legal no artigo 1637 do CC/02, a saber: Art. 1637 – Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.57 O artigo supra citado afirma ainda que, os pais podem ser suspensos do poder familiar, no caso de agirem com abusos, faltarem com os deveres inerentes ou arruinarem os bens dos filhos. Podem também ser suspensos do poder familiar o pai ou a mãe, desde que sejam condenados por crime cuja pena exceda dois anos de prisão. Cada caso deverá ser analisado em separado, pois até mesmo uma condenação por tempo menor que este estabelecido pode provocar a suspensão ou até mesmo a perda do poder familiar dependendo da gravidade do fato ocorrido com relação ao filho.58 Explana Maria Helena Diniz: A suspensão do poder familiar é uma sanção [...] que visa preservar os interesses do filho menor, privando o genitor, temporariamente, do seu exercício, por prejudicar um dos filhos ou alguns deles [...]. Nada obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder familiar, uma vez desaparecida a causa que originou sua suspensão.59 A suspensão do poder familiar se dá por má conduta dos pais ou por fato involuntário destes e somente ocorrerá por decreto judicial, sendo necessário à propositura de uma ação competente junto ao Ministério Público.60 Os procedimentos para a perda ou suspensão do poder familiar estão disciplinados no artigo 155 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que assim o descreve: 56 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 381 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1340 58 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo. Atlas. 2004. p. 381 59 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1340 60 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1341 57 18 Art. 155 – O procedimento para a perda ou suspensão do pátrio poder terá início por provocação do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse.61 Quando noticiado o comportamento ruinoso dos pais aos haveres de seus filhos, não se deve esperar a perda para impor a medida de suspensão do poder familiar. O que predomina é a idéia de proteção aos interesses do menor. Portanto, deve-se aplicá-la imediatamente, principalmente nos casos em que a demora pode tornar a medida infrutífera. A imposição da pena de suspensão do poder familiar é deixado ao juiz, que tem a liberdade de aplicá-lo ou não. A lei não estipula por quanto tempo deve ocorrer a suspensão do poder familiar. O juiz pode, também, a seu critério, revogar a medida, se assim achar conveniente.62 O poder familiar pode ser perdido pelas causas descritas nos seguintes artigos destacados do Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente respectivamente: Art. 1638 – perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I – castigar imoderadamente o filho; II – deixar o filho em abandono; III – praticar atos à moral e aos bons costumes; IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. 63 Art. 24 – A perda e suspensão do pátrio poder serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificados dos deveres e obrigações a que alude o art. 22, ou seja, “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. 64 Com referência ao inciso II do artigo 1638 do CC/02, a CRFB/88 em seu artigo 227 mencionado doravante, prevê que toda criança e adolescente deve ter direito à convivência familiar e comunitária, portanto, quando se trata de ‘infante exposto’, termo este que deve ser interpretado como ‘criança abandonada’, é dispensado o consentimento dos pais, embora seja necessário o processo de destituição do poder familiar.65 61 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 260 62 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo. Atlas. 2004. p. 380 63 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. São Paulo: Rideel, 2007. p. 280 64 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8 ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 32 65 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 530 19 A perda e a suspensão do poder familiar referida no artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente onde faz menção ao artigo 22 da mesma lei, se reporta ao descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos filhos.66 Pode se dizer que essa lei deixa claro que sua filosofia é a manutenção da criança ou adolescente na sua família de origem, da qual somente devem ser afastados havendo motivos ponderáveis.67 A lei pune o exagero. Castigar um filho, sem excesso, é lícito. Corrigir erros de conduta é lícito, sendo vedado o abuso. As circunstâncias devem ser analisadas pelo juiz, o qual pode aplicar a pena de perda do poder familiar se tal convier aos interesses do filho, pois a prática reiterada de atos vergonhosos ou reprováveis citado no inciso IV do artigo supra citado, possibilita ao juiz um elastério maior para poder aplicar a reprimenda mais gravosa do que a do artigo 1.637 do CC/02, devido ao mau comportamento dos genitores em relação à prole.68 Segundo os ensinamentos de Gonçalves: A perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, de caráter contencioso, desde que comprovem a cessação das causas que a determinaram. É imperativa, e não facultativa. Abrange toda a prole, por representar um reconhecimento judicial de que o titular do poder familiar não está capacitado para o seu exercício.69 Cáio Mario destaca que a falta de assistência à criança e ao jovem de quem se tenha a guarda e a responsabilidade em decorrência de representação legal ou judicial, pode ser identificada como crime.70 Podendo ser citados como exemplo os seguintes artigos todos do Código Penal Brasileiro: Art. 133 – Abandono de incapaz – Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, 66 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 32 67 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 379 68 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 529 69 GONÇALVES, Carlos Roberto. direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 380 70 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito família. 14. ed. v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 234 20 incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena – detenção, de seis meses a três anos. [...] Art. 134 – Exposição ou abandono de recém-nascido – Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena – detenção, de seis meses a dois anos. [...] Art. 244 - Abandono material - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de sessenta anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: pena – detenção, de um a quatro anos, e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. [...] Art. 245 - abandono intelectual – Entregar filho menor de dezoito anos a pessoa em cuja companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente em perigo: pena – detenção, de um a dois anos. [...] Art. 247 - abandono moral – Permitir que alguém menor de dezoito anos, sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou vigilância: I – freqüente casa de jogo ou mal-afamada, ou conviva com pessoa viciosa ou de má vida; II – freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor, ou participe de representação de igual natureza; IV – mendigue ou sirva para excitar a comiseração pública: Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.71 A perda do poder familiar pode atingir um ou ambos os pais. Cada caso deve ser analisado em separado pelo Magistrado. Fatos como, por exemplo, entregar a filha à prostituição ou o filho à delinqüência, injúrias graves, abandono, dever ser avaliados pelo juiz.72 Uma vez ingressada uma ação de perda e de suspensão do pátrio poder, o pai ou a mãe evolvido têm o amplo direito à defesa, devendo ser nomeado um defensor dativo para defendê-los, caso não possam fazer às suas expensas. E é de suma importância ressaltar que conforme prevê o artigo 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a falta ou a carência de recursos matérias não constituem motivos suficientes para a perda ou suspensão de poder familiar, pois sendo essa a situação, cabe ao Estado suprir as condições mínimas de sobrevivência, incluindo a família em programas oficiais de auxílio.73 Essa regra visa à proteção dos pais pobres, porém diligentes no cuidado com o filho. Procura amparar aqueles que lutam com dificuldades, muitas vezes extremas, mas que não desistem dos filhos. Esse dispositivo tutela o interesse das 71 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Penal. São Paulo: Rideel, 2007. p. 449 e 459 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 378 73 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 227 72 21 pessoas pobres, mas que não se acomodam, não se omitem nas tentativas de propiciar aos filhos uma vida digna. A condição de miserabilidade, por si só, não pode privar os pais de exercerem o poder familiar com relação a seus filhos.74 Com relação às medidas descritas sobre suspensão, perda ou extinção, a suspensão do poder familiar é a menos grave, pois uma vez extinta a causa que gerou essa suspensão, o mesmo pode ser restabelecido. Por outro lado, a perda ou a extinção do poder familiar é a mais grave sanção imposta aos pais que não cumprem os deveres com relação a seus filhos.75 Nessa relação entre filhos e pais, os limites de convivência e da educação, entre outras, estão fixadas na CRFB/88, no CC/02, no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, e não podendo deixar de ser citado o Conselho Tutelar que tem um importante papel nos casos em que alguma irregularidade seja noticiada.76 O Conselho Tutelar é um órgão público municipal de caráter autônomo e permanente, cuja função é zelar pelos direitos da infância e juventude, conforme os princípios estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. São pessoas que têm o papel de porta-voz das suas respectivas comunidades, atuando junto a órgãos e entidades para assegurar os direitos das crianças e adolescentes. São eleitos 5 membros através do voto direto da comunidade, para mandato de 3 anos. Tem como prioridade, atender às crianças e adolescentes que tiverem seus direitos ameaçados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta; omissão ou abuso dos pais ou responsáveis; ou em razão de sua conduta.77 O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, em seu artigo 136, as atribuições do Conselho Tutelar, das quais se pode destacar o atendimento às crianças e adolescentes; atender e aconselhar os pais ou responsáveis; requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança; fiscalizar entidades de atendimento; requisitar certidões de nascimento ou de óbitos, bem como iniciar por meio de representação os procedimentos judiciais de apuração de irregularidades em entidade de atendimento e de infração administrativa às normas de proteção, entre outras que visam sempre 74 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 228 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 382 76 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 380 77 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. ver. amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 139 75 22 defender, proteger, corrigir e acompanhar as famílias com tais problemas inerentes aos interesses dos menores.78 Caso as medidas de proteção destacadas no Estatuto da Criança e do Adolescente sejam violadas o Conselho Tutelar poderá aplicar medidas projetivas, tais como as elencadas no artigo 101 da referida lei, que dentre elas a de se destacar as do inciso VII e VIII consideradas mais graves, que são respectivamente: abrigo em entidade; colocação em família substituta. Mas tais medidas devem ser tomadas quando se tratar de criança ou adolescente abandonado, por ação ou omissão da Sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável, em razão de sua conduta, devendo, nesses casos, ser comunicada imediatamente a autoridade judiciária.79 Para Gonçalves, “a perda ou destituição constitui espécie de extinção do poder familiar decretada por decisão judicial [...]”.80 Dispõe Mª Helena Diniz em relação à extinção do poder familiar o momento em que ocorre tal ato, artigo 1635 do CC/02: 1) Morte dos pais ou do filho, pois morte de um deles não extingue o poder familiar, visto que o outro o exercerá sozinho; cessando apenas quando ambos os genitores falecerem, colocando-se os filhos menores não emancipados sob tutela. Se houver morte do filho, elimina-se a relação jurídica, por não haver mais razão de ser do poder familiar; 2) Emancipação do filho, ou seja, aquisição da capacidade civil antes da idade legal nos casos do Código Civil, art. 5º, parágrafo único, equiparando-se a pessoa maior, deixa, então, de submeter-se ao poder familiar; 3) Maioridade do filho, conferindo-lhe a plenitude dos direitos civis, fazendo cessar a dependência paterna, uma vez que há presunção legal de que o indivíduo, atingindo 18 anos, não mais necessita de proteção. 4) Adoção, que extingue o poder familiar do pai ou da mãe, transferindo-o ao adotante; se falecer o pai adotivo, não se restaura o poder familiar do pai ou mãe natural, nomeando-se tutor ao menor; 5) Decisão judicial decretando a perda do poder familiar pela ocorrência das hipóteses arroladas no art. 1.638 do Código Civil.81 Preleciona Silvio Rodrigues que tais sanções: 78 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. rev. amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 143 79 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e de adolescente. 6 ed. rev. amp. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 143 80 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 372 81 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito de família. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5. p. 531 23 [...] têm menos um intuito punitivo aos pais do que o de preservar o interesse dos filhos, afastando-os da nociva influência daqueles. Tanto assim é que, cessadas as causas que conduziram à destituição do poder familiar e transcorrido um período mais ou menos longo de consolidação, pode o poder paternal ser devolvido aos antigos titulares.82 A extinção do poder familiar é a forma pela qual cessa em definitivo o poderdever dos pais sobre os filhos menores, de forma natural ou por decisão judicial. Do confronto entre os dois textos (o antigo e o novo Código), chega-se à conclusão de que a estrutura legal do antigo pátrio poder foi mantida intacta, com modificações tópicas de redação. Houve, apenas, duas inclusões ao texto de 1916: a) outro tipo de extinção do poder familiar (por decisão judicial); b) outro tipo de perda do poder familiar, por ato judicial (incidir, reiteradamente, em falta aos deveres inerentes aos pais). Manteve-se o que já estava previsto com relação aos titulares do poder familiar, ao exercício e à suspensão e extinção. O novo Código mantém o usufruto legal dos bens dos filhos em favor dos pais. A inclusão de artigo prevendo a representação dos filhos menores de 16 anos e a assistência aos filhos entre 16 e 18 anos é de natureza pessoal, não se atendo apenas às questões de cunho patrimonial. Quanto ao Pátrio Poder mudou para Poder Familiar no novo Código Civil. Na época do antigo Código Civil (1916) quem exercia o poder sobre os filhos era o pai e não se falava no poder do pai e da mãe (pais). Mas esta situação mudou e hoje a responsabilidade sobre os filhos é de ambos. A separação judicial ou divórcio dos pais não altera nada a questão do poder familiar, o que se estabelece neste caso é a guarda da criança e o valor da pensão alimentícia a ser paga, mas ambos continuam responsáveis. O poder familiar se extingue com a morte dos pais ou do próprio filho, quando os filhos completam 18 anos ou são emancipados após os 16 anos. Outro caso de término do poder familiar é a adoção. O poder familiar é um instituto importante e que deve ser levado a sério. A vida de uma criança depende dos pais em todos os sentidos enquanto ela está em formação e justamente nesta fase a criança estará sendo moldada para crescer e se tornar um bom adulto. 82 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 372 24 Assim, como visto, guarda também foi tratada na Lei do Divórcio, mas não vigoram os artigos ali contidos. Para a determinação da guarda, seja essa guarda pela ruptura da sociedade conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas normas estipuladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre observar o melhor interesse da criança ou adolescente. A guarda previdenciária é muito utilizada por avós paternos ou maternos para a inclusão de netos como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes indeferida, continua a ser exercitada com freqüência. Na dissolução da sociedade conjugal através de separação consensual, ou seja, aquela em que as partes, através de um acordo, decidem por fim na relação conjugal, a guarda será definida por acordo entre os cônjuges separados. A guarda na separação litigiosa pode ser através da homologação do acordo entre os genitores ou caberá ao magistrado aplicar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. A guarda será defenda para o genitor que demonstra proporcionar as melhores condições à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da criança ou do adolescente. Na dissolução de união estável, quando os pais não entrarem em um acordo, caberá ao juiz analisar aquele que possui melhores condições em exercê-la. A guarda compartilhada é aquela em que a criança possui uma residência principal, porém, as responsabilidades sobre a criança e/ou adolescente, serão decididas conjuntamente entre os genitores. E para concessão da referida guarda, o juiz observará à harmonia entre o casal separado, a vontade dos filhos, a moradia dos pais, o diálogo e o respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, visando sempre o melhor interesse dos filhos. O exame da referida guarda, para que sua utilização se torne aceitável e de correta aplicação, deve conter uma análise de seus prós e contras, pois, a princípio, nada é perfeito ou de total inutilidade, com raras exceções, principalmente quando se encontra em jogo o desenvolvimento da personalidade de um ser em constante desenvolvimento. Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos, poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los, pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na 25 função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento de reparação civil. Ocorrerá a perda da guarda quando os pais não cumprem seu papel, desproporcionando ao filho os direitos fundamentais assegurados pela lei. 26 2 DA GUARDA DOS FILHOS Neste Capítulo abordar-se-á a Guarda, o seu histórico e a sua conceituação, nas diversas formas de ruptura da sociedade conjugal. 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS A palavra guarda originou-se do antigo alemão onde “warten (significa guarda, esperar), também se pode dizer que se originou do inglês warden (significa guarda), que formou o francês garde (guarda), assim, entende - se pelo termo guarda, proteção, vigilância, observação”, de acordo com a definição de Plácido e Silva.83 Em tempos remotos, a guarda judicial, era sempre concedida à figura da mãe, por ter gerado o filho, e ainda, dispor de tempo para se dedicar às atividades da casa e do bem estar da criança. Enquanto, o pai, trabalhava em atividades externas, buscando o sustento e alimentação de sua família, não dispondo de tempo para cuidar e participar da vida dos filhos.84 A matéria sobre guarda teve sua origem no CC/16, estabelecida em seus artigos 325 a 328. Entretanto com o surgimento da Lei do Divórcio nº 6.515 de 1977 6515/77 85 , a matéria passou a ser tratada nos artigos 9° a 1 6, desta lei, sob o título “Da Proteção do Filho”.86 A Lei do Divórcio 6515/77 regulava que nos casos da ruptura da sociedade conjugal, seja essa ruptura por qualquer motivo, os pais poderiam acordar sobre a guarda dos filhos.87 83 De Plácido e Silva apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 53 84 WELTER, Belmiro Pedro e Rolf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria dos advogados, 2004. p. 344 85 BRASIL, Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977. 86 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 166 87 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 166 27 O CC/02 ao invés de delinear regras específicas para cada caso de separação define que, na falta de acordo entre os cônjuges, a guarda será atribuída a quem obter as melhores condições para exercê-la.88 Conforme o estabelecido no artigo 1.584, caput, do CC/02: Art. 1.584 - Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.89 Corroborando com o entendimento de se conceder a guarda a quem apresentar melhores condições em exercê-la, diz Rosana Fachin: Preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente relativamente à guarda, é o princípio informador para que o juiz confira a guarda àquele dos pais que efetivamente tenha melhores condições de realizar, dentro dos padrões mínimos, esses interesses.90 Consagrado no artigo 1.586 do CC/02, o qual também estava previsto no artigo 327 do CC/16, que foi revogado, e no artigo 13 da Lei do Divórcio nº 6.515/77, o princípio favor filli91, ou seja, em qualquer caso, havendo motivos graves, poderá o juiz, tendo em vista o bem estar dos filhos, regular a situação destes com os pais, diferentemente do estabelecido nos artigos concernentes à matéria.92 Conforme o estabelecido no artigo 1.586 do CC/02: Art. 1.586 - Havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos, regular de maneira diferente da estabelecida nos artigos antecedentes a situação deles para com os pais.93 No direito, o tema guarda teve importância especial em dois momentos distintos, como se pode perceber, de acordo com Waldyr Grisard Filho: Em nosso direito, como vimos o tema guarda mereceu relevância em duas hipóteses distintas e sujeitas, cada qual, a um ordenamento 88 CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 357 89 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 277 90 Rosana Fachin apud DIAS, Maria Berenice. Direito de família e o novo código civil. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 122. 91 Princípio favor filIi significa: fazer prevalecer, em todos os casos, o bem da criança; valorizar e perseguir o que melhor atender aos interesses do menor. (Zeno Veloso) 92 CARVALHO NETO. lnácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 358 93 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 277 28 jurídico peculiar: na dissolução da sociedade conjugal, ou de qualquer forma de união: e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Em linhas gerais, percorreu esse caminha legislativo.94 Nesse mesmo entendimento diz Válter Kenji lshida: Embora o termo técnico seja o mesmo, duas modalidades de guarda existem. A primeira tratada é a guarda insenda dentro da família e normalmente atribuída a um dos genitores que igualmente exercem o poder familiar, Esta é “de competência da Vara da Família: Sendo a outra a guarda originária do Estatuto da Criança e do Adolescente e tratada como forma de colocação de família substituta”.95 É notório que para estes dois momentos distintos da determinação da guarda, cada modalidade tem a sua competência para ser julgada, conforme leciona Inácio de Carvalho Neto: É de se observar também que a competência para conhecer de questões relativas à guarda de filho, ainda que não insertas em processo de separação e divórcio, é da Vara de Família e não da Vara da Infância e da Juventude.96 Confirmando este ensinamento diz Giovane Serra Azul Guimarães que: “A guarda pode ser exercida naturalmente em virtude do pleno exercício do poder familiar ou fixada judicialmente, pelo juízo da Família ou da Infância e da Juventude”.97 Faz-se necessário observar, que a guarda também foi tratada na Lei do Divórcio, mas não vigoram os artigos ali contidos. Nas diversas maneiras de rupturas da sociedade conjugal, de que trata esta lei, tem-se o seguinte: numa separação consensual, verifica-se que caberia aos genitores acordarem sobre a guarda dos filhos; porém, numa separação litigiosa, teriam que ser analisados algumas questões, como a dos filhos permanecerem sob a guarda do cônjuge que não deu causa a separação, ou de os mesmos permanecerem sob a guarda daquele que já estavam em companhia durante a ruptura da sociedade conjugal, e ainda, de permanecerem com o genitor que apresentar melhores condições de exercer a guarda. No caso de uma separação litigiosa, onde ambos os genitores foram responsáveis pela ruptura, à guarda caberia a mãe. 94 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 55 95 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 165 96 CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 359 97 GUIMARÂES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 2. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 15 29 A guarda é um componente do poder familiar, podendo ainda ser determinada a um terceiro em alguns casos extraordinários, ou ainda ser determinada para um só dos genitores, sendo que este terá a incumbência de prestar assistência educacional, moral e material.98 Guilherme Gonçalves Strenger, conceitua a guarda como um poder dever, dizendo: Guarda de filhos é o poder-dever submetido a um regime jurídico legal, de modo a facilitar a que de direito, prerrogativas para o exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa condição. Leva-nos à crença de que a guarda não é só um poder pela similitude que contém com a autoridade parental, com todas as vertentes jurídicas, como é um dever, visto que decorre de impositivos legais, inclusive com natureza de ordem pública, razão pela qual se pode conceber esse exercício como um poder- dever.99 A guarda representa uma convivência dos filhos com os pais, dentro do mesmo lar. Cabe aos pais assistir os filhos materialmente, moralmente e psicologicamente. E ainda tem os pais o dever de vigiar os filhos nos seus atos praticados, pois devem estar atentos no desenvolvimento dos filhos tanto no psíquico, quanto no social.100 Assim aos pais, a guarda dos filhos representa um tempo de direito e deveres, como se pode observar com o que diz Valter lshida: A guarda do filho representa, para os pais, a um tempo direito e dever; direito de manter o filho junto a si, disciplinando-lhe as relações com estranhos, e, por extensão, de interceptar-lhe a correspondência; e dever de guarda, a que não podem subtrair- lhe, incumbindo-lhes resguarda a vida do filho, com os desvelos próprios à sua idade ou formação.101 Para Mário Moura Aguiar entende-se por guarda, um controle objetivo do desenvolvimento do menor, ou seja, em sentido jurídico, os pais ou responsável, devem morar no mesmo lar do menor, devendo estes conceder a assistência 98 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 2 ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003.p. 15. 99 STRENGER, Guilherme Gonçalves apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Ed. de Direito, 2005. p. 43 100 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.67. 101 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p.163. 30 material (vestuário, alimentação), para a sobrevivência física moral, desenvolvendo no menor a sua formação psicológica.102 Válter Kenji lshida divide a guarda em duas modalidades distintas, ou seja, a guarda provisória e a guarda definitiva, conceituando cada uma dessas, como se observa: Guarda Provisória — na fixação pelo juiz, pode ocorrer nas separações de casais com filhos menores ou filhos maiores e inválidos até que seja solucionada a situação, com a decisão final, sendo que nesses casos o julgamento estará afeto aos juízes de família, e não de menores. Nesta hipótese, o magistrado fixa liminarmente a guarda a um dos genitores e, em relação ao outro, fixa os dias de visita, até que a causa seja definitivamente decidida. Guarda Definitiva — é resultante de uma decisão que põe fim ao processo, determinando com quem deverá ficar o menor.103 A partir destes conceitos norteados pelo ordenamento jurídico foi estabelecida a guarda no ECA especialmente para crianças e adolescentes. 2.2 GUARDA NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE LEI 8.069/90 A guarda está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/90 - ECA, nos artigos 33 ao 35, pois a criança e o adolescente devem ser criados no seio de sua família natural, isto é, aquela formada pelo pai e pela mãe, ou ainda, entre um deles e seus descendentes. Não sendo possível essa permanência, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece princípios através dos quais à criança e o adolescente são colocados em família substituta. A guarda que é estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, é a decorrente do abandono e da orfandade, como observa Waldyr Grisard Filho: A guarda prevista no Estatuto decorre do abandono e da orfandade Porém, a só orfandade não determina a guarda sob os auspícios dessa lei. É preciso circunscrevê-la nas hipóteses de seu artigo 98 (direitos ameaçados ou violados), quando então emerge a 102 AGUIAR, Mário Moura apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 55. 103 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p.163. 31 competência da Justiça, especializada, através do artigo 48, parágrafo único, letra a: conhecer dos pedidos de guarda e tutela”.104 Marcial Barreto Casabona discorre sobre o que está previsto no artigo 28 do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde a guarda pode ser deferida à uma família substituta: O artigo 28 da lei 8.069/90 estabelece a guarda como um meio de colocar o menor em família substituta ou em associação, independentemente de sua situação jurídica, até que se resolva, definitivamente, o destino do menor.105 Giovane Serra Azul Guimarães comenta sobre o que dispõe o artigo 32 do Estatuto da Criança e do Adolescente que: Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante termo nos autos, devendo ser observado o prazo previsto no artigo 1.187 do Código de Processo Civil.106 O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê em seus dispositivos três modalidades distintas de guarda: a provisória, a permanente e a peculiar. Ana Maria Moreira Marchesan define o que vem a ser cada uma dessas modalidades de guarda: Guarda Provisória (art. 33, §1°ECA) subdividi-se em duas subespécies: liminar e incidental, nos processos de tutela e adoção, salvo nos de adoção por estrangeiros, onde é juridicamente impossível. A permanente (art. 33, §2°- 1° hipótese ) destina-se a atender situações peculiares, onde não se logrou uma adoção ou tutela, que são mais benéficas ao menor. É medida de cunho perene, estimulada pelo art.34 do ECA. Guarda Peculiar (art.33, §2°2°hipótese) traduz uma novidade introduzida pelo Es tatuto. Visa o suprimento de uma falta eventual dos pais, permitindo - se que o guardião represente o guardado em determinada situação.107 Nas modalidades supra citadas encontradas no Estatuto da Criança e do Adolescente, o órgão competente para julgar estes pedidos é o Juízo da Vara da 104 GRISARO, FILHO Waldyr apud CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 144. 105 CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 141. 106 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda: conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 2. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 18. 107 MARCHESAN Ana Mana Moreira apud ISHIDA, Válter Kenji. Direito de Família e sua interpretação doutrinária e jurisprudencial. São Paulo: Saraiva, 2003. p.73 32 Infância e Juventude, pois nos referidos casos a criança encontra-se em situação irregular.108 No artigo 33, parágrafo 3° do ECA está prevista a g uarda para fins previdenciários que, como Josiane Petry Veronese destaca: “A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.109 Assim que for estabelecida a guarda, de imediato o menor passará a ser dependente do guardião para todos os efeitos legais, até mesmo os previdenciários, estes que serão abordados no próximo item que será sobre a guarda previdenciária.110 O artigo 34 do ECA trata de guarda especial, ou seja, de crianças e adolescentes órfãos ou abandonados, tendo o Estado obrigação de fornecer assistência jurídica para facilitar a determinação da guarda. Sobre este artigo leciona Ishida: Constitui obrigação do Estado concretizada neste artigo fornecer assistência jurídica, visando, por exemplo, facilitar os meios de se pleitear a guarda, fornecer incentivos, como abatimento no imposto de renda e subsídios, visando ao acolhimento por pessoas e ao desacolhimento.111 Conforme Cury, Marçura e Garrido a guarda definitiva sempre será por prazo indeterminado, pois pode ser modificado a qualquer tempo: A guarda sempre é deferida a título precário, de modo que a chamada guarda definitiva traduz apenas medida por prazo indeterminado. Alteradas as condições que serviram de lastro para o seu deferimento, poderá ser revista mediante pedido de modificação.112 A referida modificação da guarda será feita através de vias judiciais, devendo os magistrados decidirem, com cautela, pois para a modificação da guarda, deverá ser levado em conta o melhor interesse do menor. 108 CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 143 109 VERONESE, Josiane Rose Petry. Direito da criança e do adolescente. v. 50. Florianópolis: Editora OAB/SC, 2006. p. 28 110 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro. 1999. p. 261 111 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 78 112 CURY, Munir. Jurandir Norberto Marçura e Paulo Afonso Garrido de Paula. Estatuto da criança e do adolescente anotado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 50 33 Assim, portanto, que para a determinação da guarda, seja essa guarda pela ruptura da sociedade conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas normas estipuladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre observar o melhor interesse da criança ou adolescente. Além das citadas, há outras espécies de guarda fundadas em legislação especifica que, para melhor exemplificação do tema, passa-se a expor. 2.3 GUARDA PREVIDENCIÁRIA A guarda previdenciária, muito utilizada por ascendentes para a inclusão de descendentes como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes indeferida, continua a ser exercitada com freqüência. A finalidade desta guarda é colocar a criança em lar substituto ante a ausência da família original ou a impossibilidade de ser criada por ela, é um contra-senso deferir-se, por exemplo, a guarda para os avós, quando a criança esteja morando com os pais biológicos e por estes mantidas.113 É fato comum os filhos ao se casarem, continuarem morando com os pais, e com o nascimento dos filhos, enxergando a possibilidade de no futuro, esses usufruírem de direitos previdenciários dos avós, é que se pleiteia a guarda previdenciária.114 Esta espécie de guarda é muito criticada e vem ocorrendo inúmeros casos de indeferimento nos tribunais, pois, as restrições para concessão de tal benefício se justificam em função do risco de fraudes. Pode ocorrer do menor viver no mesmo domicílio que uma avó, por exemplo. Porém, não sendo demonstrada a falta de condições dos pais de provê-lo com os cuidados necessários, ou sendo estes ausentes, não há motivos que ensejam a alteração de guarda. No entanto, deve ser analisado caso a caso, pois há situações em que se faz necessária essa medida, como por exemplo, menor em estado precário de saúde. Com a evidente precariedade da previdência social, onde muitos exames e cirurgias básicas deixam 113 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 57 114 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 58 34 de ser oferecidos, é que a guarda previdenciária faz sentido, apresentando maiores garantias para seus beneficiários.115 Além do que, o Estatuto da Criança e do Adolescente não proíbe esse tipo de guarda, mas, ao contrário, prevê, no artigo 33, § 2°, a excepcionalidade da guarda fora dos casos da tutela e da adoção. Art. 33 - A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. § 2º. Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.116 E em seu artigo 33 parágrafo 3°, estabelece como um dos efeitos da guarda o de conferir “à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.117 2.4 GUARDA NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL No rito católico do casamento mantém-se a frase “até que a morte os separe”, porém há de se compreender que: se dá a morte física onde o corpo perde suas funções vitais e a morte subjetiva onde o amor ou qualquer outro sentimento que tenha unido aquele casal cesse. Em direito este processo de litígio conjugal, de desencontro amoroso, da morte subjetiva do amor chama-se separação conjugal e divórcio e neste meio a guarda pelos filhos. A guarda e proteção dos filhos na dissolução da sociedade conjugal eram tratadas nos artigos 325 a 329 do CC/16. Esses artigos foram revogados pela Lei do Divórcio 6515/77, trazendo regras sobre a matéria nos artigos 9 a 16, que 115 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 59 116 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 37 117 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 38 35 mostraram-se injustificáveis, com o vigente CC/02, onde disciplina a referida proteção em seus artigos 1.583 a 1.590.118 Legalmente a dissolução da sociedade conjugal termina com a morte de um dos cônjuges, com a nulidade ou anulação do casamento, com a separação extrajudicial (Lei Federal nº 11.441, de 04/01/2007), judicial ou com o divórcio. No caso de separação judicial podem ser: a consensual, ou por mútuo consentimento, e a judicial, ou litigiosa. Onde é necessária a contratação de um representante legal, o advogado, para representar uma ou ambas as partes no processo. Dependendo de cada caso irá se disputar ou não os bens materiais e a posse e guarda dos filhos.119 Muitas vezes estas crianças são relegadas em segundo plano ou passam a ser mais uma arma que o casal usa para se atingirem mutuamente. Às vezes se esquecem do que seria melhor para os filhos e os colocam em situações as quais não possuem maturidade e discernimento para enfrentá-las. Os filhos acabam sendo os mais prejudicados no processo. Dependendo de cada caso podem gerar neles traumas onde a dificuldade, no futuro, em lidar com as questões afetivas serão constatadas. Geralmente a criança se sente culpada pela separação dos pais. Sentimentos de ansiedade, culpa, depressão, tristeza, repetência, dificuldade na aprendizagem, sentimento de não ser amado ou de abandono entre outros são comuns em crianças cujos pais se separam.120 Ocorrendo a dissolução, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos, não ocorrendo acordo a guarda será atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la. Cabe aos pais disciplinarem sobre o direito de visitas. Porém o mais importante não é o tipo de guarda mais sim a forma como ela é passada para a criança e como é a relação dos pais. Os pais devem tentar se relacionar da melhor forma possível para que os dramas da separação possam ser minimizados ao máximo para os filhos. Quanto melhor for a relação entre os pais menor será a dor da separação para os filhos. Evidente que isto é difícil, mas, em prol dos filhos, devem ser superadas pequenas disputas.121 A seguir será tratada a guarda nas diversas modalidades de dissolução da sociedade conjugal. 118 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Direito de família. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 204 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1289 120 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Direito de família. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 205 121 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1290 119 36 2.4.1 Guarda na separação judicial consensual Quando a separação judicial for consensual, ou seja, aquela em que as partes, através de um acordo, decidem por fim na relação conjugal, a guarda será definida por acordo entre os cônjuges separados. Verifica-se que a matéria relativa à guarda na separação consensual está prevista no Código Civil de 2002, em seu artigo 1.583, onde prevê que a guarda será deferida pela homologação do acordo realizado entre os genitores, sobre os filhos em comum do casal, assim está disposto: Art. 1.583 CC/02 - No caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial por mútuo consentimento ou pelo divórcio direto consensual, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos.122 Ensina Carlos Roberto Gonçalves que em casos de separação consensual: “Cabe aos cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos, presumindo-se que são os maiores interessados no futuro e bem estar da prole”.123 Os cônjuges ao entrarem com a ação de separação consensual, em sua petição inicial, já devem estabelecer a forma de guarda dos menores, como prevê o artigo 1.121 em seu inciso II, do Código de Processo Civil. Art. 1.121. A petição, instruída com a certidão de casamento e o contrato antenupcial se houver, conterá: [...] II - o acordo relativo à guarda dos filhos menores e ao regime de visitas; (Redação dada pela Lei nº 11.112, de 2005).124 Se na ocasião o acordado entre os genitores não respeitar a prevalência do melhor interesse dos menores, caberá ao juiz recusar a homologação do acordo, e assim alterar o regime de guarda, deferindo-a ao outro genitor ou até mesmo a um terceiro.125 Corroborando com esse mesmo entendimento, leciona Yussef Cahali: 122 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4.ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 277 123 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI. Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 256 124 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Processo Civil: Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 401 125 RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. v. 6. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 273. 37 Na separação judicial consensual, a propósito da guarda dos filhos, deve ser observado o estabelecido pelos cônjuges, salvo ocorrendo motivos graves que levem o juiz, no interesse dos menores, a regular diversamente a sua situação.126 Assim, conclui-se que na dissolução da sociedade conjugal através de separação consensual, cabe aos pais preocuparem-se, além de suas questões pessoais e patrimoniais, com a guarda dos filhos. 2.4.2 Guarda na separação litigiosa A regra estabelecida para a guarda dos filhos na separação litigiosa, antes da vigência do Código Civil de 2002, era que os filhos ficariam com o cônjuge inocente, ou seja, aquele que se comportou de um modo digno durante a relação conjugal. O legislador quis punir o cônjuge culpado com a perda da guarda dos filhos.127 Com o Código Civil de 2002, houve uma modificação sobre a determinação da guarda, passando a ser desconsiderada a culpa de um dos cônjuges para efeito da determinação da guarda. A guarda será atribuída para aquele que demonstrar melhores condições em exercê-la.128 O artigo 1.584 do CC/02 fundamenta sobre a guarda na separação litigiosa que: Art. 1.584. Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.129 Sílvio Neves Baptista diz que não há como se referir a culpa de um dos cônjuges pela separação com a definição do exercício da guarda por um dos genitores, pois um não compromete o exercício do outro. Nem sempre se quer dizer 126 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 11. ed. São Paulo; Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 23 127 CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 362. 128 CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 363. 129 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 277 38 que uma péssima mulher, ou péssimo marido, será também uma péssima mãe ou pai.130 Silvio Venosa aponta também sobre o melhor interesse da criança ou adolescente, como se observa: O carinho, o afeto, o amor, o meio social, o local da residência, a educação, a escola e evidentemente, também as condições econômicas devem ser levados em consideração pelo magistrado, que deve valer-se dos profissionais auxiliares para ter diante de si um quadro claro da situação do lar dos cônjuges, para após decidir quem será o detentor da guarda do menor.131 Ressalta-se, por fim, que nada impede que os cônjuges disponham consensualmente sobre a guarda dos filhos também na separação litigiosa, assim como em qualquer outro caso, o que será extremamente salutar.132 Desta forma, a guarda na separação litigiosa pode dar-se através da homologação do acordo entre os genitores ou por decisão do magistrado que deve aplicar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. A guarda será defenda para o genitor que demonstra proporcionar as melhores condições à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da criança ou do adolescente. 2.4.3 Guarda na dissolução da união estável A união estável encontra-se embasada na CRFB/88, em seu artigo 226, parágrafo 3°, bem como no CC/02 no artigo 1.723, co mo estabelece o fundamentado, respectivamente: Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] 130 BAPTISTA, Sílvio Neves apud CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 363. 131 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 250. 132 CARVALHO NETO, Inácio de. Separação e divórcio: teoria e prática. 7. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 365 39 § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 133 Art. 1.723 - É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.134 Para o Juiz, não existe diferença de os pais serem casadas ou não, pois importância maior é relacionada à criança, tendo esta, o direito de ser criada por ambos.135 O CC/02 não prevê sobre a guarda dos filhos na dissolução de união estável em seus dispositivos; percebe-se então, que será atribuída a guarda aplicando por analogia, conforme o disposto nos artigos compreendidos do 1583 a 1.590 do CC/02.136 Para Waldyr Grisard Filho: A regulamentação da união estável veio com a lei 9.278/96, prevendo, no artigo 2°, III, entre os direitos e de veres dos companheiros, o de guarda, sustento e educação dos filhos comuns, nos moldes do art. 1566 do CC/02. Porém, não regulamentando sobre o destino dos filhos nos casos de ruptura, impondo-se recomendar sejam aplicados por analogia os dispositivos atinentes do Código Civil (artigos 1583 a 1590).137 Portanto, a decisão da guarda dos filhos na dissolução de união estável, quando os pais não entrarem em um acordo, caberá ao juiz analisar aquele que possui melhores condições em exercê-la, assim como nas outras formas de ruptura de uma sociedade conjugal. 133 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95 134 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 284 135 WAMBIER, Teresa Amida Alvim e Eduardo de Oliveira Leite. Repertório de doutrina sobre direito de família. Aspectos constitucionais, civis e processuais. v. 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.264 136 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. Editora Rideel. São Paulo. 2007. p. 277 137 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 30. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 97 40 2.5 GUARDA COMPARTILHADA A guarda compartilhada vem a ser um instituto onde após a ruptura da sociedade conjugal, os pais, de uma forma madura e sensata, acordam que compartilham a guarda dos filhos, dividindo em conjunto os deveres e responsabilidade sobre a criança ou adolescente. Após a ruptura da sociedade conjugal, verifica-se que seria melhor, tanto para os pais quanto para os filhos, que os vínculos afetivos maternos e paternos continuassem a ser do mesmo modo, enquanto os pais estavam vivendo como cônjuges ou companheiros. 2.5.1 Guarda compartilhada: esboço histórico e conceito A guarda compartilhada surgiu no Direito Inglês, com a Common Law138, na década de sessenta, tendo como denominação joint custody139, pois o pai sempre foi o detentor da guarda dos filhos, sendo que no século XIX, a mãe passou a exerce lá, devido a uma alteração que houve no parlamento inglês. Percebendo que a guarda estava muito concentrada na figura da mãe, não sendo aceitável pelas famílias, os tribunais começaram a conceder a split order140, sendo uma divisão do desempenho de ambos os genitores.141 Assim noticia Eduardo de Oliveira Leite: [...] na Inglaterra o pai sempre foi considerado proprietário de seus filhos, logo, em caso de conflito, a guarda lhe era necessariamente concedida. Somente no século XIX, o Parlamento inglês modificou o princípio e atribuiu à mãe a prerrogativa de obter a guarda de seus 138 Common Iaw é um sistema legal oriundo da Inglaterra, utilizado ali e na maioria dos países que foram colônias ou territórios britânicos. Sua característica principal é a valorização da jurisprudência em detrimento das leis estatutárias. Uma tradução ao pé da letra seria “lei comum”, que não corresponde ao atual sentido do termo, mas leva o leitor a refletir sobre sua origem histórica, ao passo que “direito comum”. Wikpedia. Disponível em: <http:pt.wikipedia.org/wiki/Common_Iaw>. Acesso em 18 mar. 2009. 139 joint custody significa o mesmo que guarda conjunta, explica SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. Editora de Direito. São Paulo: 2006. p. 66 140 SpIit order significa o mesmo que guarda compartilhada, explica CASABONA, Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 255 141 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 67 41 filhos e, a partir de então, a prerrogativa exclusiva do pai passou a ser atenuada pelo poder discricionário dos Tribunais.142 A primeira Lei que surgiu sobre guarda compartilhada foi na França, como leciona Ana Maria Milano Silva: Foi na França que surgiu a primeira lei sobre guarda compartilhada, [...], estabelecendo que a autoridade parental deve ser exercida pelo casal a quem, divorciado ou não, compete regrar e determinar os detalhes da vida cotidiana dos filhos.143 Os Estados Unidos da América, por exemplo, absorveram a idéia da guarda compartilhada na década de 80. As estatísticas comprovam que nesse país, esse tipo de guarda é a mais adotada, sendo os genitores totalmente a favor, pois este tipo de guarda só beneficia a criança, ajudando na auto-estima, na atividade, nos relacionamentos e desenvolvimentos psicológicos da criança.144 Em 1995, foi à vez de Portugal adotar a guarda compartilhada, utilizando a nomenclatura de “Guarda Conjunta” em seu Código Civil, como leciona Marcial Barreto Casabona: Em Portugal, o advento da Lei n. 84, de 31 de agosto de 1995, alterou parte do art. 1906 do CC, cujo inciso II passou a estabelecer que os pais podem acordar sobre o exercício em comum do poder paternal, decidindo as questões relativas à prole em condições idênticas às que vigoravam na constância do matrimônio.145 Waldyr Grisard Filho sobre a necessidade da guarda compartilhada diz o seguinte: A noção da guarda compartilhada surgiu da necessidade de se equilibrar os papéis parentais, diante da pemiciosa guarda uniparental concedida sistematicamente à mãe. (na guarda tradicional, o genitor não guardião tem uma quantidade limitada de contato com o menor), e de garantir o melhor interesse do menor, especialmente, as sua necessidades afetivas e emocionais.146 A guarda compartilhada ou conjunta é aquela que, após a dissolução da ruptura conjugal, possibilita aos genitores conjuntamente, tomar decisões sobre o 142 LEITE, Eduardo de Oliveira apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 67 143 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 88 144 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 89 145 CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 261 146 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 30. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 127 42 futuro da prole. Ambos participando da vida dos filhos, em seu crescimento, na formação moral e educacional.147 Nos dias atuais, a modalidade de guarda compartilhada, seria um modelo ideal a ser aplicado após a ruptura da sociedade conjugal, pois é um instituto que permite aos pais, solteiros, ex-casados ou companheiros, uma forma de igualdade em relação à educação e o desenvolvimento da criança.148 No instituto da guarda compartilhada, os pais, em conjunto, possuem a autoridade legal, tendo estes responsabilidades e direitos igualitários em relação à prole, devendo preservar o bem estar do menor. Dr. Henry S. Gombein, americano, especialista na matéria de guarda compartilhada, refere-se ao termo como: [...] “joint legal custody”, refere-se a prerrogativa de tomar decisões em conjunto, o que significa que, mesmo em situações de divórcio, ambos os pais possuem o direito de tomar decisões sobre o futuro dos filhos, embora a criança resida unicamente com um dos pais, que exerce a guarda física.149 Na guarda compartilhada não existe um padrão a ser seguido, pois nessa modalidade o melhor arranjo é que a criança tenha um maior contato com ambos os genitores, privilegiando assim, o bem estar, a educação, a saúde e o desenvolvimento como um todo, do filho.150 Para Sérgio Eduardo Nick, a guarda compartilhada é a possibilidade dos filhos conviverem com ambos os pais: O termo guarda compartilhada ou guarda conjunta de menores refere-se à possibilidade dos filhos de pais separados serem assistidos por ambos os pais. Nela, os pais têm efetiva e equivalente autoridade legal, não só para tomar decisões importantes quanto ao bem estar de seus filhos, como também de conviver com esses filhos em igualdade de condições.151 147 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. p. 115. 148 CASABONA, Marcial Barreto. Guarda Compartilhada. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2006. p. 250. 149 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. p. 64 150 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p109 151 NICK, Sérgio Eduardo apud RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. p. 63. 43 Sintetiza Eduardo de Oliveira Leite, que a guarda compartilhada: “mantém, apesar da ruptura, o exercício em comum da autoridade parenta e reserva, a cada um dos pais, o direito de participar das decisões importantes referentes à criança”.152 Para que se possa compreender melhor, a guarda compartilhada é aquela em que a criança possui uma residência principal, porém, as responsabilidades sobre a criança e/ou adolescente, serão decididas conjuntamente entre os genitores. E para concessão da referida guarda, será observado à harmonia entre o casal separado, além de outros requisitos, visando sempre o melhor interesse daqueles. A guarda compartilhada será determinada pelo juiz, após serem observados alguns requisitos como: a vontade dos filhos, a moradia dos pais, o diálogo e o respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, entre outros. O primeiro requisito a ser analisado é a consulta à vontade do filho. É um aspecto a ser observado, pois é natural que a criança não queira escolher com qual genitor pretende ficar e sim optar em estar com ambos os genitores.153 O melhor interesse da criança persiste como norteador das decisões dos genitores, alerta Waldir Grisard Filho: [...] colima-se o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social do menor e, com absoluta prioridade, se lhe deve assegurar a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, como se vê nos artigos 3º e 4º do ECA, robustece-se de motivos o Direito brasileiro para adotar a guarda compartilhada.154 A determinação da residência é essencial para a estabilidade da criança, que terá assim um ponto de referência, mas faz-se necessário que, ambos os pais possuam acomodações para a criança em suas respectivas residências. Deve ela ter consciência de que existe um canto seu em cada um dos lares de seus genitores, onde ela sentirá que é sua casa também. A proximidade dessas residências facilitaria todo o procedimento.155 152 LEITE, Eduardo de Oliveira apud GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 30. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 126. 153 RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do direito de família. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. p. 67 154 GRISARD FILHO, Waldyr apud SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p117 155 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 114 44 Assim, tem-se que os períodos de deslocamento não poderão interromper a situação escolar das crianças. Por isso é preferível que os pais residam dentro da mesma área escolar, ou razoavelmente perto, ou que ambos disponham de meios para levar e trazer os filhos às respectivas escolas.156 O segundo aspecto a ser considerado na viabilização desse modelo de guarda, é a educação, compreendendo tanto a instrução, como meio de desenvolvimento da inteligência ou aquisição de conhecimentos básicos, quanto, em um sentido mais amplo, o desenvolvimento de todas as atividades físicas e psíquicas do menor. É a principal missão dos pais dirigirem a formação de seus filhos.157 Para a guarda compartilhada ser implantada outro ponto relevante a ser analisado, é se ambos os pais manifestam o interesse por esse instituto de compartilhar as obrigações e direitos sobre a prole, pois, se um dos genitores não aceitar essa modalidade de guarda, ela não deverá ser atribuída a esses pais em conjunto, sendo que correrá o risco de não atingir o principal objetivo, que será o bem estar do menor.158 Para Rolf Hanssen Madaleno, um dos requisitos essenciais para a determinação da guarda compartilhada, é o juízo de ponderação entre os genitores, como se verifica: A guarda compartilhada exige dos genitores um juízo de ponderação, imbuídos da tarefa de priorizarem apenas os interesses de seus filhos comuns, e não o interesse egoísta dos pais. Deve ser tido como indissociável pré-requisito uma harmônica convivência dos genitores; como a de um casal que, embora tenha consolidado a perda de sua sintonia afetiva pelo desencanto da separação, não se desconectou da sua tarefa de inteira realização parental, empenhados em priorizarem a fundamental felicidade da prole.159 Quando os pais, após a dissolução conjugal, continuam vivendo em conflitos, possuem uma relação amarga entre si, à guarda compartilhada não deve ser deferida, pois o filho acabará sendo um motivo para todas as divergências do ex- 156 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006.. p118 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p 109 158 WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 354 159 WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 354 157 45 casal, não sendo possível atingir o resultado principal da guarda compartilhada, que seria do melhor interesse da criança.160 Maria Antonieta Pisano Motta assevera que é uma característica marcante para a determinação da guarda o diálogo entre os pais da criança, ou seja, o excasal, como se observa: [...] o diálogo e o respeito mútuo são características indispensáveis àqueles que pretendem compartilhar qualquer tipo de guarda de seus filhos e muito especialmente àqueles que pretendem dividi - lá.161 Observa-se, que para ser deferida a guarda compartilhada, ela precisa preencher os requisitos essenciais e, sempre abrangendo o melhor interesse para a criança. 2.6 RESPONSABILIDADE JURÍDICA DO GUARDIÃO Guarda, como se disse, é o direito de reter o filho junto a si e de fixar-lhe a residência, levando implícita a convivência cotidiana com o menor. Nesse viés, compete ao genitor guardião escolher a residência de ambos, velar e proteger ao filho, educá-lo e sustentá-lo (artigo 1.703 do CC/02), nos limites, porém, que conhecia antes da ruptura.162 A co-gestão as sociedade conjugal estabelecida pelo artigo 226, §5°, da Carta Magna impõe releitura do artigo 1689, II do CC/02: Art. 226 – A Família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. 163 Art. 1.689 – O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: [...] 160 WELTER, Belmiro Pedro e RoIf Hanssen Madaleno. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 355 161 MOTTA, Maria Antonieta Pisano apud CASABONA, Marcial Barreto. Guarda Compartilhada. São Paulo: Editora Quartíer Latin, 2006. p. 251. 162 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1394 163 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95 46 II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.164 2.6.1 Responsabilidade civil Quando se fala em responsabilidade civil, primeiramente é necessário diferenciar a responsabilidade civil objetiva da subjetiva. A responsabilidade civil subjetiva pressupõe a culpa. Diz-se, pois, ser subjetiva a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável.165 No que tange a responsabilidade objetiva, pode-se dizer que é aquela que independe de culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Essa teoria dita objetiva, ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga. Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano.166 Dessa forma, o CC/1916 e o CC/2002 adotaram a responsabilidade civil subjetiva como regra e a objetiva como exceção, como se percebe no artigo 159 do CC/16 e o artigo 927 do CC/02: Art. 159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.167 Art. 927 - Aquele que por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.168 Após essa introdução, nos remetemos à responsabilidade civil dos menores, englobando tanto o menor impúbere quanto o púbere. Para o menor púbere o CC/16 trazia a sua regra no artigo 156 a saber: Art. 156 O menor, entre dezesseis e vinte e um anos, equipara-se ao maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos, em que for culpado.169 164 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. Lei nº 10.406, de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 282 165 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 715 166 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 716 167 MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil. Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 310 168 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 240 47 O CC/02 não traz artigo semelhante a esse, mas trouxe alterações significativas, entre elas a que trata da capacidade civil, ao reduzir o tempo em que cessa a menoridade de 21 para 18 anos (art. 5º, caput): Art. 5 - A menoridade cessa aos dezoitos anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.170 Com relação ao menor impúbere, o CC/02 adotou posicionamento diferente do CC/16. Para o CC/16, a responsabilidade civil do menor impúbere é subjetiva, em que não havendo culpa não há motivo para indenizar como é demonstrado nos artigos 1521, alínea ‘f’, e 1523, in verbis: Art. 1521 São também responsáveis pela reparação civil. I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob seu poder e em sua companhia. Art. 1523. Excetuadas as do art. 1521, V, só serão responsáveis as pessoas enumeradas nesse e no art. 1.522, provando — se que elas concorreram para o dano por culpa, ou negligência de sua parte.171 Já, no CC/2002, conforme transcreve o artigo 932, I, e o artigo 933, modifica o pensamento do CC/16 e qualifica a responsabilidade dos menores como objetiva, impondo-se a teoria do risco. Art. 932 São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia. Art. 933 As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.172 Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos, poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los, pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento de reparação civil.173 169 MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil. Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 310 170 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 19 171 MIRANDA, Sandra Julien. MARTINI, Carolina Julien. Código Civil. Código de Processo Civil. Constituição Federal. 1. ed. São Paulo: Rideel, 2001. p. 443 172 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 240 173 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1337 48 2.7 PERDA/REVOGAÇÃO DA GUARDA As medidas pertinentes aos pais ou responsáveis tem por escopo funcionar como estrutura de retaguarda para as medidas de proteção trazidas pela CRFB/88, pelo CC/02 e pelo ECA uma vez que a criança e o adolescente não podem ser vistos isoladamente, e, sim, como integrantes de contexto sociofamiliar que, certamente, exerce grande influência em sua vida. Quando os pais não cumprem seu papel, desproporcionando ao filho os direitos fundamentais, dispostos no artigo 227 da CRFB/88, bem como o artigo 15 do ECA, e agindo de maneira negligente ou imprudente, pode, a criança ou o adolescente, ser colocado em família substituta para fins de adoção, tutela ou guarda, a fim de que se garanta o ideal do artigo 19 do Estatuto: Art. 19 - Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada à convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.174 Dispõe o artigo 1634, inciso II, do CC/02: Art. 1634 - Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: [...] II - tê-los em sua companhia e guarda.175 É dever dos pais a guarda de seus filhos menores de 18 anos. O artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente salienta: Art. 22 - Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.176 Nos termos do artigo 35 do ECA: Art. 35 - A guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público.177 174 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 22, 24 175 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil: Lei 10.046, de 10 de janeiro de 2002. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 279 176 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 30 49 Tal revogação poderá ocorrer por vários motivos que nem sempre serão ligados à inadaptação do guardião ao encargo. Poderá ser em decorrência de falta superveniente de condições econômicas do guardião, por exemplo, ou mesmo por desaparecerem os motivos que ensejaram provisoriamente a retirada da guarda dos pais.178 Quando o juiz for chamado a revisar a guarda dos filhos deverá ficar atento ao sistema legal, contudo, o que prepondera é o interesse dos filhos e não a pretensão do pai ou da mãe, uma vez que, a decisão judicial concernente à guarda de filhos menores não faz coisa julgada.179 Segundo Ishida, a perda da guarda é uma das medidas pertinentes aos pais ou responsáveis e será determinada pelo juiz quando o guardião descumprir um dos deveres decorrentes da guarda. Art. 129 do ECA. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável: [...] VIII - perda da guarda.180 Guarda, como exposto alhures, é o direito de reter o filho junto a si e de fixar-lhe a residência, levando implícita a convivência cotidiana com o menor. Nesse viés, compete ao genitor guardião escolher a residência de ambos, velar e proteger ao filho, educá-lo e sustentá-lo, nos limites, porém, que conhecia antes da ruptura. Seus direitos encontram fronteiras nos de visita, companhia e fiscalização do outro. A guarda também foi tratada na Lei do Divórcio, mas não vigoram os artigos ali contidos. Para a determinação da guarda, seja essa guarda pela ruptura da sociedade conjugal ou pela dissolução de união estável, ou ainda pelas normas estipuladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o juiz deverá sempre observar o melhor interesse da criança ou adolescente. A guarda previdenciária é utilizada por avós paternos ou maternos para a inclusão de netos como dependentes, apesar de criticada e muitas vezes indeferida, continua a ser exercitada com freqüência. 177 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 60 178 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 42 179 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61 180 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 208 50 Na dissolução da sociedade conjugal através de separação consensual, ou seja, aquela em que as partes, através de um acordo, decidem por fim na relação conjugal, a guarda será definida por acordo entre os cônjuges separados. A guarda na separação litigiosa pode ser através da homologação do acordo entre os genitores ou caberá ao magistrado aplicar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. A guarda será defenda para o genitor que demonstra proporcionar as melhores condições à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da criança ou do adolescente. Na dissolução de união estável, quando os pais não entrarem em um acordo, caberá ao juiz analisar aquele que possui melhores condições em exercê-la. A guarda compartilhada é aquela em que a criança possui uma residência principal, porém, as responsabilidades sobre a criança e/ou adolescente, serão decididas conjuntamente entre os genitores. E para concessão da referida guarda, o juiz observará à harmonia entre o casal separado, a vontade dos filhos, a moradia dos pais, o diálogo e o respeito entre os pais ex-casados ou companheiros, visando sempre o melhor interesse dos filhos. O exame da referida guarda, para que sua utilização se torne aceitável e de correta aplicação, deve conter uma análise de seus prós e contras, pois, a princípio, nada é perfeito ou de total inutilidade, com raras exceções, principalmente quando se encontra em jogo o desenvolvimento da personalidade de um ser em constante desenvolvimento. Ao mesmo tempo, que o guardião tem a obrigação de fornecer os alimentos, poderá exercer o direito de pedi-los a quem tenha a obrigação legal de prestá-los, pois o titular do pátrio poder não fica isento de tal responsabilidade e, ainda que na função de guardião, responderá pelos danos que o menor causar em procedimento de reparação civil. Ocorrerá a perda da guarda quando os pais não cumprem seu papel, desproporcionando ao filho os direitos fundamentais assegurados pela lei. 51 3 A POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DA GUARDA EM FAVOR DA GENITORA NO CASO DE ABANDONO DE INCAPAZ Neste capítulo abordar-se-á a possibilidade de reversão da guarda à genitora após a ruptura do vínculo afetivo com o filho, analisando o superior interesse da criança, os vínculos com os genitores e com a família substituta, os critérios, responsabilidade, procedimentos para tal ato bem como o posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. 3.1 SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA Autores doravante mencionados tem-se que sob a ótica antropológica, a família continua a ser a célula básica, o grande mediador cultural, a essencial matriz biológica e afetiva para o desenvolvimento harmonioso da criança e a realização do adulto. Contudo a mutação da família, a realidade social desta hodiernamente, e principalmente quando a célula familiar se dissolve, enche de interrogações o destino da criança, qual o seu lugar e qual o futuro da sua relação com os dois progenitores. E sabe-se, quão importante é para o desenvolvimento harmonioso da criança, para o seu normal crescimento afetivo, que esta se possa identificar com os dois progenitores, nos seus comportamentos e nas relações que mantêm com cada um deles. Prevê o artigo 227, caput, da CRFB/88 que: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.181 181 ANGHER, Joyce Anne. Vade Mecum. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 95 52 Na ótica do CC/02 em seu artigo 1.583, no caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação extrajudicial ou judicial por consentimento mútuo ou pelo divórcio direto consensual, serão observados o que os cônjuges acordarem sobre a guarda de filhos. A expressão guarda de filhos constante do dispositivo deve abarcar tanto a guarda unilateral quanto a compartilhada, sempre atendido o melhor interesse da criança. Se não houver acordo entre os cônjuges, a guarda deverá ser atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la (art. 1.584 do CC/02). Certamente a expressão “melhores condições” constitui uma cláusula geral, uma janela aberta deixada pelo legislador para ser preenchida pelo aplicador do direito caso a caso.182 A expressão "melhores condições" no exercício da guarda, na hipótese do art. 1.584 do CC/02, significa ainda atender ao melhor interesse da criança.183 Acerca do tema, Waldyr Grisard Filho ensina que: O objetivo da lei é proteger interesses de uma forma geral e abstrata, convindo a um sem número de casos que cabem na hipótese legal. De outra parte, existem interesses individuais e concretos sobre os quais se procede a uma avaliação individualizada. É desses interesses concretos que se cuida na determinação da guarda dos filhos, sendo o juiz o intérprete dos particulares interesses materiais, morais, emocionais, mentais e espirituais de filho menor, intervindo segundo o princípio de que cada caso é um caso, o da máxima singularidade. O interesse concreto do menor, buscando em seu futuro, com o fim de protegê-lo e lograr seu desenvolvimento e sua estabilidade, apto à formação equilibrada de sua personalidade.184 O princípio do melhor interesse da criança considere-se, também, do adolescente, por força do próprio dispositivo constitucional. Representa importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais em que deixa de ser considerado objeto para ser alçado com absoluta justiça, ainda que tardiamente a sujeito de direito, ou seja, à pessoa humana merecedora de tutela do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da família que ele participa.185 182 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1289 183 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1290 184 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. São Paulo: RT, 2002, p. 63 185 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 456 53 A aludida proteção é regulamentada pelo ECA, que considera criança a pessoa com idade entre zero e doze anos incompletos, e adolescente aquele que tem entre 12 e 18 anos de idade. 186 Em reforço, o artigo 3º do ECA prevê que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, conforme o estabelecido na carta maior, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e as facilidades, a fim de facultar-lhes o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 187 Observa Marcos Alves da Silva: [...] o ECA se constitui na consolidação legal de um novo enquadramento jurídico da família, no qual a criança e o adolescente passam a uma condição de protagonismo. O câmbio de perspectiva da proteção do direito dos filhos, que se opera, é de tal ordem que a lei garante à criança a tutela do Estado contra seus próprios pais, para resguardar ou restabelecer direitos fundamentais.188 A criança e o adolescente são portadores de condição peculiar a merecer tratamento diferenciado das outras pessoas. Tal tratamento deve ser ministrado não para diminuí-los sob o prisma jurídico, mas sim para que eles possam ser integralmente protegidos com objetivo de permitir o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade, como é dever da família, da Sociedade e do Estado, conforme o artigo 4º, do ECA.189 No exercício de exegese do estatuído no ECA assim dispõe o artigo 6º: Art. 6 - [...] levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.190 186 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 2 187 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 6 188 SILVA, Marcos Alves da. apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A Nova Filiação: o biodireito e as Relações Parentais. Renovar. Rio de Janeiro. 2003. p. 457 189 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 7 190 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 16 54 Sobre os princípios que norteiam a proteção à criança e ao adolescente, tem-se a lição de João Batista Villela: Nesse novo quadro de referências, o estalão geral que tudo determina e orienta é o bem do menor. Portanto, enquanto as prerrogativas dos pais, tutores, guardiões sofrem todas as limitações que se revelem necessárias à preservação daquele valor, amplia-se a liberdade do menor em benefício de seu fundamental direito de chegar à condição adulta sob as melhores garantias materiais e morais.191 Da mesma forma como já descrito no item 1.4, o artigo 23, caput, do ECA, prioriza os interesses e valores existenciais em detrimento de valores patrimoniais, ao prever que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar, em perfeita compatibilidade com os valores e princípios constitucionais na valoração da pessoa em detrimento do patrimônio.192 Há elementos concretos no bojo do ECA que permitem identificar e qualificar o princípio do melhor interesse da criança não apenas como princípio geral, mas também sob o formato de norma específica em determinados setores envolvendo a criança. Assim, por exemplo, o artigo 45, § 2º, do ECA, prevê, que, em se tratando de adolescente, há a necessidade do seu consentimento, não o dos pais ou representantes legal do adotando, para que possa ser concedida sua adoção em favor da pessoa nele interessada, numa demonstração clara e evidente a respeito da importância da vontade do adolescente para fins de melhor preservar os seus interesses no desenvolvimento da sua personalidade.193 No campo do planejamento familiar, logicamente que o princípio do melhor interesse da criança ganha destaque, diante da priorização dos seus interesses e direitos em detrimento dos interesses de seus pais, a impedir, assim, que a futura criança venha a ser explorada economicamente ou fisicamente por estes.194 Como se pode perceber, no caso de dissolução da sociedade conjugal, a culpa não mais influencia quanto à guarda de filhos, devendo ser aplicado o princípio 191 VILLELA, João Batista. apud TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; SÁ, Maria de Fátima Freire de. Fundamentos principiológicos do estatuto da criança e do adolescente e do estatuto do idoso. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: IBDFAM: Síntese, v. 26. 2004, p. 27 192 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 30 193 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 84 194 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 462 55 que busca a proteção integral ou o melhor interesse do menor, conforme o resguardo do manto constitucional. 3.2 VÍNCULOS COM AS FIGURAS MATERNA E PATERNA A conjugação de ambos os papéis e a co-relação de seus efeitos são capazes de revelar, na maioria das vezes, uma pessoa mais harmoniosa, preparada para a integração social e o exercício natural e normal de suas potencialidades. 195 No contexto do mundo contemporâneo, com a inserção da mulher no mercado de trabalho, os avanços da engenharia genética, os métodos contraceptivos e a ruptura da concepção patriarcal da família, foram rompidos os paradigmas a que a família estava submissa: reprodução, casamento, sexo. Atualmente, não há necessidade de haver casamento, ou mesmo dos filhos serem biológicos, ou ainda, da presença do pai e da mãe para que possa se configurar uma família. Diante dessa pluralidade do conceito de família, emprestou-se juridicidade ao vínculo de afeto que enlaça as pessoas. Gama destaca que juristas costumam dizer que os princípios constitucionais são expressos ou tácitos. São tácitos quando emergem do sistema de normas e valores constitucionais. O princípio da afetividade é fato jurídico-constitucional, pois é espécie do princípio da dignidade humana. O afeto não é fruto da biologia, os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não do sangue. A história do direito à filiação confunde-se com o destino do patrimônio familiar, visceralmente ligado à consangüinidade legítima.196 Para que um filho verdadeiramente se torne filho, ele deve ser adotado pelos pais, tendo ou não vínculos de sangue que os vinculem, visto que é insuficiente a verdade biológica, pois a filiação é uma construção que abrange muito mais do que uma semelhança entre os DNA. Impõe-se a distinção entre origem biológica e paternidade/maternidade. Em outros termos, a filiação não é um determinismo 195 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. 2 ed. ver., atual. e ampl. por Carlos Alberto Bittar Filho, Márcia Sguizzardi Bittar; revisão técnica Carla Bianca Bittar. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 47 196 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482 56 biológico, ainda que seja da natureza humana o impulso à procriação. Na maioria dos casos, a filiação deriva-se da relação biológica, todavia, ela emerge da construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na responsabilidade.197 A família recuperou a função que, por certo, esteve nas suas origens mais remotas, a de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de vida. O princípio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, além do forte sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo prevalecimento de interesses patrimoniais. É o salto, à frente, da pessoa humana nas relações familiares.198 No estágio em que se encontram as relações familiares e o desenvolvimento científico, tende-se a encontrar a harmonização entre o direito de personalidade ao conhecimento da origem genética, até como necessidade de concretização do direito à saúde e prevenção de doenças, e o direito à relação de parentesco, fundado no princípio jurídico da afetividade. Uma vez que seus reflexos crescentes vêm permeando todo o Direito, como por exemplo, a valorização dos laços de afetividade e da convivência familiar oriundas da filiação, em detrimento, por vezes, dos vínculos de consangüinidade. Alem disso, independente da sua origem e se são biológicos ou não todos os filhos recebem o mesmo tratamento constitucional.199 A Constituição Federal no âmbito jurídico protege o afeto em três esferas, a saber: como direito individual, como direito de certas categorias sociais e como direito de todos contra todos. Ainda que a palavra "afeto" não conste na Lei Maior como um direito fundamental, pode-se dizer que este decorre da valorização do princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III CRFB/88) e merece ser visto como uma realidade digna de tutela.200 Assim comenta Barros sobre o afeto e o direito individual: 197 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 183 198 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 499 199 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 184 200 DIAS, Maria Berenice. Família, ética e afeto. Maria Berenice. Disponível em: <http://www.mariaberenice.com.br/site/content.php?cont_id=497&isPopUp=true>. Acesso em: 06 mai. 2009. 57 O direito ao afeto é a liberdade de afeiçoar-se um indivíduo a outro. O afeto ou afeição constitui, pois, um direito individual: uma liberdade, que o Estado deve assegurar a cada indivíduo, sem discriminações, senão as mínimas necessárias ao bem comum de todos.201 Observa Paulo Luiz Netto Lôbo: [...] o princípio da afetividade tem fundamento constitucional; [...]. projetou-se, no campo jurídico-constitucional, a afirmação da natureza da família como grupo social fundado essencialmente nos laços de afetividade.202 Neste sentido, formando-se uma família que respeite a dignidade de seus membros, a igualdade nas relações entre eles, a liberdade necessária ao crescimento individual e a prevalência das relações de afeto entre todos, ao operador jurídico resta acatar e reconhecer os fatos humanos.203 Dispõe Jacob Dolinger: [...] não há direito [...] sem a tolerância pelo outro e sem o respeito pelo que é do outro, não há vida individual em paz com o universo [...] sem a compreensão pelas necessidades do coletivo e de cada membro da coletividade.204 Se a organização da sociedade não assegurar à família condições básicas de existência, o Estado cumprindo o dever de assistir a família na pessoa dos seus integrantes está obrigado a suprir essa carência, sobretudo para a criança, o adolescente e o idoso. Todas essas dimensões do afeto devem ser conjugadas por um valor maior: a dignidade humana, que é o critério pelo qual a Constituição proporciona a proteção dos interesses individuais em sua interação com os deveres sociais, categoriais e difusos.205 O direito não tem o poder de criar afetividade. Sentimentos naturais não decorrem de legislações, mas da vivência cotidiana informada pelo respeito, diálogo 201 BARROS, Sérgio Resende de. O direito ao afeto. Artigo. Publicação: Del Rey Revista Jurídica. Editora Del Rey, Belo Horizonte - MG, n. 8, ano IV. 2002. p. 35. SR Barros. Disponível em: <http://www.srbarros.com.br/artigos.php?TextID=36>, Acesso em: 13 mai. 2009. 202 NETTO LÔBO, Paulo Luiz apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 389 203 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 390 204 DOLINGER, Jacob apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 390 205 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 135 58 e compreensão. Esse amálgama dos laços familiares é representado pela afetividade.206 A afetividade é traduzida no respeito de cada um por si e por todos os membros, a fim de que a família seja respeitada em sua dignidade e honorabilidade perante o corpo social é, sem dúvida nenhuma, uma das maiores características da família atual. Seus integrantes não obstante a intensa liberdade com que mantêm seus relacionamentos, buscam cada dia mais o fortalecimento da reciprocidade dos seus sentimentos. 3.3 FAMÍLIA SUBSTITUTA Todo indivíduo possui uma família, independente de ser ela a desejável ou não. A importância da família na vida do ser humano é indizível, vez que é a partir dela que o 'homem' adquire os seus primeiros conceitos que formarão, ao longo do tempo, as pilastras de seu caráter, servindo de orientação para os inúmeros caminhos que a vida imporá durante sua trajetória. Reconhece a Carta Magna em seu artigo 226 à importância suprema da família que é por sua vez base da sociedade, que tem especial proteção do Estado, uma sociedade natural por excelência, que alimenta, protege e educa o homem, desde o nascimento e dá origem a todas as demais formas de sociedade integradas pelos seres humanos.207 Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente que a colocação de menor em família substituta será feita de forma excepcional, só mesmo quando estiverem sido esgotadas todas as vias possíveis de permanência com a família natural é que se coloca em prática as disposições relativas à família substituta a que se refere o artigo 19 do ECA e o artigo 25 da mesma lei sobre família natural, a saber: Art. 19 - Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família 206 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 233 207 AZAMBUJA, Darcy apud GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. p. 11 59 substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. Art. 25 Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.208 Conforme observam Cury, Garrido E Marçura “a colocação em família substituta é medida de proteção destinada a crianças e adolescentes cujos direitos fundamentais forem ameaçados ou violados, prevista no artigo 101, VIII, do ECA”.209 Nesse contexto, não estando à criança e o adolescente em sua família natural estará ele assim em uma família substituta podendo se constituir mediante guarda, tutela e adoção.210 Assim defini Guimarães sob a ótica de consagrados doutrinadores o que vem a ser esses três institutos, guarda, tutela e adoção: A guarda é instituto destinado á proteção dos menores de 18 anos (limite de idade em que cessa o poder familiar), pelo qual alguém assume seus cuidados, na impossibilidade dos próprios pais fazê-lo [...], conseqüentemente, o encargo de prestar-lhe assistência material, moral e educacional, será do guardião. A tutela, [...], é o conjunto de poderes e encargos conferidos pela lei a um terceiro, para que zele pela pessoa de um menor que se encontra fora do poder familiar, e lhe administre os bens, tratando-se de um instituto de nítido caráter assistencial, com objetivo de substituir o poder familiar. A adoção [...], é o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha.211 Família substituta é aquela que se propõe trazer para dentro dos umbrais da própria casa, uma criança ou um adolescente que por qualquer circunstância foi desprovido da família natural, para que faça parte integrante dela, e nela se desenvolva, dispensando-lhe tudo de que precisa, sobretudo, amor. Em se tratando de adoção, passará a ter todos os direitos e deveres do filho de sangue. Até porque, 208 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007.. p. 24 e 45 209 CURY, GARRIDO E MARÇURA apud Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. p. 12 210 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 32 211 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. p. 15, 25 e 31 60 tanto a Guarda como a Tutela podem ser revogadas, mas a Adoção é para sempre.212 O ECA trata da Família Substituta em seus artigos 28 a 32 e 165 a 170. Esta, como o nome já a define, consiste em uma célula familiar que substituirá a família original, ou melhor, os benefícios que uma família deveria estar proporcionando ao menor, lhe oferecendo educação, lazer, alimentação, segurança, enfim, todo o bem-estar geral da criança e do adolescente, evitando assim, a internação do menor.213 O menor é o centro das discussões, desta feita, a sua opinião deve merecer todo o valor e consideração possível, ressalvado os casos de impossibilidade mental, de discernimento, ou outro impedimento. Note-se também que o grau de parentesco e a presença de afetividade junto à criança podem atenuar as conseqüências decorrentes da medida, conforme o disposto no artigo 28 do ECA: Art. 28 - A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos da lei. § 1º Sempre que possível, a criança ou adolescente deverá ser previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada. § 2º Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, a fim de evitar ou minorar as conseqüências decorrentes da medida.214 A família substituta deverá estar habilitada a oferecer os requisitos inerentes de uma célula familiar, isto é, a família acolhedora do menor deve estar fraternalmente unida e em condições de recepcionar este novo pequeno membro, de modo que não venha, por falha organizacional e administrativa familiar, ter que transferir o menor a entidades públicas ou privadas, exceto se por autorização judicial.215 A família substituta pode ser provisória, em casos como o da Guarda, temporária como na Tutela, ou definitiva, como na Adoção. É a recomposição de uma família a um abandonado, a um menor órfão, que passará a ser cuidado por 212 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 533 213 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. p. 12 214 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 49 215 TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36 61 uma família que o queira, inclusive estrangeira, desde que tenha autorização judicial para isto; ou por um parente do menor.216 A família substituta também pode ser estrangeira, conforme menciona o artigo 31 do ECA: Art. 31 - A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção.217 A família substituta estrangeira, que reside no Brasil, será tratada como se brasileira fosse, dado ao direito constitucional isonômico do art. 5º da Constituição Cidadã vigente. Todavia, os residentes fora do país perdem sua preferência perante a família substituta brasileira, e só podem adotar crianças abandonadas. Os tutores e guardiões, que devem ser brasileiros, deverão prestar compromisso de bem executar suas funções, mediante termo nos autos.218 Dar uma família à criança, Prioridade Absoluta, é um ato de grandeza imensurável, é demonstração de desprendimento, capacidade de repartir e se doar. 3.3.1 Critérios O que se torna importante mencionar é que crianças e adolescentes devem sempre ter tratamento prioritário e proteção especial da família, sociedade e do Estado. Sendo que devem ser observadas todas as suas garantias estando elas no seio de sua família, em instituição ou até mesmo em família substituta. Sendo assim, ao assumir a posição de substituta, a família que receber esta criança ou adolescente em seu lar assumirá todos os deveres e direitos inerentes àquela família original. Os deveres previstos no artigo 227 da CF expostos no item 1.4 e repetidos no artigo 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente.219 216 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 49 e 51 217 TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36 218 TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 37 219 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 535 62 Salutar ressaltar também aqui, o preceito dos parágrafos do artigo 28 do ECA ora transcritos na p. 79. O ECA dispôs critérios para a colocação em família substituta, nesse sentido, dois critérios são mencionados: 1º o grau de parentesco: os parentes próximos ao menor devem, de certo modo, possuir prioridade como no caso de irmãos, tios, avós; 2º verificada a impossibilidade destes (por exemplo, em decorrência de comportamento inadequado, como o alcoolismo etc., seguindo-se o parâmetro estipulado pelo artigo 29 infra), devem-se buscar pessoas com afinidade ou afetividade.220 Por afinidade, deve-se entender, por exemplo, as pessoas que possuem bom relacionamento e facilidade com a criança e o adolescente. Por afetividade, entende-se o comportamento sentimental e amoroso das pessoas com a criança e o adolescente. Na hipótese de incompatibilidade dessas pessoas, é necessário então buscar outras pessoas aptas à responsabilidade legal. No caso de adoção, o cadastro de inscritos da Vara da Infância e da Juventude.221 A colocação em família substituta far-se-á, como já dito, mediante guarda, tutela ou adoção. O interessado em receber um menor sob qualquer uma destas três formas de colocações deverá apresentar como requisitos os estipulados no artigo 165 do ECA, assim descrito: Art. 165 - São requisitos para a concessão de pedidos de colocação em família substituta: I - qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste; II - indicação de eventual parentesco do requerente e de seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente, especificando se tem ou não parente vivo; III - qualificação completa da criança ou adolescente e de seus pais, se conhecidos; IV - indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão; V - declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos relativos à criança ou ao adolescente. Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-ão também os requisitos específicos.222 220 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 50 221 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 559 222 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 277 63 Por outro lado, em relação aos filhos, além de preencherem os requisitos, estas famílias também assumem alguns dos direitos e deveres impostos à família natural, dispostos no CC/02, que são: Art. 1634 - [...] I – dirigir-lhes a criação e educação; II – tê-los em sua companhia e guarda; III – conceder-lhes ou negar-lhes o consentimento para casar; IV – nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não sobreviver, ou, sobrevivo, não puder exercer o poder familiar; V – representá-los, ate os 16 anos, nos atos da vida civil e assistindo-lhes após esta idade nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os próprios de sua idade e condição.223 É certo que, estes efeitos sobre a ingerência na vida da criança ou adolescente, serão maiores ou menores a depender do tipo de colocação em família substituta (eventual, transitória e permanente). Assim, por exemplo, nos casos de adoção, que possuem caráter permanente, a família substituta assumirá a totalidade de direitos desta, conforme artigo 1.634 do CC/02 exposto alhures.224 No entanto, se assume temporariamente a posição de família substituta, também restrito estarão os direitos que irá exercer. Assim, se posta uma criança ou adolescente sob a guarda de uma família, poderá esta exercer todos os direitos que não importarem maior disposição alem da própria assistência material e moral e a educação dos pupilos.225 É imprescindível que a família candidata a substituta passe por um estudo social, ou seja, por psicólogos, assistentes sociais e todos os auxiliares de que a Justiça dispõe, indagando junto à vizinhança da pretensa família guardiã, adotante ou tutora, sobre suas condições de desempenharem suas funções de substituta de forma eficaz. Alem de que, deve-se analisar a relação da Criança ou Adolescente com seus guardiões, conforme o disposto nos artigos do ECA a seguir esposados: 223 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1336 224 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1336 e 1337 225 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. Conforme o estatuto da criança e do adolescente e o novo código civil. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. p. 16 64 Art. 167 - A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre a concessão de guarda provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o estágio de convivência. Art. 168 - Apresentado o relatório social ou o laudo pericial, e ouvida, sempre que possível, a criança ou o adolescente, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de cinco dias, decidindo a autoridade judiciária em igual prazo. Art. 169 - Nas hipóteses em que a destituição da tutela, a perda ou a suspensão do pátrio poder constituir pressuposto lógico da medida principal de colocação em família substituta, será observado o procedimento contraditório previsto nas Seções II e III deste Capítulo. Parágrafo único. A perda ou a modificação da guarda poderá ser decretada nos mesmos autos do procedimento, observado o disposto no art. 35.226 O art. 30 do ECA diz que as obrigações decorrentes da guarda, da tutela ou adoção são indelegáveis e irrenunciáveis. Observa-se que embora estas obrigações sejam irrenunciáveis e indelegáveis, a guarda e a tutela não o são, o que significa que a qualquer tempo pode o guardião ou tutores renunciar ao exercício da guarda ou da tutela, desde que renuncie expressamente ou, no caso da tutela, escusar-se de logo. Do contrário, responderam pelo encargo destes institutos, não podendo nem mesmo delegar à terceiros ou instituições os cuidados com estas crianças ou adolescentes, sem autorização judicial.227 Estas medidas servem para impedir que a criança ou adolescente, seja tratado com displicência, sendo deslocado ou removido a todo tempo por interesse dos adultos, sem que possa encontrar a estabilidade e os vínculos que já foram rompidos com sua família natural, e que são os principais objetivos para que seja posto em família substituta. Estas rupturas são sempre bastante traumáticas e dolorosas, e sua repetição pode ser deletéria pra o desenvolvimento da pessoa.228 Há também requisitos quanto à pessoa do adotante, como os regulamentados pelo CC/02, a saber: Art. 1618/02 - Só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar. Parágrafo único. A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da família. 226 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 282, 283 e 284 227 TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com as leis correlatas. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 36 228 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 51 65 Art. 1619/02 - O adotante há de ser pelo menos dezesseis anos mais velho que o adotado.229 O ECA prevê em seu artigo 42 e §§ os requisitos do adotante onde a idade mínima para adotar é de 21 anos, mas, por força do artigo 1618 do CC/02 supra citado, tal limite de idade foi alterado para 18 anos, em coerência com a diminuição da idade para fins de maioridade civil, admitindo, inclusive, que se se tratar de adoção conjunta tal limite mínimo de idade somente deve existir em relação a um dos cônjuges (ou companheiros), não ambos.230 Quanto à pessoa do adotando, apenas se poderá admitir adoção que constitua um real benefício, seja ele material ou moral (pessoal, afetivo, por exemplo), para o adotando, visto que não há adoção intuitu personae, pois o magistrado é quem terá o poder-dever de optar pela família substituta adequada e não os pais ou representante da criança a ser adotada e muito menos os adotantes.231 Neste mesmo norte se posiciona o ECA em seu artigo 43, a saber: Art. 43 - A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.232 Conforme o disposto no artigo 46 do ECA, in verbis: Art. 46 - A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso. § 1º O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando não tiver mais de um ano de idade ou se, qualquer que seja a sua idade, já estiver na companhia do adotante durante tempo suficiente para se poder avaliar a convivência da constituição do vínculo. § 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de adotando acima de dois anos. O Poder Judiciário é quem analisará a conveniência ou não, para o adotando, e os motivos em que se funda a pretensão dos adotantes, ouvido, sempre 229 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1323 e 1324 230 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 561 231 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1323-1328 232 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 82 66 que possível, o adotando, levando em conta o parecer do Ministério Público. Daí a importância do estágio de convivência alhures, para melhor avaliação do grau de afetividade e adaptabilidade do adotando, em relação ao futuro adotante e aos benefícios que da adoção poderiam advir para sua formação físico-psíquica.233 Estas medidas serão tomadas para tentar proporcionar à criança ou adolescente uma vida familiar, compatível com suas necessidades e direitos, sobrepesando os interesses da criança em detrimento ao dos adultos. Algumas regras devem ser observadas para que se destitua o poder familiar dos pais e que os seus filhos sejam colocados em família substituta nacional ou internacional. 3.3.2 Responsabilidade O responsável legal, ao assumir a guarda ou a tutela, deverá prestar compromisso, visando ter ciência da responsabilidade assumida. Neste talante, insta aferir que os pais, tutores ou curadores, respondem pelos danos causados por aqueles que estiverem sob sua guarda, independente de culpa.234 Saliente-se que a responsabilidade do pai, desenvolve-se da mesma maneira que a do tutor, bem como a do curador, pois derivam das funções por eles exercidas, haja vista que a responsabilidade está baseada na culpa in vigilando, que decorre da falta de atenção ou cuidado com o procedimento de outrem que está sob a Guarda ou responsabilidade do agente.235 Conforme leciona Paulo Antônio Begalli, tem-se: [...] em primeiro plano, é imposta aos pais a obrigação precípua da criação e educação dos filhos, prestando-lhes assistência contínua, não só material como também moral, propiciando-lhes ensinamentos condizentes com os bons costumes, amoldando-os aos princípios básicos da boa moral, proporcionando-lhes lições e diretrizes 233 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 89 234 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 59 235 BEGALLI, Paulo Antônio. Responsabilidade Civil dos pais por atos de filhos menores. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 88 67 suficientes para se imbuírem da verdadeira noção de responsabilidade e assumirem postura digna perante a sociedade.236 Verifica-se ainda que, a inadimplência para com os deveres inerentes ao poder familiar, como visto no primeiro capítulo, pode resultar em conseqüências não apenas na esfera cível, mas também causar reflexos no âmbito penal, conforme expressa a tipicidade do artigo 244 do Código Penal: Art. 244 - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.237 Dispõe os artigos 1.740 a 1752 do CC/02, sobre os deveres do tutor com relação ao menor tutelado.238 Concedida à guarda ou tutela, o responsável deve prestar o compromisso de que trata o artigo 32 do ECA, e, deferida a adoção, expedir-se-á o mandado de inscrição e cancelamento, previsto no artigo 47 da mesma codificação: Art. 32 - Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante termo nos autos. Art. 47 - O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão. § 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes.239 A inscrição de que se reproduz em tela do dispositivo, constitui o novo registro de nascimento do adotado, como se fora a primeira vez, cancelando-se a anterior. Com efeito, para a plena integração do adotado na família do adotante, não 236 BEGALLI, Paulo Antônio. Responsabilidade Civil dos pais por atos de filhos menores. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 90 237 ANGHER, Anne Joyce. Código Penal. Vade Mecum. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 459 238 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1425-1432 239 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 53 e 90 68 seria suficiente a atribuição da situação de filho ao primeiro, mas era necessário também que houvesse mudança na identidade da pessoa adotada, sob pena dos laços anteriores persistirem, ainda que apenas a título formal no nome do adotado.240 3.3.3 Vínculo sócio-afetivo A filiação sócio-afetiva nada mais é que o relacionamento entre adotante e adotado. Assemelha-se a relação dos pais com seu filho, sob o ponto de vista das relações sociais e emocionais. Se um homem, mesmo sabendo não ser o genitor de criança ou adolescente, trata-o como se fosse seu filho, torna-se pai dele. Do mesmo modo, a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho durante algum tempo. 241 Segundo Paulo Luiz Netto Lobo: Pai é o que cria. Genitor é o que gera. Esses conceitos estiveram reunidos, enquanto houve primazia da função biológica da família. [...] Hoje, a paternidade é muito mais que o provimento de alimentos ou a causa de partilha de bens hereditários. Envolve a constituição de valores e da singularidade da pessoa e de sua dignidade humana, adquiridos principalmente na convivência familiar durante a infância e a adolescência. A paternidade é múnus, direito-dever, construída na relação afetiva e que assume os deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação [...] (art. 227 da Constituição). É pai quem assumiu esses deveres, ainda que não seja o genitor.242 A finalidade da família é a concretização, e a fundação do amor e dos interesses afetivos entre seus membros, pois o afeto, não é fruto somente de origem biológica, mas sim é fruto também de um processo de adoção.243 240 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 614 241 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos constitucionais do direito de família. São Paulo: Revistas dos Tribunais LTDA, 2002. p. 256 242 NETTO LÔBO, Paulo Luiz apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482 243 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 497 69 No instituto da adoção, o fator afetividade está intimamente ligado a filiação, pois a intensidade das relações que unem pais e filhos, independente da origem genética 244 Pais são aqueles que amam e dedicam sua vida aos filhos e dão a eles afeto, atenção, conforto, carinho, enfim, um porto seguro, cujo vínculo nem a lei e nem o sangue garantem. É dizer, no fundamento do estado de filho afetivo que é possível encontrar a genuína paternidade, que reside antes no serviço e no amor do que na procriação.245 É a chamada filiação sócio-afetiva, cujo interesse é a preservação da estrutura familiar, independente da origem, pois são as relações familiares, envoltas por laços afetivos, que merecem e necessitam de proteção especial do Estado (art. 226 da CF). 3.4 REVERSÃO DA GUARDA A guarda como esposado alhures no 2º Capítulo item 2.2 é o poder de resguardar, manter em vigilância, no exercício da custódia, a criança ou adolescente, e ainda, quando criança, de representá-lo, e se for adolescente assistilo; esse é o conceito de guarda em sentido jurídico.246 Em relação à guarda dos filhos, em qualquer momento pode o Juiz ser chamado a revisar a decisão atento ao sistema legal, contudo, o que prepondera é o melhor interesse dos filhos e não os dos pais como exposto no Segundo Capítulo item 2.8 artigo 35 do ECA.247 O objetivo da lei é proteger interesses de uma forma geral e abstrata. De outra parte, existem interesses individuais e concretos sobre os quais se procede a uma avaliação individualizada. É desses interesses concretos que se cuida na determinação da guarda dos filhos, sendo o juiz o intérprete dos particulares 244 FACHIN, Luiz Edson apud GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 482 245 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação. O Biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 483 246 SILVA, Ana Maria Milano. Guarda compartilhada. São Paulo: Editora de Direito, 2006. p. 43 247 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 60 70 interesses materiais, morais, emocionais, mentais e espirituais de filho menor, intervindo segundo o princípio de que cada caso é um caso, o da máxima singularidade. O interesse concreto do menor, buscando em seu futuro, com o fim de protegê-lo e lograr seu desenvolvimento e sua estabilidade, apto à formação equilibrada de sua personalidade, é critério da decisão do juiz.248 Não é demais relembrar nesta oportunidade o que preleciona Sílvio de Salvo Venosa acerca do tema, "o juiz deverá procurar a solução prevalente que melhor se adapte ao menor, sem olvidar-se dos sentimentos e direitos dos pais".249 Arnaldo Rizzardo, a propósito, averba: Sabe-se que a guarda deve ter em mira o interesse dos filhos, o que vem repetido diuturnamente pelos pretórios. Mudando-se determinada situação, torna-se viável a modificação de determinado quadro. Daí o axioma jurídico de que as disposições sobre a guarda não transitam em julgado. Alterando-se as circunstâncias vigentes quando da outorga da guarda, propicia-se a mudança das cláusulas sobre a guarda.250 A alteração da guarda ou seu cancelamento é medida judicial que deve ser levada com extrema cautela. São numerosos os casos em que os guardiões estão com o menor por vários anos e repentinamente os genitores biológicos desejam o mesmo de volta. Nesse caso, o laudo do Setor Técnico é de extrema valia para subsidiar o parecer do Promotor, bem como a decisão do Magistrado, o referido laudo encontra respaldo legal no artigo 167, a sim disposto: Art. 167 - A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre a concessão da guarda provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o estágio de convivência.251 Ishida ao comentar um julgado (Apelação Cível nº 18.167-0/8-São José dos Campos-Rel. Dês. Sabino Neto 11-11-93. Ementa Laços entre adotados e família substitutaInviabilidade de rompimento) sobre a manutenção da guarda ao casal que está há quatro anos com a menor, afirma o seguinte: 248 GRISARD, Waldyr Filho. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental, São Paulo: RT, 2002. p. 63 e 64 249 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito de Família. v. VI. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 228 250 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n. 10.406, de 10.01.2002. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 266 251 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61 e 282 71 [...], depois de permanecer quatro anos sob a guarda do casal requerente, é natural o estabelecimento de laços afetivos e a adaptação do menor à família substituta. A quebra desses laços afetivos, de um momento para o outro, poderá acarretar sérios prejuízos ao desenvolvimento biopsíquico da criança, agravada pela falta de estrutura pessoal e emocional de quem deveria recebê-la.252 Salutar ressaltar o que já foi exposto por sobre a respeito da família substituta abordado no subitem 3.3 que, em tema de colocação de menores em família substituta, da qual a guarda é uma das espécies, o bem estar da criança deve sempre preponderar.253 Dos ensinamentos colhidos do ilustre doutrinador Válter Kenji Ishida tem-se que, a manutenção do menor no local onde está bem, de regra, deve ser mantido. Cuja troca do meio ambiente onde está vivendo deve ser evitada o quanto possível, para não causar prejuízo à criança.254 A possibilidade do retorno do menor ao convívio dos genitores, é da própria precariedade da guarda permitir ou, ao menos o direito de visita.255 É valido lembrar aqui a teoria de Maria Helena Diniz que foi exposta no item 1.4, onde ela explana que a suspensão temporária do exercício do poder familiar é uma sanção imposta aos genitores que visa preservar o melhor interesse do filho menor, que nada obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder familiar e, por conseguinte a guarda, uma vez cessando os motivos geradores da suspensão.256 Neste mesmo diapasão segue os ensinamentos de Gonçalves esposados no mesmo item 1.4: “a perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, [...], desde que comprovem a cessação das causas que a determinaram”, desde norte, o poder retornando para os genitores, com este retorna o dever de guarda inerente ao poder familiar.257 252 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 61 253 TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 133 254 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 62 255 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 63 256 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1340 257 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 380 72 Desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do poder familiar, onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a possibilidade dessa guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o pedido da possível reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em detrimento dos interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o adolescente e não menos importante de considerar o vínculo criado entre o menor e seu guardião. 3.5 REVERSÃO DA GUARDA: POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL DO TJ/SC Como já exposto alhures no item 3.4, é da própria natureza precária da guarda permitir o retorno ao convívio dos genitores ou, a eles dar o direito de visita. Nesse sentido, expõe-se a jurisprudência colhida: MENOR. PODER FAMILIAR. DIREITO DE VISITAS. DESTITUIÇÃO EM DETRIMENTO DA GERATRIZ. CC, ART. 1.638, I E II E ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, ART. 24. PRESSUPOSTOS INTEGRADOS. SENTENÇA INCENSURÁVEL. RECLAMO APELATÓRIO DESPROVIDO. Presentes as situações apontadas no art. 1.638, I e II, do CC/02 e no art. 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente, revelando os autos não apresentar a mãe biológica condições de exercer, de forma responsável e adequada, dada a exposição do filho de tenra idade a riscos reprováveis, descumprindo reiteradamente os deveres inerentes ao poder familiar, a sua destituição desse poder é solução que atende, não apenas os interesses da justiça e da sociedade, mas, principalmente, do próprio infante.258 Colheu-se do ilustre acórdão o seguinte relato: que a mãe do menor é atendida pelo Programa de Atendimento Social - PAS, sendo que, estando ela e o menor habitando um prédio abandonado, sem emprego e condições de sustento, foram encaminhados a uma Pensão, custeados pelo Município, visando para ambos uma melhor situação social, inclusive tendo a criança sido matriculada na creche e a mãe empregada. Todavia, foi constatado em outubro de 2004, haver a demandada abandonado seu emprego, e deixando o menor em abandono. Diante da gravidade da situação em que o menor se encontrava, em 31-1-05 houve a intervenção do 258 TJSC. Acórdão: Apelação Cível n. 2006.032368-3, de Jaraguá do Sul-Relator: Des. Trindade dos Santos-28/01/2008. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 06 mai. 2009. 73 Conselho Tutelar, com o recolhimento do menor ao Abrigo Municipal, restando evidenciada a negligência da requerida. A Dra. Promotora de Justiça Postulou, com supedâneo nos artigos 24 e 129, incisos IX e X do ECA e no artigo 1638, incisos I e II do CC/02, em sede preliminar, a suspensão do poder familiar e do direito de visitas da mãe para, ao final, ser reconhecida a procedência do pedido, com a destituição da mesma do poder familiar em relação ao menor R.V.T. da C. O juízo 'a quo' deferiu a liminar. A respeito averba Wilson Donizeti Liberati: Assim como a perda da guarda e a destituição da tutela, a suspensão ou a destituição do poder familiar é medida aplicada aos pais ou responsável que permitem ou contribuem para a ocorrência de situação de risco pessoal de seus filhos ou pupilos (ob. cit. p. 131) Sustentou o órgão ministerial, a respeito, serem flagrantes a negligência e o abandono da apelante em relação ao menor R.V.T. da C., embasando as postulações deduzidas e, ao final, acolhidas no artigo 1.638, incisos I e II do CC/02 e no artigo 24 do ECA. O histórico de vida da ré, todavia, como bem anotado pela ilustre representante do Ministério Público na comarca, evidencia um ciclo de abandono e vitimização do menor, pelo qual, o comando sentencial impõe-se mantido! É que, nos autos restou cabalmente comprovado o abandono da criança pela mãe, assim como a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes, incidindo ela nas causas da perda do poder familiar previstas no artigo 1.638, incisos II e III do CC/02 e no artigo 22 do ECA. No mesmo sentido, mas diante de um caso concreto específico, tem-se a seguinte decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVERSÃO DE GUARDA. INTERESSE E VONTADE DO MENOR. PREVALÊNCIA. GENITORES COM DISTÚRBIOS EMOCIONAIS E INSTABILIDADE NO RELACIONAMENTO. DECISÃO PROVISÓRIA MANTIDA ATÉ DECISÃO DE MÉRITO. RECURSO NÃO PROVIDO. A guarda de menor pressupõe diligência e responsabilidade no trato com a criança. Evidenciado nos autos, ainda que perfunctoriamente, que os pais da menor, por distúrbios emocionais e instabilidade no relacionamento, não possuem condições, pelo menos momentâneas, de permanecerem com a guarda da filha, a decisão monocrática que defere a guarda provisória aos tios mostra-se incensurável. ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao agravo.259 259 TJSC. Acórdão: Agravo de Instrumento processo: 2004.019513-3. Relator: Carlos Prudêncio. Data: 23/08/2005. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 26 mai. 2009. 74 Assim estão os relatos extraídos da exordial: M.M. da S. e J.P. ajuizaram agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra a decisão do MM. Juiz de Direito da comarca de Correia Pinto que, nos autos da ação de reversão de guarda ajuizada por J.A.P. e L.L.P., deferiu provisoriamente a liminar, determinou a busca e modificou a guarda da menor L.S.P., destinando-a aos tios, ora agravados. Constatou-se, por meio de avaliação realizada pela psicóloga, que os agravantes apresentam distúrbios emocionais, não possuindo, inclusive, estabilidade alguma no relacionamento, sendo que a agravante, mãe da menor, já esteve internada diversas vezes com depressão. Além disso, nesse mesmo exame psicológico, foram colhidos relatos nos quais a infante declarou que: "a mãe me bate com tudo: de chinelo, de cinta, de mão e de vara [...] eu quero voltar a morar na outra casa com o outro pai e a outra mãe". Assim sendo, pelos dados apresentados, bem como o laudo médico em anexo, há fortes indícios de que a mãe, ora agravante, não está apta e não tem condições de criar, orientar e educar a menor. Há também nos autos registro de denúncia ao Conselho Tutelar, na cidade de Ponte Alta, feita pelos avós, informando que sua neta estava sofrendo maus-tratos pela mãe, ora agravante, M.M. da S., salientando que estiveram na residência da infante e encontraram-na descalça e suja, na casa da vizinha, no frio, enquanto a mãe dormia com a casa toda fechada. A mesma decisão levou em consideração o dever de atentar à regra insculpida no artigo 17 do ECA: O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.260 Em conformidade com a absoluta prioridade dos interesses da criança, existindo nos autos de ação de modificação de guarda provas sobre a má conduta dos agravantes M.M. da S. e J.P., durante a convivência com a menor, ainda mais com o estudo social desfavorável nesse sentido, não se revela aconselhável, no momento, a modificação da respeitável decisão do juízo a quo, que modificou a guarda da infante, destinando-as aos tios, ora agravados, J. A. P. e L. L. P. Ademais, colhe-se dos autos e da decisão do Magistrado de primeiro grau, em contato direto com a realidade das partes, que a situação da menor estava em risco 260 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente. Doutrina e jurisprudência. 8. ed. atual. de Acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 37. 75 caso mantida a guarda com os agravantes, sendo de salutar justiça manter-se a guarda com os agravados até decisão final de mérito. Apesar de haver um restrito número de jurisprudências catarinenses a esse respeito, colaciona-se a decisão a seguir, com destaque para o fato de a faixa etária dos guardiões terem sido analisadas como um dos elementos essenciais à concessão da guarda tendo em vista, como sempre, o melhor interesse do menor. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA PROPOSTA PELA MÃE EM DESFAVOR DOS AVÓS PATERNOS ARGÜIÇÃO DE MELHORIA DE SUA CONDIÇÃO SÓCIOECONÔMICA E A ELEVADA FAIXA ETÁRIA DOS AVÓS PARA SUPORTAR O ENCARGO - MENOR PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS - ADAPTAÇÃO À FAMÍLIA SUBSTITUTA - PROGRESSO DE SEU ESTADO FÍSICO E MENTAL - ALTERAÇÃO DA GUARDA QUE PODE TRAZER O RISCO DE FRUSTRAÇÃO DA RECUPERAÇÃO DO ADOLESCENTE MANUTENÇÃO DA GUARDA COM OS AVÓS PATERNOS SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Os estudos sociais elaborados e as provas testemunhais coligidas são uníssonas em demonstrar a perfeita adaptação do adolescente com os seus avós paternos e ao ambiente da unidade da APAE em que se realiza o seu tratamento. Deste modo, retirar abruptamente o menor da família substitutiva com quem convive há mais de 10 (dez) anos, além de transferi-lo para outra unidade de tratamento, seria no mínimo temerário, diante das particularidades do caso, em que pese as boas e nobres intenções da genitora com a formulação de seu pleito.261 ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Destaca-se o seguinte relatório da jurisprudência por sobre exposta: a genitora ora apelante, possui dois filhos menores de idade, sendo que um deles, portador de deficiência mental, encontra-se sob a guarda e responsabilidade dos avós paternos. A criança foi entregue aos cuidados dos avós em razão de não possuir condições financeiras suficientes, na época, para conferir-lhe assistências material e educacional adequadas. Porém, em virtude de estar recebendo benefício previdenciário pela morte de seu ex-cônjuge e estar vivendo em união estável com outra pessoa, sua situação financeira melhorou consideravelmente, o que a possibilita exercer novamente a guarda de seu filho. Consigne-se que os fatos que desencadearam a presente demanda remontam ao ano de 1996, quando a Autora e seu esposo, sem condições de prover satisfatoriamente as necessidades de seus 261 TJSC. Acórdão: Apelação cível n. 2004.006720-8, de Coronel Freitas. Relator: Des. Subst. Joel Dias Figueira Júnior. 10/04/2007. Tribunal de Justiça/SC. Disponível em: <www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 26 mai. 2009. 76 dois filhos, entregaram seu primogênito, à época com quatro anos de idade, aos cuidados dos avós paternos que, no ano de 2000 obtiveram legalmente a guarda da criança. Por volta de 2002, argüindo a Demandante ter consolidado sua situação financeira como fora exposto, acorreu ao Judiciário pretendendo reaver a guarda do aludido filho. Imperioso mencionar que o menor conta hoje com 14 anos de idade e possui sérias limitações em razão da paralisia cerebral, inspirando acompanhamento especializado que vem sendo prestado através da APAE de Pinhalzinho. Infere-se da prova produzida que, atualmente, ambas as partes possuem condições financeiras de manter e assistir o menor. Contudo, tomando por base os interesses do adolescente, não se pode desprezar o esforço dos avós paternos em proporcioná-lo o melhor amparo. Nesse passo, alterações na rotina do menino são arriscadas e de resultado positivo duvidoso, uma vez que não se tem qualquer garantia, ou mesmo indícios, que as mudanças postuladas virão em benefício do filho da autora. Deste modo, retirar abruptamente o menor da família com quem convive há mais de 10 (dez) anos e transferi-lo à outra unidade da APAE, seria, no mínimo temerário, ainda que a autora tenha postulado a guarda do filho com a mais nobre e melhor das intenções. Por oportuno, diga-se com relação ao argumento dispensado pela apelante de que, mais cedo ou mais tarde receberá a guarda de seu filho em razão de os apelados já se encontrarem com idade avançada, tal circunstância - apenas provável - não dá respaldo à reversão da guarda neste momento, pois na atual conjuntura as provas demonstram serem os avós paternos os mais indicados para continuar com a guarda do menino. Define-se o abandono, quando o menor, por negligência incapacidade, ou perversidade dos pais, ficar permanentemente exposto a grave perigo quanto à saúde, à moral e à educação, de forma comprometedora de sua formação como ser humano. O abandono pelos genitores é a hipótese mais freqüente para a destituição do pátrio poder e conseqüentemente a perda da guarda, tendo em vista a gama de situações que abrange. O abandono pode assumir feições materiais e psicológicas, mas não é apenas o ato de deixar o filho sem assistência material, fora do lar, mas o descaso intencional pela sua criação, educação e moralidade. Tendo em vista o posicionamento jurisprudencial alhures esposado, o que fica evidenciado é que sempre o melhor interesse do menor será preservado, mesmo a genitora adquirindo condições de reverter para si a guarda perdida, seja 77 essa perda por abandono ou por falta de condições de mantê-lo sob sua guarda e zelo. O magistrado sempre que se deparar com situações acima expostas de pedidos de uma possível reversão, deverá sempre preservar o bem estar do menor sob tutela, uma vez que a reversão poderá gerar danos irreversíveis no caráter da criança e do adolescente. Por esses e outros motivos é que uma decisão em favor da reversão deverá sempre ser bem fundamenta e colhida provas de que o menor ficará melhor retornando ao seu convívio anterior sem prejuízos, a ficar com a família ou local onde se encontra. Portando, a possibilidade da reversão da guarda a genitora é mínima, visto que sendo o melhor para seu filho é ficar onde esta bem sob a guarda e proteção de seu guardião mantenedor, não há que se falar em reversão. Pois sempre a prioridade é o melhor interesse do menor em detrimento dos genitores, mesmo estes obtendo condições ou desaparecendo os motivos desencadeadores da perda da guarda. 78 CONCLUSÃO Constitucionalmente, os pais devem obedecer ao princípio da paternidade responsável, com o objetivo de garantir o efetivo desenvolvimento da prole. Essa paternidade responsável implica o cumprimento das obrigações estabelecidas no artigo 229 da Constituição Federal, ou seja, o direito de assistir, criar e educar os filhos. O anterior Pátrio Poder teve a denominação alterada para Poder Familiar. Na época do CC/16 quem exercia o poder sobre os filhos era o pai e não se falava no poder do pai e da mãe (pais). Mas esta situação mudou e hoje a responsabilidade sobre os filhos é de ambos, assim, não só a denominação foi modificada, a extensão do entendimento, também. Os filhos enquanto são menores de 18 anos estão sob o poder dos pais e não podem praticar atos da vida civil sem a autorização deles. Estar sob o “poder” significa que os filhos devem obediência e respeito em relação aos pais e estes têm o dever de sustentá-los e dar assistência moral, emocional e educacional. A separação judicial ou divórcio dos pais não altera nada a questão do poder familiar, o que se estabelece neste caso é a guarda da criança (com quem vai ficar), as visitas (daquele que não tem a guarda) e o valor da pensão alimentícia a ser paga, mas ambos continuam responsáveis. É muito comum as pessoas imaginarem que somente aquele que paga a pensão tem o dever de sustento e aquele que tem a guarda decide sobre a educação, mas não é isso que a lei estabelece. Os pais têm direito e dever de educar os filhos ainda que separados, decidindo sobre a vida deles em conjunto. Por ser um direito do menor muito antes de ser um dever dos pais, o poder familiar pode ser suspenso, destituído ou extinto em casos expressos e via medida judicial, sempre visando à segurança do menor. O poder familiar é um instituto importante e que deve ser levado a sério. A vida de uma criança depende dos pais em todos os sentidos enquanto ela está em formação e justamente nesta fase a criança estará sendo moldada para crescer e se tornar um bom adulto. Assim, poderá a criança ou o adolescente, que não possua mais sua família natural, ter uma família. Essa, mesmo substituta, virá preencher a falta de pai ou 79 mãe ou familiares, onde a afetividade e o atendimento serão supridos por pessoas plenas de sentimentos de solidariedade. Por isso, é essencial idealizar que a guarda pressupõe a colocação da criança ou do adolescente em “família substituta”, não implicando necessariamente, na perda do poder familiar, podendo com ele conviver e dele se destacando, quando for o caso, pela suspensão. Guarda é o direito de reter o filho junto a si e de, velar e proteger ao filho, educá-lo e sustentá-lo, nos limites, porém, que conhecia antes da ruptura. Seus direitos encontram fronteiras nos de visita, companhia e fiscalização do outro. O superior interesse da criança ultrapassa os direitos dos pais biológicos. Prevê a CF/88 no artigo 227 “que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". Essa proteção também é regulamentada pelo ECA, que considera criança a pessoa com idade entre zero e doze anos incompletos, e adolescente aquele que tem entre 12 e 18 anos de idade. O maior interesse da criança é de ser sempre interpretado a partir desse parâmetros norteadores do direito, com o intuito de garantir os direitos consolidados constitucionalmente, tendo como diretrizes não mais a divina inspiração do "bom pai", mas a proteção integral e a prioridade absoluta objetivamente definida na normativa nacional e internacional. Tanto o papel paterno quanto o materno está no mesmo nível de importância na vida dos filhos, pois a formação deles inclui o direito e a necessidade de conviver com cada um em sua particularidade. As crianças saudáveis precisam de ambiente seguro, de proteção e de disciplina propiciado por pessoas amadas, respeitadas e que possam dar continência às suas emoções, por mais difíceis que sejam. Desta forma, educar filhos é uma tarefa que independe do sexo e o amor materno é tão contingente quanto o amor paterno. O estabelecimento e a permanência dos vínculos afetivos entre pais e filhos não encontram sua explicação na questão biológica, pois sua construção é social e determinada por diversos fatores que influem na história do casal e da família. 80 Dar uma família à criança é prioridade absoluta, é um ato de grandeza imensurável, é demonstração de desprendimento, capacidade de repartir e se doar. Esta criança (ou adolescente) vai passar a ser membro desta família que generosamente a acolhe, que livremente a quer entre os seus, dispensando-lhe tudo de que precisa sobretudo, amor. Em se tratando de adoção, passará a ter todos os direitos e deveres do filho de sangue. Até porque, tanto a Guarda como a Tutela podem ser revogadas, mas a Adoção é para sempre. O afeto é apontado atualmente, como o principal fundamento das relações familiares. Mesmo não constando à palavra afeto na carta magna como um direito fundamental, pode-se se dizer que o afeto decorre da valorização constante da dignidade humana. Vale salutar que o direito não tem o poder de criar afetividade, sentimentos naturais não decorrem de legislação, mas da vivência cotidiana informada pelo respeito, diálogo e compreensão. A afetividade faz com que a vida em família seja sentida da maneira mais intensa e sincera possível. A família só tem sentido enquanto unida pelos laços de respeito, consideração, amor e afetividade. Inexistente estes atributos, o que existe é um mero elo de direito, sem vinculação fática. A colocação de menores em família substituta, da qual a guarda é uma das espécies, o bem estar da criança deve sempre preponderar, doutrinadores afirmam que a manutenção do menor no local onde está bem, de regra, deve ser mantido. Cuja troca do meio ambiente onde está vivendo deve ser evitada o quanto possível, para não causar prejuízo à criança. A possibilidade do retorno do menor ao convívio dos genitores, é da própria precariedade da guarda permitir ou, ao menos o direito de visita. A suspensão temporária do exercício do poder familiar é uma sanção imposta aos genitores que visa preservar o melhor interesse do filho menor, que nada obsta que haja o retorno paterno ou materno ao exercício do poder familiar e, por conseguinte a guarda, uma vez cessando os motivos geradores da suspensão. A perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, desde que comprovem a cessação das causas que a determinaram, desde norte, o poder retornando para os genitores, com este retorna o dever de guarda inerente ao poder familiar. 81 Desaparecendo os motivos ensejadores da suspensão do poder familiar, onde os genitores haviam perdido a guarda do menor, há a possibilidade dessa guarda ser restabelecida, de modo que o juiz ao analisar o pedido da possível reversão não deixe de dar prioridade ao interesse do menor em detrimento dos interesses dos genitores, se possível ouvir a criança ou o adolescente e não menos importante de considerar o vínculo criado entre o menor e seu guardião. 82 REFERÊNCIAS ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Civil. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum. Código Processo Civil: Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007. 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