COMO NEGOCIAR São Paulo Abril de 2002 Revisado em março de 2008 Homero S. Amato COMO NEGOCIAR Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Autor: Homero S. Amato Editor: José Antônio Rosa Coordenação: Fernando Augusto S. Rosa Capa: Editora STS Diagramação: Set-up Time Artes Gráficas Revisão: Criações Gráficas Antiqua Gráfica: Papercrom Gráfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Amato, Homero S. Como negociar : técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens / Homero S. Amato. – São Paulo : Editora STS, 2002. 1. Negociação 2. Solução de problemas 3. Sucesso I. Título. 02-0151 CDD-658.4052 Índice para catálogo sistemático: 1. Negociação : Administração de empresas 658.4052 Editora STS Publicações e Serviços Ltda. Rua Dr. Vila Nova, 67/conj.11 – Higienópolis CEP:01222-020 São Paulo/SP Telefax: (11)221-1345 ou 3225-0353 www.editorasts.com.br [email protected] Dedica tór ia Dedicatór tória Dedico este volume e a minha vida à minha eterna esposa e companheira Sandra, que nestes 34 anos de convívio tem sido um baluarte, motivação e apoio para mim, e aos nossos preciosos cinco filhos, genro, noras e netos. Agradeciment os Agradecimentos Sou muito grato aos meus inúmeros professores, que sempre se dispuseram a lecionar com desprendimento. Agradeço aos meus alunos, pois aprendo com eles em cada aula ministrada. Pr efácio Prefácio A pessoa certa para escrever um livro sobre negociação é Homero Amato. Primeiro, por sua atuação na bem-sucedida trajetória como executivo e professor. Segundo, pelas orientações de consultor a empresários que buscam novos talentos para suas organizações. Terceiro, por seus conselhos a executivos, em transição de carreira. Quarto, pelas pesquisas que faz para dar conteúdo às suas brilhantes aulas, quer como conferencista, quer como mestre de pós-graduação. Conheço bem as qualidades de Homero nas várias frentes em que atua. Como fundador do Grupo Catho, por mais de 19 anos, tenho o privilégio de trabalhar com ele. Em nossa empresa ele tem sido um eficiente head hunter. Homero vem apresentando seminários e há mais de 15 anos ministra o curso que dá título ao presente livro, sempre com sucesso de público e com excelentes avaliações. Por conhecê-lo bem e por tê-lo visto atuar em várias negociações, seja na área de recursos humanos, seja na área comercial, posso afiançar que é um profissional que não só ensina, mas também pratica os princípios que ministra. Negociar não é fácil no mundo complexo de hoje. Inúmeras pressões externas e demandas de várias naturezas trazem dificuldades e tensões para qualquer mesa de negociação. Os negociadores têm de atender objetivos múltiplos, freqüentemente em situações de urgência, com limitações de informações e recursos. Difícil, mas fundamental para o sucesso, a negociação é parte do cotidiano dos administradores e executivos. Agora, ela se torna um pouco mais fácil com esse livro prático e objetivo. O autor nos mostra as dificuldades, mas dá os caminhos para reduzi-las e administrá-las convenientemente. É um livro abrangente e seguramente útil para todos. Sucesso ao autor. Thomas Case Presidente Grupo Catho COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens 10 Homero S. Amato Sumár io Sumário Prefácio ............................................................................................... 9 Introdução ........................................................................................... 15 I – CONCEITOS FUNDAMENTAIS ....................................................... 21 O que é negociação ................................................................................ 22 O que é uma negociação de sucesso ........................................................ 23 O papel do negociador ............................................................................ 25 Negociador moderno como solucionador de problemas ............................ 27 II – O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO ................................................... 29 Ingredientes do processo ........................................................................ 29 Fatores que influenciam os resultados ...................................................... 30 - Negociadores...................................................................................... 31 - A negociação em si ............................................................................. 32 - A situação .......................................................................................... 33 Campo de forças da negociação ............................................................... 33 III – PERFIS, ESTILOS E TIPOS DE NEGOCIADORES ....................... 35 Perfil de competência para negociação ..................................................... 37 Estilo de negociadores ............................................................................ 39 Tipos de negociações e comportamentos ................................................. 41 Atitudes básicas do negociador ................................................................ 45 Características de um bom negociador ..................................................... 49 IV – DESENVOLVIMENTO DAS HABILIDADES BÁSICAS PARA O .... SUCESSO NA NEGOCIAÇÃO........................................................ 61 O aprendizado da negociação .................................................................. 61 Percepção da necessidade dos outros ....................................................... 64 Boa comunicação .................................................................................... 70 Postura e comportamento assertivo ............................................................ 73 11 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens V – GERENCIAMENTO DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO .................... 75 O ciclo de gerenciamento da negociação ..................................................... 76 Planejamento e preparação da negociação .................................................. 77 A negociação ............................................................................................. 83 Evitando os erros típicos da negociação ...................................................... 89 Formulários que ajudam no gerenciamento ................................................. 92 VI – PRÁTICAS PARA O SUCESSO NA NEGOCIAÇÃO ......................... 97 Barreiras e objeções – como superá-las ....................................................... 97 Práticas da boa negociação ......................................................................... 101 Algumas táticas consagradas ...................................................................... 102 Mantenha-se em vantagem ......................................................................... 106 Jogo sujo – como proteger-se .................................................................... 108 VII – TIPOS ESPECIAIS DE NEGOCIAÇÃO ........................................... 111 Negociação individual X em grupo .............................................................. 111 Negociação com uso de intermediários ....................................................... 113 Negociação por telefone ............................................................................. 114 Negociações por e-mail .............................................................................. 114 VIII – O PODER, SUA AMPLIAÇÃO, SEU USO ...................................... 117 O que é poder? ......................................................................................... 117 As fontes do poder .................................................................................... 118 Ampliando o próprio poder ........................................................................ 119 Uso adequado do poder ............................................................................. 119 IX – MANTENDO A TRANQÜILIDADE E O EQUILÍBRIO NA ............ NEGOCIAÇÃO ............................................................................... 121 O estresse da negociação ........................................................................... 122 Autocontrole e eficácia ............................................................................... 122 12 Homero S. Amato X – ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES ............................................................. 125 Ética ......................................................................................................... 125 O que é um negociador ético ...................................................................... 126 Condutas antiéticas nas negociações ........................................................... 127 XI – CULTURA E ESTILO DE NEGOCIAÇÃO .......................................... 131 Variações culturais e suas manifestações na negociação ............................... 131 Mantendo-se alerta para as diferenças ......................................................... 133 Alguns estilos de negociadores internacionais .............................................. 133 Estilo brasileiro – vantagens e desvantagens ............................................... 135 O Executivo brasileiro como negociador ...................................................... 138 XII – O HOMEM E A MULHER NA NEGOCIAÇÃO .................................. 141 Presença tradicional do homem nas negociações ......................................... 141 Presença da mulher nas negociações ........................................................... 142 Uma visão adequada da mulher .................................................................. 143 Uma visão apropriada do homem ............................................................... 144 Comportamento ........................................................................................ 145 XIII – CRIATIVIDADE PARA RESOLVER .............................................. 147 O que é criatividade ................................................................................... 148 Criatividade na negociação ......................................................................... 148 Buscando soluções criativas ........................................................................ 149 Formando alianças para inovar ................................................................... 151 XIV – AVALIANDO SUA CAPACIDADE DE NEGOCIAÇÃO .................... 153 Auto-avaliação da capacidade de negociação ............................................... 153 Questionário para auto-avaliação ................................................................ 157 Avaliando suas forças e fraquezas ............................................................... 172 Traçando um plano de melhoria ................................................................. 173 Definindo um estilo de negociação em função de seu perfil .......................... 174 Bibliografia ............................................................................................. 177 13 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens 14 Homero S. Amato I NTRODUÇÃO Nas situações mais corriqueiras da vida, a negociação está sempre em pauta. No lar, marido e mulher de repente deparam-se com objetivos diferentes e inconciliáveis: ele pretende fazer um investimento e ela gostaria que gastassem as economias com uma viagem. Precisam negociar. O filho deseja fazer uma excursão, mesmo considerando-se o fato de que não anda indo bem na escola, e a mãe deseja obter um comportamento mais disciplinado dele. Eis aí situações bastante comuns nas quais as pessoas, de modo consciente ou não, negociam. O que está em jogo eventualmente poderão ser ganhos materiais, mas, em geral, é muito mais que isso – alegria, senso de realização, auto-estima... ou o contrário disso tudo. No trabalho, a negociação é a própria essência de muitos processos. Negociam-se objetivos, alternativas para atingi-los, uso dos recursos, formas de trabalhar etc. Em todas as áreas, em todos os níveis. Internamente, executivos, gerentes e técnicos negociam com seus subordinados, com seus pares, com seus superiores. Representando a organização, eles negociam igualmente com pessoas de fora, sejam clientes, sejam fornecedores, sejam agentes financeiros, membros do governo. Os prêmios pelas boas negociações são um aumento de salário, recorde de vendas, realização de um grande negócio, promoções etc. Na área social, negocia-se com o síndico, com um fornecedor de serviços (o pedreiro, por exemplo), com outros membros do clube ou da igreja. Na política, igualmente, a negociação é parte essencial do processo. A história, sob certos aspectos, é a sucessão de acordos, desacordos, conflitos e negociações apaziguadoras. Muitas vidas se foram por falta de habilidade de negociar e muitas foram preservadas. Por exemplo: O general Ulysses Grant perdera 50 mil homens na Batalha de Richmond, capital da Virgínia, apenas nas primeiras oito horas de batalha. Do outro lado, estava o general Lee. No meio da batalha, Grant propõe um encontro a Lee e o convence a retirar-se. Lee retira-se com dignidade, e Grant veio a ser o presidente dos EUA. Este é apenas um exemplo do poder da negociação e sua presença em todos os fatos históricos, na condução da política. A política implica, essencialmente, negociar. Algumas observações: ◆ É impossível achar uma situação em que a negociação não esteja presente, de um modo ou de outro, com maior ou menor abrangência. Isso é inevitável, uma vez 15 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens que a negociação é parte essencial do processo de interação humana, de construção da sociedade. Vale para o âmbito individual, vale para o âmbito social. ◆ Presente em todos os processos interativos, a negociação bem-sucedida é fundamental para a realização de objetivos, em casa, no trabalho, e igualmente para viabilização dos projetos sociais. ◆ Podemos admitir que o sucesso em todas essas áreas depende da capacidade de negociação. Quanto mais capazes formos de entender os outros, interpretar suas necessidades, encontrar arranjos mutuamente satisfatórios, mais sucesso teremos, como pessoas e como sociedade. As negociações têm conseqüências As negociações, freqüentes e corriqueiras na vida, têm conseqüências e algumas delas não são muito agradáveis: ! Um grande empresário brasileiro decidiu casar-se com uma socialite. Não deixou que a ilusão o cegasse e pediu a um famoso advogado que fizesse um acordo pré-nupcial detalhado, que fosse capaz de proteger seu patrimônio. O acordo feito, assinado pelas partes, previa para a eventual separação uma “indenização” de US$ 100 mil por ano de casamento. A separação amigável veio após seis anos, mas o casal não conseguiu chegar a um consenso sobre o valor. O que deveria ser US$ 600 mil acabou virando uma “indenização” de US$ 8 milhões. E o empresário ainda teve de arcar com as custas de advogado das duas partes! ! Uma tradicional empresa brasileira entrou em concordata. Três bancos de prestígio tomaram a frente para gerenciar a concordata, contrataram um executivo também de prestígio e desenvolveram uma proposta pretensamente excelente para tirar a empresa do 16 Homero S. Amato buraco. A dívida com os fornecedores seria convertida em ações (é melhor que perder), novos planos de compras seriam feitos, garantidos pelos bancos, e um plano estratégico igualmente foi apresentado. Entretanto, 70% dos credores simplesmente não aderiram! ! A condômina devia dez mensalidades do condomínio quando resolveu vender o apartamento. Para evitar futuros problemas jurídicos, foi a uma reunião e propôs a quitação do débito por meio do pagamento de um valor equivalente a seis mensalidades. Os demais condôminos não aceitaram. Ela vendeu o apartamento. O condomínio iniciou uma ação contra o novo proprietário, que corre o risco de perder o imóvel caso não quite o débito. E, este, por sua vez, passou a mover uma ação contra a ex-proprietária que, mais cedo ou mais tarde, terá de responsabilizar-se pelo débito. Todos perderam temporariamente. ! Um industrial brasileiro não conseguiu entender-se com a ex-esposa e filhos quanto ao controle da empresa que fundou. Foi processado pelos familiares. Acabou ganhando a disputa na Justiça. Expulsou os filhos da organização. Após algum tempo, vendeu-a a uma multinacional e deu início a um novo empreendimento. Para qualquer lado que olhemos encontraremos inúmeros exemplos de disputas com conseqüências amargas, nas quais usualmente todos perdem, e que poderiam ter sido evitadas se ocorressem processos de negociações mais eficientes. Não vamos discutir nesse momento as razões por que essas falhas aconteceram, mas vamos admitir que os envolvidos provavelmente gostariam de ter negociado de modo diferente. 17 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Negociar é uma arte – e pode ser aprimorada Não precisamos de muita pesquisa para perceber que algumas pessoas negociam melhor que outras. Sem nunca ter aberto um livro sobre o assunto, ou ter participado de qualquer curso, há aquelas pessoas que conduzem melhor a situação quando se trata de estabelecer acordos. Parece que têm jeito para a coisa: cativam mais, são mais persuasivas, mais capazes de encontrar alternativas que satisfaçam as partes envolvidas. Negociar é uma arte e muitas pessoas trazem boa dose dessa arte do nascimento. Ela requer sensibilidade, criatividade, capacidade de análise e compreensão de relações às vezes complexas. Pode-se aprender a negociar? Pode-se e deve-se, como toda arte. É certo que alguns irão mais longe com o aprendizado. Entretanto, o acesso a um conjunto de conceitos, técnicas e preceitos fundamentais permite à pessoa que, partindo do seu potencial natural, avance na capacidade de negociar. O desenvolvimento dessa arte acompanha o ser humano desde os primórdios da história. Já na Bíblia encontramos uma enorme coleção de ensinamentos práticos para a condução de negociações em todos os âmbitos da vida. O sucesso na negociação é 20% de inspiração e 80% de transpiração. ! A negociação é uma troca de valores. Estamos sempre buscando e aprimorando as qualidades necessárias para nos tornar bons negociadores. ! Negociar é um dom, mas com ele são essenciais a prática e o conhecimento. ! “O bom vendedor não é o que vende muito de uma vez. É o que vende sempre” – diz Aldamiro Dellape Baptista, presidente do Laboratório Aché. Em muitos textos de filósofos, pensadores políticos, e de todos os que se ocuparam das relações humanas encontraremos boa orientação para as negociações. Salomão foi um grande negociador. Conhecido por sua grande sabedoria, em um julgamento foi chamado a resolver o caso de duas mulheres que diziam ser as legítimas mães da mesma criança. Os argumentos eram tão convincentes que não dava para descobrir quem era a mãe verdadeira. Então, Salomão chamou um guarda e ordenou que, com sua faca afiada, “dividisse” a criança e entregasse uma parte a cada mulher. Antes que o guarda cumprisse a sentença, uma das mulheres abriu mão da criança em favor da outra. Salomão então descobriu que esta era a verdadeira mãe e a justiça foi feita. 18 Homero S. Amato “Ao que distribui mais se lhe acrescenta, e ao que retém mais do que é justo, é para a sua perda. A alma generosa prosperará e aquele que atende também será atendido. Ao que retém o trigo o povo amaldiçoa, mas bênção haverá sobre a cabeça do que o vende. O que cedo busca o bem, busca favor, mas o que procura o mal, esse lhe sobrevirá. Aquele que confia nas suas riquezas cairá, mas os justos reverdecerão como a folhagem.” Provérbios (11: 24-28) ! Podemos negociar com medo. Mas jamais vamos ter medo de negociar. John F. Kennedy (1917 - 1963) Este livro Negociação é um tema abrangente. Não nos ocuparemos da negociação no âmbito da política, nem dos aspectos sociais mais amplos em que a negociação se faça presente. O compromisso maior aqui é com a pessoa e sua capacidade de negociação. O objetivo fundamental do livro é apresentar informações sobre negociação que o leitor possa efetivamente usar no seu dia-a-dia, de modo prático e objetivo. O livro surgiu da longa experiência do autor como executivo e como consultor de administração e recursos humanos. Durante muitos anos, o autor, como executivo, realizou vários tipos de negócios nas empresas as quais esteve ligado e orientou subordinados ou assessorou superiores em processos de negociação. Posteriormente, como titular de uma consultoria especializada em recursos humanos, passou a orientar executivos em suas mudanças de emprego e evolução em suas carreiras. Sempre a tônica da negociação 19 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens esteve presente, em cada entrevista, em cada discussão salarial, em cada promoção ou mudança. Igualmente o autor colheu muitos subsídios para o livro com seus alunos de pósgraduação, usualmente já experientes e bem posicionados em suas empresas. Muitos desses alunos relataram casos, buscaram aconselhamento, colocaram questões que enriqueceram o livro. A essas mesmas pessoas que, conscientes disso ou não, contribuíram com o conteúdo desse livro, ele retorna. O livro deverá ser útil para o executivo e o técnico ligados às empresas, para os professores, para os alunos, para os profissionais autônomos. A todos os que negociam e já perceberam que a boa negociação pode fazer a diferença na trajetória de suas vidas. 20 Homero S. Amato I CONCEIT OS FUNDAMENT AIS CONCEITOS FUNDAMENTAIS O que é negociação O que é uma negociação de sucesso O papel do negociador Negociador moderno como solucionador de problemas O que é negociação? Quando estamos negociando e quando não estamos negociando? É fundamental definir bem o termo negociação, pois ele já nos dá uma orientação para a prática de entendimentos eficazes. A definição de negociação tem abrangência muito maior que aquela dada na área de negócios ou administração. Por exemplo, todos os que lidam com a diplomacia precisam de um bom conceito de negociação. O Ministério de Relações Aborígenes, da província de British Columbia, no Canadá, tem um documento que cobre os tratados válidos para todos os povos indígenas do território. Do mesmo modo, a conceituação de negociação sofre influências culturais, como lembra o professor Stephen Weiss. Ele mostra que enquanto os americanos concebem a negociação em termos de propostas e contrapropostas, os japoneses a vêem como geração de soluções com base em um quadro de informações. Vamos conceituar negociação para efeito do nosso trabalho. O leitor poderá encontrar, naturalmente, outras definições de negociação, algumas até com uma boa dosagem de complexidade. Para nós interessa um termo prático, que nos leve a aprimorar as habilidades de negociação. 21 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens O que é negociação Um renomado instituto americano dedicado à assessoria e arbitragem, o EMI – Erickson Mediation Institute, fundado e dirigido por Stephen K. Erickson e Marilyn S. Mckinight, traz em seu site uma definição de negociação: ◆ O processo que duas partes usam para resolver suas diferenças por si mesmas. A negociação poderá ser tratada de um modo competitivo ou cooperativo. ◆ As partes tomam as decisões. Uma terceira parte que decide não é usada. ◆ As partes escolhem entre falar por si mesmas ou cada uma delega a um preposto a tarefa de negociar em seu nome. ◆ As partes criam suas próprias regras de negociação. ◆ Quando uma abordagem competitiva é tomada, a barganha de posições é usada e freqüentemente resulta em cada lado cedendo um pouco (compromisso), de modo que nenhum dos dois sente como se estivesse ganhando. ◆ Quando uma abordagem cooperativa é tomada, as partes tentam encontrar soluções que focalizem cada uma de suas preocupações e necessidades de tal modo que ambos os lados sentem que o resultado é satisfatório. ◆ As partes entram em processo voluntariamente. ◆ O enfoque pode ser no passado, presente, futuro ou uma combinação de todos. Informações: http://www.ericksonmediation.com/faq.htm 22 Uma visão prática, objetiva, de profissionais da negociação. ! Pessoas em interdependência, com alguns objetivos comuns e outros conflitantes, livres, buscando o entendimento, a melhor solução para todos. Homero S. Amato Alguns pontos são fundamentais para que haja negociação: ◆ A existência de duas ou mais partes com objetivos. ◆ O conflito de objetivos, real e percebido pelas partes. ◆ A aceitação da cooperação, ainda que mínima, para chegar a um acordo satisfatório para todos. Podemos definir: Negociação Negociação é o processo por meio do qual duas ou mais partes com objetivos conflitantes procuram conscientemente, ainda que com cooperação mínima, chegar a um acordo satisfatório para todos. O que não é negociação - A compra e venda corriqueira de um produto, com ausência de conflito de interesses ou objetivos entre as partes. - A decisão de dois ou mais indivíduos de fazerem algo, que todos aceitaram sem questionamento. - A aceitação involuntária de uma coisa ou conduta imposta pelo outro proponente. - A ignorância de uma das partes sobre a situação, havendo manipulação dessa parte pela outra. O que é uma negociação de sucesso Duas partes procuram um acordo para harmonizar da melhor maneira possível objetivos conflitantes. Quais são os resultados possíveis? No mínimo, com base nas condições oferecidas pela situação, temos quatro resultados: Resultado Ganha-Perde – A parte A ganha e a parte B perde – B sente-se frustrado e ressentido, desenvolvendo atitudes negativas em relação a A. Tais atitudes, mais cedo ou mais tarde, poderão expressar-se, comprometendo o relacionamento. Resultado Ganha-Perde – A parte B ganha e a parte A perde. A sente-se frustrado e ressentido, desenvolvendo atitudes negativas em relação a B. Essas, mais cedo ou mais tarde, poderão expressar-se, comprometendo o relacionamento. 23 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Resultado Perde-Perde - Ambas as partes perdem – As partes sentem-se frustradas e desenvolvem atitudes negativas uma em relação a outra. Tais atitudes poderão atrapalhar futuras relações. Resultado Ganha-Ganha - Ambas as partes ganham – Todos sentem-se realizados com os resultados e isso cria goodwill, boa vontade, atitudes positivas para negociações futuras. Solidificam-se as relações ou pelo menos melhoram com base na situação preexistente. Nas condições, digamos, normais, negociações bem-sucedidas são apenas as que têm resultados do tipo ganha-ganha. Alguém sair perdendo quase nunca é um bom negócio, até porque as pessoas continuarão vivendo em sociedade e é melhor criar laços cooperativos que competitivos. Mas, dependendo da situação preexistente, a perspectiva muda. Imaginemos, por exemplo, a situação em que o filho fumou maconha e gostou. Quer continuar com essa prática e o pai deseja que ele pare. O resultado aqui, quanto ao objetivo imediato do filho, não pode ser ganhaganha. O ideal, até para o próprio filho, é que seja ganha-perde. Isso nos mostra que uma visão muito simplificada do que representa sucesso na negociação pode ser inadequada. Para definir o que realmente é uma negociação de sucesso precisamos responder algumas perguntas-chaves: ◆ Em relação a quais objetivos? ◆ Na perspectiva de quem? ◆ Considerando que prazo? ◆ Quais eram as outras alternativas existentes? 24 Negociações tripartites, quadripartites Nem sempre são apenas duas partes negociando. Às vezes – e freqüentemente nos dias de hoje – mais de duas partes estão representadas na mesa de negociação. São as chamadas negociações tripartites e quadripartites, nas quais mais de dois negociadores envolvem-se, cada um visando seus próprios objetivos. Os princípios são sempre os mesmos. O raciocínio passa a ser Nós e os Outros – e que nesses “outros” incluem-se os demais interlocutores. Embora com os mesmos princípios, as negociações tripartites e quadripartites são mais complexas. Nestas, o grupo tem interesses parecidos, mas negociam separadamente. Homero S. Amato O professor G. Richard Shell, que conduz um destacado workshop sobre negociação na Wharton School, e escreveu o livro Bargaining for Advantage: Negotiation Strategies for Reasonable People (Barganhando para Vantagem: Estratégias de Negociação para Pessoas Razoáveis) observa: “Nós somos todos tentados a chegar ao compromisso em negociações e essa pode ser a orientação certa, mas compromisso pode não ser o resultado ótimo quando muitas questões e necessidades estão sobre a mesa.” O presente trabalho visa à melhoria da prática da negociação, sob a perspectiva do negociador. Assim, é útil adotar um conceito de negociação bem-sucedida que nos ajude a atingir tal objetivo. Vamos, então, adotar a seguinte definição de negociação de sucesso: Negociação Bem-Sucedida Negociação bem-sucedida é aquela que, na perspectiva dos negociadores, permite a maximização dos objetivos das partes envolvidas e cria predisposição para colaboração futura. O papel do negociador Algumas vezes o negociador está agindo em nome próprio, outras vezes está representando terceiros – por exemplo: uma organização. Em qualquer dos casos, ele desempenha um papel na negociação. A aceitação plena desse papel e o seu comportamento adequado são condições para uma maior eficiência no processo. Vamos analisar três situações diferentes: Numa reunião estavam dois representantes da agência de propaganda e três representantes do cliente. O objetivo da reunião era a apresentação de uma nova proposta de distribuição da verba de propaganda do cliente. A agência apresentou seu plano, que se mostrava muito bom ... para a agência. Tinha pontos bons em relação aos interesses do cliente. Logo após a apresentação, um dos executivos representante do cliente tomou a palavra e, falando de modo convincente e agressivo, “arrasou” com a proposta da agência e demonstrou que a mesma estava fazendo uma proposta muito mais em causa própria do que pensando no interesse do cliente. Este executivo, na verdade, não quis perder a oportunidade de brilhar, interessado que estava em “mostrar serviço” e crescer na empresa. 25 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Criou-se um clima de mal-estar e a reunião “desandou” dali para frente, não trazendo benefício para nenhuma das partes. ! Uma empresa de porte médio, pela primeira vez estava admitindo um profissional qualificado para ocupar a posição de controller. O profissional e o futuro chefe negociavam os termos finais do contrato de trabalho. O salário oferecido estava bem abaixo daquele pretendido pelo candidato e ele propôs que a empresa melhorassse sua oferta. O futuro chefe manteve-se firme e pressionou o candidato para aceitar o salário oferecido, o que acabou ocorrendo. Na verdade, ele não tinha idéia sobre qual era o salário adequado para o cargo e poderia efetivamente pagar mais, se o soubesse. A pressão exercida foi para avaliar se realmente o salário oferecido era aceitável. Tudo certo para começar o trabalho, o que deveria acontecer na semana seguinte. Os outros candidatos foram dispensados. Três dias depois, o profissional telefona para a empresa e diz que infelizmente não poderá aceitar o trabalho. ! Para fechar um contrato vultoso entre sua empresa e uma grande multinacional, o diretor técnico teve de sonegar ou disfarçar duas ou três informações importantes. O negócio foi fechado, mas, alguns meses depois, ficou claro que havia ocorrido essa omissão de informações. Isso comprometeu a continuidade do contrato e o concorrente foi escolhido. Vejamos o que aconteceu: No primeiro caso, o negociador brilhou, mas prejudicou a empresa. Sua postura agressiva atrapalhou uma negociação objetiva do plano, o qual tinha aspectos positivos e efetivamente poderia ser bom para a empresa. No segundo caso, o profissional não “brigou” suficientemente por seus interesses. Com isso prejudicou a si próprio e também a outra parte. O futuro chefe não percebeu essa timidez do candidado, exercendo então pressão acima do desejável. Todos perderam. No terceiro caso, o diretor atingiu o objetivo, mas de modo não ético. Isso é fatal para a continuidade das relações. Ganhou... e perdeu. Em todas essas situações, houve desempenho inadequado do papel do negociador. Um bom negociador tem de: ◆ Conhecer bem a situação, suas limitações. 26 Homero S. Amato ◆ Conhecer as partes envolvidas, suas motivações e interesses. ◆ Conhecer as condições de negócio existentes; o que é e o que não é possível. ◆ Com base nisso tem de buscar o melhor negócio para as partes envolvidas. ◆ Mas deve fazê-lo de modo limpo, com vista nos relacionamentos produtivos e duradouros. Negociador moderno como solucionador de problemas Nem sempre é fácil chegar a acordos mutuamente satisfatórios. Cada pessoa ou empresa enfrenta hoje muitos desafios e tem muitas demandas a satisfazer. E isso esbarra em objetivos e demandas conflitantes de outros. Vejamos: ◆ O grande supermercado quer ter preços baixos para atender seus clientes de modo melhor que a concorrência. Precisa comprar barato de seus fornecedores. Esses, entretanto, têm custos que facilmente fogem ao controle e se operarem com margens muito baixas poderão enfrentar prejuízos constantes. ◆ O sindicato almeja melhorar o nível salarial dos afiliados, porque está havendo crescimento no segmento que representa. No entanto, esse crescimento vem ocorrendo justamente porque as indústrias vêm buscando sólidas melhorias de qualidade e fortes reduções de custo. A indústria pretende automatizar e cortar pessoal. ◆ As empresas estão terceirizando para tornar seus custos mais flexíveis e menores. Então, busca contratar outras organizações, prestadoras de serviços, para fazer determinados trabalhos que antes eram feitos por pessoal próprio. A empresa cliente precisa ter qualidade nota dez dos prestadores de serviços, mas não pode gerenciá-los e nem paga valores que justifiquem uma atenção privilegiada. Comprar na melhor condição possível. Vender na melhor condição possível. Como compatibilizar? Quem vai pagar pelos aumentos salariais? Tudo tem um custo. Quem aceita pagar? 27 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Em todas as situações, entra o negociador. Hoje ele é visto como um solucionador de problemas. Em meio a situações difíceis, tem de exercer sua criatividade e buscar soluções que harmonizem do melhor modo o interesse de todas as partes. Não é fácil... e por isso o negociador é valorizado! Um solucionador de problemas... - Busca alternativas criativas para viabilizar os interesses de todas as partes. - Não confunde as pessoas que estão negociando com os objetivos da negociação. Assim, mantém uma postura objetiva. - Encara a negociação como um processo, como potencial conflito que pode ser amenizado por concessões mútuas. - Considera os sentimentos e emoções das pessoas envolvidas. Sabe que isso tem extrema importância para o sucesso da negociação. - Entende que todos os envolvidos querem chegar a um acordo. Conta com eles, ajuda-os a expressarem suas necessidades e dificuldades. - Procura compatibilizar suas propostas com as necessidades dos oponentes. Para isso, usa o máximo da criatividade e explora todas as alternativas. - É sincero em suas posições. Essa sinceridade desperta emoções positivas nos outros. - Reconhece o direito de o outro lado discordar. Não toma a discórdia como ofensa ou oposição, mas como parte do processo. - Procura ter controle emocional. Sabe que o descontrole emocional impede a visão das melhores alternativas. - Mantém-se afável, amistoso e simpático. Com isso, cria boa vontade. - Escuta primeiro, fala depois. Assim, amplia sua compreensão do outro e cria empatia. - Procura antecipar problemas que poderão surgir na negociação. Então, prepara-se adequadamente. - Procura conhecer bem a outra parte, antes de negociar. Sabe que esse conhecimento é a base para fazer as propostas certas. - Defronta-se com os problemas, não com as pessoas. Não cria resistências desse modo. 28 Homero S. Amato II O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO Ingredientes do processo Fatores que influenciam os resultados Campo de forças da negociação O sucesso de uma negociação não depende apenas da boa vontade do negociador. Inúmeros fatores o influenciam positiva ou negativamente. Um bom conhecimento desses fatores ajuda não só o negociador a planejar sua estratégia de negociação, mas também a conduzir a negociação com maior segurança e a ter mais certeza da realização de seus objetivos. Ingredientes do processo Angel Tse e Gregory E. Kesten, da InterNeg Group, da Carleton University, Montreal, Canadá, observam que Sun Tzu, em seu Arte da Guerra, 400 anos a.C., já observava que a melhor maneira de ganhar uma guerra é por meio da negociação e que para isso três coisas contam muito: o negociador, seu oponente e a situação. Quem é que está negociando? Como é essa pessoa? E seu opositor no processo, quem é? Como é? Como interagem as duas personalidades? Eis algumas questões de grande importância para o processo. R. J. Ewicki e A. Hiam que, com outros autores assinaram o livro com o sugestivo nome de Pense Antes de Falar: Um Guia Completo para Negociação Estratégica, observam que a situação tem um peso sutil, mas muito importante na negociação e inclui itens como prazos, opções existentes, regras etc. 29 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Fatores que influenciam os resultados O resultado final da negociação decorre da combinação dos fatores que a influenciam. Negociadores certos, na situação errada, por exemplo, trarão um tipo de resultado. Negociadores competentes, com o processo errado, numa situação favorável produzirão resultados bem diferentes. Não podemos deixar de considerar cada um desses fatores isoladamente e a combinação, o mix, de todos. O mix da negociação Mix, em inglês, quer dizer a mistura, o conjunto de ingredientes que contribuem para formar um alimento, uma fórmula, um resultado qualquer. O mix da negociação inclui os negociadores, o processo e a situação. Conhecê-lo é fundamental para planejar, administrar e explicar os resultados de uma negociação. ! “A maioria das negociações envolve a mistura de elementos, e cada uma delas pode ser mais bem conduzida com uma estratégia diferente. Porém, deve-se notar que não há uma única melhor estratégia. Variações na posição das partes e no contexto da negociação afetará cada negociação diferentemente.“ Angel Tse e Gregory E. Kesten ! “As cores primárias são apenas cinco mas a sua combinação é tão infinita que uma pessoa não pode visualizá-las todas. Os sabores são somente cinco mas suas combinações são tão variadas que uma pessoa não pode experimentá-las todas.” Sun Tzu Angel Tse e Gregory E. Kesten. The Art of War and the Art of Negotiation – as tautht by Sun Tzu.http://gopher.ulb.ac.be/~colerche/725reading/art.htm 30 Homero S. Amato Negociadores Os negociadores gerenciam a negociação. Portanto, eles são o ingrediente mais forte no processo. Havendo eficiência genuína por parte dos negociadores, contornam-se problemas graves do processo ou da situação. Portanto, capacitar negociadores é o melhor caminho para aprimorar os resultados das negociações, seja no mundo da diplomacia, seja na promoção da paz, seja nas atividades empresariais. E quando se considera o negociador, o que conta? Pelo menos sete itens contam muito: Nível de conhecimento e informação – O conhecimento permite que a pessoa entenda mais a si mesma, os outros, a situação, os processos e em decorrência de tudo isso, que ela comporte-se de modo mais apropriado na negociação. Pessoas com maior conhecimento têm usualmente mais domínio sobre suas emoções e sentimentos, dando um tratamento mais objetivo às questões, facilitando o processo. Maior nível de informação sobre o objeto da negociação, sobre os antecedentes, sobre a situação ajudam sobremaneira. Grau de habilidade – Habilidade de ouvir com empatia, de falar com clareza e persuasão, de lidar com situação tensa – eis algumas características que tornam o indivíduo mais eficiente na negociação. Grau de poder – Quanto de poder tem cada participante da negociação? Os resultados serão diferentes conforme as várias combinações. Como observou Bacon, informação é poder. Habilidades são parcialmente inatas e parcialmente aprendidas ou adquiridas com a prática. Poder provém de várias fontes. Todas contam. 31 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Estilos – O estilo de cada negociador conta. Há estilos mais adequados e aqueles menos apropriados para cada situação. Diferentes estilos podem ser eficazes. Motivação – O nível de motivação dos negociadores com relação a seus objetivos, à busca de eficiência no processo, à defesa dos interesses em jogo tem um peso relevante. O mais motivado tende a maximizar a realização de seus resultados. A motivação pode variar em decorrência do objeto da negociação. Perfil psicológico – Que emoções predominam no negociador? Como ele lida com as suas emoções? Gente competente pode derrapar por não ter controle emocional. As emoções ou potencializam ou barram eventuais qualidades da pessoa. Inteligência emocional – capacidade de gerenciamento adequado e eficaz das próprias emoções – é fundamental para o sucesso. Momento – O momento do negociador, seja na perspectiva da trajetória de vida, seja em termos mais imediatos afeta o seu comportamento. Bons negociadores têm mais constância nos seus resultados, dependem menos de circunstâncias externas para desempenhar bem. A negociação em si Cada negociação é única. Variam os objetivos, as circunstâncias, os negociadores. Logo, cada processo é diferente. As quatro principais variáveis relacionadas com o processo são: Objetivos dos negociadores – Os objetivos de cada parte e como se inter-relacionam são importantes. Há, obviamente, sempre um conflito de objetivos, menor ou maior, pois caso contrário não haveria negociação. Mas qual é o grau de incompatibilidade e até que ponto as partes estão dispostas a ceder? Eis a questão. O grau de complexidade do objeto da negociação – Somos forçados a admitir que a negociação de um contrato de serviços pode ser algo bem mais simples que uma 32 Homero S. Amato negociação de tratado de paz. Há objetos de negociação que oferecem maior complexidade que outros. Isso afeta a qualidade e os resultados da negociação. As alternativas existentes – Tudo será diferente se os negociadores dispuserem de mais alternativas para negociar. Quando essas são limitadas, o grau de dificuldade tende a crescer. Recursos existentes – Dispõe-se de recursos para investir na preparação da negociação? Se os recursos para as negociações são escassos isso pode significar, por exemplo, menor acesso a informações. O próprio local (recurso físico) tem um peso sobre os resultados da negociação. A situação Há coisas que se passam fora do processo e o influenciam sobremaneira. Por exemplo, pode ser que agentes externos estejam pressionando os negociadores. As questões que vêm do ambiente e do histórico do relacionamento compõem a situação dentro da qual o processo desenvolve-se. Têm tudo a ver com a eficácia da negociação. Algumas variáveis de alta importância relacionadas com a situação: Tempo – Prazos apertados, escassez de tempo, pressões, tudo isso limita as possibilidades de exploração adequada das alternativas, além de causar forte estresse sobre os negociadores. Pressões externas – Muitas vezes os negociadores estão representando instituições ou terceiros. Eles desempenham também um papel importante na negociação, pois definem o grau de autonomia do negociador e fazem determinado grau de pressão sobre ele. Campo de forças da negociação Nas negociações podemos ver uma tendência ao sucesso ou ao fracasso, conforme as forças que se movem dentro do processo. Quando há forças direcionadas para o entendimento, cria-se um círculo virtuoso que culmina no sucesso. Quando as forças direcionamse ao conflito, cria-se uma situação em que cada movimento agrava a negociação. A sabedoria está em perceber como as forças existentes estão-se comportando, para transformar os círculos viciosos em virtuosos. 33 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Forças propulsoras da boa vontade e entendimento: ◆ Impulso a pertencer, a cooperar. ◆ Busca de influência, participação do outro. ◆ Ação cooperativa. Forças negativas, que refreiam a boa vontade e entendimento: ◆ Desconfiança, impulso a dissociar-se, a competir. ◆ Busca de vantagem única. ◆ Ação competitiva. Esses movimentos podem ser causados ou estimulados pela situação, pela negociação em si, pelos negociadores. Compete a eles perceberem os fluxos negativos ou positivos, suas procedências e causas, para criar o campo certo para o sucesso na negociação. Campo de Força da Negociação Cada movimento positivo agrega força Uma atitude positiva, um gesto de confiança ou boa vontade, uma recepção simpática – essas forças criam sinergismo e facilitam o processo de negociação. Cada movimento negativo provoca afastamento Atitudes negativas, gestos truculentos, desconfiança – forças negativas que afastam e dificultam a negociação. 34 Homero S. Amato III PERFIS, ESTILOS E TIPOS DE NEGOCIADORES 1 – Perfil de competência para negociação 2 – Estilo de negociadores 3 – Tipos de negociação e comportamentos 4 – Atitudes básicas do negociador 5 – Características de um bom negociador Vamos imaginar três situações bastante corriqueiras da vida: O médico acha que seu paciente deve ser operado com urgência. Entretanto, o paciente não deseja submeter-se à operação antes de concluir algumas tarefas importantes. Para concluí-las vai levar alguns meses, o que contraria sobremaneira os planos do médico. Quando vão negociar a data da operação, o paciente acaba convencendo o médico a esperar mais um pouco. Um outro médico, em igual circunstância, acaba chegando a resultados bem diferentes. Diante da argumentação do paciente, ele “endurece”, dá um sermão no paciente, e acaba convencendo-o a operar-se com urgência. ! O profissional X é muito qualificado tecnicamente e dirige uma área de importância vital para a empresa. No entanto, sua área vive sofrendo de carência crônica de recursos. O pessoal com quem trabalha solicita equipamentos, publicações, verbas para participação em cursos, e até mesmo móveis e utensílios fundamentais, mas há muitas respostas negativas. Por outro lado, o diretor de recursos humanos da mesma empresa “nada” em dinheiro. Seu pessoal encontra sempre recursos extras para fazer o que deve ser feito. ! 35 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens A nova diretora da escola é do tipo que põe seus objetivos em destaque e os busca com firmeza. Assim que assumiu, comprou inúmeras brigas, porque queria mudar, mudar e mudar. Seus objetivos são indiscutíveis – quer o melhor para a escola. Todavia, ela “bateu de frente” com muitas pessoas, criou muitas discussões. Acontece que errou na avaliação da punição de um aluno e o fato acabou tomando dimensão pública, com forte cobertura da mídia. Neste momento, muitas pessoas de importância no contexto da escola posicionaram-se de modo disfarçado e sutil, contra sua decisão. ◆ No primeiro, o médico é complacente, com uma tendência a procurar ser “bonzinho” e acaba sendo até mesmo quando não deve ser. O segundo médico, pelo contrário, procura primariamente ser eficiente, ainda que para isso precise ser durão. É melhor para o paciente. ◆ No segundo caso, o profissional não é persuasivo o suficiente para mostrar a importância de sua área e para canalizar os recursos que ela merece. Sua incapacidade de defesa contrasta com a capacidade oposta do diretor de recursos humanos, que consegue muito mais recursos. A empresa sai perdendo. ◆ A nova diretora, com seu perfil agressivo, atingiu os objetivos, mas plantou inimizades ou desaprovações que acabaram expressando-se justamente num momento crítico. Por que uns atingem os objetivos, outros não? Por que uns conquistam aliados para sempre, outros não? Por que uns conseguem fazer mais por si mesmos e pelos seus liderados, outros não? Todos negociaram, de um jeito ou de outro, mas alguns foram mais capazes em suas negociações. Como já observamos no capítulo anterior, o negociador é o ponto mais importante para o sucesso na negociação. Estilo – Comportamento que a pessoa adota para negociar. Pode ser que opte por negociações bem planejadas ou pode ser que não dê muita atenção a isso. Pode ser que enfatize a persuasão, ou a informação. Pode ser agressivo, pode ser suave. O negociador nem sempre reconhece ou percebe o próprio estilo – parte dos traços desse estilo é consciente e parte inconsciente. Tipo – Característica comportamental da pessoa, resultado do seu perfil. Há pessoas tímidas, pessoas falantes, pessoas alegres, pessoas lacônicas etc. O tipo manifesta-se em todas as circunstâncias da vida – e também na negociação. É diferente do estilo, que são comportamentos adotados para negociar. Tipo e estilo se inter-relacionam, naturalmente. 36 Homero S. Amato Perfil de competência para negociação Que tipo de pessoa é o negociador? O que pensa da vida? O que pensa dos outros? O que pensa de si mesmo? A resposta dessas questões reflete manifestações do perfil. Como já observamos, o perfil incorpora características que, se manifestadas, afetarão a negociação. O quadro a seguir mostra uma visão geral do perfil. Ele não esgota a questão, e nem há a preocupação de que seja completo. O importante é compreendermos algumas coisas fundamentais sobre o perfil: 1. As pessoas trazem para a negociação aquilo que elas são. Todas têm características que poderão manifestar-se na negociação, afetando-a negativa ou positivamente. 2. Parte das características que as pessoas trazem em seu perfil é inata e outra é adquirida, isto é, aprendida. Aplica-se neste caso um princípio educacional de Jean Piaget que diz que as características aprendidas tendem a ter maior peso à medida que a idade avança. Isto é, o aprendizado tem peso cada vez maior sobre o desempenho do indivíduo. 3. As características de perfil para a negociação podem e devem ser melhoradas. Isso requer não só o aprendizado conceitual, mas também o aprendizado emocional. 4. O indivíduo melhora seu perfil por meio do estudo e da prática. Estudo e prática têm de andar juntos para um desenvolvimento real na capacidade de negociar. 37 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Perfil de Sucesso Eis algumas características que tendem a levar ao sucesso nas negociações: Quadro emocional - Predominância de emoções agregadoras – amor, alegria, amizade, confiança. - Controle e domínio das emoções. - Presença de emoções que levam à afirmação – coragem, autoconfiança. Quadro intelectual - Conhecimentos adequados – do objeto da negociação, de si mesmo, dos parceiros. - Nível de informação – sobre necessidades, histórico, mercado etc. - Capacidade de análise, raciocínio, criação de alternativas. Características educacionais - Nível de escolaridade. - Grau de preparo para a atividade. Características sociais - Nível de poder. - Status e apoios sociais. - Cargo e função. Características físicas - Aparência. - Nível de disposição e energia. 38 Homero S. Amato Estilo de negociadores O estilo é o comportamento concreto que o indivíduo adota regularmente ao negociar. Parte vem com a própria personalidade, é característica da pessoa e só muda lentamente e mediante forte motivação ou impacto. Parte é mais superficial e aprendida. O estilo inclui: ◆ Forma típica de comunicar e argumentar. ◆ Grau de atenção com recursos, métodos, instrumentos. ◆ Estratégias e táticas de negociação típicas. ◆ Maneira de reagir a estímulos dados pela outra parte. Podemos fazer algumas considerações sobre estilo: 1. Não há um estilo bom para todas as situações. Pessoas com estilos únicos têm de procurar atingir maior flexibilidade. O ideal é adaptar o estilo à situação e aos oponentes na negociação. 2. Um estilo de negociação metódico, voltado para o planejamento, meticuloso com informações é sempre mais eficaz que o estilo desatento e improvisador. Também nessa área de negociação, fazer a lição-de-casa com zelo produz melhores resultados. 3. Aprimorar a capacidade de falar com clareza, e argumentar, de apresentar bem as idéias, de usar recursos (audiovisuais, por exemplo) permite uma significativa melhoria de resultados. 4. Não há uma estratégia certa e nem um conjunto de táticas capaz de adequar-se eficientemente a todas as negociações. É melhor refletir bem sobre isso antes de entrar no processo de negociação. 5. É fundamental conhecer seu próprio estilo e procurar aprimorá-lo. Igualmente é fundamental conhecer bem o estilo dos outros e definir qual é a melhor maneira de lidar com ele. 6. Por fim, quanto à maneira de reagir, um estilo racional será sempre melhor. As emoções podem e até devem ser expressas de modo certo e na hora certa. Reações emocionais de temperamento são desastrosas à negociação. 39 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Cooperativo ou competitivo? Há uma diferenciação em estilo que merece ser considerada com atenção: o estilo colaborador/amigável ou competitivo/radical. O estilo colaborativo é caracterizado pela atenção aos objetivos e interesses da outra parte e pelo esforço para que isso se satisfaça. Pode variar do complacente, isto é, aquele que esquece os próprios objetivos em detrimento da vantagem de outrem, até o colaborativo-assertivo, que é aquele que considera e valoriza os objetivos e interesses dos outros, mas procura igualmente maximizar a realização dos seus próprios. Este último usualmente é o estilo mais bem-sucedido na maioria das negociações. O estilo competitivo/radical, por seu lado, é o do indivíduo que coloca seus pontos de vista em destaque e menospreza os interesses e objetivos dos outros. Caracterizado usualmente pela agressividade, procura ganhar a qualquer custo. Em geral quer ganhar à custa dos outros. Enquanto os outros não se dão conta de sua conduta centrada nos próprios objetivos, tudo vai muito bem, mas, tão logo seja percebido esse lado egoísta, o competitivo pode preparar-se para enfrentar resistência. Pode até ganhar, se estiver em superioridade de poder, mas acumulará pontos negativos para futuros relacionamentos. 40 Ser cooperativo é o objetivo, mas... Nem sempre a vida é como gostaríamos que fosse. O negociador cooperativo às vezes se defronta com interlocutores hostis e pouco dispostos a ser amistosos. O que fazer? Ser o mais cooperativo possível, dentro do quadro que se apresenta. Mas, não abdicar da prerrogativa de usar o poder e a estratégia. ! Por outro lado, haverá aquela negociação em que estaremos interagindo com interlocutores amigos. O que fazer? Usar da boa vontade criada pela amizade para buscar vantagens? Isso costuma vir naturalmente, mas é necessário tomar cuidado para não usar da amizade inadequadamente, pois podemos até conseguir resultados se apelarmos emocionalmente para ela, mas não criaremos acordos que terão desdobramentos sustentáveis. ! O correto é: independente da amizade ou da hostilidade, agir baseado em valores, buscando o melhor para as partes. Homero S. Amato Tipos de negociações e comportamentos Negociação amistosa Negociação agressiva Interlocutores partilham Os interlocutores vêemsentimentos de amizade. se como rivais. O acordo é o objetivo e para atingi-lo as partes têm boa vontade para fazer concessões. Negociação orientada por valores Qualquer que seja a situação, o negociador busca a melhor alternativa, não se deixando influenciar pela atitude dos interlocutores. O objetivo é a vitória ou O objetivo é o melhor resultado pelo menos o pacto. possível. Marcada pelas comunica- Marcada por comunicações afetivas e cordiais. ções agressivas, formais ou até mesmo hostis. Marcada por comunicações objetivas e diplomáticas. Há confiança mútua. Há desconfiança. Independente da visão da outra parte, busca-se o melhor resultado. Há franqueza e transparência. Cada parte tenta esconder o jogo. Busca-se a transparência. Todos os esforços são Os esforços são feitos feitos para evitar qualquer para levar vantagem no ruptura ou confronto. confronto. Os esforços são feitos para chegar ao acordo mais justo. A pressão ou apelo emocional de uma parte usualmente leva a outra a ceder. As concessões decorrem do sentido de eqüidade e justiça e não da admiração ou amizade pela outra parte. Cada parte faz todo o esforço para não ceder nada e pode rebater as pressões com ameaças e chantagem, em casos extremos. 41 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Tipos na negociação Um indivíduo, por exemplo, cuja timidez impede que fale o que sente poderá ter dificuldade de obter bons acordos. Por outro lado, para o interlocutor é fundamental perceber essa timidez, para dar um jeito de fazer o outro expressar-se. Porque a não expressão até pode levar a um acordo satisfatório, mas ela poderá causar problemas futuros. Ganhar, levar vantagem à custa de uma fraqueza do outro nunca vale a pena. Vejamos algumas manifestações de tipos e o que se pode esperar deles na negociação. Tipo e características Se for você Se for o outro Falante carente Há aquele que é um mero tagarela, que tem vontade de expressar-se, o que usualmente reflete carência emocional. Desvia o assunto, quer falar mais que ouvir. Controle emocional é fun- Satisfaça sua carência emocional, mas controle o damental tempo e o assunto, para evitar desvios e mal-entendidos. Falante objetivo É o falante direcionado, que tem fluência verbal e sabe o que quer. Esse usualmente é persuasivo. Confunde e desvia o assunto de questões importantes. 42 Cuidado com seu próprio poder de persuasão, para não usá-lo egoisticamente. Persuasão é qualidade, mas use-a bem. Cuidado com o poder de persuasão dele. Mantenhao no assunto. Mantenha-se atento e analítico. Homero S. Amato Tipo e características Se for você Se for o outro Faça um programa de combate à timidez. Curso de oratória ajuda. Planeje bem a negociação, para evitar que sua timidez atrapalhe. Pergunte, deixe-o à vontade, procure tranqüilizá-lo. Cuidado com a aparência e com o excesso de reserva. Muitas vezes os outros poderão não entendê-lo e poderão interpretar erroneamente seu silêncio. Seja objetivo também, mostre lacunas de compreensão que você tenha, pergunte, provoque respostas. É bom suavizar-se. De onde vem essa dureza? Cuidado com o egoísmo, que leva a realizações de curto prazo à custa de duradouros relacionamentos. Você é obrigado a defender-se com plena assertividade. Mostre ao outro sua dureza, repita os objetivos, fale do propósito de obter o melhor para todos. A visão de que os outros não merecem confiança é uma fonte de problemas. É bom rever isso. Se você teve experiências negativas no passado, não deixe que elas afetem seu futuro. Mostre que você é confiável. Faça o esforço necessário para ganhar a confiança do durão. Mostre seu próprio lado humano. Calado tímido Tem dificuldade de expressar seus sentimentos e opiniões. Precisa de aprovação dos outros. Ao esconder o que quer, muitas vezes atrapalha a negociação. Calado seguro Usualmente é frio e pouco entusiasmado com a argumentação dos outros. Normalmente mantém-se calado porque já percebeu que o importante não é necessariamente falar muito, mas falar a coisa certa. Por esconder seu potencial, pode surpreender na argumentação. Durão egoísta Agressivo, franco, voltado para os próprios objetivos. Pouco sensível, se tiver o poder não hesitará em usá-lo com firmeza para atingir seus objetivos, ainda que à custa dos interlocutores. Durão defensivo O indivíduo é agressivo, franco e ríspido, mas isso é defesa. Usualmente são pessoas que já passaram por experiências negativas e acabaram por criar uma couraça protetora. Diante de argumentação objetiva, acabam por reconhecer as necessidades e interesses dos outros. À medida que sentirem maior confiança, poderão liberar seu lado mais humano e sensível. 43 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Tipo e características Se for você Se for o outro Bonzinho complacente Carente, quer garantir aprovação e estima dos outros, e por isso cede o que não deveria. Abre mão de objetivos e interesses próprios para manter a relação. Aprenda a dizer “não” sem medo de perder a estima dos outros. Conscientize-se de que você tem tanto direito quanto os outros. Faça esforço para que o “bonzinho” expresse suas vontades e objetivos. Saiba que a falta de expressão da parte dele poderá atrapalhar as coisas. Bom modo de ser, costuma levar a boas negociações. Cuide da aparência de bonzinho, para não ser confundido com o bonzinho com- Reforce o modo de ser dele, mostre agrado pela forma como ele se comporta. Bonzinho assertivo Sensível e humano, capaz de perceber, aceitar e buscar os interesses e objetivos dos outros, sabe o que quer, conhece, aceita e respeita os próprios objetivos e interesses também. Mantém-se educado, afável, propenso a colaborar. Reflexão Todos temos características diversas. Umas predominam em algumas pessoas, mas, no geral, ninguém forma o tipo perfeito. ! Em que tipo acima você se reconhece? ! O que isso significa em relação à realização de seus objetivos? 44 Homero S. Amato Atitudes básicas do negociador Atitudes fazem parte do perfil do negociador. Mas, vale a pena estudá-las separadamente, por ter peso significativo na negociação. Elas têm a ver com as emoções do indivíduo, mas também com sua informação, seus conhecimentos. E elas afetam seu comportamento imediatamente. Atitude Predisposição mental a reagir “automaticamente” de certo modo padronizado em face de determinado objeto, pessoa, situação. São positivas ou negativas. Exemplos: – A pessoa tem atitude negativa em relação ao poder. Todas as vezes em que se relaciona com outras que têm poder reaje com hostilidade ou rebeldia. – A pessoa tem atitude positiva diante de indivíduos de nacionalidade japonesa. Reaje favoravelmente à presença de japoneses, tende a ser cooperativa com eles. Para efeito de estudo da negociação vale a pena mencionar dois estudos relativos a atitudes. 45 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Análise transacional e as posições existenciais O psiquiatra canadense Eric Berne criou, em 1958, um método psicológico bastante útil para a compreensão do “funcionamento” da mente e para melhoria individual. Esse método caracteriza-se por uma linguagem simples, compreensível, marcada por metáforas úteis e práticas. Facilita o entendimento de aspectos às vezes complicados da mente. Trata-se da Análise Transacional, que tem alguns conceitos muito práticos que ajudam não só o indivíduo a conhecer-se mais e a conhecer melhor os outros, mas também a interagir melhor com eles. Um desses conceitos fundamentais é o de posição existencial. Para Berne, as pessoas posicionam-se em quatro padrões (posições existenciais) diferentes. Essas posições existenciais, que na verdade representam atitudes em relação à vida e aos outros, são as seguintes: Eu estou ok, você está ok – O indivíduo tem auto-estima, aceita-se, valoriza-se, e na mesma proporção estima os outros, aceita-os, valoriza-os. É a posição de um indivíduo saudável, seguro, equilibrado, eqüânime e justo. Com uma atitude desse tipo perante os outros e a vida, a tendência é que a pessoa crie laços fortes e espontâneos, que trarão benefícios de longo alcance. Essa atitude positiva não impede de o indivíduo perceber eventual maldade, inadequação, malícia no comportamento alheio. O indivíduo tem atitudes positivas – mas não por ser um iludido. 46 Quando minhas atitudes são positivas em relação a mim mesmo e aos outros, há uma tendência a um bom desempenho na negociação. Homero S. Amato Eu estou ok, você não está ok – Neste caso, o indivíduo tem forte auto-estima, valoriza-se, mas não considera devidamente ou valoriza os outros. Usualmente é a posição do arrogante. Ao subestimar os sentimentos, interesses, capacidade dos outros a pessoa adota posturas auto-suficientes, egoístas ou ingênuas. Ao desprezar os outros, provoca neles sentimentos negativos de mágoa, decepção, ira, frustração. Com essa posição existencial, o indivíduo não cria goodwill na negociação, e adota comportamentos, estratégias e táticas inadequados. Quando minhas atitudes são favoráveis em relação a mim mesmo e desfavoráveis em relação aos outros, tenderei a ter problemas, buscando objetivos egoísticos ou agindo de modo inadequado. Você está ok, eu não estou ok – O indivíduo considera de algum modo os outros superiores. Posiciona-se como menos capaz, menos merecedor, menos legítimo em uma dada situação. Vendose como inferior, tende a querer a agradar os outros, ou superestima seu potencial, o que leva a comportamentos inapropriados. Quando minhas atitudes são favoráveis em relação aos outros e desfavoráveis em relação a mim mesmo, tenderei a subestimar-me e negligenciar na busca de meus objetivos. Eu não estou ok, você não está ok – O indivíduo não se valoriza, não tem auto-estima, e nem valoriza os demais. É a atitude que leva ao ceticismo e à indiferença. Não se acha merecedor e nem considera que os outros o sejam, ou não avalia na devida dimensão seu potencial ou o dos outros. Com isso, na negociação, tende a comportar-se de modo inapropriado, a adotar estratégias e táticas igualmente inadequadas. Freqüentemente resvala para o desleixo e a desatenção. Quando minhas atitudes são desfavoráveis tanto em relação a mim mesmo quanto em relação aos outros, tenderei a ser cético e inconseqüente, com péssimos resultados sobre a negociação. Não é preciso dizer que a posição “Eu estou ok, você está ok” é a mais adequada para um negociador. Portanto, antes de iniciar a negociação, é bom que a pessoa reveja como se vê e como vê os outros para aquela negociação em particular. 47 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens Algumas recomendações: Veja você mesmo e os outros de modo adequado * Se você se acha despreparado para a negociação ou se acha bom demais perante os interlocutores, repense essa questão e posicione-se de modo mais eficiente. * Se você vê os outros de modo inadequado – você os superestima ou os subestima, de algum modo – repense isso. * Se você não acredita na proposta que vai fazer, mude a proposta ou mude sua mente. * Certifique-se de que ao entrar na negociação estará gostando de si mesmo e dos outros, com atitudes positivas, com bom astral. Atitude Ganha-Ganha No primeiro capítulo já falamos dos resultados possíveis de uma negociação, que podem ser Perde-Perde, Ganha-Perde e Ganha-Ganha. O resultado Ganha-Ganha, em condições normais, é o único capaz de criar relações duradouras e produtivas. É evidente que há as exceções e que eventualmente o resultado Ganha-Perde ou até mesmo o Perde-Perde acaba sendo mais eficiente. Mas, Ganha-Ganha traz satisfação imediata e é uma espécie de plantio em prol das boas relações. A pergunta é: O que o indivíduo visa quando entra na negociação? Stephen R. Covey, professor e pesquisador, estudou 200 anos de história da literatura de auto-ajuda nos EUA e escreveu o livro Os 7 Hábitos das Pessoas Muito Eficazes. Munido da autoridade que seus estudos lhe conferem, ele observa que pessoas com uma visão positiva de si mesmas, do mundo e dos outros, têm mais poder de realização. Há um modo de ver o mundo muito pernicioso, isto é, vê-lo como um ambiente de escassez no qual para realizar os próprios objetivos a pessoa tem de impedir que os outros realizem os seus. Essa visão do mundo leva o indivíduo a buscar resultados Ganha-Perde na negociação. Por outro lado, se a pessoa parte do pressuposto da abundância, de que o mundo oferece condições para todos, a pessoa já entra propensa a buscar o Ganha-Ganha e essa sua atitude é um poderoso facilitador das relações. Dicas para o negociador: ◆ Veja o mundo como um ambiente de oportunidades para todos. ◆ Entre na negociação com uma genuína atitude Ganha-Ganha, buscando maximizar a sua vantagem e também a do outro. ◆ Às vezes, as oportunidades que a vida oferece para a realização das necessidades de todas as partes não se revelam imediatamente e é necessário usar da criatividade e da confiança para buscá-las. ◆ Controle o medo de perder, que resulta em agressividade que acaba atrapalhando as negociações. 48 Homero S. Amato Postura Ganha-Ganha - Conquista a confiança. - É uma maneira simpática e agradável de negociar. Quando todos ganham, a negociação cria laços que trarão benefícios futuros. - Leva à discussão de interesses comuns. - Cria um clima adequado nas conversações. - Permite a troca de experiências. - Elimina a necessidade de justificar o “não” - Cria boa vontade. - Cria relações duradouras e produtivas. Características de um bom negociador O que é um bom negociador? Já falamos do perfil, do comportamento, de atitudes, mas tudo isso não esgota a questão. Em decorrência da prática e da observação de negociadores de sucesso ao longo de muitos anos de carreira, fizemos uma lista de 40 itens usualmente presentes nos bons negociadores. O leitor pode usar essa lista como um referencial de auto-avaliação ou de avaliação de outros – subordinados, colegas, candidatos a empregos etc. Use a lista a seguir como um instrumento de autodiagnóstico e indicador de melhorias a serem obtidas. Eis as características dos bons negociadores: 1. Habilidade de preparação e planejamento No mundo moderno, o profissionalismo predomina em todas as áreas. Pessoas que não fazem a “lição de casa” têm menos probabilidade de sucesso, quando interagindo com outras que a fazem, com atenção e zelo. Planejar – decidir antes o que fazer, por que e como, e preparar – buscar os recursos, organizar etc., são imprescindíveis para negociações efetivamente profissionais. “Se um homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável.” SÊNECA 49 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens 2. Capacidade de persuadir outros Algumas pessoas falam as coisas certas, nas horas certas, do jeito certo. Falam para a mente e, principalmente, o coração de seus interlocutores. Com isso, “vendem” melhor suas idéias, projetos e propostas. Essa capacidade de persuadir pode e deve ser buscada pelo negociador que deseja ir mais longe em seus objetivos. Falar a coisa certa, de modo certo, na hora certa. Controlar a fala é fundamental. 3. Paciência Negociações simples e pouco importantes poderão ter desfecho rápido. Mas, na maioria das vezes, as negociações terão alguma importância e não serão tão simples assim. Daí surgem as dificuldades, que têm de ser contornadas com exaustiva busca de alternativas. Paciência tornase fundamental. Algumas negociações poderão envolver longas horas de reuniões, muitas idas e vindas. Paciência vale ouro, nesse caso. 4. Habilidade de perceber e explorar o poder para atingir objetivos “Um homem pode o que sabe.” Carlyle 5. Persistência e determinação Os que não têm persistência e determinação abandonam a arena antes do desfecho da negociação – e perdem enormes oportunidades por isso. 50 Há mais pessoas que desistem do que pessoas que fracassam”, disse Ford. Homero S. Amato 6. Conhecimento do assunto sendo negociado O conhecimento é uma fonte de poder. Pessoas que sabem são mais respeitáveis e entendem melhor o que se passa. Quando o negociador conhece bem o assunto objeto da negociação, terá mais “cartucho” para apresentar seus argumentos, mais credibilidade, além de conseguir apresentar as melhores soluções para as partes. 7. Capacidade de saber ouvir Ouvir e escutar são coisas diferentes. Muitos escutam sem dar atenção. Ouvir com sabedoria é efetivamente abandonar os próprios raciocínios para, primeiro, captar com clareza e entender bem os dos outros. Depois, se dá uma resposta adequada – a resposta de quem ouviu. Ouvir é o começo. Ouvir sem preconceitos, sem julgamento, sem interpretações apressadas, na fase inicial, é o segredo. 8. Mente aberta (tolerância com os pontos de vista de outros) Não precisamos concordar imediatamente com os outros, mas, temos de, no mínimo, abrir a mente para reconhecer seus pontos de vista e respeitá-los. Quando respeitamos os pontos de vista do parceiro, a negociação tende a manter-se. Mesmo que não se chegue a um acordo imediato, as bases ficam estabelecidas para o futuro. Os outros em princípio não são nem melhores, nem piores, mas são diferentes. 9. Temperamento de comprometimento Há negociadores que efetivamente querem resolver, buscar a melhor alternativa para todos, isto é, são comprometidos. Esse comprometimento fica imediatamente perceptível, cria boa vontade, abre os canais de cooperação. 51 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens 10. Habilidade de pensar claramente e rapidamente sob pressão Quando a pressão aumenta, mais a tranqüilidade torna-se necessária. É fundamental treinar a capacidade para manter a cabeça isenta do que se passa fora. Nas horas em que a pressão aumenta e as emoções afloram, vale a pena contar até 100 e manter a mente serena. 11. Integridade A desonestidade não compensa. Pode eventualmente trazer alguns benefícios de curto prazo, durante algum tempo. Mas não se pode enganar a todos o tempo todo. A integridade cria acordos para a vida. Dá base para bons negócios hoje e amanhã. 12. Transmitir confiança Se o interlocutor não é confiável, o oponente vai armar-se; questionar cada questão, querer clareza exagerada mesmo em itens pouco relevantes, parar o processo para refletir e investigar se não há alguma armadilha oculta. Isto é, trava-se o processo. Confiança é fundamental em qualquer negociação e ela é resultado de um comportamento confiável, seja nos atos, seja nas palavras. O bom negociador zela pelo seu nome e pelo seu comportamento. 13. Desejo de colocar a mente, corpo, em entender o que está sendo explorado/negociado Envolver-se, não apenas com palavras, com comportamentos, mas também com as emoções 52 “A única coisa pior que a má saúde é a má fama.” GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ Homero S. Amato e o raciocínio – é imprescindível. Esse envolvimento integral com o entendimento do objeto da negociação cria as melhores soluções. O que é efetivamente envolver-se? O real envolvimento implica paciência, persistência, vontade de ajudar. 14. Capacidade de liderança e controle Por meio da liderança, o bom negociador consegue que os outros tenham um compromisso com os objetivos de se chegar ao melhor para todos. “A liderança visionária e não a capacidade administrativa será o modelo mais valioso para o executivo de amanhã.” LESTER KORN 15. Experiência prévia em outras negociações O conhecimento teórico dá a base, ajuda e será sempre essencial para um aprimoramento, mas não é suficiente. A prática é fundamental. Praticar, aprender com a experiência é um caminho de autodesenvolvimento que pode e deve ser programado. Ninguém aprende a andar de bicicleta apenas lendo o livro. 16. Senso pessoal de segurança Antes de entrar na sala de negociações é bom que o negociador já esteja convencido da validade de suas propostas, projetos e idéias. Essa firmeza e segurança no que diz e propõe cria confiabilidade e produz reações de entusiasmo e aceitação por parte dos outros. “Existe uma única bênção, a fonte e a pedra angular da beatitude – a confiança em si mesmo.” S ÊNECA “Os que recomendam aos príncipes uma constante desconfiança, a pretexto da necessidade de segurança, pregam-lhes a ruína e a desonra, pois nada de nobre se faz sem riscos.” MONTAIGNE 53 COMO NEGOCIAR - Técnicas, estratégias e táticas para negociar melhor e obter vantagens 17. Habilidade de expressar pensamentos verbalmente O treino da fluência verbal é importante para quem deseja ser um bom negociador. Esse treino torna o indivíduo mais e mais capaz. 18. Capacidade de decisão Hesitar é deixar os interlocutores confusos e inseguros. Decidir, propor, mostrar firmeza é liderar. O bom negociador procura conhecer bem seus papéis, seus objetivos, o que os seus representados desejam dele – e toma a iniciativa, decide. “O desejo de segurança coloca-se contra toda e qualquer empresa grande e nobre.” T ÁCITO 19. Capacidade de enfrentar riscos Riscos são inerentes a qualquer negociação. Não podemos evitá-los. 20. Habilidade de entender e de ser compreendido por todos Cada pessoa tem seu jeito de se expressar, suas preferências em termos de idéias, formas de raciocínio etc. Alguns negociadores são por demais fechados em seus próprios esquemas intelectuais e têm dificuldade tanto para compreender os outros quanto para se fazerem compreender. 21. Capacidade de ganhar respeito e confiança do interlocutor Seja por meio das palavras, seja por meio dos gestos e comportamentos, o bom negociador visa adquirir e preservar sua credibilidade, sua reputação. Ela vale ouro. 54 Primeiro compreender, para depois ser compreendido, como ensina Stephen R. Covey. Homero S. Amato 22. Espírito de competitividade O ideal do bom negociador é a cooperação, mas ele sabe competir se necessário e o faz de modo limpo e pelas causas justas “Uma coisa que você aprende em corridas é que os outros nunca esperam por você.” ROGER PENSKE 23. Habilidade em organização e coordenação de atividades Sem a organização adequada todo planejamento torna-se inútil. É preciso organizar os eventos, os recursos, os meios, coordenar as pessoas, para que a negociação faça-se do modo mais eficiente. 24. Capacidade analítica e de resolver problemas Manter a mente clara é um ponto importante. Ela precisa ser “treinada” pelo estudo e análise de problemas, pela discussão, pelo aprendizado do raciocínio. “Rir, antes da hora, engasga.” JOÃO GUIMARÃES ROSA 25. Autocontrole, especialmente de emoções Inteligência emocional, controle das emoções, com direcionamento para aquelas que produzem o agregamento e a cooperação. Abandono ou controle da expressão de emoções como ira ou frustração. O bom negociador mantém-se no comando da própria mente. 26. Capacidade de percepção e análise dos sentimentos Os sentimentos contam muito. É preciso percebêlos, entendê-los, agir de modo a que nos sejam favoráveis. Há comportamentos que despertam sentimentos bons, como a simpatia, a vontade de ajudar etc. 55