RECURSO ESPECIAL Nº 1.264.358 - SC (2011/0157502-1) RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL RECORRENTE : PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A ADVOGADA : TÂNIA REGINA PEREIRA E OUTRO(S) RECORRIDO : OS MESMOS EMENTA TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. ART. 186 DO CTN. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211/STJ. EXECUÇÃO FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR. IMPENHORABILIDADE. ART. 649, INCISO IV, DO CPC. RELATIVIZAÇÃO. VERBA ARBITRADA EM ELEVADA MONTA. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE PARCELA DO VALOR TOTAL. DIREITO DO CREDOR. 1. A alegação genérica de violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF. 2. Descumprido o indispensável exame dos dispositivos de lei invocados pelo acórdão recorrido, apto a viabilizar a pretensão recursal da recorrente, a despeito da oposição dos embargos de declaração. Incidência da Súmula 211/STJ. 3. Discute-se nos autos a possibilidade de penhora, mesmo que parcial, de verbas recebidas a título de honorários advocatícios. 4. Os honorários advocatícios, tanto os contratuais quanto os sucumbenciais, tem natureza alimentar e destinam-se ao sustento do advogado e de sua família, portanto são insuscetíveis de penhora (art. 649, IV do CPC). 5. Todavia, a regra disposta no art. 649, inciso IV, do CPC não pode ser interpretada de forma literal. Em determinadas circunstancias é possível a sua relativização, como ocorre nos casos em que os honorários advocatícios recebidos em montantes exorbitantes ultrapassam os valores que seriam considerados razoáveis para sustento próprio e de sua família. Nesses casos, a verba perde a sua natureza alimentar e a finalidade de sustento. 6. "Não viola a garantia assegurada ao titular de verba de natureza alimentar a afetação de parcela menor de montante maior, desde que o percentual afetado se mostre insuscetível de comprometer o sustento do favorecido e de sua família e que a afetação vise à satisfação de legítimo crédito de terceiro, representado por título executivo." (REsp 1356404/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 4/6/2013, DJe 23/8/2013) 7. No caso, o valor penhorado não compromete o sustento do advogado e de sua família. Ademais, o princípio da menor onerosidade do devedor, insculpido no art. 620 do CPC, tem de estar em equilíbrio com a satisfação do credor, sendo indevida sua aplicação de forma abstrata e presumida e, no presente caso, não há notícias de outros bens em nome do devedor passíveis de penhora. Recurso especial da FAZENDA NACIONAL não conhecido e recurso especial da PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A improvido. ACÓRDÃO "A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso da Fazenda Nacional; negou provimento ao recurso de Perdigão Agroindustrial S.A., nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques (Presidente) e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 25 de novembro de 2014(Data do Julgamento). MINISTRO HUMBERTO MARTINS Relator RECURSO ESPECIAL Nº 1.264.358 - SC (2011/0157502-1) RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL RECORRENTE : PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A ADVOGADA : TÂNIA REGINA PEREIRA E OUTRO(S) RECORRIDO : OS MESMOS RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator): Cuida-se de recursos especiais interposto por FAZENDA NACIONAL e PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que deu parcial provimento ao recurso de agravo regimental da segunda recorrente. A ementa do julgado guarda os seguintes termos (fl. 299, e-STJ): "AGRAVO LEGAL (ART. 557, §1º, DO CPC). AGRAVO DE INSTRUMENTO A QUE SE DEU PROVIMENTO. EXECUÇÃO/CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE GRANDE MONTA. NATUREZA ALIMENTAR AFASTADA. 1. Em linhas gerais, nos termos da orientação do egrégio Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e desta Corte, os honorários advocatícios têm natureza alimentar. 2. Hipótese em que os honorários advocatícios cuja retenção foi determinada pelo magistrado prolator da decisão guerreada, são de grande monta, o que afasta sua natureza alimentar. 3. Reforma parcial da deliberação monocrática do Relator que deu provimento ao agravo de instrumento. 4. Em razão do posicionamento que vem sendo adotado pelos Tribunais pátrios, excepcionalmente no caso dos autos é de se definir o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) por parcela, do montante dos honorários de sucumbência fixados na demanda principal, permitindo o levantamento, pelo beneficiário, em tais parâmetros, mantendo, no entanto, a penhora no rosto dos autos quanto ao demais." Rejeitados os embargos de declaração opostos (fls. 331/334, e-STJ). No recurso especial da FAZENDA NACIONAL, a recorrente alega, preliminarmente, ofensa ao art. 535, inciso II, do CPC, porquanto, apesar da oposição dos embargos de declaração, o Tribunal de origem não se pronunciou sobre pontos necessários ao deslinde da controvérsia. Aduz, no mérito, que o acórdão regional contrariou as disposições contidas no artigo 186 do CTN. Sustenta, em síntese, que "(...) não obstante a natureza alimentar dos honorários advocatícios, isso não lhes assegura o caráter de crédito preferencial em relação aos créditos não obstante a natureza alimentar dos honorários advocatícios, isso não lhes assegura o caráter de crédito preferencial em relação aos créditos" (fls. 344/345, e-STJ). No seu recurso especial, a PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A alega violação do art. 649, IV, do CPC, ao passo em que aponta divergência jurisprudencial com arestos desta Corte. Sustenta, em síntese, que "o art. 649, IV, do CPC assegura a impenhorabilidade absoluta dos honorários advocatícios, independentemente do valor a ser recebido. Portanto, nada justifica a manutenção da penhora, mesmo que parcial e, o acórdão recorrido contraria o citada artigo, pois permite que a penhora recaía sobre um bem impenhorável - honorários advocatícios que faz jus o profissional advogado nas causas que patrocinam no exercício da sua profissão" (fl. 312, e-STJ). Apresentadas as contrarrazões (fls. 351/357 e 359/362, e-STJ), sobreveio o juízo de admissibilidade positivo da instância de origem (fls. 363/364 e 365/366, e-STJ). É, no essencial, o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.264.358 - SC (2011/0157502-1) EMENTA TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. ART. 186 DO CTN. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211/STJ. EXECUÇÃO FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR. IMPENHORABILIDADE. ART. 649, INCISO IV, DO CPC. RELATIVIZAÇÃO. VERBA ARBITRADA EM ELEVADA MONTA. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE PARCELA DO VALOR TOTAL. DIREITO DO CREDOR. 1. A alegação genérica de violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF. 2. Descumprido o indispensável exame dos dispositivos de lei invocados pelo acórdão recorrido, apto a viabilizar a pretensão recursal da recorrente, a despeito da oposição dos embargos de declaração. Incidência da Súmula 211/STJ. 3. Discute-se nos autos a possibilidade de penhora, mesmo que parcial, de verbas recebidas a título de honorários advocatícios. 4. Os honorários advocatícios, tanto os contratuais quanto os sucumbenciais, tem natureza alimentar e destinam-se ao sustento do advogado e de sua família, portanto são insuscetíveis de penhora (art. 649, IV do CPC). 5. Todavia, a regra disposta no art. 649, inciso IV, do CPC não pode ser interpretada de forma literal. Em determinadas circunstancias é possível a sua relativização, como ocorre nos casos em que os honorários advocatícios recebidos em montantes exorbitantes ultrapassam os valores que seriam considerados razoáveis para sustento próprio e de sua família. Nesses casos, a verba perde a sua natureza alimentar e a finalidade de sustento. 6. "Não viola a garantia assegurada ao titular de verba de natureza alimentar a afetação de parcela menor de montante maior, desde que o percentual afetado se mostre insuscetível de comprometer o sustento do favorecido e de sua família e que a afetação vise à satisfação de legítimo crédito de terceiro, representado por título executivo." (REsp 1356404/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 4/6/2013, 7. No caso, o valor penhorado não compromete o sustento do advogado e de sua família. Ademais, o princípio da menor onerosidade do devedor, insculpido no art. 620 do CPC, tem de estar em equilíbrio com a satisfação do credor, sendo indevida sua aplicação de forma abstrata e presumida e, no presente caso, não há notícias de outros bens em nome do devedor passíveis de penhora. Recurso especial da FAZENDA NACIONAL não conhecido e recurso especial da PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A improvido. VOTO O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator): DO RECURSO ESPECIAL DA FAZENDA NACIONAL. Da alegação genérica de violação do art. 535 do CPC. Não prospera a alegada violação do art. 535 do Código de Processo Civil, por deficiência de fundamentação. Com efeito, a recorrente limitou-se a alegar, genericamente, ofensa ao referido dispositivo legal, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido. Assim, aplica-se ao caso, mutatis mutandis, o disposto na Súmula 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia". Nesse sentido: "PROCESSO CIVIL - VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC DESCABIMENTO - DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO SÚMULA 284/STF - ACORDO DE PARCELAMENTO - GARANTIA DO JUÍZO - ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO LOCAL (LEI ESTADUAL Nº 6.374/89) - IMPOSSIBILIDADE - SÚMULA 280/STF. PRECEDENTES. 1. É deficiente a fundamentação do recurso especial que aponta violação do art. 535, II, do CPC, sem especificar as teses sobre as quais o tribunal de origem teria sido omisso. Incidência da Súmula 284/STF. (...) 3. Recurso especial não conhecido." (REsp 1203051/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 7/5/2013, DJe 15/5/2013). "PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VALOR IRRISÓRIO. POSSIBILIDADE DE REVISÃO. NÃO-INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07/STJ. MAJORAÇÃO. 1. Alegações genéricas de violação do artigo 535 do CPC não são suficientes para viabilizar o conhecimento do recurso especial. É mister que sejam apontadas as omissões, contradições ou obscuridades consideradas como existentes no acórdão recorrido e as razões pelas quais a decisão não estaria devidamente fundamentada. Incidência da Súmula 284/STF. (...) 6. Recurso especial conhecido em parte e provido." (REsp 1349013/DF, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 2/5/2013, DJe 10/5/2013). Da ausência de prequestionamento. Da análise dos autos, observa-se, também, que a Corte de origem não analisou, ainda que implicitamente, o art. 186 do CTN. Logo, não foi cumprido o indispensável exame da questão pela decisão atacada, apto a viabilizar a pretensão recursal da recorrente, a despeito da oposição dos embargos de declaração. Assim, incide no caso o enunciado da Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça, verbis: "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo." Oportuno consignar que esta Corte não considera suficiente, para fins de prequestionamento, que a matéria tenha sido suscitada pelas partes, mas sim que a respeito tenha havido debate no acórdão recorrido. Esclareça-se, por fim, que não configura contradição afirmar a falta de prequestionamento e afastar indicação de afronta ao art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que é perfeitamente possível o julgado se encontrar devidamente fundamentado sem, no entanto, ter decidido a causa à luz dos preceitos jurídicos desejados pela postulante, pois a tal não está obrigado. Nesse sentido, os recentes julgados: "PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO A QUO DO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS NO QUAL O CONTRIBUINTE FICA ISENTO DA MULTA DE OFÍCIO NA FORMA DO § 2º DO ART. 63 DA LEI N. 9.430/96. PUBLICAÇÃO DA DECISÃO QUE REVOGA A LIMINAR PARA CONSIDERAR DEVIDO O TRIBUTO, INDEPENDENTEMENTE DA OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFICÁCIA IMEDIATA E EX TUNC DA REVOGAÇÃO DA LIMINAR. PRECEDENTE. 1. Primeiramente, cumpre afastar a alegada ofensa ao art. 535 do CPC, eis que o Tribunal de origem se manifestou de forma clara e fundamentada sobre as questões postas à sua apreciação, ainda que de forma contrária à pretensão da ora recorrente, não havendo que se falar em omissão. É cediço que o julgador não precisa enfrentar, um a um, os argumentos das partes, desde que a fundamentação do decisum seja suficiente para por fim à lide, tal qual ocorreu na hipótese em tela. Por outro lado, para que ocorra o prequestionamento de dispositivo de lei federal não é necessária a sua manifestação expressa no acórdão recorrido, desde que o tema nele inscrito tenha sido debatido no julgado. (...) 6. Recurso especial parcialmente provido para considerar devida a multa de ofício na hipótese." (REsp 1239589/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/4/2011, DJe 28/4/2011) "AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. REAJUSTE DE 28,86%. ARTIGOS 535 E 458 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. OMISSÃO E AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. LIMITAÇÃO. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.131/2000. 1. Decididas efetiva e inequivocamente as questões suscitadas, não há falar em violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, à ausência de omissão, contradição ou obscuridade a ser suprida ou dirimida, eis que os embargos de declaração não se destinam ao prequestionamento explícito. (...) 4. Agravo regimental improvido." (AgRg no Ag 1364663/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/4/2011, DJe 26/4/2011) "PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. Não se conhece de Recurso Especial quanto a matéria não especificamente enfrentada pelo Tribunal de origem, dada a ausência de prequestionamento. Incidência, por analogia, da Súmula 282/STF. 3. Inexiste contradição em afastar a alegada violação do art. 535 do CPC e, ao mesmo tempo, não conhecer do mérito da demanda por ausência de prequestionamento, desde que o acórdão recorrido esteja adequadamente fundamentado. 4. Embargos de Declaração rejeitados." (EDcl no AgRg no Ag 1345585/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 7/4/2011, DJe 25/4/2011) Desse modo, não conheço do recurso. DO RECURSO ESPECIAL DA PERDIGÃO AGROINDUSTRIAL S/A. Discute-se nos autos a possibilidade de penhora, mesmo que parcial, de verbas recebidas a título de honorários advocatícios. Preliminarmente, faz-se necessário um breve resumo dos fatos. Trata-se na origem de execução fiscal movida pela Fazenda Nacional contra a Cervejaria Caçadorense Ltda. A ação foi redirecionada para um dos sócios, o advogado José Carlos Pereira, tendo a Fazenda Nacional requerido a penhora de bens do advogado, dentre eles créditos oriundos de precatórios emitidos para pagamento de verba honorária. A penhora foi efetivada no rosto dos autos. Da decisão que a deferiu foi interposto agravo de instrumento requerendo a sua desconstituição, com a alegação de impenhorabilidade dos honorários advocatícios, ante a sua natureza alimentar. O Tribunal de origem, ao analisar a matéria, reconheceu a impenhorabilidade da verba honorária, todavia manteve a penhora no rosto dos autos à exceção do valor de R$ 15.000,00 a ser disponibilizado ao advogado em cada parcela, valor este que considerou suficiente para sustento próprio e de sua família. É o que se extrai do seguinte trecho do acórdão recorrido (fls. 292/297, e-STJ): "Dos elementos que instruem o agravo de instrumento, verifico a presença. de informações no tocante à dívida que o beneficiário da verba honorária em questão possui junto ao Fisco, correspondendo, no ano de 2000, a mais de R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais). A questão central diz com a determinação de bloqueio das parcelas relativas aos honorários em questão, pois o montante deverá ser quitado parceladamente, nos seguintes valores até aqui definidos: 1ª parcela: R$ 248.341,96 (duzentos e quarenta e oito mil, trezentos e quarenta e um reais e noventa e seis centavos); 2ª parcela: R$ 292.272,14 (duzentos e noventa e dois mil, duzentos e setenta e dois reais e quatorze centavos); 3ª parcela: R$ 319.476,79 (trezentos e dezenove mil, quatrocentos e setenta,e seis reais e setenta e nove centavos); 4ª parcela: R$ 359. 118,72 (trezentos e cinqüenta e nove mil, cento e dezoito reais e setenta e dois centavos); 5ª parcela: R$ 395.139,18 (trezentos e noventa e cinco mil, e cento e trinta e nove reais e dezoito centavos); 6ª parcela: R$.431.155,65 (quatrocentos e trinta e um mil, cento e cinqüenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos); 7ª parcela: R$, 461.416,30 (quatrocentos e sessenta e três mil, quatrocentos e dezesseis reais e trinta centavos); Depreende-se do montante tratado, então, afastar-se da, caracterização de verba de caráter alimentar, pois os altos valores superam a razoabilidade para tanto, pois a caracterização importa em necessidade do valor para fins de sustento próprio do advogado e de sua família, sendo que, no caso telado, refoge sobremaneira aos valores que, no contexto atual, poderia ser tido como razoável à manutenção familiar. Desta forma, cumpre-me delinear os contornos de um valor razoável, passível de liberação ao advogado beneficiário da verba ora em discussão, pois subjetiva a questão, exigindo traçar tais parâmetros à observância da jurisprudência pertinente à matéria, no tocante, especificamente, aos limites nos quais vem sendo fixada a verba honorária. (...) Refriso a aplicação por analógica dos precedentes colacionados, a fim de obter um parâmetro razoável e não prejudicar nenhuma das partes, pois, in casu, não se discute mais a respeito do valor dos honorários que foram fixados, mas permito-me utilizar os julgados em questão como parâmetro para fins de não extrapolar a esfera alimentar, ou seja, considero razoável a liberação de um valor compatível com aquele considerado como limite máximo de fixação para honorários de sucumbência, de forma que, haja vista o fracionamento da verba devida em 10 parcelas, nada mais justo do que permitir o levantamento, pelo causídico, de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) em cada uma, mantendo-se a retenção do restante. Desta forma, a decisão que foi objeto do agravo de instrumento merece tão-somente reforma parcial, devendo ser mantida a penhora no rosto dos autos à exceção do valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a ser disponibilizado ao advogado beneficiário relativamente a cada parcela do montante devido, tendo em vista não haver notícia a respeito da existência de outros bens passíveis de penhora, ao contrário, conforme consta na petição cuja cópia foi juntada nas fls. 130/131 destes autos, o único bem localizado foi um imóvel já arrematado em prol da Fazenda estadual, motivo pelo qual, a penhora no rosto dos autos de créditos correspondentes a honorários sucumbenciais foi a única maneira, encontrada para o adimplemento da dívida fiscal em comento, de forma que é de ser dado parcial provimento ao agravo das fls. 266/270, reformando em parte a decisão das fls. 262/264, e verso, e acolhido em parte o pedido da Fazenda Nacional para considerar descabida a entrega da totalidade dos honorários ao advogado beneficiário." Não merece reforma o acórdão recorrido. Os honorários advocatícios são, em síntese, a remuneração do advogado e em razão disso ostentam natureza alimentar. A fixação do natureza alimentar dos honorários advocatícios foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 470.407, Rel. Min. Marco Aurélio, em 9.5.2006, cuja ementa guarda o seguinte teor: "CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA - ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A definição contida no § 1-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - NATUREZA EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei nº 8.906/94, os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional nº 30, de 2000. Precedentes: Recurso Extraordinário nº 146.318-0/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 4 de abril de 1997, e Recurso Extraordinário nº 170.220-6/SP, Segunda Turma, por mim relatado, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de agosto de 1998." (RE 470407, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 09/05/2006, DJ 13-10-2006 PP-00051 EMENT VOL-02251-04 PP-00704 LEXSTF v. 28, n. 336, 2006, p. 253-264 RB v. 18, n. 517, 2006, p. 19-22) A Corte Especial do STJ também já se manifestou no mesmo sentido. A propósito: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FALÊNCIA. HABILITAÇÃO. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. ART. 24 DA LEI N. 8.906/1994. EQUIPARAÇÃO A CRÉDITO TRABALHISTA. 1. Para efeito do art. 543-C do Código de Processo Civil: 1.1) Os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal. 1.2) São créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts. 84 e 149 da Lei n. 11.101/2005. 2. Recurso especial provido." (REsp 1152218/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 7/5/2014, DJe 9/10/2014) É sabido que verbas de natureza alimentar são absolutamente impenhoráveis. O art. 649 do CPC com a redação dada pela Lei n. 11.382/2006 expressamente consignou a impenhorabilidade dos honorários de profissional liberal. Nas palavras do doutrinador Elpídio Donizetti: "Agora, todo e qualquer numerário recebido em decorrência de relação de trabalho é impenhorável, ou seja, o vencimento percebido por funcionário público, subsídio de membro de poder (magistrados, parlamentares e presidente da República, entre outros), o soldo do militar, a remuneração do empregado celetista. Igualmente penhorável é o provento do aposentado, a pensão paga ao dependente do segurado morto, o pecúlio (isto é, a aplicação, a poupança programada para utilização depois de um determinado tempo ou idade do poupador), o montepio, ou seja, o benefício instituído em favor de terceiros, para ser recebido depois da morte do instituidor. Também não se admite a penhora sobre as quantias recebidas por liberalidade de terceiros e destinados ao sustento do devedor e de sua família (tenças), bem como os ganhos do trabalhador autônomo e do profissional liberal" (Curso Didático de Direito Processual Civil, 10ª Edição, Lumen Juris Editora, p. 670). Regra geral, toda verba que ostente natureza alimentar e que seja destinada ao sustento do devedor e de sua família é impenhorável. Com efeito, a impenhorabilidade, nesses casos, decorre da natureza e da finalidade da verba. No mesmo sentido: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CRÉDITOS DE NATUREZA ALIMENTAR. IMPENHORABILIDADE. 1. Os honorários advocatícios, tanto os contratuais quanto os sucumbenciais, têm natureza alimentar. Precedentes do STJ e de ambas as turmas do STF. Por isso mesmo, são bens insuscetíveis de medidas constritivas (penhora ou indisponibilidade) de sujeição patrimonial por dívidas do seu titular. A dúvida a respeito acabou dirimida com a nova redação art. 649, IV, do CPC (dada pela Lei n.º 11.382/2006), que considera impenhoráveis, entre outros bens, "os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal". 2. Recurso especial a que se nega provimento." (REsp 1032747/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/3/2008, DJe 17/4/2008) Todavia, a regra disposta no art. 649, inciso IV, do CPC não pode ser interpretada de forma literal. Em determinadas circunstancias é possível a sua relativização, como ocorre nos casos em que os honorários advocatícios recebidos em montantes exorbitantes ultrapassam os valores que seriam considerados razoáveis para sustento próprio e de sua família. Nesses casos, a verba perde a sua natureza alimentar e a finalidade de sustento. Como bem determinou o Min. Raul Araújo, no julgamento do REsp n.1356404/DF "Não viola a garantia assegurada ao titular de verba de natureza alimentar a afetação de parcela menor de montante maior, desde que o percentual afetado se mostre insuscetível de comprometer o sustento do favorecido e de sua família e que a afetação vise à satisfação de legítimo crédito de terceiro, representado por título executivo (...) Sopesando criteriosamente as circunstâncias de cada caso concreto, poderá o julgador admitir, excepcionalmente, a penhora de parte menor da verba alimentar maior sem agredir a garantia desta em seu núcleo essencial" A propósito a ementa do referido julgado: "RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA. IMPENHORABILIDADE (CPC, ART. 649, IV). MITIGAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS ESPECIAIS. ELEVADA SOMA. POSSIBILIDADE DE AFETAÇÃO DE PARCELA MENOR DE MONTANTE MAIOR. DIREITO DO CREDOR. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. É firme nesta Corte Superior o entendimento que reconhece a natureza alimentar dos honorários advocatícios e a impossibilidade de penhora sobre verba alimentar, em face do disposto no art. 649, IV, do CPC. 2. Contudo, a garantia de impenhorabilidade assegurada na regra processual referida não deve ser interpretada de forma gramatical e abstrata, podendo ter aplicação mitigada em certas circunstâncias, como sucede com crédito de natureza alimentar de elevada soma, que permite antever-se que o próprio titular da verba pecuniária destinará parte dela para o atendimento de gastos supérfluos, e não, exclusivamente, para o suporte de necessidades fundamentais. 3. Não viola a garantia assegurada ao titular de verba de natureza alimentar a afetação de parcela menor de montante maior, desde que o percentual afetado se mostre insuscetível de comprometer o sustento do favorecido e de sua família e que a afetação vise à satisfação de legítimo crédito de terceiro, representado por título executivo. 4. Sopesando criteriosamente as circunstâncias de cada caso concreto, poderá o julgador admitir, excepcionalmente, a penhora de parte menor da verba alimentar maior sem agredir a garantia desta em seu núcleo essencial. 5. Com isso, se poderá evitar que o devedor contumaz siga frustrando injustamente o legítimo anseio de seu credor, valendo-se de argumento meramente formal, desprovido de mínima racionalidade prática. 6. Caso se entenda que o caráter alimentar da verba pecuniária recebe garantia legal absoluta e intransponível, os titulares desses valores, num primeiro momento, poderão experimentar uma sensação vantajosa e até auspiciosa para seus interesses. Porém, é fácil prever que não se terá de aguardar muito tempo para perceber os reveses que tal irrazoabilidade irá produzir nas relações jurídicas dos supostos beneficiados, pois perderão crédito no mercado, passando a ser tratados como pessoas inidôneas para os negócios jurídicos, na medida em que seus ganhos constituirão coisa fora do comércio, que não garante, minimamente, os credores. 7. Recurso especial a que se nega provimento." (REsp 1356404/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 4/6/2013, DJe 23/8/2013) No casos dos autos, o Tribunal de origem manteve a penhora no rosto dos autos ressalvando o valor de R$ 15.000,00 a ser disponibilizado ao advogado relativamente a cada parcela do montante devido. Como se vê, o valor penhorado não compromete o sustento do advogado e de sua família. Ademais, o princípio da menor onerosidade do devedor, insculpido no art. 620 do CPC, tem de estar em equilíbrio com a satisfação do credor, sendo indevida sua aplicação de forma abstrata e presumida e, no presente caso, não há notícias de outros bens em nome do devedor passíveis de penhora. Desse modo, mantenho o acórdão recorrido. Ante o exposto, não conheço do recurso especial da Fazenda Nacional e nego provimento ao recurso especial da Perdigão Agroindustrial S/A. É como penso. É como voto. MINISTRO HUMBERTO MARTINS Relator CERTIDÃO Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: "A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso da Fazenda Nacional; negou provimento ao recurso de Perdigão Agroindustrial S.A., nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques (Presidente) e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.